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A REPRESENTAÇÃO DO ECOSSISTEMA LAVRADO NOS LIVROS DIDÁTICOS DE CIÊNCIAS DO ENSINO FUNDAMENTAL I, DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE ENSINO DE BOA VISTA, RR
THE REPRESENTATION OF THE ECOSYSTEM LAVRATED IN THE TEACHING BOOKS OF SCIENCES OF FUNDAMENTAL EDUCATION, OF THE PUBLIC NETWORK OF TEACHING OF BOA VISTA, RR
REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, vol.. 7, núm. 1, 2019
Universidade Federal de Mato Grosso

REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil
ISSN-e: 2318-6674
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 7, núm. 1, 2019

Recepção: 19 Novembro 2018

Aprovação: 01 Abril 2019

Resumo: O objetivo deste artigo foi analisar a representação do Ecossistema Lavrado nos livros didáticos de Ciências e observar a contextualização deste conteúdo com a realidade local dos alunos do Ensino Fundamental I da rede pública municipal de ensino de Boa Vista, Roraima. Os dados foram obtidos por meio de pesquisa bibliográfica, onde foram analisados os livros de Ciências utilizados nas escolas municipais. Após a análise, observou-se que não foi encontrado nenhuma referência ao Ecossistema Lavrado. Além disso, notou-se, que os conteúdos presentes nestas obras não fazem contextualização com a realidade local dos alunos, o que pode dificultar a compreensão do conteúdo, uma vez que para existir uma aprendizagem significativa é importante que o estudante consiga identificar a relação entre aquilo que ele estuda e o seu cotidiano.

Palavras-chave: Ecossistema Lavrado, Ciências, Roraima.

Abstract: The objective of this paper was to analyze the representation of the Lavrado Ecosystem in Science textbooks and to observe the contextualization of this content with the local reality of the students of Elementary School I of the municipal public school of Boa Vista, Roraima. The data were obtained through bibliographical survey, where the science books used in municipal schools were analyzed. After the analysis, it was observed that no reference was found to the Lavrado Ecosystem. In addition, it was noted that the contents present in these works do not contextualize the local reality of the students, which may make it difficult to understand the content, since for meaningful learning it is important that the student can identify the relationship between what he studies and his daily life.

Keywords: Lavrado Ecosystem, Sciences, Roraima.

1. INTRODUÇÃO

O livro didático (LD) é uma ferramenta pedagógica de suma importância para o aluno, devido a sua acessibilidade e disponibilidade e para o professor, no auxílio de suas atividades. É evidente a importância que o LD assumiu com o passar dos anos, muitos autores dedicaram-se ao estudo deste, a fim de analisar a sua eficiência. O conhecimento escolar presente no LD tornou-se objeto de estudo e discussão devido à centralidade ocupada no processo de ensino-aprendizagem.

O LD trata-se de um recurso pedagógico de fundamental importância para auxiliar o professor na sala de aula. Lajolo (1996) considera que o livro didático é um instrumento específico, sistemático, aplicável no processo de ensino-aprendizagem de um determinado objeto do conhecimento, geralmente uma disciplina escolar. Constitui-se em uma importante ferramenta no processo de ensino e aprendizagem formal, pois é um instrumento de aprendizagem coletiva e pode ser mediado pelo professor. Mesmo não sendo o único material didático disponível na maioria das escolas, é uma ferramenta que pode ser decisiva para a qualidade do ensino.

Sendo assim, não seria diferente no ensino de ciências, que apesar dos avanços tecnológicos e da enorme variedade de materiais curriculares, disponíveis no mercado, o LD ainda continua sendo o recurso mais utilizado nesta disciplina.

Sabendo da importância que o LD ocupa no processo de ensino e aprendizagem, surgem diversas preocupações relacionadas ao seu uso na sala de aula. E certamente uma das maiores indagações é sobre a contextualização ou descontextualização dos conteúdos presentes no LD com a realidade na qual os alunos estão inseridos. Já que no ensino de ciências, o professor e o aluno podem se deparar com palavras ou termos complexos, de difícil compreensão, então contextualizar os conteúdos com o cotidiano dos alunos é uma estratégia fundamental para o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa.

Então foi escolhido o Ecossistema Lavrado, por fazer parte da realidade local dos alunos do município de Boa Vista. Pois apesar, do Lavrado tratar-se de um ecossistema único, que não é encontrado em outra parte do Brasil, com elevada importância para a conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos (BARBOSA et al 2007). Ele ainda é pouco conhecido, o que dificulta a sua conservação e preservação.

