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MULTIMODALIDADE DA RESISTÊNCIA NEGRA: UMA ANÁLISE VISUAL
CRÍTICA DA MATERIALIDADE DISCURSIVA EM MEMES DIGITAIS
Black resistance multimodality: a critical visual analysis of discursive materiality in
digital memes
JOANA PAULA SILVA SOUSA
1
FRANCISCO JEIMES DE OLIVEIRA PAIVA
2
EDUARDO DIAS DA SILVA
3
RESUMO: Este artigo objetivou analisar à
luz das teorias críticas do discurso, o
gênero meme que abordou em sua
materialidade discursiva à resistência
negra, a partir da (des)contrução dos
discursos neles revelados sobre o
preconceito racial e social causados pela
diferença de classe e etnia oriundos da
violência fomentada nas redes sociais,
geralmente, por questões de raça e classe
social. Para tal análise, foram
selecionados onze memes que tematizam
a luta e a resistência negra no Brasil,
publicados na plataforma Facebook em
2018. Constatamos que os discursos
construídos por meio da interação
sociocomunicativa com esses memes
foram capazes de evidenciar o uso da
linguagem escrita e imagética criados no
intuito de (des)naturalizar a prática
discriminatória étnicorracial e social no
discurso digital de muitos interactantes.
PALAVRAS-CHAVE: Memes. Resistência
Negra. Análise de Discurso Crítica.
Multimodalidade.
ABSTRACT: This article aims to analyze in
the light of the critical theories of discourse,
the genre meme that addressed in its
discursive materiality to the black
resistance, from the (dis) construction of
the discourses in them revealed on the
racial and social prejudice caused by the
difference of class and ethnic origin of the
violence fomented in the social networks,
generally, by questions of race and social
class. For this analysis, eleven memes that
theme the struggle and the black
resistance in Brazil, published on the
Facebook platform in 2018, were selected.
We found that the discourses constructed
through the socio-communicative
interaction with these memes were able to
evidence the use of written and imagined
language created in order to (dis)
naturalize the discriminatory practice of
social and ethnic in the digital discourse of
many interactants.
KEYWORDS: Memes. Black Resistance.
Analysis of Critical Discourse.
Multimodality.
SOUSA, J. P. S.; PAIVA, F. J. de O.; SILVA, E. D. da. Multimodalidade da
resistência negra: uma análise visual crítica da materialidade discursiva em
memes digitais In.: Revista Diálogos, v. 7, n. 3, out.-dez., 2019.
1
Mestra em História e Letras MIHL pela Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão
Central FECLESC/ UECE. Graduada em História pelo Centro Universitário (UNINTA (2012).
Especialista em História do Brasil pelo Centro Universitário INTA (2014). Bolsista FUNCAP.
joanapaula4@hotmail.com
2
Mestre pelo Programa Interdisciplinar em História e Letras na Faculdade de Educação, Ciências
e Letras do Sertão Central (FECLESC), campus da Universidade Estadual do Ceará (2019). Aluno
Especial do Mestrado Interdisciplinar em Humanidades da UNILAB/CE (2016).
geimesraulino@yahoo.com.br
3
Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Literatura da Universidade de Brasília
(PósLIT/UnB), Mestre pela mesma instituição no Programa de Pós-Graduação em Linguística
Aplicada (PPGLA/UnB) (2014). edu_france2004@yahoo.fr
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DAS PERSPECTIVAS TEÓRICAS À ANÁLISE DA MATERIALIDADE
DISCURSIVA DA CONSTITUIÇÃO MULTIMODAL DO GÊNERO MEME
A pós-modernidade, como sistema contemporâneo de forma de vida em
sociedade, trouxe muitas rupturas e novas tendências associadas às diferentes
práticas e manifestações linguísticas e sociais (GUERREIRO; SOARES, 2016).
Dessa forma, concordamos que os textos, as práticas sociais e discursivas na
perspectiva da Análise do Discurso Crítica (ADC) vêm sendo (re)configurados, em
razão de inúmeras mudanças impulsionadas pelo acesso as novas tecnologias,
discursos e conhecimentos (BATISTA JR; SATO; MELO, 2018). Dessa forma,
[...] tem-se uma perspectiva de fragmentação, de ordem global, da
contemporaneidade que remete a ideia de uma sociedade, que de
acordo com alguns pensadores, está inserida em um
entendimento de líquida (Bauman, 2009) ou pós-moderna
(Lyotard, 2011) ou em um processo de modernidade tardia
(Giddens, 2002) cujos os elementos estão fragmentados/diluídos,
deixando simplesmente de existir, sendo necessário recorrer a
fragmentos, fatos ou “pedaços” da história para dar sentido à
materialidade do sujeito na interação social mediada pela
linguagem (XOTESLEM, SILVA, SILVA, 2017, p. 27).
