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EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA: REFLEXÕES SOBRE A INCORPORAÇÃO DE TECNOLOGIAS MÓVEIS NA EDUCAÇÃO
Liliane da Silva Coelho Jacon; Ana Carolina Garcia de Oliveira; Elizabeth Antonia Leonel de Moraes Martines;
Liliane da Silva Coelho Jacon; Ana Carolina Garcia de Oliveira; Elizabeth Antonia Leonel de Moraes Martines; Irene Cristina de Mello
EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA: REFLEXÕES SOBRE A INCORPORAÇÃO DE TECNOLOGIAS MÓVEIS NA EDUCAÇÃO
EDUCATION & TECNOLOGY: REFLECTIONS ABOUT THE INCORPORATION OF MOBILE TECNOLOGIES IN THE EDUCATION
REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, vol. 1, núm. 1, 2013
Universidade Federal de Mato Grosso
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Resumo: Nos tempos atuais, existe um apelo cada vez maior para a inclusão de dispositivos móveis na sala de aula, tais como tablets, celulares, smartphones com o intuito de melhorar o aprendizado a as práticas de ensino. No entanto, a presença dessas tecnologias provoca questionamentos, desafios, reflexões sobre a necessidade de repensar a prática pedagógica. Para isto, o objetivo deste artigo é apresentar os resultados parciais de uma pesquisa exploratória para discutir o processo de incorporação de tecnologias na educação. Primeiramente, são apresentadas algumas reflexões sobre a expansão tecnológica e suas aplicações. Em seguida, é abordado o processo de incorporação das TIC na educação: quais as etapas necessárias e os desafios e tensões a serem superados, principalmente com relação à formação de professores. O professor continua a ser crucial para orientar o processo de ensino aprendizagem, mas o seu papel de professor muda. Apresenta também o relato de uma atividade pedagógica realizada com a participação de discentes do curso de licenciatura Química da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) sob a orientação de duas professoras (uma formadora de professores de Química e uma professora de informática).

Palavras-chave: formação de professores, dispositivos móveis, tecnologia de informação e comunicação.

Abstract: In current times, there is a growing call for the inclusion of mobile devices in the classroom, such as tablets, mobile phones, smartphones in order to improve the learning teaching practices. However, the presence of these technologies provokes questions, challenges, reflections on the need to rethink the pedagogical practice. For this, the aim of this article is to present a the partial results of an exploratory research to discuss the process of incorporating of this technology in education. Firstly, are presented some thoughts on technological expansion and its applications. And then approached the process of incorporation of ICTs in education: what are the steps required, and the challenges and tensions to overcome, especially according to the training of teachers. The professor continues to be crucial to guide the teaching learning process, but its role of teacher change. It also presents an account of a pedagogical activity carried out with the participation of students from the undergraduate Chemistry, Federal University of Rondônia (UNIR) under the guidance of two teachers (one teacher trainer of Chemistry and a professor of computer science).

Keywords: teacher education, mobile devices, technology of information and communication.

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Artigos

EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA: REFLEXÕES SOBRE A INCORPORAÇÃO DE TECNOLOGIAS MÓVEIS NA EDUCAÇÃO

EDUCATION & TECNOLOGY: REFLECTIONS ABOUT THE INCORPORATION OF MOBILE TECNOLOGIES IN THE EDUCATION

Liliane da Silva Coelho Jacon
Universidade Federal de Rondônia, Brasil
Ana Carolina Garcia de Oliveira
Universidade Federal de Rondônia, Brasil
Elizabeth Antonia Leonel de Moraes Martines
Universidade Federal de Rondônia, Brasil
Irene Cristina de Mello
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil
REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil
ISSN-e: 2318-6674
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 1, núm. 1, 2013

Recepção: 05 Agosto 2012

Aprovação: 15 Agosto 2013

Publicado: 20 Setembro 2013


1. INTRODUÇÃO

No início de 2012, o então ministro da Educação, Aloizio Mercadante concedeu uma entrevista a uma revista brasileira[5], informando a compra de 600.000 tablets para professores de ensino médio da rede pública, a partir do 2º. semestre de 2012. Segundo a entrevista, o ministro promete distribuir os equipamentos somente a 52.000 escolas que contam com acesso à banda larga e a professores que passarem por um treinamento de 360 horas, com o objetivo de evitar equívocos como os do projeto Um Computador por Aluno (UCA). O projeto UCA, iniciado em 2007, levou 150.000 netbooks às escolas, mas enfrentou problemas, pois havia instituições que não tinham sequer acesso à rede elétrica ou à internet e de professores que mal sabiam ligar os netbooks.

