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CURRÍCULO: DISCUSSÕES NO CAMPO DA TRANSDISCIPLINARIDADE E DA EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA

CURRICULUM: DISCUSSIONS IN THE FIELD OF TRANSDISCIPLINARITY AND TECHNOLOGICAL EDUCATION

Adriana Neves de Almeida
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas, Brasil
Amarildo Menezes Gonzaga
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas, Brasil

REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

ISSN-e: 2318-6674

Periodicidade: Frecuencia continua

vol. 4, núm. 1, 2016

revistareamec@gmail.com



DOI: https://doi.org/10.26571/2318-6674.a2016.v4.n1.p88-103.i5319

Os direitos autorais são mantidos pelos autores, os quais concedem à Revista REAMEC –Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática -os direitos exclusivos de primeira publicação. Os autores não serão remunerados pela publicação de trabalhos neste periódico. Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada neste periódico (ex.: publicar em repositório institucional, em site pessoal, publicar uma tradução, ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial neste periódico. Os editores da Revista têm o direito de proceder a ajustes textuais e de adequação às normas da publicação.

Resumo: Apresentam-se discussões sobre o Currículo, a Transdisciplinaridade, a dimensão formativa do professor e a Educação Tecnológica, enquanto questões pertinentes para o processo educativo. O objetivo é debater as temáticas expostas demonstrando que estas devem dialogar entre si e percebendo suas contribuições para as práticas educativas. A metodologia utilizada foi a leitura de referenciais teóricos que subsidiaram a produção de textos que foram cruciais para a elaboração deste trabalho. Os resultados indicam que é necessário que os saberes dialoguem, sendo urgente os currículos serem repensados a fim de que os conteúdos deixem de ser trabalhados de forma fragmentada, assim como o professor seja percebido como um ser em constante processo de formação.

Palavras-chave: currículo, transdiciplinaridade, educação tecnológica, dimensão formativa.

Abstract: This article shall be presented brief discussions around the Curriculum, the Transdisciplinarity, of formative dimension of the teacher and of Technological Education, in the attempt to strive to find new paths and proposals for the educational processes. The objective is to discuss the themes exposed demonstrating that these should dialog among themselves, signaling their contributions to the educational practices. The methodology used was the reading of theoretical frameworks which helped us to production of texts that were crucial to the preparation of this work. The results indicate that it is necessary that the knowledges talking, being urgent curricula be rethought so that the contents are no longer to be worked on in a fragmented way and the teacher is perceived as a being in a constant process of formation.

Keywords: curriculum, transdisciplinarity, technological education, formative dimension.

1. INTRODUÇÃO

O Currículo e a Transdisciplinaridade são temas incessantemente discutidos na área da educação, sendo que o primeiro tem permeado no campo da teoricidade enquanto o outro no da praticidade, o que tem requerido algumas reflexões sobre a real objetividade destes no âmbito escolar. Contudo, tais discussões são necessárias justamente para que haja cada vez mais uma aproximação entre o que tem sido pensado em currículo e práticas teóricometodológicas com o que de fato tem se vivido no contexto educacional, na aprendizagem dos discentes e na prática de sala de aula.

É pertinente debatermos tal aproximação, enfocando ainda o processo formativo do docente, uma vez que este precisa ser olhado como um sujeito dotado de subjetividade, assim como um construtor de conhecimentos. Desta forma, o objetivo principal desse trabalho é discutir sobre Currículo, Transdisciplinaridade e Educação Tecnológica, demonstrando que estas dialogam entre si, além de extrair das reflexões as contribuições de cada uma para as práticas educativas. A organização metodológica envolveu leituras de referenciais teóricos por meio de livros, artigos e textos, que subsidiaram o desenvolvimento de produções textuais foram essenciais para a realização deste trabalho, bem como de uma compreensão acadêmicocientífica da temática.

Este trabalho está estruturado em três seções, sendo que na primeira tratamos de algumas perspectivas gerais e conceituais de Currículo. Na segunda abordamos a Transdisciplinaridade e a Pedagogia de Projetos, a fim de reconhecê-las como propostas metodológicas que precisam ser repensadas para o processo de ensino e aprendizagem, e por fim, na última seção apresentamos uma discussão em torno da dimensão formativa do professor pesquisador, além de trazer à tona a questão da Educação Tecnológica, uma vez que foi a modalidade de ensino escolhida para ser trabalhada.