Baseando-nos nas perspectivas teórico-metodológicas da Linguística
Sistêmico-Funcional (LSF) de Halliday (1994 [1985]), da Teoria Semiótica Social
da Multimodalidade (TSSM) de Gunther Kress e Theo van Leeuwen (2006 [1996])
e da Análise de Discurso Crítica (ADC) de Norman Fairclough (2001 [1992]), entre
outros. Este artigo visa analisar a constituição discursiva e multimodal dos memes
como forma de resistência negra, tendo em vista às questões a eles imbricados,
sobretudo, incutidos na materialidade discursiva que revelem o preconceito racial
e social no discurso digital, veiculados nas mídias sociais. Pois, ao vislumbrar
uma Educação Antirracista enquadrada no rol das abordagens de pesquisas
críticas cujo escopo consiste em entender a intrínseca relação entre discurso e
práticas sociais, visamos combater, nesta investigação, à produção e reprodução
do poder, ideologia e dominação simbólica e a construção de estereótipos raciais
relacionados à produção do Outro, segundo Souza-Dias (2013), Silva e Souza-
Dias (2017; 2018).
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Ressaltamos que tanto a LSF, TSSM e ADC são discutidas, neste
trabalho, de forma a esclarecer os fenômenos de língua(gem) e suas respectivas
práticas discursivas/sociais em uma dimensão das multissemioses e produção de
sentidos, reforçando a importância desses enquadres teóricos-metodológicos,
para que o(a) pesquisador(a) e/ou o(a) analista do discurso possa compreender
os múltiplos significados que estão inseridos no meio social e nas interações
sociais, sendo o signo o ajuntamento de uma forma e significado e existindo em
vários modos que devem ser considerados como instrumentos para compor o
significado de um texto.
Compreendemos que um texto multimodal é, segundo Kress e van
Leeuwen (1996, p. 18) um texto que vai além da linguagem escrita, abrangendo
outras formas comunicativas como gestos, imagens, o olhar, as expressões
faciais, entre outros. Nesse sentido, Barros (2018), ancorando-se na Semiótica
Social e nos estudos multimodais de Kress e van Leeuwen ([1996] 2006), retoma
a perspectiva dos autores, enfatizando que as imagens são a matéria de que
nossa linguagem se constitui (BARROS, 2018, p. 108). Por isso, coadunamos
também que as “estruturas visuais o simplesmente reproduzem as estruturas
da realidade, pelo contrário, elas produzem imagens da realidade que estão
ligadas aos interesses das instituições sociais nas quais as imagens circulam, são
produzidas e lidas” (AQUINO; SOUZA, 2008, p. 34).
Analisar os memes no contexto das práticas sociais propõe além de um
olhar crítico ao discurso construído com a apresentação desse produto cultural
como nos proporciona uma forma simples de observar situações complicadas
dando um novo sentido aos fatos. Nesse sentido, o biólogo Richard Dawkins
(1976) criou o termo “meme” a partir da palavra grega μιμἐομαι ("mimema", que
tem a mesma raiz de mimese, e significa, portanto, "imitação"), através de sua
forma em inglês mimeme, por aférese (DAWKINS, 2007), definindo meme como
uma unidade de transmissão cultural, ou uma unidade de imitação ligada à
memória, algo que se propaga entre os indivíduos, assim, o conceito de meme
que temos hoje significa espalhar pela internet.
Seguindo uma perspectiva funcional e semiótico-social, os memes estão
inseridos num dado contexto de produção e circulação nas redes sociais,
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principalmente, no Facebook, pois encontramos diversos gêneros discursivos,
textos verbo-visuais, informações variadas na forma de expressão, ideologias e
interesses diferentes, visando o compartilhamento de ideias, sentimentos, valores,
discursos e lutas por seus usuários e/ou interactantes em um dado contexto
sociocultural de significação.
Na ótica de Lima e Castro (2016) os memes são artefatos culturais e
textuais do ambiente virtual, ou seja, são estruturas verbo-visuais que, nas redes
sociais, congregam informações e carregam ideias, emoções, argumentos, pontos
de vista, configurando-se de forma individualizada e se materializando como
gênero do discurso. Isso significa dizer para essas autoras que
[...] os memes, além de serem compartilhados através de redes
várias, podem ser criados, modificados, recategorizados,
proporcionando suas diferentes construções em estrutura e em
conteúdo. Sob tal perspectiva, nesses textos, ocorre na maioria
das vezes a multimodalidade, uma vez que a internet permite o
acesso (e a reconstrução) a textos de semioses variadas (LIMA;
CASTRO, 2016, p. 40).
