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VERBOS MANUAIS EM LIBRAS: ANÁLISE DA PRODUÇÃO EM L2
E CONTRIBUIÇÕES Â PRÁTICA PEDAGÓGICA
RESUMO: Este trabalho analisou a
produção de verbos manuais (FARIA-
NASCIMENTO, CORREIA, 2011), na
sinalização de ouvintes sinalizantes de
Libras como L2 sob a perspectiva da teoria
de análise de erros (Corder, 1967). Para
tanto, contou com a participação de cinco
ouvintes e de oito juízes. Nossos
resultados apontam para uma produção
desprovida de características visuais como
a iconicidade, a gestualidade e a
representatividade, e indicam que tal
produção se justifica no argumento de
erros intralinguais. Essas realizações são
avaliadas como falta de clareza por surdos
e, portanto, solicitam que o ensino de
Libras como L2 apresente propostas
pedagógicas interventivas.
PALAVRAS-CHAVE: Verbos Manuais.
Teoria de Análise de Erros. Libras como
segunda língua.
ABSTRACT: This work analyzed the
production of manual verbs (Faria-
Nascimento and Correia, 2011), in the
signaling of Libras signaling listeners as L2
from the perspective of the theory of error
analysis (Corder, 1967). To that end, it was
attended by five listeners and eight judges.
Our results point to a production devoid of
visual characteristics such as iconicity,
gesture and representativeness, and
indicate that such production is justified in
the argument of intralinguinal errors. These
achievements are evaluated as lack of
clarity by deaf people and, therefore, they
request that the teaching of Libras as L2
presents pedagogical interventions.
KEYWORDS: Manual Verbs, Error
Analysis Theory, Libras second language.
Manual verbs in Brazilian sign language: L2 production analysis and contributions
to pedagogical practice
LIDIA DA SILVA
Doutora em Linguística Aplicada. Professora do Curso de Licenciatura em Letras Libras
da UFPR Universidade Federal do Paraná. lidiaufpr@gmail.com
AMANDA REGINA SILVA
Aluna do Curso de Licenciatura em Letras Libras da UFPR Universidade Federal do
Paraná, participante do Programa de Voluntário Acadêmico junto ao Projeto de Pesquisa
denominado “Aquisição de Libras como segunda língua por ouvintes” ID do
projeto 18932 registrado no Banpesq da UFPR com o número 2015018932, sob
coordenação e orientação da primeira autora. mandyrawr29@gmail.com
Recebido em 26/12/2018. Aprovado em 16/05/2019.
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1.INTRODUÇÃO
Quadros e Karnopp (2004) traduziram handling verbs para ‘verbos
manuais’. A primeira vista o rótulo pode sugerir uma oposição em relação a
verbos não manuais, o que seria muito estranho, uma vez que em Libras ‘não
existem’
1
verbos desse tipo. É verdade que as expressões faciais (marcas não
manuais) podem aparecer com função verbal mas, isso ocorre em contexto
discursivo. Na nossa compreensão, o uso que as autoras fizeram do termo tem a
ver com o seu sentido mais direto, ou seja, é o “sinal que demonstra uma ação
feita com as mãos”, como PEGAR, VARRER, LIMPAR e muitos outros. Apesar de
em outros trabalhos, como de Johnston e Schembri (2007), o termo utilizado ser
‘verbos de manuseio’ no nosso estudo vamos manter a tradução original dada ser
essa a terminologia usada por Faria-Nascimento e Correia (2011) que nos
embasam teoricamente.
Segundo Silva (2018), tais verbos manuais, quando produzidos por surdos,
em contexto de uso de primeira língua (L1), apresentam certos traços:
iconicidade, gestualidade e representatividade. Ocorre que, de acordo com os
dados da autora, durante a sinalização por ouvintes que são sinalizantes de
Libras como L2,
2
nem sempre a realização de verbos manuais mantêm tais
características, o que pode comprometer a clareza e a fluência na sinalização.