2. BREVES PERSPECTIVAS EM TORNO DO CURRÍCULO

As teorias curriculares versam sobre as discussões a respeito das perspectivas em torno do currículo, tendo como ponto de partida as tendências educacionais emergentes ao longo da historicidade da sociedade e da educação em si, uma vez que conforme Pacheco (2005, p.82) estas são “[...] tentativas de abordagem das concepções de currículo através das quais se diferenciam formas distintas de relacionar a teoria com a prática e a escola com a sociedade.”.

Considerando o contexto educacional brasileiro, explicitamos que as tendências curriculares perpassaram a iniciativa de teóricos que se tornaram pioneiros frente as discussões em torno do currículo, pois se propuseram a repensar a educação enquanto um processo capaz de modificar a realidade social, assim como interligar questões sociais, econômicas, políticas e culturais. Dentre eles destacamos Anísio Teixeira por ter engendrado o movimento de aproximação do currículo as questões sociais, entendendo que a educação deve considerá-la em sua prática, onde “[...] as disciplinas escolares foram consideradas instrumentos para o alcance de determinados fins, ao invés de fins em si mesmas, sendo-lhes atribuído o objetivo de capacitar os indivíduos a viver em sociedade. ”. (PACHECO, 2005, p.88)

Posteriormente, a reforma de Minas Gerais, idealizada por Francisco Campos e Mário Casassanta, oportunizou a reorganização do ensino elementar e normal, tendo como foco a reflexão acerca da sociedade e a estruturação do pensamento da Escola Nova, na medida em que buscava a vinculação entre os conteúdos curriculares da escola com a realidade de vida dos estudantes. A reforma do Distrito Federal, elaborada por Fernando Azevedo, por sua vez procurou enfatizar mais a interação entre sociedade e escola, considerando a civilização industrial, suas demandas e novas perspectivas de vida e cultura.

Em concordância a isto, é pertinente destacar que o processo histórico da Educação Tecnológica no Brasil estabeleceu-se a partir do atendimento as questões emergentes da política e economia da sociedade daquela época, o que pressupôs a definição de aspectos legislativos educacionais que tinham como foco a formação de mão-de-obra-tecnológica, conforme destaca Silveira (2007, p.8) “[...] o que se pretendia estabelecer [era] uma política diretiva relacionada ao ensino técnico industrial, com base na necessidade de “mão-de-obra tecnológica” em diversos níveis de formação [...].”. Portanto, a Educação Tecnológica está vinculada ao mundo do trabalho, que por sua vez está imbricado aos interesses políticos, econômicos, ideológicos e culturais, o que nos permite dizer que esta vincula-se as questões curriculares, na medida em que o currículo em si continua sendo entendido como algo dotado de intencionalidades.

Diante as inúmeras transformações econômicas, políticas, culturais e tecnológicas que o mundo tem vivenciado ao longo dos tempos é extremamente necessária novas formações sociais e pessoais de ser e estar inserido numa sociedade. Conforme essa realidade e frente as novas exigências impostas aos indivíduos percebemos que as preocupações da escola não se limitam apenas a formação intelectual dos alunos, mas também a aquisição de valores morais, éticos e culturais.

O currículo, então passa a ser debatido enquanto a estratégia chave da educação, visto que sua estrutura procura dar atenção a todas as especificidades que esse processo e realidade exigem, em conjunto com as problemáticas da sociedade, não se excluindo os pressupostos, crenças, valores e teorias que o compõem implicitamente.

Podemos inferir que não há mais espaço para currículos estruturados e/ou organizados em disciplinas fragmentadas que o tratam de igual forma, uma vez que estas não dão conta de formar um ser humano integral, reflexivo e crítico diante a sua realidade de vida, sendo que ainda desvaloriza a subjetividade e as experiências vivenciadas em diferentes espaços pelo sujeito. Nesse sentido, a palavra currículo “[...] assume um sentido renovado: como verbo, enfatiza-se o ato de correr, devendo ser compreendido como uma atividade que não se limita ao espaço educativo, mas engloba toda a vivência dos sujeitos. ” (Silva, 2000 apud Hidalgo, 2008, p. 38).

Nessa perspectiva, alguns teóricos do âmbito pedagógico e de vertentes do pensamento educacional contemporâneo, por meio de seus estudos, trouxeram contribuições relevantes para as definições de currículo, que atualmente podem ser incorporados por elementos políticos, culturais e epistemológicos. Dentre estes destacamos a perspectiva fenomenológica de currículo, que segundo Hidalgo (2008, p. 38)

[...] não é constituído de fatos nem de conceitos teóricos e abstratos, mas é um espaço no qual os docentes e aprendizes têm a oportunidade de examinar os fatos da vida cotidiana, visto, o currículo, portanto como experiência e local de interrogação e questionamentos da experiência.