Partindo dessa trajetória conceitual, sabemos que essas manifestações
nas redes sociais são direcionadas e motivadoras do processo de comunicação
multimodal e de construção simbólica da linguagem na era do globalismo digital
(BUZATO, 2016). Gonçalves (2017) ao analisar as práticas de letramentos na
elaboração de memes em atividades com fins educacionais problematiza que
[...] as mudanças, nos meios de informação, comunicação e
divulgação, ampliaram as possibilidades através da facilidade de
circulação e, em muitos casos, de acesso. Com isso, houve
também o aumento da quantidade de gêneros que transitam
nesses espaços (o que frequentemente vemos nas redes sociais é
que essas, além de servir de fonte de lazer, podem assumir a
função de divulgar e fomentar a circulação de diversas
informações), que, segundo a autora, criam novas
possibilidades de comunicação (GONÇALVES, 2017, p. 31).
Retomando às asserções acima, salientamos que a constituição
multimodal e a materialidade de sentidos construídos nos memes analisados
demonstram que esses gêneros em ambientes digitais reproduzem e naturalizam
outros discursos, que vão além do humor [lazer] como analisado por Gonçalves
(2017). Para tanto, acreditamos que por esses gêneros serem replicadores de
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informações e/ou da própria informação (com)partilhada (CASTRO; CARDOSO,
2015), têm muitos outros propósitos enunciativos no contexto digital, entre os
quais o de ampliar o conceito de “novo gênero”, considerando que muitos textos
imagéticos e/ou verbo-visuais publicados nas redes sociais, criações dos próprios
usuários mesclam, reconfiguram e recontextualizam uma dada situação
(contextos e práticas sociais) com diversas construções verbais do cotidiano,
integrados multimodalmente, complementando-se e construindo outros
significados.
Ademais, concordamos com Castro e Cardoso (2015) ao imporem uma
função crítica político-social para os memes, ainda que fiquem subentendido de
modo frequentemente associado ao humor e a ironia nas práticas de linguagem
desses usuários da língua. Por isso, o discurso contribui para a constituição de
todas as dimensões da estrutura social que direta ou indiretamente, o moldam e o
restringem: suas próprias normas e conversões (FAIRCLOUGH, 2001, p. 91).
Ou seja, o discurso é um modo de ação de agir sobre o outro, essas
informações que os memes trazem, produzem e repassam conteúdos que fazem
uma troca de informações coletivamente, é um discurso moldado pela estrutura
social. Como defende Resende (2017), os textos que escrevemos e com que
temos acesso em nossas experiências de socialização advêm das estruturas e
situações sociais em que se produzem, das práticas de que participam, das
convenções semióticas, mas também têm efeitos sobre essas articulações,
muitas vezes transitórias, de elementos sociais e discursivos.
Fairclough (2001, p. 92) propõe que o discurso como modo de ação
estabelece mudanças sociais e nos diferentes discursos expõe também uma
forma de consumo por parte dos receptores e na “função identitária relaciona-se
aos modos pelos quais as identidades sociais são estabelecidas no discurso”.
Sabendo que as identidades presentes nos discursos transferem a ação individual
para uma ação coletiva dos indivíduos nessa troca de informação e crítica,
passamos a acreditar que as representações de raça, gênero e classe são
percebidas, sob esta perspectiva, como sendo produtos de lutas sociais sobre os
signos e as significações, privilegiando-se as transformações das relações
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sociais, culturais e institucionais nas quais estes significados são suscitados
(CANDAU, 2012).
Em suma, analisamos que a construção da identidade social em memes
perpassa uma gama de enunciados e ideologias, logo é preciso [...] referir os
enunciados ao acontecimento de sua enunciação e à memória de dizer que
atravessa as formulações, não é possível interpretar o movimento argumentativo
nem os efeitos de sentido nele produzido” (FONTANA, 2016, p.3). Seguindo essa
lógica, esses enunciados são necessários, nesta contextualização, para mostrar a
materialidade discursiva da discriminação que os negros e negras, de certa forma,
são vitimados e discriminados, porém, os enunciados verbais e imagéticos, a
seguir, não nos levou apenas a análise de sua composição multimodal, mas sim,
à compreensão de suas representações no intuito de apreendermos seus
sentidos e ideologias predominantes em práticas sociais determinadas.
1. DA ANÁLISE DISCURSIVA CRÍTICA À CATEGORIZAÇÃO MULTIMODAL
DOS SIGNIFICADOS REPRESENTACIONAIS, INTERATIVOS E
COMPOSICIONAIS DOS MEMES
Trazendo à baila as repercussões do episódio de discriminação de uma
dançarina Arielle que trabalha para a cantora Anitta, vitimada pelo discurso do
apresentador Faustão, constatamos que a resistência negra se faz materializada
por meio da construção social e das práticas de linguagem na enunciação verbo-
visual usadas pelos usuários nas redes sociais, dessa forma, entendemos que
“[q]ualquer sistema semiótico tem a capacidade de formar textos, complexos de
signos, com coerência interna e com o contexto em que foram produzidos
(AMOÊDO; SOARES, 2018, p. 136).
