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A INVISIBILIDADE NA REPRESENTAÇÃO DE HOMENS TRANS: UMA
ANÁLISE DAS CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS DAS MARCAS DE CUECA
DRESSMANN E MASH
1
The invisibility in the representation of trans men: an analysis of the advertising
campaigns of the underwear brands Dressmann and Mash
FABIANO ELOY ATÍLIO BATISTA
2
JULIO MOTA DE OLIVEIRA
3
RESUMO: O artigo tem por objetivo
pensar, analisar e compreender as
construções dos corpos masculinos na
contemporaneidade, mais propriamente
as construções corporais dos homens
trans. Buscamos, assim, indagar e
problematizar, a partir de uma análise
discursiva, sobre a invisibilidade desses
corpos na trama social. Em termos
metodológicos, o artigo assumiu um
delineamento “qualitativo”, do tipo
“descritivo”. A coleta dos dados se deu
mediante o método “documental”, se
caracterizando nesta pesquisa enquanto
duas campanhas publicitarias de marcas
de cuecas: a primeira Mash, veiculada no
ano de 2018, e a segunda Dressmann,
veiculada ano de 2015. As análises se
deram através de uma inspiração na
perspectiva da análise de conteúdo, que
nos permitiu inferir conhecimentos
relativos à produção e recepção das
imagens. Enquanto resultados principais,
podem-se destacar a invisibilidade de
homens trans nas campanhas
publicitárias analisadas, que propunham
a valorização da diversidade masculina,
bem como a invisibilidade desses corpos
em sociedade.
ABSTRACT: The purpose of this article is
to think, analyze and understand the
constructions of male bodies in the
contemporary world, rather the trans
bodied corporeal constructions. We seek,
therefore, to inquire and to problematize,
from a discursive analysis, on the
invisibility of these bodies in the social
fabric. In methodological terms, the article
assumed a "qualitative" design, of the
"descriptive" type. The data collection was
done using the "documentary" method,
being characterized in this research as
two publicity campaigns of brands of
briefs: the first Mash, published in the
year 2018 and the second Dressmann,
published in the year 2015. The analyzes
were done through of an inspiration from
the perspective of content analysis, which
allowed us to infer knowledge regarding
the production and reception of images.
As main results, it is possible to
emphasize the invisibility of trans men in
the advertising campaigns analyzed,
which proposed the valorization of
masculine diversity, as well as the
invisibility of these bodies in society.
1
Este artigo é fruto da disciplina Linguagem, Masculinidade e Interseções’ produzido no âmbito
da Especialização em Gênero e Sexualidade: perspectivas interdisciplinares, da Faculdade de
Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora, ministrada pelo professor Dr. Alexandre
Cadilhe.
2
Mestre em Economia Doméstica pela Universidade Federal de Viçosa (PPGED); Especialista em
Televisão Cinema e Mídias Digitais (UFJF); Especialista em Moda, Cultura de Moda e Arte (UFJF).
fabiano_jfmg@hotmail.com
3
Homem Trans. Bacharel em Direito pelo Instituto Vianna Júnior. Atualmente, cursando a
especialização em Gênero e Sexualidade: perspectivas interdisciplinares, na Faculdade de
Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). juliamota@outlook.com.br
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PALAVRAS-CHAVES: Gênero.
Masculinidade. Homens Trans.
KEYWORDS: Genre. Masculinity. Men
Trans.
BATISTA, F. E. A.; OLIVEIRA, J. M. de. A invisibilidade na representação de
homens trans: uma análise das campanhas publicitárias das marcas de cueca
Dressmann e Mash. In.: Revista Diálogos, v. 7, n. 3, out.-dez., 2019.
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INTRODUÇÃO
[...] a invenção do humano é entrecortada por relações de poder,
constituem efeitos dos micropoderes onde determinadas
expressões de singularidades se produzem numa dimensão de
abjeção, de não reconhecimento, de injúria verbal, de violência
física, moral, sexual, entre outras. Entre essas formas de ser e
estar “em mundos” encontram-se as experiências trans cortadas,
muitas vezes, por violências cotidianas seja em sua dimensão
simbólica e/ou concreta. (LIMA, 2014, p. 38-39).
Como mencionado por Fátima Lima (2014), na citação supracitada, o
mundo que vivemos/passamos/vivenciamos já está subjetivado por outros sujeitos
que nos antecederam e que preestabeleceram valores, normas e regras a serem
seguidas e assimiladas como “verdades absolutas. Todos os sujeitos que fogem
destas “verdades” são “disciplinarizados”, “penalizados”, “culpabilizados” e
sofreram consequências das mais variadas, de acordo com o seu contexto sócio
histórico cultural (FOUCAULT, 1987, 1997, 1998). Assim, compreender os
discursos cotidianos que subjetivam os corpos Trans se faz necessário para uma
ampliação dos olhares sobre estes sujeitos, que são historicamente
“estigmatizados” (GOFFMAN, 1978).