Os jornais constantemente divulgam notícias relacionadas a crescente preocupação dos governos estaduais e federal, na aquisição de tablets para as escolas públicas. Também são divulgadas reportagens sobre escolas particulares, que já solicitam tablets na lista de material escolar, inclusive algumas, divulgam que já o utilizam em sala de aula com seus alunos. Há um verdadeiro bombardeio de notícias na mídia, inclusive de especialistas em Educação, lardeando os benefícios deste dispositivo, ou então, apresentando ressalvas à sua utilização.

Aqui cabe uma pergunta: e os professores, como ficam neste emaranhado? Na entrevista citada, o ministro da Educação, fez a seguinte afirmação: “a escola precisa estar aberta ao século XXI. Hoje, os professores são do século XX e os alunos, do século XXI”. Trata-se de uma afirmação que ilustra a defasagem tecnológica dos professores frente aos seus alunos, expondo os professores como o “bode expiatório” do processo.

Os tablets representam uma novidade para a população brasileira e, em especial, para aos profissionais da educação. Das colocações anteriormente apresentadas, surgem algumas questões: ao equipar as salas de aula (professores e alunos) com tablets, conseguiremos incorporar esta tecnologia, de forma apropriada, ao cotidiano escolar? A ênfase está/será na pedagogia ou na tecnologia? Quais são as etapas e os desafios a serem superados para incorporar esta tecnologia? Estão as escolas preparadas para receber estes dispositivos (elas possuem infraestrutura adequada)? A integração destes dispositivos nos currículos trarão melhoras qualitativas na compreensão dos alunos? Para incorporar esta tecnologia em sala de aula, estão os professores devidamente preparados para esta tarefa? Aqui é questionada a formação do professor na utilização das TIC; fundamental para o sucesso (ou o fracasso) desta proposta. São vários questionamentos, com implicações complexas devido ao quantitativo de escolas, professores e alunos envolvidos em uma grande extensão territorial brasileira.

Mas antes de analisar estas questões, surge uma anterior a todas elas, e que merece uma reflexão mais aprofundada: trata-se da expansão tecnológica e suas aplicações. Em seguida, são apresentadas algumas reflexões sobre o processo de incorporação das TIC na Educação: quais as etapas para esta incorporação e alguns pontos de tensão e desafios decorrentes deste processo. Apresenta também uma experiência de inclusão dos dispositivos móveis com a participação de futuros professores de Química na sua formação inicial. E encerra com algumas considerações sobre o uso dos dispositivos móveis no processo de ensino aprendizagem.

2. A EXPANSÃO TECNOLÓGICA E SUAS APLICAÇÕES

Para definir tecnologia, far-se-à uma breve introdução sobre o que é a técnica. Segundo o dicionário de filosofia Lexicon[6], técnica “é a utilização dos recursos e forças da natureza, endereçada a satisfazer às necessidades humanas”. Para Vieira Pinto (2005, p.269), a técnica, por necessidade, deve ser um patrimônio da espécie e sua função deveria ser a de proporcionar melhores condições de vida para a humanidade. No entanto, Habermas alerta que, a ciência e a técnica podem servir de instrumento para legitimar a dominação eficiente do homem sobre o homem. A dominação política de uma sociedade tende a perder o seu caráter explorador e opressor e torna-se “racional” (HABERMAS, 1994, p.47). Para Heidegger, a expansão ocidentalizada e racional da técnica moderna “é o agir técnico que dá ao homem, hoje, a sua essência”. Cabe ao próprio homem zelar por sua salvação, em questionar e não se deixar alienar pela técnica, em conduzi-lo ao perigo do esquecimento do ser (Heidegger, 2001).

