O PODER MÉDICO DE “PENETRAR” E O PODER JURÍDICO DE “INFAMAR”: UM CRIME DE DEFLORAMENTO EM CUIABÁ (1920-1940)

Autores

  • Mayara Laet Moreira Universidade do Estado de Mato Grosso

Palavras-chave:

Relações de poder, Defloramento, Jogo de verdades.

Resumo

A trama discursiva desta pesquisa tem como ponto de partida narrar a experiência de Aldair França, cuja trajetória causou desordem, tumulto e excitações na cidade de Cuiabá na década de 1930, resultando na instauração de um processo por crime de defloramento. Por que teria esse acontecimento causado tanto frenesi no decoro público? O caso Aldair se insere em um momento de mudanças políticas e sociais que perpassaram o Brasil desde a Abolição da escravatura (1888), a Proclamação da República (1889), o Código Penal de 1890, e que se intensificou entre as décadas de 1920 e, principalmente, em 1930 com a instalação do regime autoritário. Definitivamente, a cultura política brasileira do início do século XX, principalmente sob atuação de médicos, juristas, educadores e literatos, procurou energicamente organizar a estrutura urbana, cultivar qualidades morais socialmente aceitas, avançar material e intelectualmente. Isto é, pôr a vida sob regras e normas a respeitar. É, nesse sentido, que a mulher passou a ter, dentre as obrigações cívicas e os deveres patrióticos, a missão de cuidar dos filhos, pois o aperfeiçoamento moral da sociedade e o desenvolvimento nacional dependiam da maternidade. Contrapondo a utopia de construção de um novo mundo, temos mulheres que transgrediram a norma familiar-social, as condutas tipicamente femininas e romperam com o destino que lhes fora reservado pelo discurso biológico. Sendo assim, focalizamos as redes invisíveis inscritas substancialmente no procedimento técnico do processo judicial que trouxe à luz essa personagem, bem como o regime de verdades e os discursos de saber-poder que circularam entre as décadas de 1920 e 1940. Toda a sua movimentação foi atravessada por uma linha tênue entre o discurso jurídico e o saber médico, que pretendiam controlar seu corpo, sua sexualidade, disciplinar suas práticas cotidianas, seus gestos, desvendar seus segredos, seus desejos. É preciso, também, evidenciar o jogo de metades que perpassou o processo do começo ao fim, e que, aos poucos, ajustavam as peças uma às outras colhidas no desenrolar desse drama policial, na tentativa de recompor o cenário do crime. Por último, procuramos dar visibilidade ao próprio acontecimento que, em si, já causava uma tensão entre as leis do Estado e a instituição familiar, nos revelando pistas sobre a abertura de mundos possíveis. Embrenhados nessa proposta e inspirados por Michel Foucault, pretendemos evidenciar os processos de subjetivação circunscritos no processo que, no intervalo entre o poder médico de “penetrar” e o poder jurídico de “infamar”, inscreveu, seja pela vontade normativa, seja pelas vozes que estilizaram sua existência – por vezes loquaz, por outras silenciosas –, a trajetória de Aldair.

Biografia do Autor

Mayara Laet Moreira, Universidade do Estado de Mato Grosso

Doutoranda em História pela Universidade Federal de Mato Grosso (2016); mestra em História pela Universidade Federal de Mato Grosso (2015); graduada em História pela Universidade do Estado de Mato Grosso (2012). Desenvolve pesquisas na área de História e Gênero, atuando principalmente nos seguintes temas: feminismo, sexualidade, relações de poder e corpo.

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Publicado

2017-08-15

Como Citar

Moreira, M. L. (2017). O PODER MÉDICO DE “PENETRAR” E O PODER JURÍDICO DE “INFAMAR”: UM CRIME DE DEFLORAMENTO EM CUIABÁ (1920-1940). Revista Outras Fronteiras, 4(1), 246. Recuperado de https://periodicoscientificos.ufmt.br/outrasfronteiras/index.php/outrasfronteiras/article/view/267

Edição

Seção

Resumos de Dissertações e Teses