Nesse sentido, o presente artigo busca analisar e compreender a
construção do gênero a partir dos discursos sobre o corpo masculino, para tanto,
optou-se, mais precisamente, em analisar as campanhas publicitárias de cuecas
masculinas das marcas Dresmann, veiculada no ano de 2015 e da Mash,
veiculada no ano de 2018. Onde, buscamos, por meio das imagens e dos
discursos, identificar, analisar e compreender a relevância destas campanhas e
como as mesmas, ainda, constroem questões que orientam as construções das
masculinidades contemporâneas, e que não compreendem/comtemplam outras
formas de masculinidades como as Transmasculinidades.
Entenderemos, neste artigo, as pessoas trans, de forma geral - masculinos
ou femininos - como pessoas que não se identificam, de maneiras e formas
diferentes, com os comportamentos e/ou papéis impostos e esperados dos
gêneros que lhes foram atribuídos ao nascerem. Mas especificamente, para este
artigo, entenderemos como Homens Trans, foco desta análise, os sujeitos
designados biologicamente como mulheres no nascimento, mas que se
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identificam, seja através da nominação, vestimenta e/ou transformações
corporais, como pertencentes ao gênero masculino (ÁVILA, GROSSI 2010).
Neste sentido, podemos compreender que, na atualidade, existem
masculinidades plurais e dinâmicas, segundo o sociólogo Stuart Hall (2001), tudo
é fluído, fragmentado, múltiplo e com diferentes facetas. Ou seja, não podemos
mais apresentar um único modelo a ser seguido, como visto no decorrer de várias
épocas. O papel sociocultural do ser homem vem se modificando e se
distanciando de valores de outrora, tais como o burguês, heterossexual, viril,
dominador, branco, provedor, e afins. No entanto, tal modelo ainda se apresenta
na dinâmica social.
Segundo Molinier e Welzer-Lang (2009), o homem é civilizado desde a
infância a ser dominador, viril, a ter sua sexualidade direcionada ao gênero
oposto, porque essa “[...] virilidade é a expressão coletiva e individualizada da
dominação masculina” (p.102). Por conseguinte, os homens que não se adequam
às atitudes viris e apresentam características que os aproximam do modelo
imposto ao gênero feminino, sofrem diversos tipos de discriminação, sendo o
oposto aplicado ao gênero feminino.
Esta polarização entre o feminino e o masculino é sociocultural e
caracterizada como “uma forma de controle social que se exerce sobre todos os
homens [e também sobre todas as mulheres], desde os primeiros passos da
educação” (MOLINIER e WELZER-LANG, 2009, p. 102).
Em suas análises, corroborando com os pensamentos de Stuart Hall,
Patrícia Sant’anna (2005, p.91) aponta que, “[...] é praticamente impossível se
pensar em um modelo de masculino, pois, esta síntese não para ser
resgatada, que o sentido totalizador do mundo é algo superado [...]”. Na
contemporaneidade, “[...] vive (e reivindica) uma existência do plural, do indivíduo
múltiplo vagando e manipulando uma teia de identidades (idem)”.
Portanto, presenciamos na atualidade um momento em que o masculino,
assim como o feminino, é vivenciado de maneira plural. Contudo, ao se tratar
sobre Transmasculinidades, ainda se observa um apagamento e uma
invisibilidade desses atores sociais. Assim, Simone Ávila e Miriam Pillar Grossi
(2010), ponderam que:
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[...] são praticamente inexistentes no Brasil, estudos sobre
transmasculinidade e que os transexuais masculinos, parecem ter
menos visibilidade que as transexuais femininas, tendo em vista a
ampla variedade de estudos sobre travestilidades femininas como
os de Marcos Benedetti (2005), Don Kulick (1996, 1997, 1998),
Roger Lancaster (1998) e Fernanda de Albuquerque e Maurizio
Janelli (1995), e transexualidade feminina, como o estudo de
Berenice Bento (2006) em comparação com a quase inexistência
de similares sobre transexualidade masculina (ÁVILA; GROSSI,
2010, P. 1).
Assim, este artigo busca, mesmo que inicialmente, analisar, compreender e
problematizar a compreensão sobre as masculinidades, em especial as
Transmasculinidades, a partir da publicidade, procurando identificar os fatores
que ocasionam a invisibilidade desses sujeitos.