[..] temos uma tendência a alienarmos-nos das coisas do mundo, o que faz com que nos esqueçamos do nosso SER. É essa tal alienação que faz com que nos percamos nas coisas (nos utensílios na terminologia do filósofo). Essa condição nos leva a valorizar em excesso os objetos, em detrimento da nossa própria valorização como seres humanos e, por extensão, negarmos a humanidade dos nossos semelhantes (Idem, p.38)

A tecnologia, a ciência da técnica, pode ser definida como a junção da técnica com a automação. A automação é o produto de sistemas fechados de máquinas eletrônicas, que trabalham a uma velocidade instantânea (MORAIS, 2002, p.149). Por dedução, tecnologia é um termo que envolve conhecimento técnico e científico e a utilização de ferramentas e máquinas com o objetivo de satisfazer às necessidades humanas.

É preciso educar o homem numa crescente interação com a máquina, não perdendo de vista que o papel prioritário da tecnologia é servir ao homem. O perigo é a alienação, pois uma educação que se limite ao uso de novas tecnologias e à compreensão apenas de seu funcionamento contribui em manter o processo de dominação do homem pelos ideais de lucro a qualquer preço, não contribuindo para a busca de um desenvolvimento verdadeiramente humano. Trata-se de uma visão simplista e reducionista do verdadeiro uso tecnológico.

Outro questionamento com relação à tecnologia, diz respeito à sociedade moderna que passou a confiar na tecnologia, em especial na informática, como se confia em uma divindade. Pode-se equipará-la a uma visão salvacionista, como se a tecnologia fosse a mola propulsora para superar os problemas educacionais brasileiros, cuja preocupação é acompanhar os passos dos países mais desenvolvidos tecnologicamente. Observa-se uma supervalorização da tecnologia, ao considerar que através da modernização dos recursos (por exemplo, na utilização de computadores e/ou tablets), obter-se-à avanços educacionais concretos. A educação brasileira obedece a uma série de fatores (econômicos, históricos, culturais, políticos, entre outros) que devem ser considerados e que é, portanto, distinta de outros países. Talvez a preocupação pública da sociedade com os rumos da mudança tecnológica, tenha acarretado por provocar a necessidade dos tablets nas escolas. Novamente, a tecnologia vista como um fim, só servirá para aumentar as diferenças sociais e econômicas.

No discurso do ministro, deve ser considerado o efeito do marketing tecnológico ao equipar as escolas e, em especial, os professores com tablets, com o discurso no estilo do “não podemos deter o avanço tecnológico”. Criou-se uma necessidade de consumo, a necessidade “urgente” de uma modernização tecnológica das salas de aula. Em contrapartida, é preciso considerar que o mundo da vida atual torna-se totalmente dependente do aparato técnico, os humanos acabam por tornarem-se “funcionários” deste aparato. Imagine uma instituição, seja ela acadêmica, empresarial, governamental, bancária etc; sem computadores, em que todos os documentos são controlados manualmente, de forma manuscrita. É inconcebível nos dias atuais, pois a sociedade se deu conta dos benefícios da automatização dos processos, da velocidade e na agilidade proporcionada em satisfazer suas necessidades cotidianas. O mesmo se dá na sala de aula. Através da tecnologia e, em especial com os tablets ou com os computadores, torna-se possível a conexão com o mundo, na realização das mais diversas pesquisas acadêmicas, visualizar simulações e melhor compreender os eventos físicos e químicos da natureza, executar jogos que permitam a compreensão dos cálculos e equações matemáticas sem a necessidade de “decorar” fórmulas, realizar pesquisas artísticas em acervos de museus internacionais, acompanhar os acontecimentos sociais e econômicos que dizem respeito diretamente ao cidadão.

As tecnologias podem ajudar, mas também podem atrapalhar/complicar. Depende do emprego e da utilização que se faz dela. Segundo Moran (2012, sp)

[...] elas podem nos ajudar a aprender e a evoluir, mas também pode favorecer a dispersão nas múltiplas telas, aparelhos, aplicativos, redes. Ajudam a comunicar-nos melhor, mas também a desfocar-nos, distrair-nos, tornar-nos dependentes. A tecnologia está para nos servir, para ajudar-nos a aprender, a evoluir, a sermos pessoas livres.

Para a concretização disso, o professor precisa estar devidamente preparado para conduzir o processo de ensino aprendizagem utilizando as tecnologias e, as escolas equipadas adequadamente, inclusive com conexão à internet. Segundo as palavras de Moran (2012, sp), pode-se concluir que “as tecnologias fazem parte do nosso mundo, mas ainda precisamos experimentar muito para encontrar caminhos de integração que nos permitam avanços significativos na escola e na vida”.

