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Artigos

COMPREENSÕES SOBRE CIÊNCIA DE CRIANÇAS RIBEIRINHAS AMAZÔNICAS

SCIENCE UNDERSTANDINGS OF AMAZONIAN RIVERINE CHILDREN

Ana Paula Melo Fonseca 1
Universidade do Estado do Amazonas, Brasil
Augusto Fachín Terán 2
Universidade do Estado do Amazonas, Brasil
Marlece Melo Fonseca 3
Instituto Federal do Amazonas- IFAM, Brasil

REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

ISSN-e: 2318-6674

Periodicidade: Frecuencia continua

vol. 7, núm. 1, 2019

revistareamec@gmail.com

Recepção: 14 Janeiro 2019

Aprovação: 08 Maio 2019



DOI: https://doi.org/10.26571/REAMEC.a2019.v7.n1.p312-323.i7834

Os direitos autorais são mantidos pelos autores, os quais concedem à Revista REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática - os direitos exclusivos de primeira publicação. Os autores não serão remunerados pela publicação de trabalhos neste periódico. Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada neste periódico (ex.: publicar em repositório institucional, em site pessoal, publicar uma tradução, ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial neste periódico. Os editores da Revista têm o direito de proceder a ajustes textuais e de adequação às normas da publicação.

Resumo: As crianças são sujeitos dotados de capacidades cognitivas, e não devem ser vistas apenas como seres com pouca idade e receptoras das ações dos adultos. Elas aprendem por meio de interações em diferentes contextos sociais e pensam segundo lógica própria. Neste estudo, objetivou-se compreender qual o entendimento sobre ciência de crianças da Educação Infantil de uma escola ribeirinha do município de Parintins-AM. O estudo é de natureza qualitativa. Os sujeitos foram 15 crianças do II período da Educação Infantil. Os dados foram coletados durante um semestre letivo, usando as técnicas de observação participante; roda de conversa, relatos livres e atividade de desenhos. O compartilhamento de informações durante as atividades realizadas despertou nas crianças um olhar para a presença da ciência em seu cotidiano. A visão de ciência das crianças está ligada à transformação da natureza pela ação humana. As crianças ribeirinhas aprendem sobre a ciência através de suas vivências na comunidade e na escola. Desenvolver com elas atividades que despertem a oportunidade de expressar seu pensar sobre o mundo e sobre a ciência é uma forma de valorização, visto que a mesma é um ser que constrói seu próprio conhecimento.

Palavras-chave: Ciência na Educação Infantil, Escola ribeirinha, Espaços Não Formais, Amazônia.

Abstract: Children are cognitively gifted individuals, and should not be seen only as beings of little age and recipients of adult actions. They learn through interactions in different social contexts and think according to their own logic. The purpose of this study was to understand the understanding about children's science in Early Childhood Education in a riverside school in the municipality of Parintins-AM. The study is qualitative in nature. The research subjects were 15 children from Early Childhood Education. Data were collected during a semester, using participant observation techniques; conversation wheel, free reports, and drawing activity. The information sharing during the carried out activities aroused in the children a different point of view for the presence of science in their daily life. The vision of science of children is linked to the transformation of nature by human action. Riverine children learn about science through their experiences in the community and at school. Developing with them activities that arouse the opportunity to express their thinking about the world and about science is a form of appreciation, since it is a being that builds its own knowledge.

Keywords: Science in Early Childhood Education, Riverine School, Non-Formal Spaces, Amazon.

1. INTRODUÇÃO

Atualmente vivemos em um cenário em que as conexões da ciência crescem a cada dia, oportunizando a educação um alicerce para ensinar e aprender de forma prazerosa. No entanto, entender o que é ciência e sua importância para a sociedade ainda precisa ser esclarecido para os estudantes e docentes no contexto escolar. Diante disso, faz-se necessário introduzir a ciência desde os primeiros anos escolares para familiarizar a criança com o universo científico (LORENZZETTI; DELIZOICOV, 2013). Estabelecer uma relação com a ciência é fator primordial para o desenvolvimento do ensino e aprendizagem, que não se resume apenas à leitura e escrita, mas necessita também da leitura de mundo compartilhada com suas experiências cotidianas (CHASSOT, 2011).