Ao abordamos acerca das questões inerente as transexualidades, se faz
pertinente refletir, inicialmente, sobre o que é ser homem e ser mulher em nossa
sociedade
4
que, em grande parte, é baseada pelo binarismo dos corpos. Ou seja,
onde somos ensinados desde pequenos que o “normal”, “natural” e socialmente
aceitável diz respeito a uma conduta baseada na heteronormatividade, em grande
parte branca e de classe média, tendo como parâmetro os papéis sociais de
gênero atribuídos no nascimento, como por exemplo, vagina =
menina/mulher/fêmea e pênis = menino/homem/macho, compreendendo uma
homogeneidade entre as categorias de sexo-gênero-sexualidade.
Nesse sentido, observamos que estamos imersos em práticas sociais que
estabelecem importantes mecanismos na criação de “regimes de verdades”
(FOUCAULT, 1997), na afirmação e/ou reafirmação de discursos e práticas
ideológicas que legitimam certos modelos sociais, corporais e de vida em
detrimento a outros.
Sobre esses “regimes de verdades”, como mencionado por Foucault
(1997), Tereza de Lauretis (1987), em seu texto Tecnologia de Gênero, enfatiza
diversos mecanismos que são utilizados para instituir socialmente certos
4
Deste modo, faz jus a celebre frase de Beauvoir (1980) que inaugura o segundo livro de sua
famosa obra intitulada O segundo sexo: Não se nasce mulher, torna-se mulher”, analogamente,
não se nasce homem, torna-se.
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processos de sociabilidade como verdades absolutas, sejam esses instituídos
pela família, igreja, escola, grupo de amigos, mídia, e afins, pois de acordo com a
autora as “tecnologias de gênero” são consideradas uma série de mecanismos
sociais, institucionais, blicos ou privados que buscam, por diferentes formas, o
“[...] poder de controlar o campo da significação social e produzir, promover e
‘implantar’ representações de gênero” (LAURETIS, 1987, p.18).
Assim, de acordo com Lauretis (1987) os corpos, antes mesmo do
nascimento, estão carregados de significações, valores e discursos sociais que
lhes fornecem, por finalidade, diferenciações, hierarquizações, submissões,
violações, dentre outras infinidades de práticas.
Nesse aspecto, possuímos uma polarização dos gêneros instituída
socialmente, embora essa perspectiva, mesmo que ainda lentamente, esteja
sendo reconfigurada, temos de um lado o masculino, ligado às questões de
poder, virilidade, provedor, trabalhador, agressividade, dentre outros; e do outro,
temos o feminino, ligado às questões do cuidado com o lar, família, filhos, um
corpo dócil, dentre outros (LAURETIS, 1987).
Destaca-se ainda que, até mesmo os intersexos (conhecidos como
hermafroditas, embora este termo não seja mais utilizado), também são
condicionados a essa lógica binária, sendo crivada em seus corpos a adequação
a um desses papéis, mesmo que isso não exprima a vontade desses sujeitos.
Essa dicotomia entre os gêneros masculino e feminino é fixada aos poucos
por meio de práticas sociais de domesticação sobre todos os corpos, até mesmo
antes do nascimento, sob um viés de normas e modelos instituídos como
padrões. Esses corpos, nessa lógica, tornam-se superfícies discursivas fruto do
próprio discurso instaurado como verdade, na ordem do natural (LAURETIS,
1987).
Contudo, cada categoria (sexo, gênero e sexualidade) diz respeito a uma
definição particular, e que não se refere a uma homogeneidade, conforme iremos
brevemente explicitar e catalogar para compreensão deste artigo.
Por sexo compreendemos, de acordo com Jaqueline de Jesus (2012, p.
25), como uma “Classificação biológica das pessoas como machos ou fêmeas [ou
intersexuais, conhecidas como hermafroditas como enfatizado], baseada em
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características orgânicas como cromossomos, níveis hormonais, órgãos
reprodutivos e genitais”.
No que diz respeito a gênero, Joan Scott (1995) afirma que,
[...] refere-se a construção de atitudes expectativas e
comportamentos, tendo por base o que determinada sociedade
define como seus valores. Aprendemos a ser homens e mulheres
pela ação da família, da escola de grupos de amigos, das
instituições religiosas, do espaço de trabalho, dos meios de
comunicação [...]. Gênero diz respeito também ao modo como
lidamos ao longo da história e de forma diversa em diferentes
culturas, com o poder nas relações interpessoais, hierarquizando
e valorizando o masculino em detrimento do feminino (SCOTT,
1995, p.74).