Soma-se a essa constatação o fato de que, dado o incentivo da Lei
10.436/2002 e do decreto 5626/2005, nas últimas décadas, percebe-se um
aumento exponencial de pessoas ouvintes adquirindo a Libras e, por conta disso,
faz-se importante refletir a respeito de como o professor desta língua pode lidar
com os diversos tipos de produções que são apresentados pelos aprendizes
ouvintes.
A análise de erros é uma interessante teoria que ajuda a lançar luz sobre
essa questão. Seguindo Corder (1974), olhamos para as produções dos alunos
como se fossem desviantes em relação aos traços (iconicidade, gestualidade e
representatividade) e, então, identificamos, descrevemos, explicamos e avaliamos
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1
A exceção seriam os verbos ROUBAR e TRANSAR.
2
A autora baseia-se em Gesser (2006) para defender que L2 e LE o intercambiáveis que o
termo não faz menção a quantidade de línguas não-maternas adquiridas e, dado os aspectos
políticos, sociais, cognitivos, culturais que envolvem o processo aquisicional, as teorias que tratam
de um podem ser aplicados a outra e vice-versa.
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tais produções para, a partir disso, pensar no tratamento interventivo em sala de
aula de ensino de Libras como L2 para ouvintes.
Assim, este estudo pretendeu analisar a produção de verbos manuais na
sinalização de ouvintes sinalizantes de Libras como L2 e, para atingir tal objetivo,
as seguintes perguntas de pesquisa foram definidas: I) Quais são as
características dos verbos manuais produzidos por ouvintes sinalizantes de Libras
como L2?; II) Como as produções de verbos manuais dos ouvintes sinalizantes de
Libras como L2 podem ser explicadas de acordo com a Teoria de Análise de
Erros?; III) Como essas produções são avaliadas por juízes surdos?; IV) Quais as
propostas de intervenção pedagógica para o tratamento das produções dos
ouvintes?
Um estudo como o ora proposto vai ao encontro da necessidade de
pesquisa em relação ao tema e o torna importante que pretende ser um estudo
descritivo que toma a Libras como L2 em sua centralidade de análise. Convém
ainda apontar que neste texto pretendemos contribuir com reflexões que sirvam
diretamente à prática pedagógica, de modo a tornar o ensino de uma língua de
modalidade visual-manual cada vez mais eficiente a ouvintes.
Feito esse esclarecimento, apresentamos as partes que seguem o texto.
Na primeira seção brevemente, apresentamos o embasamento teórico relativo
aos verbos manuais e à análise de erros. Na seção 2, é apresentada a
metodologia do estudo, e na terceira parte os resultados são apresentados e
discutidos. Em seguida, são apresentadas as reflexões sobre as implicações
pedagógicas para tratamento dos erros de produção dos verbos manuais em
Libras. As considerações finais aparecem ao final do texto.
2.VERBOS MANUAIS DA LIBRAS E ANÁLISE DE ERROS: BREVES
CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS
Um importante trabalho para o estudo da morfologia das línguas de sinais
foi realizado por Padden (1988). Sua tese de doutorado tratou da interação entre
a morfologia e a sintaxe da língua americana de sinais, e sua proposta foi a
classificação dos verbos em três tipos sendo essa classificação utilizada até
hoje pela maioria dos pesquisadores. A autora identificou a existência de três
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diferentes tipos de verbos: os verbos simples, os verbos com concordância e os
verbos espaciais. Entretanto, há outros verbos que parecem romper com as
regras fonológicas, morfológicas e sintáticas e portanto, não se aplicam a estas
classes. São esses verbos que nos interessam.
Para Faria-Nascimento e Correia (2011), as realizações verbais que são
capazes de indicar como a ação foi praticada são chamados de “verbos manuais”,
pois é como se a pessoa estivesse imitando a ação, segurando e/ou manipulando
o objeto que usou para praticá-la. Para as autoras, um verbo manual e sua
realização se explicam pelos predicados que trazem informações adicionais ao
verbo. Conceito bem parecido com o de McCleary e Viotti (2011) que tratando
sobre esses verbos dizem que a mão assume “um formato compatível com o do
objeto que é o referente do complemento dos verbos.” (p. 292).