Isso significa que podemos destacar, nesse momento, a significação
completa e inter-relacionada entre discursos, textos, semioses, porque tornou-se
hoje evidente essa relação multissemiótica entre texto e imagem (KRESS; VAN
LEEUWEN, 1996, p. 41). Por fim, salientamos ainda a importância categórica da
análise verbo-visual em descrever as estruturas que compõem a composição
multimodal do texto visual, pois este é o caminho para se compreender os
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elementos representacionais e interativos que são produzidos integrados ao
significado composicional (AMOÊDO; SOARES, 2018).
Apresentamos agora a análise discursiva crítica e multimodal dos memes,
coletados e separados por eixos temáticos: Memes e resistência, Discurso de
autoestima e afirmação, Resistência e empoderamento e Não ao racismo.
Memes e resistência
Figura 01. "Cabelo “vassoura de bruxa”: comentário de Faustão sobre dançarina de Anitta
gera revolta”. A qualificação negativa aos cabelos cacheados da jovem nos remete mais uma vez
ao racismo cordial dos brasileiros”
4
Fonte: reprodução/Facebook.
Na perspectiva representacional, este meme em questão é uma
representação narrativa, pois a indicação de vetores que realizam uma ação,
ou melhor, um posicionamento de resistência por quem foi discriminada por
questões raciais. A materialidade desse meme
5
se evidencia politicamente pela
representação social que vai ao encontro às lutas seculares das mulheres negras
por mais espaço na sociedade, sobretudo de uma profissional da dança que tem
os cabelos em conformidade com sua identidade cultural
6
e valores específicos
4
Disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/2014/04/22/cabelo-vassoura-de-bruxa-comentario-
de-faustao-sobre-dancarin_a_21668419/. Acesso em: 26 jun. 2018.
5
Cabe mencionar, segundo Castro (2017, p. 27) que “[o] meme, isto é, essa informação
rapidamente veiculada, não é exclusivo do ambiente virtual, não surgiu com a internet. Isso
significa dizer que o meme, em si, não é exclusivo do ciberespaço. Em momentos diferentes da
história, com seus respectivos meios de comunicação, uma informação, poderia se propagar de
maneira mais intensa ou não. Retomando o raciocínio de Dawkins (2006), um meme pode
constituir, por exemplo, bordões, ideias, modas de roupas, entre outros”.
6
Para Hall (2006, p. 13) “a identidade cultural é um conjunto vivo de relações sociais e patrimônios
simbólicos historicamente compartilhados que estabelece a comunhão de determinados valores
entre os membros de uma sociedade”.
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pertencentes a um grupo social bastante discriminado nas redes social
atualmente.
Em relação, a metafunção interativa, observa-se uma relação entre a
participante e o observador/leitor. Pode ser avaliada do ponto de vista do olhar, da
distância social, da perspectiva ou da modalidade. No caso desse meme, temos
um olhar de determinação e de luta por direitos, em que a participante olha
diretamente para o leitor-observador, de modo a se reafirmar sua identidade
cultural e étnica como mulher negra e profissional da dança que precisa ser
respeitada independente de cor.
De um lado, a análise composicional das informações que nos são dadas
pela imagem de Arielle à esquerda com um olhar firme e disposta a resistir aos
discursos hegemônicos da indústria cultural, das mídias nacionais que constroem
estereótipos de beleza homogeneizantes, de outro, temos na margem superior à
direita o discurso institucionalizado e naturalizado “Arielle do cabelo de vassoura
de bruxa” reproduzida por um agente conhecido da mídia brasileira.
Enfim, na margem inferior do meme, salta-se aos olhos, o discurso de
(re)afirmação da identidade cultural da dançarina: “Esta é Arielle, negra, mulher e
dançarina, reforçando a materialidade da luta da mulher negra em um contexto
de relações de poder desiguais à medida que vai se naturalizando
discursivamente nas práticas sociais o racismo cordial no Brasil. Em resumo, esse
meme analisado se tornou nas redes sociais uma crítica social, política e cultural,
com base em um fato lamentável veiculado por um apresentador brasileiro,
portanto, esse meme materializa mais do que apenas um protesto virtual, é um
posicionamento de luta e resistência em meio a esse contexto tão acirrado nas
relações étnicorraciais na contemporaneidade.
Discurso de autoestima e afirmação
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Figura 02
a
. Memes diversos.
Fonte: reprodução/Facebook, 2018.