O gênero, em suma, diz respeito a como a pessoa sê vê socialmente
e ao papel que ela assume/exerce na sociedade, como por exemplo homem ou
mulher cisgênero, homem ou mulher transgênero, neutro, e afins. Para Meyer
(2011, p.195), “o gênero, enquanto organizador da cultura, e em articulação com
sexualidade, modula o modo heteronormativo de como homens e mulheres
devem se comportar, como seus corpos podem se apresentar e como as
relações interpessoais podem se constituir, nesses domínios”.
Em relação à sexualidade, compreendemos como um aspecto “[...] da
ordem do indivíduo. Diz respeito aos prazeres e às fantasias [...]” (TONELI, 2012,
p.152). A sexualidade refere-se ao modo como o indivíduo exerce e para quem
ele orienta seus desejos, podendo ser compreendida, por exemplo, como
heterossexual, homossexual, bissexual, pansexual, entre outras formas de
expressar os sentimentos afetivo-sexuais.
Assim, após uma breve explanação sobre as questões inerente ao sexo, ao
gênero e à sexualidade, observa-se que variando de cultura para cultura e de
acordo com cada tempo sócio-histórico, a existência de uma série de
condutas, normas e comportamentos esperados em relação a cada sujeito no que
diz respeito aos seus papéis sociais de gênero, posto em nossa cultura como algo
do “natural” e do biológico. Segundo Dagmar Meyer (2011):
Vivemos nossas vidas e não nos apercebemos de como este
cotidiano está pautado, regulado e normatizado por
compreensões generificadas, apreendidas na cultura e assumidas
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como certas e verdadeiras. Estas concepções generificadas,
culturalmente legitimadas e naturalizadas, pautam o sistema
heteronormativo que produz comportamentos e corpos,
reconhecidos como “adaptados” pelos discursos psi, e como
“normais” pelos discursos biologicistas. (MEYER, 2011, p. 195)
Ao passo que, tudo que diverge dessas condutas, normas e
comportamentos esperados e tidos como “naturais” é considerado como
transgressor e “anormal”. Esses discursos e construções históricas do que seria a
“anormalidade” servem como pano de fundo para direcionar os sujeitos que não
se enquadram nos padrões impostos e crivados culturalmente para locais a
margem, numa condição de invisibilidade social e, em grande parte, de negação
de direitos.
1. MATERIAL E METODOLOGIA
O presente artigo busca trabalhar os dados procurando analisar e
compreender os seus significados, portanto, se caracteriza como descritivo de
natureza qualitativa”. Os dados foram coletados mediante o todo
documental, se caracterizando neste artigo como propagandas publicitárias
(TRIVIÑOS, 1987), pois,
Filmes, músicas, revistas e livros, imagens, propagandas são
também locais pedagógicos que estão, o tempo todo, a dizer de
nós, seja pelo que exibem ou pelo que ocultam. Dizem também de
nossos corpos e, por vezes, de forma tão sutil que nem mesmo
percebemos o quanto somos capturadas/os e produzidas/os pelo
que lá se diz (GOELLNER, 2010, p.29. grifos nossos).
Assim, foram selecionadas duas campanhas publicitárias de marcas de
cuecas masculinas: Dresmann (marca Norueguesa), veiculada no ano de 2015, e
da Mash (marca brasileira), veiculada no ano de 2018, realizada pelo fotografo
brasileiro Wendy sob a supervisão da diretora da marca Débora Matalon. Assim,
através dessas imagens, buscamos compreender os discursos inerentes à
construção da masculinidade, bem como o que se compreende enquanto
masculino. Buscamos, também, analisar a invisibilidade e o apagamento das
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Transmasculinidades na campanha publicitária, e, por conseguinte, em nossa
sociedade.
A seleção das campanhas se deu, dentre diversos fatores, por terem como
escopo principal de merchandising a valorização da diversidade corporal
masculina. Importante destacar que ambas as campanhas foram amplamente
divulgadas em sites e plataformas de relacionalmente como, por exemplo, o
Facebook e Instagram.
Para a análise dos dados foi utilizado como inspiração o método de Análise
de Conteúdo proposto por Laurence Bardin (1977, p.42) que se caracteriza como
"um conjunto de técnicas de análise das comunicações [...] que permitam a
inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas
mensagens".
Assim, buscamos analisar e compreender os elementos constitutivos
presentes nas campanhas publicitárias, procurando decodificar possíveis valores
concernentes a corporalidade e a identidade masculina.
2. ANÁLISES E DISCUSSÕES
Presenciamos significativas modificações no que diz respeito ao corpo. De
acordo com os estudos de David Le Breton (2006), em seu livro A sociologia do
corpo, e Marcel Mauss (1974), em seu ensaio sobre As técnicas corporais, o
corpo deve ser compreendido de acordo com a cultura, sendo ele fruto de um
contexto sócio-histórico específico.