3. A INCORPORAÇÃO DAS TIC NA EDUCAÇÃO

As inovações tecnológicas no contexto educacional são denominadas de Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC) e sua incorporação na sala de aula não é uma tarefa trivial. O emprego das TIC na educação depende da atitude dos professores (embora não seja este o fator único), pois requer um saber específico para que se possa lançar mão delas no processo de ensino aprendizagem.

Para compreender melhor este processo, são discutidas as etapas necessárias para se incorporar as TIC na educação.

3.1. Etapas de incorporação das TIC na educação

Para determinar o grau de avanço da incorporação das TIC nas instituições escolares, Sunkel (2006, p.126) afirma que existem 4 etapas neste processo, a saber: emergente: quando se toma consciência dos benefícios das TIC na Educação.; aplicação: quando as autoridades educacionais começam a realizar projetos pilotos em escolas selecionadas; integração: é aquele em que as escolas contam com recursos tecnológicos (infraestrutura), já foram estabelecidos processos de capacitação e integração das TIC no currículo, mas as tecnologias ainda não foram plenamente assimiladas ao processo de ensino/aprendizagem; transformação: esta etapa caracteriza-se quando as escolas incorporaram as TIC de maneira sistemática e integral no processo de ensino aprendizagem e na organização da tarefa docente.

Na sala de aula, Valente (2011, sp) exemplifica a etapa de aplicação das TIC, ao utilizar-se um software educacional mesmo que não seja de forma integrada ao currículo e, a etapa de transformação como àquela de geração de novos conhecimentos. Bastos (2010) afirma que os países Chile, Costa Rica, Brasil e México encontram-se no estágio de “integração” (p.38).

Bastos (2010) ao citar o projeto ICT-CST da Unesco, lançado em 2008, como referência para adaptações nacionais de padrões de competência em TIC para docentes, cita que a publicação “marco político” divide em 3 etapas o processo de vinculação entre política educacional com relação à TIC na educação e desenvolvimento econômico. São eles:

alfabetização tecnológica, aprofundamento do conhecimento e geração do conhecimento. A alfabetização tecnológica seria a expressão de uma concepção que a meta política da educação é aumentar o entendimento tecnológico dos estudantes, cidadãos e força de trabalho incorporando as habilidades tecnológicas ao currículo. O aprofundamento do conhecimento tem como meta política para o uso das TIC na educação aumentar a habilidade dos estudantes, dos cidadãos e da força de trabalho para utilizar o conhecimento de forma a agregar valor à sociedade e à economia, aplicando-o para resolver problemas complexos do mundo real. E a etapa de geração do conhecimento vê como meta política o uso de TIC aumentar a capacidade dos estudantes, cidadãos e força de trabalho para inovar, produzir novos conhecimentos e se beneficiar deste novo conhecimento (Bastos, 2010, p.47).

3.2. Algumas tensões e desafios no processo de incorporação das TIC na educação

A incorporação das TIC na formação docente é um imperativo tanto para a própria formação quanto para a aprendizagem dos futuros alunos. Um docente que não maneje as tecnologias da informação e comunicação está em clara desvantagem com relação aos seus alunos.

Este “manejo” das tecnologias implica em alguns pontos de tensão. Um ponto de forte tensão das experiências com TIC na formação de docentes é a dualidade/ênfase na tecnologia e não na pedagogia. As experiências com TIC na educação devem enfatizar os aspectos pedagógicos e não tecnológicos, mas nem sempre isso acontece. A ênfase está no processo de ensino aprendizagem e não no manejo técnico dos equipamentos.

Observa-se a universalização do discurso de que o professor é o protagonista principal das mudanças que se buscam na educação, mas a incorporação do tema “TIC e educação” no currículo de formação inicial docente é limitado e insuficiente.

A incorporação das TIC na educação é um processo altamente dificil, pois envolve o “enxerto” de um modelo (com seus conceitos, discursos e práticas), originados fora do sistema de ensino. O processo inicial é sempre de "fora" para “dentro” do sistema educativo criando múltiplas resistências. Grande parte da resistência vem dos professores, cuja educação foi de forma tradicional e, portanto, não estão familiarizados com as TIC e suas linguagens (SUNKEL, 2006,p.108).