Para nortear esta pesquisa, formulou-se os seguintes questionamentos: De que forma o Ecossistema Lavrado está representado nos livros didáticos de ciências, do ensino fundamental I, da rede pública de ensino do município de Boa Vista?

Tentando responder a esta pergunta, este trabalho tem como objetivo analisar a representação do Ecossistema Lavrado nos livros didáticos de ciências, do Ensino Fundamental I, da rede pública de ensino do município de Boa Vista.

2. ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO

Levando em consideração a importância do LD como ferramenta pedagógica, usada na concretização de uma educação de qualidade, sempre existirá uma preocupação sobre a qualidade, as finalidades e os objetivos do LD, entre os estudiosos da área da educação.

Inicialmente esta preocupação com a qualidade do LD, pode ser observada com a criação do decreto nº 91.542, de 19 de agosto de 1985, que regulamentava o PNLD, e em seu artigo 2º, já estabelecia a avaliação rotineira dos livros. Contudo, foi apenas no início dos anos 90 que o Ministério da Educação e do Desporto (MEC) deu os primeiros passos para participar mais direta e sistematicamente das discussões sobre a qualidade do livro escolar. Foi uma iniciativa do Governo Federal que consistiu em uma ação mais ampla do MEC para avaliar o LD, apresentando um projeto pedagógico difundido por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e dos Guias do livro didático. E em 1994 o MEC criou uma comissão de especialistas encarregada de duas tarefas principais: avaliar a qualidade dos livros mais solicitados ao Ministério e estabelecer critérios gerais para a avaliação das novas aquisições (BRASIL, 1994).

A preocupação com a qualidade do LD, também ficou evidente nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (PCN) de 1998, quando já apontava que era preciso ter cautela no uso do livro em sala de aula.

O livro didático é um material de forte influência na prática de ensino brasileira. É preciso que os professores estejam atentos à qualidade, à coerência e a eventuais restrições que apresentem em relação aos objetivos educacionais propostos. Além disso, é importante considerar que o livro didático não deve ser o único material a ser utilizado, pois a variedade de fontes de informação é que contribuirá para o aluno ter uma visão ampla do conhecimento. (BRASIL, 1998, p. 67)

Segundo Alvarez (1991), a escolha do texto (livro) é uma das poucas autonomias que o professor ainda possui no exercício de sua profissão. Porém, as condições precárias de trabalho do professor, o número demasiado de coleções a serem analisadas, somadas às possíveis lacunas na orientação em sua formação, a escolha do livro didático, terminam por serem feitas de maneira aleatória, caótica, em lugar de ser uma opção consciente. O professor precisa analisar os textos que encontra a seu dispor antes de decidir sobre aquele a ser adotado. Não somente para detectar erro no conteúdo ou distorções pedagógicas, mas principalmente para verificar se os objetivos e pressupostos do autor são adequados ao curso que planejou.

2.1. A contextualização e o ensino de ciências nas escolas municipais de Boa Vista – RR

A partir das críticas sobre o distanciamento existente entre os conteúdos curriculares do ensino de ciências e a realidade dos alunos, as discussões sobre a contextualização do ensino vêm ganhando cada vez mais força entre os estudiosos da educação. Nesse sentido, muito tem sido falado sobre a importância de se considerar o contexto dos alunos e sua realidade, de modo que o que aprendem na escola faça sentido em suas vidas e possa, definitivamente, ser utilizado por eles para resolver problemas diários, tomar decisões de forma autônoma e intervir em seu cotidiano, melhorando suas condições de vida.

Freire (1974), destacava que “ensinar é uma prática social, uma ação cultural, pois se concretiza na interação entre professores e alunos, refletindo a cultura e os contextos sociais a que pertence”.

A contextualização dos conteúdos vem sendo constantemente preconizada e difundida nos documentos que guiam o ensino brasileiro. Na LDB 9.394/96, o artigo 28º, mostra como deve acontecer este processo, quando coloca que “os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente” (BRASIL, 1998). Isso significa que o ensino deve levar em conta o cotidiano e a realidade de cada região. Por sua vez, nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para o Ensino Fundamental (2013, p. 113) traz uma alerta neste sentido, quando diz que:

Os conteúdos curriculares que compõe a parte diversificada do currículo serão definidos pelos sistemas de ensino e pelas escolas, de modo a complementar e enriquecer o currículo, assegurando a contextualização dos conhecimentos escolares diante das diferentes realidades.