Figura 02
a
. Memes diversos.
Fonte: reprodução/Facebook, 2018. Fonte: reprodução/Facebook, 2018.
Esse memes caracterizam discursivamente a necessidade da busca pela
autoestima “Cabelos cacheados não trabalho/Dá autoestima e afirmação da
identidade Solte seus cabelos/prenda o racismo” e da luta da mulher negra Me
sinto culpada as vezes... por oprimir os brancos no contexto brasileiro em
razão das inúmeras violências simbólicas e preconceitos arraigados na cultura
dominante branca que impõe a esse grupo social os valores e os estereótipos de
beleza hegemonicamente veiculados pelo discurso do capital que impera as
mídias sociais e as empresas na sociedade global.
Todos esses memes digitais transmitem e imbricam-se multimodalmente
por seus significados representacionais, interativos e composicionais,
colocando à mulher negra em destaque por sua beleza própria, sobretudo,
deixando os cabelos da forma que representa sua identidade étnica e
culturalmente individual. O propósito aqui foi de interagir com o interlocutor a fim
de enaltecer a cultura negra no enfrentamento social dos preconceitos sociais e
étnicorraciais na sociedade contemporânea.
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Na Análise de Discurso Crítica, desenvolvida inicialmente por Fairclough
(2003) e Chouliaraki e Fairclough (1999), temos uma abordagem científica
interdisciplinar para estudos críticos da linguagem como prática social, com foco
na explanação de problemas sociais parcialmente sustentados por relações de
causa-efeito do discurso no mundo, e vice-versa (PAIVA, 2017). Retomando às
questões conceituais neste estudo, reforçamos com base em Lima e Castro
(2016) que o gênero meme digital é um:
[...] artefato (ciber)cultural, não é estrutura cristalizada. São formas
de ação social de caráter dinâmico, de estilo e de conteúdos
demarcados (MARCUSCHI, 2010, 2011). Deve-se, portanto,
atentar-se para o funcionamento linguístico imerso nas atividades
culturais específicas, porque constituem fatores de
circunstancialização, como os textos se realizam em espaços
distintos, e sob que influências. O meme, gênero emergente das
novas tecnologias digitais (MARCUSCHI; XAVIER 2010), tem seu
ambiente específico, como já dito, que propicia sua criação e
rápida disseminação e, além disso, é preciso considerar seus
aspectos composicionais, uma vez que o ciberespaço lhe confere
caráter multimodal (LIMA; CASTRO, 2016, p. 42).
Para tanto, pode-se observar que todos os memes digitais do nosso
corpus têm em seu contexto um discurso de afirmação contra à discriminação
racial e social sofrida construída a partir de um passado histórico opressor.
Consequentemente, ao retomá-los, recontextualizá-los e reconfigurá-los em
ambientes digitais os usuários reproduzem o discurso de (des)legitimar o que é
dito como resistência negra contra o preconceito atribuído na forma de combatê-lo
por meio desses discursos. Ao interpretarmos essas práticas sociais,
conseguimos evidenciar e possibilitar uma possível compreensão multimodal do
assunto que se possa vir a abordar, bem como das formas de comunicação
intermediadas por recursos semióticos múltiplos, e como esses recursos atuam
para erigir signos em contextos sociais efetivos (KRESS; VAN LEEUWEN, 2001).
Paiva e Fernandes (2012, p. 160-161), em uma leitura crítica à luz das
teorias bakhtinianas (2010, p. 71), entende que o “discurso é um fenômeno social
em todas as esferas de sua existência”, e traz para dentro de sua estrutura
sintática e semântica outras vozes, outros discursos, igualmente situados social e
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ideologicamente e que, além disso, ao serem citados, o perdem, de todo, sua
forma e conteúdo (PAIVA, 2018). Por isso, concordamos com a visão
faircloughiana de que
O discurso como prática política estabelece, mantém e
transforma as relações de poder e as entidades coletivas
(classes, blocos, comunidades, grupos) entre as relações de
poder. O discurso como ideológica constitui, naturaliza,
mantém e transforma os significados do mundo de posições
diversas nas relações de poder (FAIRCLOUGH, 2001, p. 94).
Sob essa perspectiva, a relação de poder, segundo Fairclough (2001) é
um movimento de discurso para as práticas sociais, percebemos que os memes
digitais deste estudo apresentam um discurso de momento, um diálogo exposto a
ponderações ideológicas e surgido a partir de críticas preconceituosas. Nesse
sentido, do ponto de intersecção entre as práticas sociais e os textos, as práticas
discursivas não são apenas um lugar de construção de ideologias, mas, de
maneira especial, de sua (des)construção, um espaço potencial de transformação
das relações de dominação e de poder instituídos (PEIXOTO, 2014).