Tendo como parâmetro esta linha de pensamento, percebemos que as discussões em torno do currículo começam a permear no campo das experiências de vida, objetivando uma aproximação entre as questões escolares e as práticas de sala de aula com o que de fato é vivenciado pelos discentes em seu cotidiano diário, e consequentemente entendendo que sua história de vida, seu autoconhecimento e subjetividade devem ser considerados no processo educativo, uma vez que são aspectos inerentes a condição humana.

A ampliação da concepção de currículo também foi discutida pelo educador Paulo Freire, que tinha uma postura caracterizada pela defesa da participação da comunidade escolar e dos movimentos sociais em todo o processo educativo e principalmente nas situações que demandam decisões, a fim de que estas fossem realizadas de forma democrática, sendo que além disso almejava a valorização dos saberes populares, como nos corrobora Hidalgo (2008, p. 43) ao afirmar que

[a] participação dos alunos, pais, professores e representantes dos movimentos sociais nas discussões acerca do currículo é marcante nas elaborações de Freire e está em consonância com o reconhecimento da capacidade e necessidade das populações das classes populares de participarem dos processos decisórios, como fato de desenvolvimento da democracia no país.

É perceptível que o processo educativo tem condições de ser pensado e estruturado, tendo como ponto de partida a perspectiva do coletivo, não excluindo as expectativas dos sujeitos em torno do que está sendo desenvolvido no contexto escolar, uma vez que estes fazem parte deste e devem participar dos processos decisórios, a fim de que gradativamente exercitem sua autonomia e consciência de avaliação. Para tanto, “O currículo escolar, dentro desse quadro teórico, não se restringe à relação de conteúdos, mas é definido de forma ampla, como todas as atividades desenvolvidas na escola, incluindo “as relações entre todos e todas as que fazem a escola”. ” (Freire, 2001, p. 123 apud Hidalgo, 2008, p. 45), ou seja, a escola, o corpo pedagógico, docente e principalmente o diretivo deve ultrapassar as visões limitadas de currículo e compreendê-lo como um conhecimento socialmente organizado, que é dotado de múltiplas intencionalidades, sejam elas facilmente perceptíveis ou não.

No que se refere à conceptualização de currículo, é perceptível que esta perpassa por múltiplos significados que são correspondentes a um determinado contexto ou a forma de um grupo de pessoas percebê-lo, visualizá-lo e até mesmo executá-lo, o que nos direciona para a compreensão de que este também é construído ideologicamente. Por isso, deve-se examinar as variáveis que compõem a adoção de um tipo de conceito em torno do currículo, seja ele contemporâneo ou tradicional, por parte dos profissionais da educação, uma vez que este é um documento extremamente relevante para a estrutura organizacional das instituições escolares, bem como que por meio deste que se justifica as ações desenvolvidas no interior da escola. Diante disso, Sacristán (2000, p. 15) explana que

A prática a que se refere o currículo, no entanto, é uma realidade prévia muito bem estabelecida através de comportamentos didáticos, políticos, administrativos, econômicos, etc., atrás dos quais se encobrem muitos pressupostos, teorias parciais, esquemas de racionalidade, crenças, valores, etc. que condicionam a teorização sobre o currículo. […].

Conforme o exposto, inferimos que o currículo estabelece sua estruturação pela união das questões pedagógicas com as questões do sistema social, na medida em que sua tendencia é assegurar as exigências deste ou incluí-los em sua dinâmica, como Sacristán (2000, p. 17) confirma-nos ao ressaltar que “de alguma forma, o currículo reflete o conflito entre interesses dentro de uma sociedade e os valores dominantes que regem os processos educativos”. Desta forma, todos os propósitos de uma determinada instituição escolar acabam enfocando em sua filosofia, procedimentos metodológicos e seleção de conteúdos, aquilo que pretendem alcançar durante a formação dos indivíduos. Por esta razão, é forte a crença de que com as reformas curriculares pode-se promover modificações na finalidade das escolas e quem sabe até amenizar as desigualdades de oportunidades existentes, já que este é uma expressão da função socializadora e cultural.