Outro ponto de tensão é delegar a responsabilidade da tarefa de formação inicial docente em TIC a todos os formadores e também a instituição formadora como um todo e não ao especialista/professor de informática.

A formação de docentes e seu desenvolvimento profissional são pontos cruciais e decisivos nos processos de reforma da educação e que merecem especial atenção por parte dos dirigentes governamentais. Gatti e Sá Barreto (2009) apontam em seus estudos sobre a formação inicial de professores no Brasil, um currículo tradicional sem campos de estudo nem prática, em pesquisa e inovações educativas. A característica do currículo dos cursos superiores brasileiros é o conjunto de disciplinas bastante disperso e fragmentado, com uma proporção bem pequena de disciplinas obrigatórias dedicadas a temas de tecnologia, cujos conteúdos em TIC não passam de iniciação ou de alfabetização digital. Os cursos de formação inicial docente não se devem restringir à introdução de temas específicos, mas sim que resulte em modificações das práticas dos formadores na preparação dos futuros professores. Valente (2011) destaca ainda que a rápida evolução das TIC tornaram-se outro obstáculo, pois os processos de formação docente não acompanham todas as inovações educativas e tecnológicas.

A infraestrutura é uma das principais dificuldades para “vencer a resistência” dos professores e da escola, neste processo de incorporação das TIC. A escassez da infraestrutura (hardware, software, manutenção) frustra o professor quando ele encara a realidade da escola em que trabalha. Outra queixa é a falta de conectividade (Internet) (BASTOS, 2010, p.21) (SUNKEL, 2006, p.107) (RICHIT, 2010, p.31). No entanto, isso não pode ser considerado quando se trata de celulares e smartphones. Com relação a infra estrutura necessária para incorporar os dispositivos móveis na educação, Poli (2012) esclarece que a maioria dos estudantes, inclusive de escolas públicas, já possuem celular e o levam a todos os lugares, sendo o instrumento mais utilizado pela população brasileira. Este autor afirma que o potencial do celular no ensino a distância é promissor. O setor da telefonia móvel no Brasil cresce de forma contínua a cada ano. Para termos de comparação, havia 257,9 milhões de linhas habilitadas em agosto de 2012, de acordo com a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) (POLI, 2012, sp)

Outro ponto a ser discutido e que representa mais um desafio: a integração das TIC ao currículo. Sunkel (2006) afirma que todos os conteúdos curriculares são suscetíveis ao apoio tecnológico digital. Contudo, isto não equivale dizer que só porque o currículo tenha recebido apoio tecnológico significa que consiga transformar e melhorar qualitativamente o nível de compreensão dos alunos. Isto depende muito da mediação pedagógica dos educadores, seus próprios conhecimentos e formas de questionar a aprendizagem dos estudantes através dos recursos disponíveis no contexto escolar (SUNKEL, 2006, p.109).

Neste ponto, finaliza-se o assunto sobre as etapas e desafios no processo de incorporação das TIC na educação. A seguir, tem-se um relato de uma atividade utilizando dispositivos móveis com a participação dos futuros professores de Química da Educação Básica.

4. RELATO DE UMA ATIVIDADE PEDAGÓGICA UTILIZANDO DISPOSITIVOS MÓVEIS COM PROFESSORES EM FORMAÇÃO INICIAL

A pesquisa consistiu num estudo de uso de dispositivos móveis no ensino de química realizada por duas pesquisadoras ligadas ao Laboratório de Ensino de Ciências (EDUCIÊNCIA) da UNIR, utilizando uma abordagem exploratória e qualitativa. Os encontros dialógicos entre uma pesquisadora do Departamento de Computação e uma professora formadora do Departamento de Química, buscam entender as alterações decorrentes do uso destes artefatos tecnológicos (dispositivos móveis) na educação e como isso afeta o processo de comunicação e informação ao instaurar uma nova forma de ensinar/aprender conhecimentos químicos. Num primeiro momento foram realizadas reuniões das duas professoras para planejamento de atividades, com o objetivo de explorar com os alunos da licenciatura as possibilidades e os limites destes dispositivos para o ensino de conhecimentos químicos, buscando-se uma postura pró-ativa do aluno.