Para McCleary e Viotti, esses sinais são intrinsecamente icônicos e
parecem ser formados por mais de um componente de significação. Afirmam,
ainda, que esses sinais nem sempre são feitos da mesma maneira:
Dependendo do tamanho do referente, a mão vai assumir uma
configuração mais ou menos aberta. A orientação da palma da
mão vai variar de acordo com o lugar, no espaço de sinalização,
em o que o objeto está sendo conceitualmente colocado, do
mesmo modo que a direcionalidade do movimento da mão vai
variar de acordo com a trajetória do objeto. (MCCLEARY; VIOTTI,
2011, p. 292)
Com isso, os referidos autores mostram que um componente gestual
presente na realização desses verbos, apresentando características que são
dependentes de toda a organização que o sinalizante escolher para seu discurso.
Para Dudis (2008, p. 188), a realização de verbo manual diz respeito à
“representação”, o que, segundo o autor, é a presença de traços semânticos os
quais detalham a esquematicidade do conceito que o sinal simboliza. (DUDIS,
2008, p. 160)
Então, para compreender melhor os traços de iconicidade, gestualidade e
representatividade que compõem os verbos manais em Libras, tomemos um
exemplo: O verbo VOAR. De acordo com dicionário da língua de Sinais do Brasil
de Capovilla et al o sinal é feito conforme abaixo:
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Figura 1 Sinal VOAR
Fonte: Dicionário da língua de Sinais do Brasil: A Libras em suas Mãos - Capovilla et al (2017)
Nota-se pela imagem, que o sinal traz em si o traço de iconicidade, pois
remete a um objeto real e demonstra o movimento realizado por um animal
durante a ação. Ocorre que, este sinal não traz o detalhamento de que animal voa
(isso pode se dar por inferência contextual mas, não é o foco do tópico). O
detalhamento é a representatividade discutida por Dudis (2008). Para referir-se a
uma borboleta voando, por exemplo, além do sinal acima, poderia se usar um
sinal representativo como o demonstrado abaixo:
Figura 2 Sinal de VOAR
BORBOLETA
Fonte: as autoras(2019)
Outros elementos gestuais poderiam ser acrescidos à sinalização a fim de torná-
la ainda mais clara, como o destaque as antenas da borboleta, por exemplo.
Figura 3 Detalhamento do sinal
Fonte: as autoras(2019)
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Tomamos o exposto para concordar com Silva (2018) quando indica que
quando os verbos manuais são produzidos de forma icônica, gestual e
representativa (DUDIS, 2008; MCCLEARY;VIOTTI, 2011) a sinalização torna-se
mais clara, fluente e sofisticada. Se isso pode se dar facilmente na sinalização de
surdos que têm a experiência visual otimizada, não se pode fazer a mesma
afirmação em relação aos ouvintes, pois além de serem aprendizes de uma L2
o que por si impõe certo desafio a todo e qualquer aprendiz –, estão lidando
com uma língua cuja modalidade expressiva não lhes é comum, e que exige
aguçamento visual para ser desenvolvida.
Nesse sentido, a Teoria de Análise de Erros – que nasce no seio da
Hipótese de Análise Contrastiva parece ser plausível para explicar tal processo
de produção. Maia (2009) explica que esta foi a primeira teoria a estudar os erros
dos aprendizes e a solucionar os problemas na prática de ensino de LE.
Como muitas teorias, essa também sofreu muitas modificações e foi
reformulada algumas vezes, até que se dividiu na versão fraca e na versão forte,
sendo que na primeira explicam-se os erros que realmente ocorrem, e na
segunda o objetivo é uma predição de erros que podem ocorrer. Na década de
70, a teoria popularizou-se no campo da linguística aplicada.