Mediante ao exposto, é sempre pertinente discutir o currículo em suas dimensões epistemológicas e culturais, pois este pressupõe aprofundamentos teóricos acerca da construção em si do conhecimento e de seus desdobramentos no âmbito educacional, subsidiando assim o embasamento para as diversificadas ações metodológicas preconcebidas na educação.

3. TRANSDICIPLINARIDADE E PEDAGOGIA DE PROJETOS

Vai descrever a qualificação da pesquisa, o tipo de estudo, local, corpus pesquisados, os aspectos éticos, quando for o caso, se foi obtido o consentimento livre e esclarecido do represente legal do local e do corpus para participarem do estudo, com a concordância ajustada entre as partes. Vai conter também os procedimentos utilizados, as técnicas e instrumentos de coleta de dados e o tipo de análise.

A transdisciplinaridade propõe termos uma nova postura diante do que está posto no âmbito da sociedade, na medida em que implica a valorização do diferente, seja ele imerso nos espaços sociais, religiosos, acadêmicos ou científicos, e a reconfiguração das diversas relações de um sujeito com outro, na certeza de que esta “[...] repousa sobre uma atitude aberta, de respeito mútuo e mesmo de humildade com relação a mitos, religiões e sistemas de explicações e de conhecimentos, rejeitando qualquer tipo de arrogância ou prepotência.” (D’ AMBROSIO, 1997, p. 80), o que a caracteriza como transcultural e transreligiosa.

A transdisciplinaridade surge como um paradigma emergente, justamente porque requer a promoção de mudanças na dinâmica em qual estamos inseridos, pressupondo novas expectativas e iniciativas diante de questões pré-concebidas ou determinadas, a fim de promover a dialogicidade entre elas, ao mesmo tempo em que faz emergir uma concepção de complementariedade diante daquilo que é aparentemente diferente e antagônico. Nicolescu (1999, p. 57) destaca ainda que “A visão transdisciplinar propõe-nos a consideração de uma Realidade multidimensional, estruturada em múltiplos níveis, substituindo a Realidade unidimensional, com um único nível, do pensamento clássico.”.

Para adentrar ainda mais nesta discussão, é necessário abordarmos a pluridisciplinaridade e a interdisciplinaridade, tendo em vista o crescimento das componentes disciplinares para a compreensão de determinados conhecimentos de forma especializada. A pluridisciplinaridade pressupõe o estudo de um objeto de uma determinada disciplina por várias disciplinas de forma simultânea, ou seja, este objeto receberá contribuição de outros campos do conhecimento.

A interdisciplinaridade, por sua vez, pressupõe a “[...] a transferência de métodos de uma disciplina para outra”, (NICOLESCU, 1999, p. 52), que apesar de transcender as disciplinas em si, ainda tem seu propósito vinculado a pesquisa disciplinar. E por fim, a transdisciplinaridade tem como objetivo central compreender o mundo e unir o conhecimento, pois “[...] está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina.” (Ibidem, p. 53), o que presume o diálogo dos saberes. Nessa perspectiva, salientamos que há uma complementariedade entre a pesquisa disciplinar e a pesquisa transdisciplinar, mesmo estas apresentando aspectos diferenciados. A pesquisa disciplinar compreende o estudo de um único e mesmo de nível de realidade, diferentemente da pesquisa transdisciplinar que tem interesse pela dinâmica proveniente da ação de vários níveis de realidade simultaneamente.

Cabe salientar ainda que os fundamentos que norteiam o paradigma da transdisciplinaridade perpassam pela lógica de três postulados: os níveis de realidade, a lógica do terceiro incluído e a complexidade, que são compreendidos e explicáveis minuciosamente por meio da física. Os níveis de realidade abrangem todas as dimensões inerentes a realidade, ou seja, considera uma gama de situações ou ações próprias de um determinado contexto ou condição humana, uma vez que perpassa pela questão ontológica do ser, que é impregnado de crenças, valores, dogmas e aspectos culturais, bem como pelos níveis de percepção que possibilitam uma visão geral da realidade. Carvalho (2003, p. 224) explica-nos que

Um nível de realidade é o que é, porque todos os outros níveis existem ao mesmo tempo. Esse princípio de Relatividade é o fundamento de uma nova maneira de olhar a cultura, a religião, a política, a arte, a educação, a vida social. E quando muda a nossa maneira de olhar o mundo, o mundo se transforma.

Em suma, os níveis de realidade não estão vinculados a um fato ou conhecimento pronto e acabado, uma vez que em conjunto com os demais postulados da transdisciplinaridade engloba e/ou considera a diversidade em si, almejando assim a sua aceitação e negando a existência de uma verdade absoluta.