Neste trabalho foi testado o aplicativo gratuito da plataforma Android e analisado seu uso na perspectiva dos alunos, para verificar a possibilidade de utilização pedagógica dos mesmos. O aplicativo Atomdroid[7] é uma ferramenta para construção de moléculas químicas tridimensionais, através da manipulação de suas partículas atômicas. Ele também possui uma extensa biblioteca de moléculas 3D (tridimensionais) previamente construídas, que podem ser consultadas e manipuladas pelos estudantes.

A aplicação da atividade foi elaborada pela professora formadora que é a responsável pela disciplina de Prática de Ensino no 7º. Período do curso de Licenciatura, e foi acompanhada pela pesquisadora/professora de Informática. A atividade ocorreu no dia 12 de abril de 2013, com duração de 4 horas no Laboratório de Ensino de Ciências da UNIR. O objetivo foi a manipulação de dispositivos móveis com a plataforma Android (tablet e smartphone), bem como identificação de possibilidades e limitações do uso de aplicativos para o ensino de Química utilizando estes equipamentos. Participaram da atividade 13 (treze) alunos, com média de idade de 23,6 anos. Com relação ao total de dispositivos utilizados, foram 4 (quatro) tablets e 7 (sete) smartphones. Alguns alunos que não tinham equipamentos compatíveis com a plataforma Android juntaram-se a outros colegas para compartilhar o equipamento e desenvolver a atividade em duplas.

A professora formadora de Química iniciou com uma breve exposição sobre as diversas plataformas de trabalho dos dispositivos e sobre conexão de rede sem fios wi fi, para em seguida solicitar a instalação do aplicativo Atomdroid (em inglês).

A primeira tarefa solicitada pela professora aos seus alunos foi a construção de moléculas tridimensionais através do aplicativo Atomdroid. Inicialmente, a professora solicitou a construção de moléculas mais simples, tais como: metano (CH4), amônia (NH3), água (H2O), metanol (CH2O), gás carbônico (CO2) e gás nitrogênio (N2). A professora formadora utilizou um tablet e um projetor para fazer a exposição inicial das atividades propostas.

Os alunos adicionavam as partículas atômicas para compor a molécula no formato tridimensional, selecionando-as uma a uma, recorrendo a uma Tabela Periódica digital. Enquanto os alunos realizavam a construção das moléculas, a professora caminhava pela sala e supervisionava os diversos grupos, auxiliando-os nas eventuais dificuldades. As Figuras 1a e 1b ilustram alguns destes alunos utilizando tablet e smartphone para construção das moléculas.


Figura 1a.
Uso de tablet e smartphone para a realização da atividade pedagógica Fonte: autoras da pesquisa


Figura 1b.
Construção e manipulação de moléculas tridimensionais Fonte: autoras da pesquisa

Após a construção destas moléculas, a professora solicitou a construção de novas moléculas orgânicas, mas com um nível maior de complexidade. São elas: trans-buteno, cisbuteno e butano (neste último pelo menos duas conformações: anti, gauche e eclipsada). Nesta etapa, a professora fez uma breve revisão sobre as diferentes conformações estereoquímicas do butano (conformação eclipsada, anti e gauche), a fim de auxiliar os alunos na construção dos modelos tridimensionais. Em seguida, os alunos fizeram consultas à biblioteca de moléculas tridimensionais existentes no aplicativo Atomdroid. A molécula consultada foi o composto da droga Heroína e os alunos enfrentaram dificuldades com o acesso à Internet, pois a conexão estava lenta, o que acarretou na desistência de alguns ao tentarem visualizar as moléculas da biblioteca. O encerramento dessas atividades se deu após a professora pedir ao grupo que respondesse a uma breve avaliação.

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A avaliação dos alunos sobre as possibilidades e limitações do uso do tablet e do smartphone no ensino de conhecimentos químicos, se deu após a realização da atividade didática descrita e revelou que, dos 13 (treze) alunos que participaram da atividade, 5 (cinco) são do sexo masculino e 8 (oito) do sexo feminino, com idade média de 23,6 anos. Embora todos fossem jovens (entre 20 e 26 anos), observou-se que havia aqueles que estavam utilizando um tablet pela primeira vez. Com relação ao total de dispositivos utilizados, foram 4 (quatro) tablets e 7 (sete) smartphones sendo que, apenas 3 (três) utilizaram equipamentos próprios. Apesar de haver 2 (dois) outros alunos que também possuíam dispositivo móvel, os mesmos não eram compatíveis com a plataforma Android, ou então, a versão não atendia os requisitos para execução dos aplicativos utilizados. Ou seja, 10 (dez) alunos participaram da atividade com equipamentos emprestados de terceiros.