Por fim, podemos ressaltar que o discurso não apenas representa o
mundo, a partir de visões relativamente estáveis de aspectos da realidade,
entretanto o significa (FAIRCLOUGH, 2001), por meio da produção de sentidos
gerada na dinâmica discursiva, o estudo desses memes digitais precisam lançar
mão de uma perspectiva linguístico-discursiva acerca dos significados da
ngua(gem), para abranger também a composição multimodal e a inscrição
discursiva do evento na vida social e política desses sujeitos.
Com isso, destacamos os memes que se consolidam nessa formação
discursiva e cultural do mundo tecnologizado (BUZATO, 2016), ocasionados por
fatos históricos e emblemáticos no Brasil que tem legitimado a necessidade por
lutas e resistências constantes do povo negro, como pode ser observado nos
memes por meio da desnaturalização do preconceito racial:
Resistência e Empoderamento
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Figura 03
a
. Memes diversos.
Fonte: reprodução/Facebook, 2018. Fonte: reprodução/Facebook, 2018.
Figura 03
a
. Memes diversos.
Fonte: reprodução/Facebook, 2018. Fonte: reprodução/Facebook, 2018.
Observando às práticas discursivas em relação à resistência e ao
empoderamento se mantêm e se estruturam por relações entre os indivíduos e os
meios de comunicação sociais que são apresentados, a importância dos
discursos em torno da afirmação e resistência negra põe em evidência o processo
de luta e (des)construção de discriminação que expõe negras e negros no meio
social, criticados por estarem na sociedade o que leva esse processo de
afirmação provocar uma mudança social.
Nesses memes os significados representacionais, interativos e
composicionais da atuação-militante de mulheres negras famosas e
reconhecidas por uma determinada comunidade cultural e racial, os/as negros/as,
evidenciando a necessidade de todas as mulheres lutarem por seus direitos em
meio a uma sociedade dividida por crises institucionais e sociais em que as
relações de poder são moldadas geralmente pela ação, atitudes, valores e
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crenças de homens/mulheres brancos/as e ricos/as. Para tanto, as práticas de
linguagem nesses memes se materializam, neste momento, sobretudo pelo
recurso das ironias em contrapartida com uma expressão fácil, ora satirizando
quem as tenta atingir com preconceitos, ora de forma séria, repudiando os
discursos racistas contra elas com o uso de imagens de mulheres que possuíam
grande representação social nessa luta no plano da realidade atual.
Nesse sentido, além do racismo, os negros e negras passam pela
discriminação do colorismo
7
ou a pigmentocracia
8
causada pela cor da pele. Essa
discriminação impede o acesso desses indivíduos em alguns lugares da
sociedade, por aspectos fenótipos como cabelo crespo, nariz arredondado ou
largo, dentre outros aspectos físicos materializados por intermédio dos vários
significados dos memes digitais analisados, para isso, Recuero (2009, p. 130) nos
explica que a “[a] presença de memes é relacionada ao capital social, na medida
em que a motivação dos usuários para espalhá-las é, direta ou indiretamente,
associada a um valor de grupo”. Adiante, trazemos a análise visual crítica dos
memes que representam a seguinte temática:
Não ao racismo
Figura 04. Memes diversos.
Fonte: reprodução/Facebook, 2018. Fonte: reprodução/Facebook, 2018.
7
Para mais informações sobre Colorismo. Disponível em: <https://www.geledes.org.br/colorismo-
o-que-e-como funciona/?gclid=CLaypbzz79QCFRAJkQodUdILLw>. Acesso em: 27 jun. 2018.
8
O colorismo ou pigmentocracia é a discriminação pela cor da pele e é muito comum em países
que sofrem a colonização europeia e em países pós-escravocratas. De uma maneira simplificada,
o termo quer dizer que, quanto mais pigmentada uma pessoa, mais exclusão e discriminação essa
pessoa irá sofrer.
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Analisando esses memes, consideramos que “[a] ADC vai se ocupar dos
efeitos do discurso na sociedade, como por exemplo, a instalação do poder,
manutenção e perpetuação do poder (SATO; BATISTA JR, 2018, p. 186). Por
isso, ressaltamos que as escolhas lexicais presentes memes realçam
conhecimentos compartilhados, pressupostos, modos de agir e ser no mundo, isto
é, em forma imperativa os discursos são entrelaçados por uma rede discursiva de
luta contra o racismo, enaltecendo questões identitárias de forma imperativa: “Não
me chame de moreno, sou negro”, outro exemplo com o uso de vocativo: Cara
gente brancaou de alerta: Se toca meu bem” todos integrados semioticamente
às estruturas visuais multimodais respectivas.