E os PCNs referente aos conteúdos de Ciências da Natureza (Brasil, 1998), propõem a contextualização e a transversalidade como meios de motivar o aluno e dar significado ao que é ensinado em sala de aula, pois a contextualização do ensino dá sentido àquilo que o aluno aprende, fazendo com que ele relacione o que está sendo ensinado com suas experiências cotidianas.

Porém, segundo Krasilchick e Marandino (2004), apesar dos avanços nas discussões sobre a contextualização no ensino, o que ainda vemos de forma geral no ensino de ciências é a predominância de práticas tradicionais, com ênfase na memorização de fórmulas e conceitos, nomes científicos e estruturas químicas, o que pouco acrescenta na formação do cidadão.

Então para que aconteça uma (re)significação dos conteúdos ensinados na escola é necessário um entendimento muito mais amplo do que é a realidade do aluno, para que essa não se restrinja à ilustração de um conhecimento científico ou à mera aplicação de um artefato tecnológico (FREIRE, 2005), mas que se apresente como um ponto de partida para a escolha. Como por exemplo, de temáticas socialmente relevantes e de chegada, como uma devolutiva para a sociedade de um saber que começou com ela e que a ela volta agora de forma sistematizada.

A escola deve contribuir para a formação do aluno vendo-o como pessoa humana, crítica e reflexiva frente à realidade em que vive. Portanto, as várias estratégias de ensino devem permitir a significação da aprendizagem, e a contextualização mostra-se como uma possibilidade de dinamizar o ensino, envolvendo mais os alunos com o conhecimento científico, inserido no seu mundo de vida.

O sistema público de ensino das escolas municipais de Boa Vista, dispõe de uma Proposta Curricular Municipal – PCM (BOA VISTA, 2008), que norteia a educação em geral nos anos iniciais do ensino fundamental, essa proposta foi elaborada respeitando as orientações gerais dos documentos oficiais que guiam o ensino brasileiro.

Com relação à contextualização no ensino de ciências esta PCM, propõe que:

O ensino das Ciências Naturais deve contribuir para que as crianças investiguem o ambiente em que vivem e o compreendam melhor com base em leituras críticas das transformações nele realizadas pelo ser humano (BOA VISTA, 2008, p.158).

Este documento traz também alguns aspectos mostrando o papel do professor e do aluno na construção do conhecimento. Dentre os aspectos apresentados, vale ressaltar o primeiro, que se refere ao cotidiano do aluno:

O desenvolvimento do conteúdo deve partir do já conhecido para o desconhecido e transformando os interesses, os conhecimentos e as necessidades em objeto de investigação e pesquisa ultrapassando a barreira do que se conhece (BOA VISTA, 2008, p.159).

O documento deixa bem claro que os temas locais, ou seja, conhecimento diretamente vinculado à realidade, onde a escola está inserida, temas de interesse específico de uma determinada comunidade de acordo com a sua realidade, podem ser trabalhados por meio dos Temas Transversais.

2.2. Características gerais do Ecossistema Lavrado em Roraima

Segundo Barbosa et al. (2007), especificamente aqui no Estado de Roraima, foi atribuído a este ecossistema o termo local “Lavrado” que é destinado a todas as áreas das Savanas. Também aqui no nosso Estado este ecossistema tem características específicas, que não são encontradas em outra parte do Brasil, criando assim, portanto uma identidade ecológica própria. Como mostra (Fonseca, 2008, p. 3):

Apesar de parecido com a paisagem do Centro-Oeste, os campos naturais de Roraima possuem uma diversidade estimada de espécies de plantas por quilômetro quadrado maior que a do cerrado (0,0125 espécie/km2 contra 0,0032 espécie/km2). Isto é por conta da maior extensão em área dos cerrados do Brasil Central, que dilui a densidade de espécies por unidade de área. Entretanto, o lavrado está no Hemisfério Norte, cercado pela Floresta Amazônica e pelo Planalto das Guianas, o que confere à paisagem características e evolução natural única.