Questionados se tinham a intenção em adquirir um dispositivo móvel, 10 (dez) alunos responderam que desejavam adquirir um tablet e 1 (um) aluno respondeu que desejava adquirir um smartphone, todos com acesso à Internet. Apenas 2 (dois) alunos responderam que já possuíam um dispositivo móvel e que não tinham a intenção em adquirir outro. Questionados sobre os benefícios que os dispositivos móveis podem trazer para o ensino de ciências químicas, todos (100%) mencionaram que o acesso à Internet para consulta a sites e a utilização de aplicativos auxiliam o aprendizado. Dez alunos (77%) mencionaram que o dispositivo móvel possibilita que o aprendizado ocorra em qualquer lugar e a qualquer momento (em casa, na indústria, na escola, no trabalho) e 4 (quatro) alunos (30%) afirmaram que facilita a interação com os demais colegas e o professor a qualquer momento, seja ela via skype, email, redes sociais ou bate-papo.

A questão que indaga sobre os problemas a serem enfrentados caso sejam adotados os dispositivos móveis no ensino de química, obteve os seguintes resultados: 9 alunos (69%) responderam que há necessidade em adaptar os conteúdos de química para estes dispositivos e também que estes devem ser elaborados na língua portuguesa. Sete alunos (54%) mencionaram que há desafios de ordem técnica a serem superados, tais como: dificuldade de escrita, diversidade de plataformas, pois acarretam em incompatibilidade na execução de aplicativos e problemas de visualização em equipamentos com visor reduzido. Com relação aos custos para aquisição e manutenção de conectividade móvel, 7 alunos (54%) afirmaram que é preciso garantir o acesso à todos, sejam eles alunos ou professores. Quanto à formação de professores, 8 alunos (61%) destacam que a capacitação docente é inexistente ou insuficiente, que há resistência por parte dos professores e também que a graduação não prepara o futuro professor para incorporar estes dispositivos no processo educacional. Com relação aos desafios de ordem pedagógica, 5 alunos (38%) citaram que as práticas pedagógicas ainda são incipientes acrescentando que há necessidade de um modelo pedagógico específico para estas práticas. Um dos alunos mencionou sua preocupação com o “ensino mecânico, que acaba prejudicando o aprendizado caso ofereça as respostas prontas ao aluno”. Um outro alertou sobre a possível desatenção dos aprendizes, que terão acesso à Internet e que facilmente poderão se distrair dispersando a atenção com as redes sociais.

A última questão trata sobre a utilização de diferentes modelos com o objetivo de potencializar o aprendizado em química. Os modelos mencionados foram os seguintes: bolavareta, aplicativos em dispositivos móveis, imagens bidimensionais impressas em papel, quadro negro e giz. Observou-se que, nesta questão, houve uma convergência nas respostas ao afirmarem que os modelos são complementares e que todos os recursos devem ser utilizados dependendo do contexto, embora dois alunos mencionem que a visualização tridimensional de moléculas potencializa o aprendizado de forma mais evidente. Um aluno fez a seguinte citação: “com o intuito de potencializar o ensino, acredito que toda forma pedagógica é válida, tudo depende da realidade da escola”.

Observou-se a facilidade e agilidade dos alunos para a movimentação das moléculas pelo visor do dispositivo móvel, realizados através de comandos de zoom (aproximação/distanciamento), bem como para girar e deslocar (movimentos de rotação e translação). Apenas uma aluna, que utilizava um smartphone, não conseguiu realizar os comandos de zoom, embora ela tenha conseguido girar e deslocar as moléculas sem problemas. A tela sensível ao toque (touchscreen) facilitou a interação e consequentemente facilitou a manipulação das partículas orgânicas durante o processo de construção das moléculas. Com relação a facilidade de distração, principalmente devido a permissão de acesso à Internet, a pesquisadora da informática, bem como a professora formadora observaram que, durante as atividades desenvolvidas pelo menos dois alunos entraram nas redes sociais (facebook), dispersando-os das atividades solicitadas.