Mauss (1974) pondera que toda nossa existência e tudo que estamos
contextualizados é fruto da cultura. Somos, nesta perspectiva, incessantemente
influenciados e influenciadores em nosso meio social através das relações entre
homem-homem, homem-sociedade, homem-natureza e diversas outras
combinações possíveis. Somos construídos, descontruídos e reconstruídos
mediante nossas interações e a partir do olhar do outro
5
.
5
“A presença do outro faz com que o corpo e a identidade se reconstrua, adquirindo um aspecto
diferencial no discurso. Assim, na sua máxima individualidade, o corpo reflete a identidade que
nasce das entrelinhas do discurso do semelhante, na apreensão de valores e significados
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Neste sentido, o autor ainda enfatiza que o corpo é o resultado de distintas
maneiras de sociabilidade, não se constituindo somente de noções biológicas,
mas também de construções sociais a partir de símbolos e signos, materiais ou
imateriais que estão imersos em nossa cultura. Deste modo, na perspectiva de
Maus (1974), uma série de condutas que a principio poderia ser natural são
produzidas e ensinadas de acordo com cada cultura, como por exemplo, a
maneira de sentar, de falar, de agir e de se portar.
Na perspectiva de Le Breton (2006), corroborando as ponderações de
Mauss (1974), o corpo não se trata apenas de um aglomerado de órgãos
dispostos segundo as normas biológicas, mas sim, como um conjunto de
símbolos, como algo que é mutável, variável de uma sociedade para outra e, por
conseguinte, expressa valores e tradições particulares de determinadas culturas.
Pois, no fundamento de qualquer prática social, como mediador privilegiado e
pivô da presença humana, o corpo está no cruzamento de todas as instâncias da
cultura, o ponto de atribuição por excelência do campo simbólico” (LE BRETON,
2003, p. 31).
Sendo este - o corpo - variável de cultura para cultura e de tempo em
tempo, cada sociedade operou/opera sobre ele de acordo com seus valores e
normas. Ao longo da história, o corpo foi palco de múltiplas maneiras de
sociabilidade, como por exemplo, de negação, de coerção, de manipulação, de
glorificação, entre outras cnicas. (BARBOSA, M; et. al, 2011). Seguindo este
pensamento, para Michel Foucault, (1987),
[...] o corpo está preso no interior de poderes muito apertados, que
lhe impõem limitações, proibições ou obrigações. [...] Forma-se
então uma política das coerções que são um trabalho sobre o
corpo, uma manipulação calculada de seus elementos, de seus
gestos, de seus comportamentos. O corpo humano entra numa
maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o
recompõe. (FOUCAULT, 1987, p.119).
Vivemos em tempos em que o culto ao corpo musculoso e bem definido
vem abrindo espaço para novas formas de corporalidade, embora este modelo
pertinentes ao grupo e que se organizam em seu ser, seu fazer e na sua estrutura, concepção e
construção corpórea” (CASTILHO, 2006, p.56).
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ainda seja imperioso, uma vez que a noção do “corpo perfeito” ainda se encontra
arraigada em nossa cultura que reafirma a todo instante que “ou se é um corpo
espetacular ou se é um João ou Maria Ninguém” (COSTA, 2004, p. 231).
Assim, a partir de significativos debates em relação as (de)construções dos
corpos hegemônicos, buscamos compreender como não se enquadrar em
determinados padrões impostos culturalmente pode gerar nos sujeitos uma série
de “estigmas” (GOFFMAN, 1978), em especial aos corpos trans sejam eles
masculinos ou femininos, ocasionando, por conseguinte, uma série de
sofrimentos, tais como, por exemplo,
[...] tentativas de suicídio, depressão, transtornos alimentares e
angústia das mais diversas formas o que é provocado não apenas
pelo conflito de não pertencimento ao sexo biológico como
também pelas inúmeras consequências sociais intrínsecas a esta
condição (ARAN; MURTA; ZAIDHAFT, 2008, p. 74).
Observa-se, então, que o corpo é um mecanismo que habilita ou não os
sujeitos em suas interações em sociedade, e a adequação a certos padrões
garante essa legitimidade. Ao passo que, oo enquadramento condiciona esses
corpos à margem da sociedade.
Cabe ressaltar que, em grande parte, os corpos à margem são silenciados
e negligenciados, sendo eles: corpos negros, gordos, velhos, com deformidades,
amputações, corpos periféricos, corpos LGBTI+, dentre diversas outras formas de
existências que tem seus direitos enquanto pessoa menosprezados (CARMO,
2016).