A biodiversidade das savanas roraimenses (lavrados) ainda é pouco conhecida o que dificulta a sua proposição como uma das áreas prioritárias para a conservação no estado. Barbosa et al. (2007), ainda coloca que o estado de Roraima possui as maiores áreas de savanas da Amazônia brasileira, ocupando cerca de 20% do território nacional, sendo dominado por áreas abertas, mas também apresenta ambientes florestais. Os ambientes não-florestais são as savanas verdadeiras, cobrindo cerca de 70% da região, as áreas de florestas cobrem menos de um terço da região e são constituídas por matas estacionais, ombrófilas, de contato (ecótonos), e savanas florestas ligadas a rios, lagos e pequenas serras.

Apesar do bom estado de conservação em que o Lavrado se encontra atualmente, mesmo assim, existe a presença de grandes ameaças à conservação deste ecossistema, como o crescimento urbano, a expansão de áreas de lavouras, da silvicultura e a pouca valorização do Lavrado pela população em geral. Sobre isso o Bispo Dom Mário, em uma campanha em defesa do ecossistema lavrado falou:

O Lavrado é uma obra da criação. Precisamos conhecê-lo para preservá-lo. O ecossistema contém diversos recursos por isso é fundamental para Roraima e para a preservação da Amazônia. O seu ecossistema é único e tem como características principais áreas abertas, florestas e buritizais que são fundamentais na preservação das águas: rios, igarapés e lagos (SILVA, 2017, p. 2).

O Ecossistema Lavrado é composto por uma rica biodiversidade relacionada tanto a fauna como a flora. Com relação à flora, é formado por gramíneas, entretanto, ao longo dos cursos d'água, situam-se palmeiras de grande porte e também se encontra arbusto em grande quantidade. Barbosa e Melo (2010, p. 199), colocam que “A paisagem do lavrado, apesar de ser dominada por uma vegetação aberta, também abriga ilhas de mata de tamanhos variável, além de áreas florestais associadas ao curso d'água e encostas de serras”.

E ainda esclarecem que a flora se desenvolve em meio às condições climáticas estremas do lavrado, com altas temperaturas médias durante o ano e estação seca acentuada com pico entre dezembro e março. Devido a estas condições climáticas as plantas desta região têm como características principais: raiz profunda, cascas duras e grossas, árvore com galhos tortuosos e de pequeno porte, folhas cobertas de pelos, etc. Veja o que também diz (CAMPOS, 2011, p. 17) neste sentido:

A vegetação das áreas abertas do lavrado está adaptada a características climáticas extremas, resistindo a longos períodos de seca, calor intenso e alta incidência solar, e sendo capaz de sobreviver ou ressurgir rapidamente após a passagem do fogo.

Na fauna, os principais representantes do Lavrado é o tamanduá bandeira e o cavalo lavradeiro, espécies locais, porém podemos encontrar uma diversidade de espécies de animais que habitam neste ecossistema como tatus, jabutis, veados campeiros, pacas, cutias, cobras, etc.

Sobre a avifauna do Lavrado Silveira (2013), destaca como sendo as aves interessantes do Lavrado, o sabiá-da-praia (Mimus gilvus); a garrincha-dos-lhanos (Campylorhynchus griséus); o téu-téu-da-savana (Burhinus bistriatus); uru-do-campo (Colinus cristatus); periquito-de-bochecha-parda (Aratinga pertinax) e a jandaia-Sol (Aratinga solstitialis), que pode ser considerada a mais célebre moradora dos Lavrados roraimenses, habitando as áreas mais secas, esse periquito, outrora abundante nesses locais, foi traficado aos milhares para o exterior entre as décadas de 1970 e 1980, atualmente, a Jandaia-Sol só sobrevive em poucos lugares dentro de áreas indígenas.

Além destas espécies locais, a diversidade avifauna no Lavrado também inclui as aves migratórias, que fazem daqui parte de sua rota migratória, muitas dessas aves costumam utilizar os mesmos locais de pouso ano após ano, como locais de reabastecimento.

É importante salientar que algumas destas espécies locais estão seriamente ameaçadas de extinção, e que apesar do Lavrado possuir identidade ecológica própria, no entanto não existe nenhuma unidade de conservação que preserve sua riqueza biológica, como afirma Barbosa et. al (2008) “a falta de áreas de conservação que ajudem a proteger a biodiversidade do Lavrado é um descompasso e um retrocesso nos avanços que o Brasil realizou nos últimos anos por todo o Bioma Amazônia”. Alertam ainda, que a conservação do ecossistema Lavrado representa uma prioridade e uma urgência, visto que este ambiente possui elevada importância biológica, está sob forte ameaça devido à expansão do agronegócio.