Corder (1967) é o principal representante da teoria e sempre defendeu que
os erros são importantes tanto para aprendizes quanto para professores, pois
podem ser classificados e analisados de modo a revelar o algo do sistema
operacional, sobre a natureza do conhecimento em momentos específicos e
determinados, para que assim se possa descobrir o que se tem a aprender,
mediante a superação dos problemas diagnosticados.
Sabe-se, todavia, que essa teoria apresenta algumas limitações, mas a sua
grande relevância “reside no fato de reconhecer que os erros dos aprendizes não
devam ser tratados como algo a ser evitado, mas sim considerados como uma
característica inevitável do processo de aquisição tanto de uma L2 quanto de uma
língua estrangeira”, e de os aprendizes possuírem gramáticas mentais
idiossincráticas. (FORTES, s/a, p.8).
Nessa teoria, explica Fortes (s/a, p. 10), os erros não são vistos apenas
como problemas a serem superados, mas sim como características normais e
inevitáveis que indicam as estratégias que os aprendizes usam quando estão
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desenvolvendo uma interlíngua. Aliás, o erro não é algo que impede o progresso
do aprendiz. Pelo contrário, é indício ativo do seu processamento e evolução no
contato com a língua nova.
Corder (1967) segue a clássica distinção chomskyana de competência e
desempenho e explica que existem erros (error) que são sistemáticos pois estão
no campo da competência, ou seja, como o aprendiz não domina o sistema de
regras da L2, sistematicamente ele comete as falhas gramaticais. Por outro lado,
os enganos (mistakes) são erros ocasionais, cometidos no desempenho de quem
tem a competência. Trata-se de erros pontuais, não-sistemáticos, ocorridos em
momento particular por conta de ansiedade, nervosismo, cansaço, desatenção,
etc.
Sobre isso, Maia (2009) comenta que é possível que os enganos sejam
facilmente corrigidos pelos aprendizes, até porque eles estão naturalmente
presentes nas falas espontâneas, mesmo de nativos, entretanto, os erros não o
são, pois são parte da competência transitória dos aprendizes. Nesse sentido,
afirma que as pesquisas devem concentrar-se nos erros e não nos enganos.
Todavia, as fronteiras entre um e outro são muito tênues.
Em relação aos fatores determinantes dos erros, Maia (2009) explica que
há uma variedade de visões: a própria L2, o contexto, o método de ensino,
aptidão do aprendiz, influência da LM e outros.
Maia (2009) explica, ainda, que as produções errôneas podem ser
classificadas em interlinguais ou intralinguais. As primeiras ocorrem por
interferência da L1 e são também chamadas de transferência negativa. nos
erros internos, não interferência da língua maternta (LM), e são do tipo
desenvolvimentais e únicos.
Os erros desenvolvimentais são os mesmos cometidos por crianças
quando estão adquirindo sua L1 e, portanto, mediante exposição a amostras e/ou
correções passarão à forma correta. Os erros únicos quer dizer, sem
interferência da L1 podem ser do tipo: ambíguos ou induzidos. Os primeiros são
aqueles também cometidos por crianças em processo de aquisição de L1, e os
segundos são aqueles cometidos pela natureza da instrução.
A Teoria de Análise de Erros apresenta uma metodologia de pesquisa
bastante específica, organizada em cinco passos, a qual é apresentada por
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Corder (apud Fortes, s/a): 1) Coleta de dados da interlíngua do aprendiz; 2)
Identificação dos erros; 3) Descrição dos erros; 4) Explicação dos erros; 5)
Avaliação dos erros.
A coleta de dados, explica Fortes, implica na decisão do tamanho da
amostra, em sua natureza temporal (longitudinal ou transversal), e no tipo de
extração do dado (se natural ou eliciada). Em relação à amostra, destacamos que
ela pode ser massiva (várias produções de um grande número de aprendizes),
específica (que restringe os dados a um número limitado de aprendizes), ou
incidental (amostra de uso da língua produzida por um único aluno). Em relação
ao tipo de dado, pode ser de uso espontâneo e natural da língua ou, ainda,
eliciada de alguma maneira.