Nesse sentido, pensar sobre esses corpos é “[...] de extrema importância
exatamente porque trazem à tona o problema da violência, do preconceito e da
discriminação, que acontece por uma suposta “normalidade” e “superioridade”
entre grupos no interior da sociedade” (CARMO, 2016, p. 206).
Ao pensarmos os corpos trans, levantamos algumas questões que não
procuramos responder ao longo do artigo, mas que suscitam um debate
significativo no que diz respeito aos corpos trans em sociedade, tais como: Quais
são os espaços que as pessoas trans podem ocupar socialmente? Quando esses
sujeitos não têm suas vidas dizimadas pela intolerância e pelo preconceito, quais
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alternativas de existência lhes restam? Quais são os meios ou mecanismo de
sobrevivência que lhe são permitidos? Quais politicas públicas os auxiliam em
seu dia a dia em sociedade e lhes garantem suas cidadanias?
Assim, a partir de inúmeros discursos e estudos inerentes as
(des)construções corporais na contemporaneidade (CASTRO, 2007; BENTO,
2006; LE BRETON, 2006, 2003; SANT'ANNA,2001; BATISTA, 2018, entre
outros), observa-se que a publicidade e a propaganda vêm, mesmo que de modo
incipiente, tentando quebrar e transpor algumas barreiras no que se refere à
diversidade corporal.
A partir desses pensamentos, a marca de roupas íntimas masculina
norueguesa Dressmann e a brasileira Mash lançaram suas campanhas pautadas
nessa diversidade corporal com os slogans: #JustTheWayYouAre (apenas do jeito
que você é), e "Confortável é ser quem você é", respectivamente.
De acordo com as empresas, a ideia dessas campanhas é “agradar a todos
os tipos de homens, independente de como é o seu corpo”. Assim, inicialmente
podemos levantar algumas questões que nos deixam inquietados, tais como: O
que se entende por homem nessas campanhas? Todos os homens são, de fato,
representados nessas campanhas? Todos os homens se sentem, de fato,
agradados e acolhidos nestas representações? uma universalidade do ser
homem?
Ao longo das imagens produzidas pelas campanhas, (figura 01 e figura 02),
observamos a presença de diversos corpos masculinos, dos mais diferentes
biótipos, raças, tamanhos e afins.
Na figura 01, observam-se 7 homens dispostos um ao lado do outro, com
um fundo branco. Todos estão vestidos com roupas íntimas (cuecas boxer) da
marca Dressmann, exercendo “representações [...] [que] define o que é ser
homem” (ROSA, 2008, p. 438), conforme podemos observar na imagem a seguir.
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Figura 01 Campanha de cuecas da marca Dressmann
Fonte: Foto de divulgação/Facebook
Analisando a diversidade corporal, podemos observar a partir da esquerda
para direita, a presença de um primeiro homem que, aparenta ter uma idade entre
20 a 25 anos, com biótipo magro e alto, branco, cabelos ruivos (apesar da
imagem estar em P&B), o segundo homem é branco, de estatura mais baixa que
o primeiro, aparenta ter uma idade entre 50 a 60 anos, possui cabelos brancos e
uma longa barba também branca, confirmando assim um determinado sinal de
idade, seu porte físico é magro, porém com corpo definido.
O terceiro homem é o típico modelo de cueca, possui um corpo musculoso
e definido, aparentando ter aproximadamente 30 anos de idade, branco
(poderíamos inferir que eles estaria bronzeado se a imagem fosse colorida)
possui um cabelo e barba curtos na cor preta. Ele representa “[...] uma imagem
masculina, viril, adulta e sedutora” (BATISTA, 2017, p.134), sendo considerado,
por grande parte da sociedade, “[...] um corpo “perfeito”, jovem e musculoso [...] o
modelo “ideal” para se apresentar em determinados lugares [...](BATISTA, 2017,
p.137), amplamente valorizada em nossa cultura.
O quarto homem possui uma estatura padrão, branco, um corpo gordo e
aparenta possuir uma idade entre os 30 a 35 anos de idade, com pelos
espalhados por diversas partes do corpo. Enfatiza-se que ele é o único que se
encontra com os braços cruzados cobrindo seu tórax, onde poderíamos identificar
uma protuberância mamária (talvez tenha coberto, pois se aproxima de signos
corpóreos concebidos enquanto femininos), possui cabelos e barba curta.
O quinto homem, também branco e com padrões bem semelhantes ao
terceiro (modelo), embora apresente uma barriga proeminente, não se diferencia
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muito de padrões hegemônicos corporais que, de acordo com as análises
realizadas por Batista (2018, p.01), é pautado “num corpo saudável, magro, jovem
e livre de quaisquer sinais do processo de envelhecimento”. Ele se encontra de
cabelos penteados para trás e uma barba feita, aparenta ter uma idade entre 28 a
31 anos. O sexto homem, possui um biótipo magro e branco, assim como o
primeiro, com cabelos e barba curto, aparente ter uns 21 anos de idade.