6. CONSIDERAÇÕES

Os dispositivos móveis, tais como o tablet, trazem em sua essência, uma revolução nos conceitos de presença, espaço, comunicação, inteligência, interação e conhecimento. Mas como foi apresentado neste trabalho, deve-se buscar a compreensão para o uso apropriado da tecnologia: não como um fim a ser alcançado, mas sim como um “meio”. A tecnologia pode ser considerada como um elemento-chave para a compreensão da sociedade moderna e não pode ter a sua análise reduzida à dimensão instrumental do fenômeno.

Um dos grandes desafios no uso pedagógico destes dispositivos pelos professores, reside na necessidade de promover um sólido processo de formação destes profissionais em TIC. Apesar do estágio embrionário em que se encontram as práticas e a formação envolvendo a incorporação dos dispositivos móveis na educação, acredita-se que é necessário repensar as práticas pedagógicas, assim como investir na formação e capacitação dos professores que envolvam a utilização desta tecnologia. Porém, este processo exige a compreensão que não se trata de simplesmente preparar o cidadão para saber lidar com essa ou aquela ferramenta tecnológica ou desenvolver no aluno representações que o instrumentalize a absorver as novas tecnologias. É muito mais do que isso. Espera-se que a vivência de situações didáticas auxilie a incorporação dos dispositivos móveis em suas salas para uma aprendizagem contextualizada numa sociedade em que o acesso das novas gerações é cada vez maior aos dispositivos móveis de comunicação.

Material suplementar
REFERÊNCIAS
BASTOS, Maria Inês. O impacto das TICs na Educação: O desenvolvimento de competências em TIC para a educação na formação de docentes na América Latina. Org. Unesco OREALC. Brasília. Abril, 2010.
GATTI, Bernadette A. (coord.); BARRETO, E.S. de Sá. A formação continuada em questão. cap. 8 p.199-236. Livro Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília, set/2009.
HABERMAS, Jurgen. Técnica e ciência como “ideologia”. Lisboa: edições 70, 1994, p.45- 92.
HEIDEGGER, Martin. Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2001; p.11-38.
MORAIS, Regis de. Filosofia da Ciência e da Tecnologia. 7ª.ed. Campinas: Papirus, 2002; p.99-172.
MORAN, José Manuel. Tablets e netbooks na educação. Disponível em: http://www.eca.usp.br/prof/moran/tablets.pdf. Acesso em 5 abr 2012a.
______; Tablets para todos conseguirão mudar a escola? Disponível em: http://www.eca.usp.br/prof/moran/tablet.pdf Acesso em 5 abr 2012b
POLI, José Luis. Matemático usa smartphone para ensinar analfabetos a ler e a escrever em SP. Entrevista concedida a Claudia E. Izumi, publicada na UOL Educação. Disponível em http://educacao.uol.com.br/noticias/2012/10/25/matematico-usa-smartphone-para-ensinaranalfabetos-a-ler-e-a-escrever-em-sp.htm. Acesso em 25.out.2012
RICHIT, Adriana. Apropriação do Conhecimento Pedagógico-Tecnológico em Matemática e a Formação Continuada de Professores. Tese de doutorado. Unesp, Rio Claro, SP. 2010.
SUNKEL, Guillermo. Las nuevas tecnologias de la comunicacion y la informacion TIC em la educacion: Desafios para lãs políticas públicas em América Latina. Santiago do Chile: CEPAL, Division de Desarollo Social, Serie Políticas Sociales, 2006.
VALENTE, José Armando. O uso das tecnologias digitais de informação e comunicação na Educação: a passagem do currículo da era do lápis e papel para o currículo da era digital. Palestra proferida no dia 19.out.2011, em Porto Velho, RO.
VIEIRA PINTO, Álvaro. O conceito de tecnologia. Volume I. Rio de Janeiro: Contraponto, 2005, p.29-355. Cap. III e IV
Notas
Notas
[5] Revista Veja Online. Entrevista concedida aos jornalistas Renata Honorato e Janio de Freitas, publicada em 12 de fevereiro de 2012.

Figura 1a.
Uso de tablet e smartphone para a realização da atividade pedagógica Fonte: autoras da pesquisa

Figura 1b.
Construção e manipulação de moléculas tridimensionais Fonte: autoras da pesquisa
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