Ou seja, para colocar no papel o fluxo de consciência de Benjy, o narrador
de 33 anos, portador de uma severa deficiência intelectual, Faulkner precisou
depurar uma série de mecanismos da linguagem a fim de atingir um nível de
estranhamento condizente com o seu narrador. Benjy não possui noções
temporais precisas de presente, passado e futuro – seu tempo funciona como um
presente contínuo; da mesma forma, não possui linguagem verbal articulada; não
é capaz de efetuar relações de causalidade ou de lógica de modo refinado.
Incapaz de um senso apurado de perspectiva, sequer de momentos de
reflexividade, Benjy vivencia a realidade com uma mente infantil fundada em
categorias básicas de apreensão, sobretudo sensoriais.
A cena de abertura, portanto, opera uma desfamiliarização desconcertante
daquilo que, de outra forma, seria uma situação bastante corriqueira. Essa
construção textual alerta o leitor para a excentricidade do relato, sendo que a
estranheza da escrita é motivada pela falta do frame “golfe” aliado a uma
descrição marcada pela exatidão. Trata-se de uma narração altamente “realista”
que aliena o leitor por operar segundo regras bastante específicas: o material
textual é desenvolvido com base em um modo descritivo, depurado de
interpretações e julgamentos latentes naquilo que é explicitado no próprio texto
(cf. ROBINSON, 2007, p. 115-116).
Há, nessa primeira seção, como demonstram Noel Polk (1996, p. 99-109),
Owen Robinson (2006, p. 13-30; 2007, p. 115-132) e Taylor Hagood (2012, p. 92-
106), uma cisão entre significante e significado, entre causa e efeito: os jogadores
de golfe não desenvolvem um jogo, apenas fazem coisas; não efetuam tacadas,
simplesmente batem; não atingem objetivos do jogo e controlam pontuações,
apenas tiram e recolocam a bandeira e se dirigem à mesa. O campo de golfe é
chamado de pasto – mais tarde, nas seções de Quentin e Jason, vê-se que o
local do campo é o antigo pasto dos Compson, vendido para financiar os estudos
de Quentin. O termo “caddie” está longe de identificar uma função do jogo; Luster
apenas procura; o narrador não descreve suas próprias reações. Benjy, assim,
não possuiria e também não necessitaria de explicações para o que ocorre diante
de seus olhos. Robinson (2006, p. 17) defende que o mais importante nessa
narrativa é a apreensão do porque e como as coisas ocorrem, mais do que o quê
acontece. Essa quebra entre significante e significado, bem como a ausência de