3. MATERIAIS E MÉTODOS

Este trabalho é resultado de uma pesquisa bibliográfica de caráter qualitativo. A pesquisa bibliográfica segundo Gil (2008) é desenvolvida com base em material já elaborado constituído, principalmente, de artigos científicos e livros. Ainda sobre o conceito de pesquisa, Dalarosa (1999, p. 102) explica que “a pesquisa constitui, portanto, a busca, a investigação, movida pela necessidade de se solucionar um determinado problema. Esta busca sistemática, planejada e rigorosa consiste na pesquisa”.

Sobre a abordagem qualitativa, Dalfovo, Lana e Silveira (2008, p. 5-6), colocam que “levam como base de seu delineamento as questões ou problemas específicos”. Os referidos autores fazem um esboço acerca desse tipo de pesquisa:

A pesquisa qualitativa, por sua vez, descreve a complexidade de determinado problema, sendo necessário compreender e classificar os processos dinâmicos vividos nos grupos, contribuir no processo de mudança, possibilitando o entendimento das mais variadas particularidades dos indivíduos.

Foram usados como referência para esta pesquisa os livros de ciências do ensino fundamental I (1º ao 5º ano), usados atualmente na rede pública de ensino do município de Boa Vista. Portanto são cinco livros analisados no total, como mostra o quadro 1.

Quadro 1.
Livros analisados usados atualmente (2018) nas escolas municipais de Boa Vista

Para a efetivação desta análise foram utilizados dois critérios. O primeiro critério foi de observar se consta ou não, a representação do Ecossistema Lavrado no LD, e o segundo critério, foi de analisar se os conteúdos apresentados na obra fazem contextualização com a realidade local, ou seja, se tem relação com o cotidiano do aluno.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Desde o ano de 2013 até os dias atuais, o sistema público municipal de ensino de Boa Vista, trabalha com o Programa Saber Igual, que por meio do Instituto Alfa e Beto (IAB), efetivou nas escolas municipais o ensino estruturado.

Sendo assim, os livros analisados fazem parte da Coleção IAB de Ciências. A análise foi feita minuciosamente, observando as características e especificidades de cada livro, no intuito de identificar a proposta desta pesquisa, que é a representação do Ecossistema Lavrado nestes livros didáticos, como também observar se os conteúdos presentes nestes livros fazem contextualização com a realidade local dos alunos.

De acordo com Oliveira (2011), criador do IAB, o Programa de Ensino da Coleção de Ciências (1º ao 5º ano), é organizado a partir de três conceitos centrais que reaparecem em todas as unidades e lições e ajudam o aluno a compreender a relação entre os conceitos científicos: a ideia de evolução; a teoria atômico-molecular e o conceito de que os seres se organizam em sistemas. O autor acredita que esses três conjuntos de conceitos permitem ao aluno, portanto, uma visão integrada e consistente dos fatos científicos, superando um ensino de ciências fragmentado.

A. LIVRO 1 - 1º ANO ENSINO FUNDAMENTAL

Este LD é destinado a crianças de seis anos, em processo de alfabetização, portanto, apresenta atividades simples, com ilustrações que facilitam o entendimento. Ele tem 88 páginas, e está dividido em onze unidades, são elas:

Unidade I: Identidade: eu e minha família;

Unidade II: O corpo humano;

Unidade III: Os animais;

Unidade IV: O meio ambiente;

Unidade V: As plantas;

Unidade VI: Materiais;

Unidade VII: Os sons;

Unidade VIII: Luz e sombra;

Unidade IX: Luz e cores;

Unidade X: Água e ar;

Unidade XI: Movimento e energia.

Com relação à representação do Ecossistema Lavrado, não foi constatado nenhuma referência nesta obra.

Com relação à contextualização dos conteúdos com a realidade local dos alunos, observou-se que o LD traz elementos de uma realidade distanciada da vivida pelos alunos, isso fica mais evidente nas unidades III e V, quando a unidade III (p. 28 a 33), com o tema “Os animais”, traz figuras de animais distante da realidade do aluno como ovelha, foca, elefante, baleia, polvo, etc. E a unidade V (p.38 a 41), com o tema “As plantas”, ao falar sobre o fruto das plantas que comemos, usa a imagem da uva e da maçã, que não são frutas características de nossa região.