Na fase 2 de identificação dos erros, primeiramente, é preciso acatar a
distinção proposta por Corder (1967) entre erro (error) e engano (mistake), e
classificar suas interpretações em três tipos diferentes: normal, autoritária e
plausível.
A descrição de erros, fase 3, envolve a comparação das produções dos
aprendizes com um enunciado da L2. Normalmente, essas descrições
fundamentam-se em taxionomias descritivas que se baseiam em categorias
linguísticas: erros lexicais, erros fonológicos, erros sintáticos. A vantagem dessas
taxionomias é que estão relacionadas a propósitos pedagógicos.
No próximo passo, que se refere a explicar os dados (fase 4), o
pesquisador busca as justificativas psicolinguísticas, sociolinguísticas,
epistêmicas ou discursivas para o erro cometido pelo aprendiz. Para Corder
(1967), a explicação pode ser dada a partir dos problemas de processamento,
pelas estratégias de comunicação, pela transferência ou transição.
Por fim, a avaliação dos erros, segundo Fortes (s/a):
(...) difere dos estágios anteriores por envolver o efeito do erro no
interlocutor e não por examiná-lo do ponto de vista do aprendiz
que o cometeu. Tal efeito pode ser constatado tanto em termos de
compreensão quanto de resposta afetiva por parte do ouvinte. A
formulação de um estudo de avaliação da gravidade ou seriedade
dos erros cometidos por aprendizes de L2 envolve: definir quem
serão as pessoas endereçadas, isto é, os juízes que irão
determinar a gravidade dos erros a eles apresentados; determinar
quais erros eles serão requisitados a julgar; e planejar como eles
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serão requisitados a julgar tais erros, ou seja, a forma como os
erros lhes serão apresentados.
A autora aponta, ainda, que os juízes podem ser falantes nativos, falantes
não-nativos, professores de língua (nativos e/ou não-nativos), e não-professores
de língua (nativos e/ou não-nativos), e que esses podem fazer uso de diversos
instrumentos durante a avaliação para avaliar: a inteligibilidade das sentenças que
contenham erro; a gravidade ou naturalidade dos erros; o grau de irritação que os
erros causam. Também, em alguns casos, eles podem ser requisitados a corrigir
erros e a justificar por que julgaram alguns erros como problemáticos e, em outros
casos, ter a sua compreensão das sentenças errôneas testada através de
entrevistas.
3. METODOLOGIA
Para a realização de nossa investigação, com algumas adaptações,
seguimos as cinco etapas da pesquisa em Análise de Erros proposta por Corder
(1974), a saber: 1) Coleta de dados da interlíngua do aprendiz; 2) Identificação
dos erros; 3) Descrição dos erros; 4) Explicação dos erros; 5) Avaliação dos erros.
Para a coleta de dados da interlíngua dos aprendizes, utilizamos os
mesmos dados que Silva (2018) utilizou em sua pesquisa de doutorado. No caso
da tese, a autora trabalhou com dados de alunos, do vel avançado, do curso de
Libras do NEL Núcleo de Ensino de Libras da Universidade Federal do Paraná,
que abrangiam, além de acadêmicos do curso de graduação em letras libras da
mesma universidade, estudantes externos. Neste estudo, excluímos os
estudantes externos. Os dados disponibilizados dizem respeito à sinalização da
narrativa “A História da Pera”
3
, que está disponível no Youtube
4
, feita por cinco
acadêmicos ouvintes.