Em geral, os significados representacionais, interativos e
composicionais se manifestam pela interlocução entre a ação de verbo-
visualizar textos verbais que causam impacto aos interactantes nas redes sociais
a terem consciência e posicionarem contra o preconceito racial aos negros/as.
Logo, a postura corporal no segundo meme reforça o valor informacional dado
pela linguagem visual, emanada da luta e da resistência da comunidade negra no
Brasil.
Dessa forma, compreendemos que na perspectiva da ADC, a ideologia é
uma dimensão analítica do estudo do discurso como prática social, ao lado da
hegemonia, mesmo que Fairclough (2001) entenda que a ideologia constrói-se e
materializa-se nas práticas discursivas, ela é concebida como categoria da prática
social, porque sua investigação tem o objetivo geral de especificar a “natureza da
prática social da qual a prática discursiva é uma parte, constituindo a base para
explicar por que a prática discursiva é como é, e os seus efeitos sobre a prática
social” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 289).
Enfim, concordamos ainda com Fairclough (1989, p. 85), quando ele
afirma que a ideologia é mais efetiva quando sua ação é menos aparente, então,
o direcionamento da ADC está sendo fornecer enquadres científicos para apontar
e desvelar sentidos ideológicos naturalizados ou legitimados, considerando a
possibilidade da superação de relações desiguais de poder e emancipação
daqueles/as que se situam em desvantagem social (RAMALHO, 2010).
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Cabe mencionar que a linguagem online oferece na seara da internet,
segundo Barton e Lee (2015, p. 34) espaços de reflexão sobre a própria
linguagem e comunicação, nesse sentido essas novas formas de participação e
diálogo podem contribuir na construção de uma “consciência da linguagem”, em
outras palavras, esses autores enfatizam que:
[c]ompreender como funciona a linguagem online também é
importante no sentido de os linguistas poderem contribuir para
discussões públicas sobre a importância das novas dias,
oferecendo alternativas as teorias deficientes, desafiando pânicos
morais sobre a língua e indo além do determinismo tecnológico.
Isso pode ajudar as pessoas a desenvolver uma consciência
crítica de como usar espaços online de modo eficaz (BARTON;
LEE, 2015, p. 34).
A compreensão desse contexto de interação comunicativa traz
contribuições na reflexividade linguística
9
como mediador do discurso digital. Não
resta dúvida que nesses espaços “[...] os sujeitos são posicionados
ideologicamente, mas são também capazes de agir criativamente no sentido de
realizar suas próprias conexões entre as diversas práticas e ideologias a que são
expostos e de reestruturar as práticas e as estruturas posicionadoras”
(FAIRCLOUGH, 2001, p. 121).
Seguindo essa análise, se deve observar o contexto em que o discurso
está inserido, para que se possa compreender e fazermos nossos
posicionamentos seja a favor, contra ou posiciona-se diferente dos discursos que
foram apresentados.
Vejamos, a seguir, o quadro com a categorização multimodal dos memes
digitais por eixo temático, analisados à luz da multimodalidade e da ADC
faircloughiana:
9
De acordo com Barton e Lee (2015, p. 162) a reflexividade é uma propriedade fundamental da
linguagem humana. Os usuários da língua são capazes de usá-la para refletir sobre ela e seu uso
na vida cotidiana”. Ou seja, [...] As novas mídias também proporcionam novas oportunidades e
espaços para que os atores sociais reflitam sobre questões linguísticas, especialmente na forma
escrita”.
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Quadro 1 - Categorização da análise multimodal/visual dos memes digitais
Objetivo
Conteúdo
Proposicional
Forma
Função Social
Categorização
temática dos
memes digitais
- Interagir com
os participantes
(representados
e interativos) no
contexto digital
- Registrar lutas,
histórias sociais
e culturais,
contextos atuais
- Multimodal
(incorporação
de diferentes
modos
semióticos)
- Mostrar
ideologias
sociais
incorporadas
- Preconceitos/
Racismo
- Memes e
resistência;
- Discurso de
autoestima e
afirmação;
- Resistência e
empoderamento; e -
Não ao racismo.
Fonte: Elaboração própria, com base nos teóricos citados e na análise multimodal dos memes.
A partir do quadro acima, ficou comprovado que os discursos de resistência
de negros(as) presentes nos memes analisados apresentam um tom de ironia,
humor, luta em seu contexto, tornando evidente que nessa abordagem a
transmissão dos memes está sujeita à mutação contínua e também à mistura
(DAWKINS, 1979), seja de valores e sentimentos dados pelos indivíduos que
repassam discursos e desejam se expressar na forma direta ou por metáforas, o
que enfatiza a afirmação de um discurso sobre o outro.