Nessa dinâmica, o terceiro incluído é um elemento articulador que atua como um outro nível de realidade, capaz de eliminar as contrariedades de dois outros níveis de realidade, permitindo um diálogo ou complementariedade entre estes, que são de certa forma visualizados de forma antagônica, desvinculando-se assim da lógica clássica binária, que tem como pressuposto apenas dois valores contrários: verdadeiro ou falso. Nesse sentido, Carvalho (2003, p.222) nos esclarece que “O terceiro dinamismo, o estado T, exerce-se em outro nível de Realidade, onde o que aparece como desunido é de fato unido e o que aparece como contraditório é percebido como não-contraditório. ”.

A complexidade, por fim, está exatamente em não mais compreendermos a realidade de forma fragmentada, mas enquanto um processo de interconexões que abrangem diversos aspectos e/ou conhecimentos. Nesse sentido, este paradigma será ressignificado na medida em que os sujeitos compreenderem que o mundo está rodeado de pessoas e concepções diferentes, que necessitam ser aceitos com suas particularidades, bem como que não existe verdade absoluta diante a dinamicidade da vida. Essa ressignificação implicaria em uma compreensão de mundo mais condizente com a diversidade de coisas, experiências e perspectivas que são próprias da contemporaneidade.

No que se refere ao campo da educação, teríamos condições de pensar o conhecimento de maneira mais unificada/abrangente, onde os currículos não seriam fragmentados e cheio de conteúdos meramente individualizados e antagônicos que não dialogam com o todo, assim como não possibilitam a compreensão e resolução de problemas do atual mundo complexo, ou seja, haveria dinamicidade e flexibilização curricular. Além disso, se diminuiria os embates desnecessários no âmbito das diferentes concepções em torno do currículo, criando espaços de valorização e respeito nos espaços escolares e nas relações entre os sujeitos.

Nessa perspectiva, Santos, Santos e Chiquieri (2009, p. 84) especificam que “Na Educação, o uso dos conceitos complexidade e transdisciplinaridade restauram algumas metodologias de ensino, situando-as na percepção de outro nível de realidade requerido pela exigência da interlocução entre vários saberes.”, pré-determinando assim um diálogo entre os conhecimentos. Desta forma, a transdisciplinariedade propõe também a dialogicidade nas teorias curriculares, a fim de que as dimensões em torno do currículo possam ser convergidas e centralizadas na melhoria da prática e consequentemente da aprendizagem do aluno em sala de aula, promovendo principalmente o equilíbrio entre estas ao mesmo tempo em que se valoriza seus aspectos positivos e particularidades.

Outras perspectivas que estão sendo debatidas e inseridas gradativamente nas ações escolares são os projetos de trabalho e a gerência de projetos, onde cada uma tem apresentado suas contribuições para o contexto educacional e seus aspectos metodológicos. Os Projetos de trabalho, por sua vez, indicam uma nova alternativa para o processo educativo, na medida em que oportunizam uma nova compreensão acerca das práticas pedagógicas, do conhecimento e do currículo. Hernández (1998, p. 63) esclarece que

Globalização e significatividade são, pois, dois aspectos que se plasmam nos Projetos. É necessário destacar o fato de que as diferentes fases e atividades que se devam desenvolver num Projeto ajudam os alunos a serem conscientes de seu processo de aprendizagem e exige do professorado responder aos desafios que se estabelece uma estruturação muito mais aberta e flexível dos conteúdos escolares.

Nesse sentido, esses projetos transpõem as práticas tradicionalmente desenvolvidas na escola quando pressupõem a flexibilização dos conteúdos escolares, a fim de que os alunos tenham experiências significativas de aprendizagem por meio de um modelo curricular que compreende um determinado tema, que pode ser emergente de problemas, questões atuais da sociedade ou até mesmo do ambiente escolar, e não necessariamente de disciplinas trabalhadas de forma fragmentada. Permite ainda que os alunos sejam sujeitos ativos e reflexivos diante de suas aprendizagens e construção de conhecimento, que tende a ser ressignificado quando interligado aos aspectos da vida.

Nessa perspectiva, a inter-relação entre projetos de trabalho e transdisciplinaridade está no fato de se pensar o conhecimento de forma unificada, onde este não deve ser apresentado aos alunos como algo pronto e acabado, mas enquanto uma incessante construção que visa a compreensão de mundo. É emergente que se busque novas posturas teóricometodológicas para que o processo educativo e o currículo escolar não sejam mais vivenciado como algo alheio as condições sociais e culturais dos integrantes da escola.