E, por fim, o sétimo homem, negro, com barriga proeminente, careca e com
uma barba por fazer, aparente ter entre 40 a 48 anos de idade. Destaca-se que
ele é o único corpo negro entre os sete modelos.
Na figura 02, observa-se 11 homens, sendo 7 dispostos um ao lado do
outro e 4 homens sentados/ajoelhados no chão (uma típica cena de foto de time
de futebol). Assim como na primeira foto, todos estão vestidos com as roupas
íntimas (cuecas boxer) da marca Mash.
Figura 02 Campanha de cuecas da marca Mash
Fonte: Foto de divulgação/Facebook
Analisando a diversidade corporal dos homens presentes na foto 02, em
pé, da esquerda para direita, podemos observar a presença do primeiro homem
que possui uma estatura padrão, branco, tatuado, gordo, com pelos espalhados
por diversas partes do corpo, inclusive na barba, com cabelos raspados e
aparentando ter entre 25 e 30 anos. O segundo homem possui uma estatura
maior do que a média dos demais, negro, magro, tatuado, com poucos pelos pelo
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corpo, com cabelos de dread, na altura das orelhas e aparentando ter entre 25 e
30 anos.
O terceiro homem possui uma estatura padrão, asiático, tatuado, com
músculos torneados, barbado e aparenta ter de 20 a 25 anos. O quarto homem é
o ator Bruno Gagliasso de 36 anos, conhecido não por sua atuação, mas
também por ser considerado um homem bonito ao se enquadrar num padrão de
beleza ideal, possui estatura média, branco, magro, cabelos médios, bigode,
pelos e tatuagens pelo corpo.
O quinto homem possui estatura padrão, branco, magro, cabelos
raspados, com poucos pelos pelo corpo com exceção de um cavanhaque e
aparenta ter de 20 a 25 anos. O quinto homem possui uma estatura maior do que
a média dos demais, branco, magro, cabelos médios, pelos por diversas partes do
corpo, inclusive barba e aparenta ter entre 20 e 25 anos de idade. O sexto homem
também possui uma estatura maior do que a dia, branco, cabelos longos,
barriga protuberante, sem pelos pelo corpo e aparentar ter entre 55 e 60 anos,
apresenta alguns sinais do processo de envelhecimento, tais como: cabelos
brancos, pele enrugada.
Na fileira inferior, da esquerda para a direita, o primeiro homem tem
uma estatura alta, é branco, gordo, apresenta protuberância mamária, cabelos
médios e escuros, pelos pelo corpo assim como na barba e aparenta ter de 25 a
30 anos de idade. O segundo homem possui estatura alta, negro, magro, careca,
sem pelos pelo corpo e aparenta ter entre 25 e 30 anos. O terceiro homem tem
uma estatura média, branco, magro, cabelos longos e tingidos e aparenta ter
entre 15 e 20 anos, possui traços considerados como femininos em sua
corporalidade. O quarto homem tem uma estatura alta, negro, magro, cabelos
“black power”, sem pelos pelo corpo e aparentar ter entre 20 e 25 anos.
Podemos observar que, em ambas as campanhas, a inserção de homens
com corpos “normais”, “comuns”, demonstra que todos podem, e devem, se
sentire confortáveis com sua corporalidade. Segundo Nolasco (1995, p. 19), “a
legitimidade da representação masculina associada a comportamentos de
virilidade, posse, poder e atitudes agressivas se ‘relativiza’, abrindo frente a outras
possibilidades de representação do homem”, o ser homem na
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contemporaneidade, e em especial nos meios de comunicação, “começa a perder
suas virtudes de patriarcal, machista e provedor do lar” (BONÁCIO, 2009, p. 37),
dando espaço a novas possibilidades de ser homem.
Ao analisarmos ambas as campanhas, observamos que os corpos
representados partem das ideias expostas por Mauss (1974) e Le Breton (2006),
onde o corpo é entendido como múltiplo e diverso. Assim, ao pensarmos na
nossa atual sociedade, observamos que o corpo, em sua maioria, vem passando
por processos de desconstruções e, em grande parte, as diferenças vêm sendo
aceitas, problematizadas e incluídas em discussões antes impensáveis, mesmo
que ainda de maneira embrionária.