Os diferentes tipos de apresentação de discurso sejam escritos, falados ou
imagéticos nas mídias digitais propõe uma abordagem da análise de discurso na
desconstrução estereotipada aqui relacionada à imagem de negras e negros. As
imagens e textos expostos completam-se, “prática e resistência ancoradas no
lugar de enunciação do eu corpo = espaço simbólico de resistência” (FONTANA,
2016, p. 11). Assim, é proporcionado um espaço de manifestações com esses
elementos de interpretação do indivíduo oprimido em um processo individual o
qual toma proporções coletivas, isso acontece quando se expressa no discurso
digital, pois são muitas as formas de expressar e construir identidades em redes
sociais.
2. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho, analisamos à resistência negra em memes encontrados no
Facebook, que trazem em seu contexto uma forma de compreensão multimodal
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em torno das manifestações, lutas e resistências efetivadas em práticas de
letramento nas mídias sociais, consubstanciadas pelo discurso digital
materializado em forma de memes. Acreditamos que a prática discursiva desses
sujeitos nas mídias digitais, impulsionou-se pela necessidade de expressar a
resistência negra, produzida no meio social como qualquer outra situação que
causou incômodo coletivo, fazendo-os reagirem com a apropriação e uso destas
imagens na (des)construção de discursos.
Sendo assim, as pessoas fazem escolhas sobre o modelo e a estrutura de
suas expressões lexicais que são também escolhas sobre o significado (e a
construção, manutenção ou subversão) de identidades sociais, relações sociais e
conhecimento e crença (FAIRCLOUGH, 2001; RESENDE; RAMALHO, 2004,
p.189). Essa análise proporcionou compreender o comportamento linguístico
desses sujeitos e sua forma de representar seus discursos contra a discriminação
racial e social e a partir da análise de discurso crítica, buscamos entender a
linguagem nas mídias digitais desenvolvida como prática social/discursiva na
contribuição de questões ligadas à discriminação, às lutas e às resistências por
direitos e expressão de pensamento, entre outros.
A análise verbo-visual empreendida, nos proporcionou entender que tanto
os corpos das mulheres negras representam, de fato, o espaço simbólico de
resistência ao preconceito racial quanto a integração multimodal dos textos verbo-
visuais promovem a construção discursiva e a materialidade discursiva na
configuração de ideologias, valores e crenças, emanadas pelos memes,
evidenciando, pois, às práticas de resistências, ancoradas no lugar da enunciação
do eu (FONTANA, 2016), o que possibilitou o uso da linguagem virtual como
prática discursiva capaz de refletir as lutas e as relações de poder recorrentes na
contemporaneidade.
Ao encontro a essa constatação, concordamos que “qualquer pessoa com
conhecimentos rudimentares de edição de imagem digital pode, potencialmente,
se apropriar de uma ideia, modificá-la e compartilhá-la” (MARTINO, 2015, p. 178),
características da produção desses gêneros, por isso, é necessário que os
usuários da língua tenham consciência crítica do que se está compartilhando e/ou
viralizando nas redes sociais.
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Os memes existiam mesmo antes do virtual, no entanto, foi no meio
digital que eles ganharam destaque devido a rápida veiculação desses textos,
consequência de sua plasticidade (CASTRO, 2017). Em outras palavras, os
memes, além de serem compartilhados por meio de redes variadas, podem ser
criados, modificados, recategorizados, resultando em diferentes construções em
estrutura, conteúdo e propósitos, por isso, os aspectos do discurso multimodal
estão em demasia integrados à constituição semiótico-visual dos memes
veiculados na atualidade.
Em suma, a análise dos significados representacionais, interativos e
composicionais da constituição dos memes nesta pesquisa, nos forneceu
condições teórico-metodológicas de descrever e analisar a materialidade
discursiva das estruturas visuais e verbais concernentes à composição de cada
meme, que traz a sua constituição semiótico-visual outros propósitos, além do
sentido humorístico, o crítico, sendo crucial, não somente a articulação dos signos
semióticos e linguísticos para este entendimento, mas também a exploração dos
significados que emergiram dos textos verbais e/ou imagéticos e do caráter
denunciador contra os preconceitos e o racismo institucionalizado e naturalizado
nos discursos de muitos sujeitos e/ou interactantes das redes sociais.
Pois, parafraseando Rubens Alves, conhecimento que não decifra a vida e
não ilumina o mundo não é conhecimento. É enganação. Assim sendo, é
importante para combater a desigualdade, a discriminação e para compreender
verdadeiramente a história e a cultura brasileiras. Reverberando Silva e Souza-
Dias (2017; 2018), pretendemos, assim, acumular forças para a formação de uma
sociedade justa, igualitária e fraterna, livre de toda forma de preconceito,
discriminação e opressão, independentemente da cultura, religião, raça e etnia,
gênero e orientação sexual.
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