Hernández (1998, p. 66) enfatiza ainda que “A perspectiva de globalização que se adota na escola, e que se reflete nos Projetos de trabalho, trata de ensinar o aluno a aprender, a encontrar nexo, a estrutura, o problema que vincula a informação e que permite aprender.”, isso nos remete que o aluno deve ser entendido como aquele que constrói seu próprio conhecimento, sendo que as instituições de ensino juntamente com os professores precisam criar os mecanismos para tal, subsidiando meios de favorecer a autonomia deste durante sua trajetória escolar. Nessa dinâmica, os alunos deixam de ser meros receptores de informações e passam a ter consciência de que sua passagem pela escola é carregada de experiências que o ajudarão a se perceber enquanto parte integrante da sociedade.

Em se tratando de projetos é interessante destacar ainda a Gerência de Projetos (área da administração) por esta se preocupar com o planejamento, organização, motivação, direção e controle de recursos organizacionais em um determinado negócio (projeto), onde ainda é considerado fator tempo, custo e execução, uma vez que “[...] hoje [é] praticada em todas as indústrias, em entidades militares e educacionais, em organizações eclesiásticas e no domínio político.” (CLELAND, 2002, p. 11).

Assim, as características específicas do gerenciamento de projeto têm sido inseridas no contexto educacional, na medida em que a escola é um espaço que deve ser administrado tendo como parâmetro a definição de objetivos específicos para o seu sucesso e consequentemente dos seus integrantes. O corpo diretivo em conjunto com o corpo docente deve ter em mente que suas ações precisam estar minuciosamente planejadas e organizadas, a fim de que possam ser previamente discutidas e pensadas as dificuldades e prováveis problemas do processo, bem como que haja o mínimo possível de erros.

Para que tais propostas possam ser praticadas o professor é o principal colaborador, na medida em que deve ser um problematizador e reflexivo do seu contexto, onde deixará de ser apenas um profissional que reproduz aulas e repassa conteúdos, passando a atuar então como um produtor de conhecimento. É necessário ter maturidade para a problematização, buscando enxergar as possibilidades existentes no processo, o que pressupõe o exercício de um olhar investigativo e do autoconhecimento. Por isso, iniciaremos a seguir uma discussão acerca da dimensão formativa do professor pesquisador, entrelaçando-o com a Educação Tecnológica e a transdisciplinaridade.

4. DIMENSÃO FORMATIVA DO PROFESSOR PESQUISADOR E A EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA

Na dimensão formativa dos professores, segundo Sandin Esteban (2010) é necessário considerar a dimensão ontológica, a dimensão epistemológica e a dimensão metodológica. A dimensão ontológica pressupõe pensar as questões subjetivas do ser, ou seja, é um conhecimento individual que abrange considerarmos as particularidades do indivíduo, bem como seus anseios, sentimentos e perspectivas diante a vida. Assim, o professor deve se conhecer primeiramente, para que a partir daí possa traçar seus caminhos, descobrindo-se e refletindo sobre sua condição enquanto sujeito.

A dimensão epistemológica preocupa-se em explicar como se estabelece o conhecimento do que sabemos. Sandin Esteban (2010, p. 49) especifica que epistemologia “É o estudo do conhecimento científico. A epistemologia, ou teoria do conhecimento, é aquele conjunto de saberes que é objeto de estudo da ciência (sua natureza, sua estrutura, seus métodos) ”, ou seja, é por meio desta que podemos esclarecer a forma com que adquirimos um determinado conhecimento, tendo como parâmetro suas bases teóricas. Nesse sentido, o professor tem condições de se aprofundar em um determinado conhecimento por meio de uma postura investigativa, a fim de compreender e refletir suas ações dentro de um contexto social ou educacional.

A dimensão metodológica tem como foco o delineamento da maneira com que buscamos conhecer ou ressignificar algo, e “[...] significa uma preocupação com o modo pelo qual o indivíduo cria, modifica e interpreta o mundo em que se encontra. ” (SANDIN ESTEBAN, 2010, p. 30). Assim, nesta dimensão o professor tem condições de traçar seus caminhos, evidenciando as experiências vivenciadas e as perspectivas que possui perante o objeto que quer conhecer.

