ÉDEN CINZA

Cacio José FERREIRA1



Cristal reluzente ao longe acena para um olhar que

condena.

A gota salinar da água explode entre fios negros, agora

fatiados pela cromaticidade que cega.

Ordena que a gota caia sobre a terra e sinalize o chão

varrido ora por dor, ora amor, ora oração. Solidão?

Abandono completo no embrionário reflexo da lua, na curva nua!

Os dedos apertam o invisível cerne do ventre! Sexos interagem

ou mera sondagem do desprezo? Não há apego! Há fragmentos e tormentos.

Aquela folha que rola na rua esfolada pelo vento? Não é de agora. É outrora

um poema distante. Diz que havia amor entre a lua e Bashô! Poeta faz amor?

Se não faz, contempla a palavra que fixa o cristal traidor!

As cores tomam vultos e consomem a forma homogênea. Tomam partido!

Essa palavra é pura verdade, tem pedestal ainda que alheio à moral!

Aquela! amola a foice que corta a garganta de tantas vontades noturnas.

Sobrevive aos gritos a cor que corta o aço e contorna ilusões.

A realidade é fome, é vício, ninfas nuas e homens crus!

Todos nus! Esperando o momento da partida, não da vida sem graça.

Do Éden eivado de pirraça que condena a liberdade das cores.

Tudo deve ser cinza e sisudo. Credo, que mundo! O muro deita-se.

Verte-se verde a aurora! Sexo anexa à poesia todo prazer que explode.

Dane-se o rigor! A dor sempre existe. Contemple o único espaço subversivo,

pois a planta do pé não goza. Há caminhos além do concreto. O cinza entrelaça

qualquer cor. Avante! Una-se aos poetas que não esperam o portão abrir.

Fogem antes que Eva decida ficar! Amam o pêssego, o sossego e a sofreguidão.

Adão desnudo continua propenso ao pecado, à invenção.

Com licença poética, Prado é a campina onde nasce o anjo esbelto!

Cor cora apelidos e mulher da zona!

Exemplificação de estrelas cadentes vistas ao farfalhar do bambu.

Amargo e quente o desencanto ainda sacode a Bandeira!

A mulher negra e nua da senzala sacode a classe.

Não espera a vontade do pecado que acinzenta o Éden.

Se todos fossem assim! Ai deles, ai daqui!

Gritos consomem a voz, mas é a clorofila da alma.

Não, tenha calma. Não tenha calma! Abane a cinza!

O preço da fome é a inércia.

O cristal não reluz sem luz! A refração é nossa ação.

Há cores! Espalhe a notícia que todos foram expulsos do Éden.

Dane se o Éden! Danem se as cinzas! Prazer, multicultural, sem nome, poeta.









1 Professor Assistente da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). E-mail: caciosan@hotmail.com

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