CHAMADA DOSSIÊ TEMÁTICO: Produção de conhecimentos, verdades e subjetividades na interface entre currículos e saúde sexual

11-12-2024

O conceito de biopolítica, cunhado por Michel Foucault, permanece em constante atualização, sendo ampliado, por exemplo, por Nikolas Rose (2013), que o identifica como biopolítica contemporânea. Essa política da vida, em nosso século, ultrapassa a tradicional delimitação entre saúde e doença, deslocando-se para a administração e (re)modelação das próprias capacidades de viver. Nesse contexto, os corpos, desejos e modos de vida, especialmente das populações LGBTQIAP+, tornam-se centrais na produção de subjetividades e saberes, bem como na contestação de normas sociais e biomédicas.

Tecnologias como a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), parte da Prevenção Combinada do Ministério da Saúde, ilustram essas dinâmicas. A PrEP permite a indivíduos, incluindo muitas pessoas LGBTQIAP+, negociar novas formas de viver suas sexualidades com menos medo e maior autonomia, tensionando práticas preventivas tradicionais e levantando questões sobre os currículos escolares (e não escolares). Por exemplo, a insistência na camisinha como única forma de prevenção, ignorando avanços biomédicos como a PrEP, pode reproduzir narrativas limitadas e excludentes. Isso é particularmente problemático considerando os retrocessos políticos no Brasil, que dificultam a inclusão de debates atualizados sobre saúde sexual e direitos LGBTQIAP+ nos currículos.

Essas questões revelam o entrelaçamento entre saúde sexual, gênero, sexualidade e biopolítica. Conforme Foucault afirmou, devemos investigar “de que maneira o poder penetra e controla o prazer cotidiano” (FOUCAULT, 2014, p. 17). A biopolítica contemporânea afeta diretamente as experiências e vivências LGBTQIAP+, ao mesmo tempo em que abre caminhos para novas subjetividades e formas de contestação, muitas vezes traduzidas ou tensionadas nos currículos.

Assim, a proposta deste dossiê é reunir trabalhos que explorem a interface entre currículo e saúde sexual, com foco em questões que impactem diretamente o público LGBTQIAP+. Algumas perguntas mobilizadoras incluem: Como os avanços biomédicos, como a PrEP, têm sido incorporados às práticas pedagógicas e curriculares? Que saberes e verdades são mobilizados em currículos que abordam saúde sexual e diversidade? Quais subjetividades LGBTQIAP+ estão sendo demandadas ou marginalizadas nesses contextos? Que desafios emergem diante dos retrocessos políticos e da precarização de direitos no Brasil? O objetivo é fomentar reflexões críticas e promover diálogos interdisciplinares que ampliem as discussões sobre currículo, saúde sexual e direitos LGBTQIAP+, contribuindo para enfrentar os retrocessos políticos e para fortalecer práticas pedagógicas inclusivas.

REFERÊNCIAS

ROSE, Nikolas. A política da própria vida: biomedicina, poder e subjetividade no século XXI. São Paulo: Paulus. 2013.
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I. A vontade de saber. São Paulo: Paz e Terra, 2014.

COORDENAÇÃO:

 

ANDERSON FERRARI (Universidade Federal de Juiz de Fora)

Atualmente é professor associado de Ensino de História da Faculdade de Educação da UFJF, lecionando as disciplinas de Prática Escolar, Fundamentos Teórico-metodológico em História e Didática e Prática do Ensino de História, com Estágio Supervisionado. É professor permanente do PPGE/UFJF (mestrado e doutorado) da Universidade Federal de Juiz de Fora. Mestrado em Educação pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2000) e doutorado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (2005). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Linguagem Conhecimento e Formação de Professores, atuando principalmente nos seguintes temas: educação, gênero, sexualidade, currículo e homossexualidade. Em 2010 desenvolveu o período de pós-doutorado na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Barcelona, trabalhando com a relação entre Cultura Visual, Educação e Homossexualidades. Em 2013 foi agraciado com a menção honrosa Cora Coralina do edital da ANPED/SECADI pela importante contribuição para área de Diversidade Sexual e Educação. Entre 2014 a 2016 ocupou o cargo de presidente nacional da ABEH- Associação Brasileira de Estudos da Homocultura. De 2020 a 2023 assumiu a coordenação do Programa de Residência Docente da UFJF É coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Gênero, Sexualidade e Diversidade (GESED), assim como pesquisador e membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação, Currículo e Ensino de História (GEPACEH).

 

DANILO ARAUJO DE OLIVEIRA (Universidade Federal do Maranhão)

Professor Adjunto da Universidade Federal do Maranhão no curso de Pedagogia e está vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da mesma Universidade. Doutor em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Educação pela Universidade Federal de Sergipe. Possui graduação em Pedagogia (UNINTER, 2020) e Letras Português/Inglês pela UNIRB Faculdade Atlântico (2013). Líder do Grupo de Pesquisa sobre Questões e Políticas de Currículo. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Currículos e Culturas (GECC) e do Observatório da Juventude. Tem experiência como docente e pesquisador nas seguintes questões: gênero, sexualidade, questões étnico-raciais e currículo.