Tais dimensões são complementares e relacionais, na medida em que dialogam entre si a partir de um circuito ternário previsto no campo da transdisciplinaridade, que tem como objetivo compreender uma determinada realidade, entendendo-se dentro do processo e reconhecendo a sua intencionalidade, o que nos permite dizer que o professor, na condição de dimensão ontológica, exerce a função de complementariedade entre as dimensões epistemológica e metodológica, caracterizando-se assim como terceiro incluído.

O professor, nessa condição, primeiramente deve ser entendido como uma pessoa dotada de subjetividade, que não está alheio as questões pessoais, ideológicas e emocionais. É um sujeito que no processo de se autoconhecer consegue compreender a dinamicidade da vida, valorizar o outro em sua particularidade, reconhecendo-o como parte integrante da sociedade ou de um determinado processo, sendo que tal postura se estende para sua prática em sala de aula, na medida em que consegue ter atitudes menos excludentes e de aceitação ao diferente.

Diante disso, adentramos rapidamente a discussão no campo da Educação Tecnológica, tendo como parâmetro aspectos históricos. Assim Peña (2003) historia que a sociedade em suas inúmeras transformações econômicas, políticas e sociais, transcorridas por passagens pontuais, como a Revolução Industrial (século XVIII), as Revoluções Burguesas (séculos XVII e XVIII), a Consolidação do Sistema Capitalista, o Movimento do Iluminismo e outros, culminaram no processo de marginalização e exclusão das camadas sociais, tendo em vista que o contexto de ascensão que emergia em conjunto com aspectos do liberalismo e a expansão do racionalismo tinham como foco o aperfeiçoamento das máquinas.

Peña (2003, p. 11) explicita que

A história nos revela que desde o momento em que a máquina passou a fazer parte do processo produtivo, muitos pensadores dedicaram-se a refletir sobre a influência desta, sobre a vida do homem. O taylorismo buscava colocar o trabalhador no compasso da máquina, implicando nisso a separação entre trabalho intelectual e físico, dispensando a atividade mental do trabalhador.

Frente a essa nova expectativa, e todas as outras oriundas do desenvolvimento econômico e dos avanços tecnológicos determinaram-se um conjunto de práticas pedagógicas e formas de conceber a educação, interligadas a uma dada realidade, como por exemplo, a pedagogia autoritária. Nesse sentido, a política educacional não se volta para a emancipação do sujeito, já que têm outros interesses e uma preocupação com o progresso e/ou globalização.

Peña (2003, p.13) também sinaliza que

[...] A sociedade neoliberal e informacional provocou transformações nas relações humanas da mesma forma que na sociedade industrial, acelerando o processo de desigualdades sociais e o empobrecimento. A tecnologia se transforma hoje num instrumento que viabiliza a exclusão social, na medida em que o acesso às novas técnicas é ditado pelas condições materiais dos indivíduos agravadas por sua vez pelo monopólio dos meios de comunicação exercido pelas grandes empresas internacionais.

Depreende-se assim que apesar da tecnologia ter mantido, ao longo da história, um caráter mercadológico, de opressão e exclusão da classe operária, devemos pensar nesta imbricada com a educação política, inclusiva e emancipatória que oportunize a todos uma postura reflexiva diante os aspectos preestabelecidos que o rodeiam, seja na dimensão social ou profissional.

Retomando a discussão conceitual de tecnologia, Pinto (2005, p. 219) propõe quatro significados importantes para ela, o primeiro esclarece que a tecnologia “[...] tem de ser a teoria, a ciência, o estudo, a discussão da técnica, abrangidas nesta última noção as artes, habilidades do fazer, as profissões e, generalizadamente, os modos de produzir alguma coisa.”, ou seja, é entendida de forma ampla. A segunda perspectiva conceitua a tecnologia como a técnica propriamente dita em sua essência, sendo que muitas vezes estas são encaradas como termos equivalentes em um sentido mais popular e generalista.

A terceira acepção entende a tecnologia como “[...] o conjunto de todas as técnicas de que dispõe uma determinada sociedade, em qualquer fase histórica do seu desenvolvimento.” (PINTO, 2005, p. 220), sendo também compreendida de forma genérica e global. Por fim, a última definição compreende que a tecnologia perpassa por uma ideologização da técnica, que por sua vez, é o viés que o autor dedica uma maior atenção.

A tecnologia possui caráter ideológico na medida em que passa a ser utilizada como instrumento de dominação, onde o homem não reflete sobre a prática ou técnica que desenvolve, bem como não problematiza sua realidade e os meios tecnológicos que são postos em sua realidade local, o que nos permite corroborar a dita política de dominação, que precisa ser dialogada de forma crítica ao mesmo tempo em que deve atingir a todos os indivíduos.