Sobre a importância de se relacionar os conteúdos curriculares com a realidade local dos alunos (RICARDO, 2003), coloca que “a contextualização visa dar significado ao que se pretende ensinar para o aluno (...), auxilia na problematização dos saberes a ensinar, fazendo com que o aluno sinta a necessidade de adquirir um conhecimento que ainda não tem”.

B. LIVRO 2 – 2º ANO ENSINO FUNDAMENTAL

O livro tem 87 páginas e está dividido em quatro unidades, cada unidade é formada por dez lições com temas diferentes, que reunidas trabalham o tema gerador da unidade. As unidades são apresentadas no LD da seguinte forma:

Unidade I – Onde vivo;

Unidade II – Conhecendo o Tempo;

Unidade III – Os seres vivos;

Unidade IV – Matéria e energia.

Com relação à representação do Ecossistema Lavrado no conteúdo da obra, observou-se que em nenhum momento do LD consta alguma referência. Analisando os temas das quatro Unidades apresentadas na obra, observou-se que o conteúdo proposto para análise “Ecossistema Lavrado”, poderia ser representado na Unidade I, já que esta traz o tema “Onde vivo”, onde se pressupõe que será discutido mais especificamente sobre o local onde os alunos vivem.

Observou-se também que os conteúdos trabalhados no LD são totalmente descontextualizados com a realidade local dos alunos e este processo fica mais explícito em dois momentos.

Na Lição um que trabalha o tema “Onde moro” (p. 8 e 9), já que o conteúdo foi trabalhado de forma superficial, enfatizando apenas o conceito de MAPA, e não falando diretamente das características específicas do local em que os alunos moram, pelo contrário, o livro traz como referência para trabalhar o conceito de MAPA, um mapa da cidade do Rio de Janeiro, o que não tem nenhum vínculo com a realidade local dos alunos.

E na Lição três com o tema “Paisagens” (p. 12 e 13), pois o livro trabalha o conceito de “PAISAGEM”, trazendo como referência imagens de uma cidade à beira mar, o que não faz parte da nossa realidade local, deixando aqui de representar as nossas belas paisagens naturais, as nossas savanas locais, por exemplo.

Neste sentido (Libâneo, 1990) aconselha que:

Ao selecionar os conteúdos da série em que irá trabalhar, o professor precisa analisar os textos, verificar como são abordados os assuntos para enriquecê-los com sua própria contribuição e a dos alunos, comparando o que se afirma com fatos, problemas, realidades da vivência real dos alunos (...)

C. LIVRO 3 – 3º ANO ENSINO FUNDAMENTAL

O livro tem 167 páginas e também está dividido em quatro unidades, cada unidade é formada por um bloco de dez lições com temas diferentes, que reunidas trabalham o tema gerador da unidade. As unidades são apresentadas no LD da seguinte forma:

Unidade I – A vida em nosso planeta;

Unidade II – Interação entre os seres vivos e os seres não vivos;

Unidade III – Conhecendo o bicho homem;

Unidade IV – Expandindo os horizontes.

Após a análise conclui-se que nesta obra também não foi encontrada referencia ao Ecossistema Lavrado, apesar de acreditar que este conteúdo poderia ser trabalhado em dois momentos mais especificamente. Na unidade I, com a lição oito “Os biomas” e na unidade II, com a lição quinze “Ecossistemas”, nestas duas lições os conteúdos abordados poderiam ser trabalhados dando ênfase as nossas características ecológicas locais, ao se falar de Biomas e Ecossistemas poderia sim chamar atenção para o ecossistema, para as paisagens a qual estamos inseridos.

Os conteúdos também são trabalhados de forma descontextualizada com a realidade local. E isso pode ser observado em vários momentos na obra, mas pode ser visto mais evidentemente na unidade II, na lição dezoito ao trabalhar o conceito de espécies nativas e exóticas traz como exemplo o caramujo africano (p.79), que não faz parte da realidade local dos alunos.

D. LIVRO 4 - 4º ANO ENSINO FUNDAMENTAL

O livro tem 167 páginas e está dividido em quatro unidades, cada unidade é formada por um bloco de dez lições com temas diferentes, que reunidas trabalham o tema gerador da unidade. As unidades são apresentadas no LD da seguinte forma:

Unidade I – O corpo humano;

Unidade II – Matéria e energia;

Unidade III – A terra e suas mudanças;

Unidade IV – A vida no planeta Terra.