As escolas inseridas em contextos ribeirinhos precisam valorizar os conhecimentos prévios das crianças, que são parte da cultura local, a fim de aproximá-los dos conhecimentos científicos (CHASSOT, 2011). Em destaque pode-se citar os fazeres ribeirinhos intrinsecamente ligados à diversidade biológica e à diversidade do modo de vida, como o nadar, pescar, caçar e outras atividades que proporcionam o contato das crianças com a natureza.

As crianças das comunidades amazônicas interagem com seus pares em diversos espaços, apresentando características diferenciadas, para que possamos entender seus gestos, pensamentos, pois são produtoras de cultura e co-criadoras do mundo, precisando ser ouvidas e valorizadas em seus contextos (MARCHI, 2010). Nesse sentido o objetivo deste trabalho foi compreender qual o entendimento sobre ciência em crianças da Educação Infantil numa escola ribeirinha do município de Parintins.

2. REFERENCIAIS TEÓRICOS

2.1. Espaços não formais e a alfabetização científica

Os espaços não formais oferecem a oportunidade de suprir, ao menos em parte, algumas das carências da escola, como a falta de laboratórios, recursos audiovisuais, entre outros, conhecidos por estimular o aprendizado (ARAUJO; SILVA; FACHÍN-TERÁN, 2011). Na região Amazônica, as escolas ribeirinhas dispõem de espaços privilegiados rico em recursos naturais que, quando usadas, podem contribuir para o melhoramento das aulas, tornando-se motivadoras para a aprendizagem das crianças (SILVA; FACHÍN-TERÁN, 2015). O uso desses espaços faz com que a criança passe a ter um bom desempenho em seu aprendizado, fazendo com que elas discutam e interliguem as experiências vivenciadas com os ensinamentos de conteúdo na sala de aula.

Lorenzetti e Delizoicov (2013, p. 125) pontuam que “[...] a alfabetização científica é um processo pelo qual a linguagem das Ciências Naturais adquire significados, constituindo-se num meio de ampliação da cultura elaborada”. Nesse feito, incentivar na criança a investigação desde cedo, oportuniza o desenvolvimento do pensar infantil que ultrapassa a compreensão de conteúdos e se materializa em novas aprendizagens disseminadas em seu contexto social, tornando formador de opiniões. O uso dos espaços não formais assume um importante papel na alfabetização cientifica das crianças. A relevância da alfabetização científica desenvolvidas nesses espaços está principalmente em transcender aquela oferecida pela escola (ROCHA; FACHÍN-TÉRAN, 2010).

Na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental, é preciso considerar a fase de desenvolvimento das crianças, cabendo ao professor assumir o papel de organizar e mediar as situações de aprendizagem nesses espaços, mesmo naqueles que dispõem de monitores. O professor deverá organizar a aula passeio, estabelecendo os objetivos e os procedimentos que deverão ser atingidos, senão pode acabar se transformando em uma atividade somente de passeio e recreação, perdendo uma ótima oportunidade para ensinar ciências (ROCHA; FACHÍN-TERÁN, 2010). As crianças se manifestam à sua maneira nos mostrando possibilidades de construção de conhecimentos que são próprios de sua vivencia, havendo, portanto, uma troca de sentidos que afetam tanto o pesquisador quanto a criança, visto que o conhecimento encontra significado para ambos.

O conhecimento não gira apenas em torno da escola, ele envolve todos os espaços onde há vida (JESUS; LEITE, 2014). Os espaços não formais educativos, além de apresentar a cultura científica servem também como uma alternativa à prática pedagógica das escolas (ROCHA; FACHIN-TERÁN, 2010, p. 43). Acreditamos que estes espaços são grandes facilitadores do ensino e aprendizagem para a criança permitindo a descoberta de novos conhecimentos a partir de experiências nesses espaços.

2.2. Crianças como produtoras de culturas

As crianças produzem culturas a partir das suas vivências em diversos contextos, criam e recriam situações que são imbuídas de significações, nesse processo há todo um arcabouço de diferenças por causa do contexto social, cultural e de valores, mas, o que há de comum entre as crianças? O elemento em comum entre as crianças são as representações de experiências ligadas ao seu cotidiano por meio dos jogos e da construção imaginária de contexto de vida (SARMENTO, 2003).

Dessa forma, entende-se que a cultura infantil é caracterizada pela relação presente entre a fantasia e a realidade, entre o presente e o imaginário. Essas relações da criança com o mundo permitem-nos uma compreensão do imaginário infantil em diferentes contextos que contribuem com o processo de formação e desenvolvimento da personalidade e racionalidade (SARMENTO, 2003).