É perceptível, portanto, que a tecnologia tem relação direta com o contexto social que está sendo vivenciado, contudo, a percebemos aqui atrelada a vertente do sistema capitalista, que não tem interesse que o sujeito seja desalienado quanto aquilo que está sendo posto em sua prática e seu modo de ser e viver em sociedade.

Nesse sentido, destacamos que “Cabe a todo homem trabalhador o direito de dizer em que consiste a técnica, pelo elementar motivo de a ter nas mãos. Uma vez de posse desse conceito, passará facilmente ao de tecnologia, no sentido de representar simultaneamente o conjunto das técnicas produtivas e o reflexo subjetivo, e portanto ideológico, das condições em que operam.”. (PINTO, 2005, p. 330).

Desta forma, é emergente que a educação cumpra seu papel de transformadora das condições preestabelecidas na sociedade, buscando intervir gradativamente na dinâmica escolar, nas concepções de currículo e consequentemente em sua comunidade como um todo, contribuindo assim para uma sociedade mais democrática, plural e participativa, perante os enfoques tecnológicos funcionalistas e burocratizantes.

Cabe salientar, no entanto, que é essencial estudar os meios técnicos e tecnológicos visando não apenas a aprimoração de conhecimentos de suas funções, mas desvendar suas potencialidades no campo comunicacional e pedagógico, objetivando a emancipação dos indivíduos de forma global e a melhoria das práticas escolares. Pressupõe-se que o professor repense sua práxis, assumindo sua função de mediador e facilitador do processo de aprendizagem ao criar espaços de participação e reflexão, a fim de propiciar aos discentes a condição de serem sujeitos ativos, reflexivos, participativos e autônomos.

Ressaltamos ainda que “[...] a utilização das tecnologias de informação e comunicação podem e devem colaborar para o bem comum e a construção de uma educação mais humanizadora, que forneça as bases para transformar as injustiças observadas em nossa sociedade. [...].” (Peña, 2003, p. 17). Depreende-se que apesar do atual contexto de progressão da tecnologia e dos desdobramentos desta no âmbito da sociedade, a utilização dos meios técnicos pode ser ressignificado através de uma educação comprometida com a emancipação e humanização de todos os sujeitos envolvidos no processo educativo.

5. CONSIDERAÇÕES

Salientar as conclusões e/ou posições do autor frente aos frutos do estudo, geralmente confeccionada por meio da exploração dos objetivos alcançados e da discussão do problema discutido.

O currículo é o documento que norteia ou deveria nortear todas as ações desenvolvidas no contexto educacional, uma vez que é composto de filosofias, teorias educacionais, intencionalidades explícitas ou não, propostas metodológicas e demais estruturas que servem de base para as instituições de ensino. À par disso, o currículo é compreendido como a estratégia chave da educação, na medida em que discuti-lo é buscar renovar as práticas de ensino, as concepções educacionais, os objetivos e funções da escola, bem como todas as demais questões pertinentes ao processo educacional. Torna-se emergente que as discussões em torno do currículo considerem ainda as vivências dos sujeitos, sua subjetividade, sua história de vida e seus aspectos culturais, visto que estes componentes são relevantes para a dinâmica escolar.

Podemos relacionar currículo e a Educação Tecnológica, uma vez que este se vincula ao mundo do trabalho, que está imbricado as questões políticas, econômicas e ideológicas, procurando assim atendê-los. Portanto, percebemos que o Currículo e a Educação Tecnológica precisam atuar enquanto base dialógica da transdisciplinaridade, a fim de que o processo educativo possa ser melhor conduzido. Não podemos esquecer ainda que o professor deve sempre rever sua prática em sala de aula para que enxergue situações-problema, bem como encontre os meios de intervir em sua realidade, exercitando assim uma postura investigativa e em consonância com o que propõe a complexidade e os níveis de realidade da transdisciplinaridade.

Por fim, destacamos que a transdisciplinaridade nos possibilita a compreensão de que não existe uma condição uniforme e/ou padronizada no campo da educação, do currículo e da própria vida, tendo em vista que há inúmeras vertentes e concepções em diversos segmentos, sendo crucial então a proposição de diálogos e o exercício de enxergar o outro de distintas formas, a fim de que se propague o respeito ao diferente e a melhoria das relações entre os sujeitos.

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