Contudo, ao refletirmos sobre os corpos trans masculinos, objeto
desse estudo, fica evidente que esses sujeitos ainda são silenciados e
“estigmatizados” (GOFFMAN, 1978), observa-se que, em muitos casos e em
especial nas campanhas analisadas, esses corpos são apagados da trama social,
não sendo, por conseguinte, apresentados nas campanhas enquanto formas de
vivenciar e experimentar as diversas formas de masculinidades.
Neste sentido, trazer a tona discussões que envolvem esses sujeitos e
suas corporalidades são de suma relevância para compreensão das dinâmicas
sociais envolvidas na contemporaneidade.
Pensando ainda sobre os discursos fornecidos pelas imagens
ponderamos que, assim como enfatizado por Foucault (1987), existem poderes
que legitimam uns corpos em detrimentos a outros. A nosso ver, as campanhas
se pautam em discursos médicos e biologistas para entendimento do que é ser
homem em sociedade, não abarcando, portanto, as diferentes formas de vivenciar
as masculinidades, pautando-se ainda numa lógica falocêntrica.
Ou seja, o ser homem ainda está condicionado a se ter ou não um pênis.
Desta forma, os sujeitos que não se enquadram nos padrões preestabelecidos
pela sociedade, como no caso dos homens trans, são colocados à margem da
sociedade.
Outro aspecto que chama a atenção nas propagandas/campanhas é
o fato de, em sua grande parte, ampliarem a gama de personagens/público
expostos e veiculados nos mais diversos meios midiáticos, não tendo como
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objetivo primário a disseminação da aceitação ou inclusão destes, mas sim como
forma de ampliarem suas vendas e atingir novos nichos de mercado.
Afinal, o mundo “hipersemiotizado” (CHOULIARAKI; FAIRCLOUGH, 1991) está
atrelado ao capitalismo e é utilizado como potente máquina de dinheiro, uma vez
que a sociedade capitalista requer uma cultura baseada nas imagens. Ela
necessita fornecer uma ampla quantidade de entretenimento, de forma a
estimular o consumo e anestesiar os danos causados a determinadas classes
sociais, raças e sexo” (SOTANG 2004, p.57).
Somos então uma sociedade da diferença ou queremos cumprir
certas demandas sociais? Queremos vender mais ou a representatividade de
corporalidades diversas é real e legítima? resistências nessas
representações? Como pensar e repensar essas representações? Essas são
algumas, das possíveis indagações a serem feitas. Contudo, embora esse viés
capitalista se apresente enquanto uma realidade cruel, é necessário compreender
que, em certa medida, a representação de uma gama corporal diversa tenciona,
até certo ponto, as discussões sobre inclusão e visibilidade dos sujeitos que são
historicamente negligenciados em sua existência. Conforme Trinca (2008, p.3),
“[...] nossa sociedade tanto cultua o corpo como não cessa de desprezá-lo,
comercializá-lo e coisificá-lo. O corpo reina e padece diariamente”.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Destacamos antes de tudo que, com este artigo, não buscamos esgotar ou
finalizar nenhuma discussão, mas sim estimular uma possíveis problematizações
sobre as questões relativas às corporalidades contemporâneas, mais
especificamente no que tange aos corpos dos homens trans que, como analisado,
são invisibilizados pela sociedade, pelos movimentos (LGBTTI+), pela mídia
(propagandas, revistas, programas televisivos, novelas, afins), dentre diversas
outras instâncias.
As campanhas analisadas neste artigo vêm, mesmo que ainda dentro de
uma gama restrita de possibilidades como a não representação dos homens
trans, abrindo espaços para novas formas e maneiras de viver/pensar essas
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masculinidades, em especial no que se refere aos padrões corporais destes que,
a priori, eram pautados em modelos hegemônicos de beleza que, geralmente, são
inalcançáveis.
Entendendo o movimento de adequação dos corpos à identidade de
gênero como um campo marcado pelas relações de poder e, compreendendo que
onde há poder há resistência, os corpos transmasculinos são expressões tanto de
resistência quanto de subversão às normas. Neste sentido, como aponta Guacira
Louro: “ao não falar a respeito deles e delas, talvez se pretenda “eliminá- los”, [...]
a ausência [...] aparece como uma espécie de garantia da “norma”” (LOURO,
1997, p. 67-68).
Contudo, considerando que a invisibilidade desses corpos impossibilita o
acesso ao reconhecimento, aos direitos fundamentais e aos serviços básicos, é
preciso trazer à tona a existência desses sujeitos, bem como a existência das
singularidades desses corpos. Mesmo que evidenciar a transexualidade
masculina em uma propaganda não seja uma garantia à existência representativa
desses sujeitos, é necessário que estes sejam representados uma vez que
também se fazem presente na trama social.
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