Entre as formas culturais produzidas pelas crianças a linguagem é a que se desenvolvem nas interações de pares (MARCHI, 2010). Nesse sentido, Sarmento (2013, p. 10) reforça que “as culturas das crianças são prioritariamente, culturas de pares, isto é: um conjunto estável de atividades ou rotinas, artefatos, valores e ideias que as crianças produzem e partilham com seus pares”.

Posto isto, as crianças como produtoras de culturas, precisam ser ouvidas em seus contextos, e os espaços não formais surgem como possibilidade para essa construção dialógica. Sasseron e Carvalho (2007) apontam que:

A introdução dos estudantes na cultura científica implica proporcionar e propiciar espaço e tempo em que os alunos possam estudar temas científicos utilizando ferramentas culturais próprias desse cenário. Em nossa visão, para o início da alfabetização científica é importante que os alunos travem conhecimentos de artifícios legitimamente associados ao trabalho do cientista, como por exemplo, o levantamento e teste de hipóteses na tentativa de resolução de um problema qualquer sobre o mundo natural, o uso do raciocínio lógico como forma de articular suas ideias e explicações e linguagem em suas diversas modalidades (escrita, gráfica, oral e gestual) como requisito para argumentação e justificativa de ideias sobre o mundo natural (p.5, grifo das autoras).

As atividades desenvolvidas nos espaços não formais permitem o contato das crianças com diferentes tipos de saberes, contribuindo com novos sentidos, formulação de novas hipóteses e novos conhecimentos. Esses espaços se apresentam como uma alternativa para o ensino e aprendizagem, pois para a criança, estes espaços fazem parte de seu cotidiano, abrindo a possibilidade de uma aprendizagem significativa.

3. ASPECTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa foi realizada na escola Santa Luzia do Macurany, comunidade ribeirinha localizada a 7 km da cidade Parintins, Amazonas. O espaço físico da escola é constituído de 4 salas de aula climatizadas, 1 laboratório de informática, 1 secretaria, 1 cantina, 2 banheiros e 1 almoxarifado; além de uma extensa área natural. A escola possui floresta no seu entorno, ambiente propício para trabalhar diversos conteúdos de ensino de ciências, pois tem uma biodiversidade possível de ser utilizada como recurso pedagógico em diversas áreas do conhecimento.

Os sujeitos participantes da pesquisa foram 15 crianças ribeirinhas do II período da educação infantil. As crianças moram perto da escola e suas casas têm no seu entorno a floresta, estando familiarizadas com a natureza, com seus costumes onde a vida não é algo estático, pois participam de atividades como a pesca, agricultura, tomar banho no rio, etc.

Neste trabalho, usou-se a pesquisa de cunho qualitativa com abordagem fenomenológica, “a pesquisa qualitativa com apoio teórico na fenomenologia é essencialmente descritiva, sendo que as descrições dos fenômenos estão impregnadas dos significados que os outorga” (TRIVÍNOS, 2008, p. 128).

Os dados foram coletados através das técnicas de observação participante em ambiente não formal; rodas de conversas/relatos livres e atividade de desenho. A observação participante iniciou em fevereiro e terminou em junho. A aplicação das atividades de desenhos em espaço fora da sala de aula deu oportunidade para as crianças expressarem suas opiniões e compreenderem o significado de ciência. As crianças puderam discorrer em roda de conversa dialogando sobre o ambiente no qual vive, o que percebiam nele e se conheciam aspectos da ciência a sua volta. As falas das crianças foram identificadas com nomes fictícios.

Para trabalhar com as crianças foi entregue o documento de autorização à escola e aos pais ou responsáveis pelas crianças, pois segundo Kramer (2002) é necessário para que as imagens não sejam exploradas ou mal usadas.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com o intuito de compreender a ciência na infância a partir das vozes das crianças, fez-se necessário um diálogo, mantendo sempre a participação e o envolvimento dos pesquisadores com esses sujeitos, pois é necessário o pesquisador se colocar no ponto de vista das crianças descentrado seu olhar adultocêntrico para poder entender o mundo social da infância através de suas vozes (KRAMER, 2005).

A roda de conversa com as crianças foi realizada na área externa da escola, sendo solicitada a cooperação delas (Fig. 1). Oliveira-Formosinho (2008, p.16) diz que: “a criança é possuidora de uma voz própria, que deverá ser seriamente tida em conta, envolvendo-a num diálogo democrático e na tomada de decisão”. Na roda de conversa registramos as falas, compartilhamos experiências e construímos um ambiente comunicativo de verdadeira interação.