 

MARCIO CAETANO (UFPel)

Professor Associado da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), atua no Departamento de Ensino e no Programa de Pós-graduação em Educação, onde é coordenador, atuando na mesma função no DINTER (Universidade do Vale do Acaraú/Sobral-Ceará e PPGE-UFPel) e preside várias comissões. Líder do Grupo de Pesquisa Políticas dos Corpos, Cotidianos e Currículos (POCs-UFPel), coordena o Centro de Memórias João Antônio Mascarenhas (UFPel, UFES, Center for Latin American and Caribbean Studies - Brown University Grupo Arco-Íris-RJ). Também atua como professor permanente do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e integra o Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero - GEERGE. Entre os anos de 2011 e 2020, foi docente na Universidade Federal do Rio Grande-FURG, assumindo a Diretoria de Desenvolvimento do Estudante da Pró-reitoria de Assuntos Estudantis (2013-2015) e também atuando em várias comissões normativas da Pró-Reitoria de Graduação. Na mesma instituição, entre 2016 e 2018, foi membro Conselho Superior Universitário - CONSUN. Paralelo a essas funções acadêmico-administrativas, foi editor da Revista Momento - diálogos em educação (2012 - 2019) e docente na pós-graduação. Até o momento, publicou 83 artigos em periódicos especializados, mais 70 trabalhos em Anais de eventos, 60 capítulos de livros e 13 livros, como autor e/ou editor. Possui vários itens de produção técnica e artística, dentre eles, o Documentário Quando Ousamos Existir (2022), que recebeu inúmeros prêmios em festivais especializados no Brasil e exterior. Membro de redes de pesquisas nacionais e internacionais, participou de eventos no exterior e no Brasil e recebeu 3 prêmios e/ou homenagens. Até o momento, orientou 16 trabalhos de dissertação de mestrado, 11 teses de doutorado (sendo 06 como co-orientador), 20 pesquisas de iniciação científica e supervisionou 1 estágio de Pós-doutorado. Coordenou vários projetos de pesquisa que contaram com financiamento de agências de fomentos e incentivos da Universidade, atualmente está coordenando em 2 projetos de pesquisa com apoio da FAPERGS e UFPel. Colabora em conselhos editoriais de vários periódicos e é Co-Editor da Revista Cadernos de Educação da UFPel (A2) e Sul-sul Revista de Ciências Humanas e Sociais da UFOB (B3). Conselheiro Fiscal da Associação Brasileira de Currículo (ABdC), coordenador do GE COTIDIANOS - ÉTICAS, ESTÉTICAS E POLÍTICAS e membro da Comissão de Diversidade, Acessibilidade e Ações Afirmativas da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), desenvolve parcerias com instituições e redes internacionais El telar: pensamiento feminista Latinoamericano (Universidad Nacional de Cordoba/Argentina, UFF/RJ-BR, UNAM/México, Universidad Manuela Beltrán/Colômbia e UFPel/RS-BR), Center for Latin American and Caribbean Studies - Brown University) e a Red Latinoamericana de Estudios Epistemológicos en Política Educativa. Filiado a Associação Brasileira de Estudos da Homuculturas, entidade em que atuou na direção (2013 e 2015). É membro, desde 2017, do Conselho de Ética da entidade brasileira Aliança LGBTI+ e atuou no Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de LGBT da Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e do Conselho Municipal dos Direitos e da Cidadania LGBTI+ de Pelotas. Suas pesquisas voltam-se à área de Educação, com ênfase em estudos sobre Currículos e Pedagogias Culturais Juvenis. Em seu Currículo Lattes os termos mais frequentes na contextualização da produção científica, tecnológica e artístico-cultural são: movimentos sociais populares, políticas públicas e cidadania, populações LGBTI+, gênero, sexualidade, marcadores sociais de diferença, desigualdades, currículos e escolas.

 

TIM DEAN (University of Illinois at Urbana-Champaign)

Em uma era de sobrecarga de informações, a pesquisa interdisciplinar de Dean aborda a produção de significado — existencial e semiótico — bem como como o significado falha. Ele investiga questões amplas de produção de significado em gêneros discursivos, em campos díspares (literatura, cinema, fotografia, antropologia, filosofia, psicanálise), em divisões nacionais e em períodos históricos tradicionais. Na pesquisa sobre poesia e poética, concentra-se na transformação — mas também na persistência — de formas verbais importantes, como o soneto do século XVI até o presente. Na pesquisa sobre sexualidade humana, concentro-se em práticas sexuais estigmatizadas ou minoritárias, incluindo formações subculturais, que se afastam das normas sociais. É interessado em cultura popular e vernáculos subculturais (bem como alta cultura e linguagem literária), pesquisa pornografia além de poesia (veja Porn Archives no site do autor). O fio condutor de sua pesquisa sobre sexualidade inclui mais de 30 anos de trabalho sobre a história das pandemias, notadamente HIV/AIDS. Essa gama de focos requer uma abordagem de métodos mistos: etnografia, análise formalista, leitura atenta, filosofia continental e pragmatista e psicanálise pós-freudiana. Na maioria das vezes, suas publicações colocam em primeiro plano questões metodológicas e refletem explicitamente sobre normas disciplinares. Pelo trabalho em teoria psicanalítica, recebeu um prêmio Distinguished Educator do International Forum for Psychoanalytic Education em 2022. Seu programa de pesquisa — que rendeu 7 livros e mais de 170 capítulos de livros, artigos de periódicos revisados ​​por pares e resenhas — foi apoiado pelo National Endowment for the Humanities, pela Fulbright Foundation, pelo Center for Advanced Study e institutos de humanidades da Stanford University, SUNY-Buffalo e da University of Illinois, bem como pela James M. Benson Professorship.