A obra não faz referência ao Ecossistema Lavrado e também apresenta conteúdos descontextualizados com a realidade local dos alunos. Pode-se observar isso, na unidade IV, na lição 32 “Os seres vivos evoluem”, ao explicar o conceito de evolução (p. 132), é usado a imagem da girafa para exemplificar este processo, sendo que poderia ser utilizado um animal que pertencesse a realidade local dos alunos, para facilitar o entendimento.

E. LIVRO 5 - 5º ANO ENSINO FUNDAMENTAL

O livro tem 217 páginas e está dividido em quatro unidades, cada unidade é formada por um bloco de dez lições com temas diferentes, que reunidas trabalham o tema gerador da unidade. As unidades são apresentadas no LD da seguinte forma:

Unidade I – O universo e a terra;

Unidade II – Os seres vivos;

Unidade III – O corpo humano;

Unidade IV – Matéria e energia.

Esta obra não traz referência ao Ecossistema Lavrado. E também apresenta conteúdos com elementos de uma realidade distanciada da vivenciada pelos alunos. Esta descontextualização fica bem clara na unidade I, na lição seis “A terra por fora: solos e rochas”, ao apresentar o conceito de ROCHA (p.28), são apresentadas imagens do Pão de açúcar na cidade do Rio de Janeiro e do Grand Canyon nos Estados Unidos para ilustrar este conceito, perdendo a oportunidade de mostrar as rochas existentes em Roraima.

Se o LD apresentar conteúdo de uma realidade diferente daquela vivenciada pelos alunos, cabe ao professor ter a sensibilidade para criar situações em que a realidade local possa ser evidenciada. Sobre a função do professor neste processo Almeida Filho (2007, p.39) esclarece que:

Toda vez que o professor for fazer a contextualização deve ter em mente que ela é necessária para criar imagens do campo que ele irá explorar. É a contextualização que deixa claro para o aluno que o saber é sempre mais amplo, que o conteúdo é sempre mais complexo do que aquilo que está sendo apresentado naquele momento. No entanto, sabendo da amplitude e da complexidade, é essencial que tenha o domínio, a chave de acesso à complexidade.

5. CONSIDERAÇÕES

Após a análise dos cincos LD, observou-se que esta Coleção de Ciências do IAB (1º ao 5º ano), foi idealizada com o objetivo de atender a um sistema nacional de ensino, já que em nenhum momento é contemplado nos seus conteúdos, discussões ou elementos sobre aspectos característicos de nossa realidade local, ou seja, os conteúdos apresentados nas obras não fazem contextualização com a realidade dos alunos.

E como os LD não trazem aspectos da nossa realidade local, consequentemente também não fazem nenhuma referência ao Ecossistema Lavrado, que é uma das nossas maiores riquezas ecológicas. O que pode agravar mais ainda o processo de desvalorização do Lavrado, já que, sem conhecer o Lavrado as crianças ou a população em geral não pode valorizar, e sem a valorização, não haverá o cuidado, a preservação e a manutenção deste importante ecossistema. Sendo assim, essa falta de conhecimento, que pode ocasionar a desvalorização, pode ser uma das principais ameaças na luta pela preservação do Lavrado.

Levando-se em consideração que o livro didático ainda é o principal recurso utilizado por professores e alunos no processo ensino-aprendizagem, seria importante que os conteúdos fossem pensados de forma a contemplar a realidade na qual o aluno está inserido, já que, para que haja uma aprendizagem significativa é importante que o aluno consiga identificar a relação entre aquilo que ele estuda em Ciências e o seu cotidiano, para que não haja uma simples memorização de conteúdo, mas para que o aluno possa aprender significante e através desse aprendizado possa intervir socialmente no meio em que vive.

Já que os LD não abordam as questões locais, uma solução para trabalhar estes temas importantes para a comunidade local, seria trabalhar através da Transversalidade, como sugerido na PCM (Boa Vista, 2008), através de projetos de ensino que possam ser trabalhados no decorrer do ano letivo no momento que a escola achar melhor.

REFERÊNCIAS

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Autor notes

1 Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências (PPGEC) da Universidade Estadual de Roraima-UERR
2 Mestranda do PPGEC da Universidade Estadual de Roraima-UERR
3 Mestrando do PPGEC da Universidade Estadual de Roraima-UERR
4 Docente do PPGEC da Universidade Estadual de Roraima-UERR
5 Docente do PPGEC da Universidade Estadual de Roraima-UERR

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