De acordo com Moura e Lima (2014, p.101):

As rodas de conversa consistem em um método de participação coletiva de debate acerca de determinada temática em que é possível dialogar com os sujeitos, que se expressam e escutam seus pares e a si mesmos por meio do exercício reflexivo. Um dos seus objetivos é de socializar saberes e implementar a troca de experiências, de conversas, de divulgação e de conhecimentos entre os envolvidos, na perspectiva de construir e reconstruir novos conhecimentos sobre a temática proposta.

As crianças tiveram a oportunidade de expressar seus pensamentos de maneira informal, pois, tratando-se de crianças pequenas, torna-se uma atividade fundamental para ampliar sua competência comunicativa.

Crianças pequenas participando na roda da conversa
Figura 1
Crianças pequenas participando na roda da conversa
Fonte: figura selecionada pelos pesquisadores a partir da coleta de dados

Quando perguntado sobre ciência, o menino (João) disse: “só sei o nome”, outra (Pedro) disse: “só conheço de televisão”. Nisso percebemos que a ciência era pouco contextualizada no âmbito escolar, a clareza dessa afirmação deu-se pelas expressões e pelas falas. A maioria desconhecia a presença da ciência no cotidiano de sua comunidade. A partir do compartilhamento de informações foi possível despertar o olhar das crianças para perceberem a presença da ciência em seu cotidiano. De forma simples as crianças expuseram seus conhecimentos através do diálogo com os pesquisadores que especificaram as transformações que a ciência proporciona a nossa sociedade de forma simples e concreta, exemplificando os elementos presentes na realidade das crianças.

Após a conversa uma criança (Elias) aponta, dizendo “então a ciência está em toda a parte, até na minha sandália que calço para vim a escola”. No pensar da criança ela esclarece que a sua sandália para chegar a seus pés, passou por processos de mudança e a ciência esteve presente nessa construção. Outras vozes foram sendo ouvidas e compartilhamos saberes junto com as crianças de maneira dialógica.

Adiante, realizamos atividades de desenho com as crianças com o objetivo de compreender qual o significado de ciência para as crianças do II período do Maternal. A partir do desenho a criança organiza informações, processa experiências vividas, revela seu aprendizado e pode desenvolver um estilo de representação singular do mundo (GOLDBERG; YUNES; FREITAS, 2005). Dessa maneira, através do desenho, as crianças puderam expressar seus sentimentos e opiniões, é uma forma de representar sua realidade, bem como seu olhar sobre a concepção de mundo e os fatores que nele se desenvolvem como a ciência.

A aplicação dos desenhos foi realizada no espaço não formal próximo à escola (Fig. 2). Procuramos um ambiente que propiciasse maior interação com as crianças, onde as mesmas conversassem a fim de expor opiniões. Paulo Freire (2011, p. 88) nos fala que “ensinar não se configura unicamente em transmitir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção, de modo que, educador e educando aprendam e ensinem numa dinâmica dialógica e transformadora na consciência de si com o mundo”. No ambiente selecionado as perguntas fluíram, havendo uma troca de informações que nos proporcionaram conhecer uma realidade diferente, através do pensar infantil.

Interessante expor a fala da criança (Carolina) “gosto de estudar aqui fora, com vento, nuvens e árvores”. Os espaços não formais surgem como estratégia para auxiliar no processo de ensino-aprendizagem das crianças, haja vista que a região amazônica é rica em laboratórios vivos e muitas vezes eles são pouco explorados pelos docentes da educação básica (CASCAIS; FACHÍN-TERÁN, 2015). O diálogo nesse espaço tornou-se dinâmico e educativo, com bastante interação entre as crianças.

Oficina de desenho
Figura 2
Oficina de desenho
Fonte: Figura selecionada pelos pesquisadores a partir da coleta de dados.

No desenho, a criança apresenta elementos como árvores, casas, flores (Fig. 3) transmitindo um saber que está ligado ao mundo pelas suas invenções e progressos, mesmo não tendo um conhecimento formal de ciência, a criança expressa sua visão por meio do espaço vivido, trazendo elementos naturais, como árvores, animais e plantas. Para Fonseca et al. (2018, p. 173):

A região amazônica é um grande laboratório ao ar livre onde o professor encontra um ambiente que lhe possibilita inúmeras possibilidades de ensino-aprendizagem. Os elementos naturais que constituem este rico ecossistema ficam presentes no entorno das escolas ribeirinhas amazônicas, proporcionando espaços diversificados para intervenções pedagógicas, envolvendo temáticas relacionadas ao cotidiano do homem amazônico.

Assim, o contexto físico das crianças é um disparador para contribuir com a aprendizagem sobre os conteúdos escolares, a descrição das crianças em suas falas e desenhos exalta a natureza de seu cotidiano. Para transformar esse conhecimento de senso comum em conhecimento escolar é necessário que o professor faça a relação desses saberes introduzindo os conteúdos de forma dialógica.

Desenho com elementos ligados ao mundo natural.
Figura 3
Desenho com elementos ligados ao mundo natural.
Fonte: figura selecionada pelos pesquisadores a partir da coleta de dados.

A criança compreende que a escola está presente no processo de construção da ciência, reconhece que é um sujeito que interage com os conhecimentos produzidos pela ciência, ao fazer parte do ambiente escolar. A escola é importante disseminadora de conhecimento devendo sempre estar ligando conteúdos sistematizados aos conhecimentos da realidade das crianças, utilizando estratégias pedagógicas que despertem sua curiosidade.

Chassot (2011, p. 91) destaca que:

A ciência pode ser considerada como uma linguagem construída pelos homens e pelas mulheres para explicar o nosso mundo natural. Compreendermos essa linguagem (da ciência) como entendemos algo escrito em uma língua que conhecemos (por exemplo, quando se entende um texto escrito em português) é podermos compreender a linguagem na qual está (sendo) escrita a natureza. Também é verdade que nossas dificuldades diante de um texto em uma língua que não dominamos podem ser comparadas com as incompreensões para explicar muitos dos fenômenos que ocorrem na natureza.

Desse modo, é importante que a ciência seja discutida na escola desde a Educação Infantil para que facilite a compreensão das relações existentes entre escola e comunidade.

Outros elementos fora do contexto amazônico como dinossauros foram acrescentados aos desenhos (fig. 4), nisso percebemos que a criança tem a percepção de que a ciência vem sofrendo mudanças. O pensar da criança possibilita o entendimento de ciência como um fator de tempo, construindo uma visão interligada às transformações de mundo.

As crianças em todos os desenhos representaram suas casas, seus desenhos refletem que a ciência está ligada ao seu mundo desde sua criação. A casa representa ainda para as crianças um lugar de abrigo, visto que estão em adaptação no ambiente escolar, uma criança (Gabriel) em meio aos desenhos após a conversa sobre ciência fala “a ciência está em todo lugar, nas plantas, na bicicleta...”. A fala da criança aponta para o entendimento de que a ciência está em nosso mundo como algo ligado à natureza e a produção dos objetos existentes em nossa sociedade.

Desenho com elementos fora do contexto amazônico.
Figura 4
Desenho com elementos fora do contexto amazônico.
Fonte:Figura selecionada pelos pesquisadores a partir da coleta de dados.

A ciência deve ser abordada desde a educação infantil, pois nesse estágio a criança está em processo de construção de si e se adaptando ao ambiente, formulando ideias sobre suas visões de mundo. Diante disso, desenvolver com as crianças atividades que despertem a oportunidade de expressar seu pensar sobre o mundo e sobre a ciência é uma forma de valorização, visto que a mesma é um ser que constrói seu próprio conhecimento. Entender a ciência nos facilita também contribuir para controlar e prevenir transformações que ocorrem na natureza (CHASSOT, 2011). Despertar o olhar da criança para o meio em que vive e socializar os conhecimentos construídos possibilita à criança ver com outros olhos o que ela observava todo dia, mas não vinculava significados.

5. CONSIDERAÇÕES

O compartilhamento de informações e experiências durante a roda de conversa e atividades de desenho despertou nas crianças um olhar para a presença da ciência em seu cotidiano. As crianças de forma simples expuseram seus conhecimentos e seu pensar sobre ciência, passando a ideia que entendiam que a ciência está ligada as transformações do mundo por meio da ação humana.

É importante contextualizar a ciência no ambiente escolar para assim formar cidadãos autênticos e criativos, dando às crianças visibilidade e lugar dentro da sociedade. Nesse sentido os espaços não formais são importantes elementos no processo formativo, onde as crianças expressam seus sentimentos e opiniões de maneira livre, desfrutando dos momentos de conversa e aproveitando o ambiente natural, o mesmo que deve ser aproveitado pelo professor para transformar esse conhecimento de senso comum em conhecimento escolar, com o uso de estratégias pedagógicas que despertem a curiosidade na criança. Diante disso, desenvolver com as crianças atividades que despertem a oportunidade de expressar seu pensar sobre o mundo e sobre a ciência é uma forma de valorização, visto que a mesma é um ser que constrói seu próprio conhecimento.

REFERÊNCIAS

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CABRAL, C.; FACHÍN-TERÁN, A. A aprendizagem significativa como fundamento epistemológico para o ensino de ciências em espaços não formais na Amazônia. Anais do I Simpósio de Ensino de Ciências na Amazônia. Universidade do Estado do Amazonas. Manaus – AM, 20 a 23 de setembro de 2011.

CASCAIS, M. G. A.; FACHÍN-TERÁN, A. Os espaços educativos e a alfabetização científica no Ensino Fundamental. Manaus: Editora e Gráfica MODERNA, 2015. 115p.

CHASSOT, A. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. 5 ed., rev.- Ijuí: Ed. Unijuí, 2011. (Coleção educação em química).

FREIRE, P. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 14 ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

FONSECA, A. P. M.; OLIVEIRA, L. S. J.; FACHÍN-TERÁN, A.; NOBRE, G. L. A ludicidade no ensino de ciências utilizando o tema dos quelônios em uma escola ribeirinha, Parintins-AM, Brasil. Revista REAMEC, v.6, n.1, jan/jun 2018.

GOLDBERG, L. G.; YUNES, M. A. M.; FREITAS, J. V. O desenho infantil na ótica da ecologia do desenvolvimento humano. Revista psicologia em estudo, Maringá, v.10, n.1, p. 97-106, jan/abr, 2005.

JESUS MONTEIRO, M. L.; LEITE, R. C. M. Nem só de escola vive o ensino de ciências: formação científica cidadã no contexto dos museus de ciência. V Enebio e II enebio Regional I. Revista da SBEnbio, n.7, Outubro de 2014.

KRAMER, S. Autoria e autorização: questões éticas nas pesquisas com crianças. Cadernos de Pesquisa, n.116, p. 41-59, julho, 2002.

LORENZETTI, L.; DELIZOICOV, D. Alfabetização científica no contexto das séries iniciais. Rev. Ensaio. Belo Horizonte, v.3, n.1, p.45-61, jan-jun. 2001.

MARCHI, R. C. O “ofício de aluno” e o “ofício de criança”:articulações entre a sociologia da educação e a sociologia da infância. Revista portuguesa de educação, v.23, n.1, p. 183-202, 2010.

MOURA, A. F.; LIMA, M. G. A reinvenção da roda: roda de conversa: um instrumento metodológico possível. Revista temas em educação, João Pessoa, v.23, n.1, p. 98-106, jan.-jun. 2014.

TRIVÍNOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 2008.

ROCHA, S. C. B.; FACHÍN-TERÁN, A. O uso de espaços não-formais como estratégia para o ensino de Ciências. Manaus: UEA/ ENS/PPGEECA, 2010.

SARMENTO, M. J. Imaginário e culturas da infância. Cadernos de educação. FaE/UFPel, Pelotas, v.21, p. 51-69, jul/dez., 2003.

SASSERON, L. H.; CARVALHO, A. M. P. A alfabetização científica desde as primeiras séries do ensino fundamental: em busca de indicadores para a viabilidade da proposta. XVII SNEF-Simpósio Nacional de Ensino de Física, 2007. Disponível em: < http://www.cienciamao.usp.br/tudo/exibir.php?midia=snef&cod=_aalfabetizacaocientifica_1 >. Acesso em: 25 jun. 2014.

SILVA, D. X; FACHÍN-TERÁN, A. Educação científica utilizando o tema dos quelônios amazônicos. Jundiaí, Paco Editorial, 2015, 160p.

Autor notes

1 Mestranda em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia. Universidade do Estado do Amazonas, UEA/ENS, bolsista CAPES.
2 Doutor em Ecologia. Professor do Curso de Pedagogia e do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia da UEA. Manaus, Amazonas, Brasil. Líder do GEPECENF.
3 Mestranda em Educação Profissional tecnológica pelo Instituto Federal do Amazonas- IFAM.

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