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3
Em uma floresta, um homem está no topo da escada colhendo peras na árvore. Um homem
passou sob a árvore puxando um bode com uma corda no pescoço, o homem continuou tirando as
peras e colocando no avental. Um menino pedalando se aproximou, parou sob a árvore, olhou
para as cestas, deitou a bicicleta no chão, olhou o homem distraído na árvore e aproveitou para
pegar uma cesta, levantou a bicicleta, subiu e colocou a cesta na frente e foi pedalando no
caminho, vinha de encontro a ele uma menina pedalando sua bicicleta, ele se virou pra olhar
enquanto ela passava por ele e o seu chapéu voou, havia uma pedra na frente em que ele bateu e
caiu derrubando a cesta, as peras se espalharam pelo chão, o menino se sentou pra limpar a
calça, e viu outros 3 meninos ao lado que resolveram ajuda-lo a levantar, recolher as peras, com a
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Os cinco participantes deste estudo receberam pseudônimos e apresentam
o seguinte perfil: três homens (com pseudônimos Guilherme, Matheus e Rafael)
com 32, 31 e 21 anos de idade, respectivamente; e duas mulheres (com
pseudônimos Luciane e Isabela) com 38 e 31 anos de idade, respectivamente. Os
participantes adquiriram a Libras entre 2 a 14 anos. Todos eles têm contato diário
com a língua, uma vez que à noite têm aula na graduação no curso de
licenciatura em Letras Libras. Dois deles atuam profissionalmente com a Libras.
Em geral, não têm contatos pessoais com surdos ou interagem em ambientes
sociais de lazer.
Também participaram do estudo oito juízes. O grupo de juízes, todo
composto por surdos, foi dividido entre 4 professores do Curso de Licenciatura em
Letras Libras, PS, e 4 não professores, NP. Eles foram chamados de PS1 até
PS4, e NP1 até NP4, respectivamente. Recortamos os trechos da “História da
Pera” em que as ações que provavelmente seriam expressas por meio de verbos
manuais, mostramos a eles e, em seguida, mostramos vídeos com as formas de
sinalização encontradas no Corpus da Interlíngua dos Ouvintes. Com isso, o juiz
respondia em Libras qual das formas achava melhor e explicava o porquê.
Gravamos suas respostas e posteriormente as traduzimos para língua portuguesa
para fins de registro neste estudo. Todos os participantes do estudo, surdos e
ouvintes, assinaram o termo de compromisso livre e esclarecido
Os passos 2 a 5 (Identificação dos erros; Descrição dos erros; Explicação
dos erros e Avaliação dos erros) serão apresentados em forma de resultados na
próxima seção.
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cesta de volta no lugar ele segurou e foi andando a empurrando sua bicicleta, os outros
meninos também foram andando, um deles encontrou o chapéu que havia caído e assobiou para
o dono esperar e poder entregar a ele, em troca, ganhou 3 peras como uma forma de
agradecimento, dividiu entre os demais amigos e foram andando e comendo. O homem que
estava colhendo peras, após descer da escada, quando se ajoelhou para colocar as peras no
cesto, percebeu que faltava algo e levantou, em seguida viu os 3 meninos passando por ele,
comendo as peras, ficou desconfiado.
4
https://www.youtube.com/watch?v=bRNSTxTpG7U
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4.RESULTADOS: APRESENTAÇÃO E ANÁLISE
4.1 Da identificação e descrição dos erros
O objetivo desta seção é trazer resposta a nossa primeira pergunta de
pesquisa, qual seja: quais são as características dos verbos manuais produzidos
por ouvintes sinalizantes de Libras como L2? Para tanto, conforme proposta da
Teoria de Análise de Erros, identificamos e descrevemos algumas produções.
A identificação e a descrição dos erros que são aqui apresentados referem-
se a nossa interpretação da realização dos sinais. Não tivemos contato com os
sinalizantes para checar as intenções de produção e, portanto, a análise não pode
ser categorizada como interpretação autorizada.
Em nossa identificação e descrição de erros lexicais, focamos na
comparação entre os parâmetros fonético-fonológicos tipicamente usados na
língua para formação do sinal e o apresentado pelo ouvinte em relação aos
verbos SUBIR
NAÁRVORE
5
e ANDAR
DEBICICLETA
, ilustrados pelas imagens A e B da
Figura 1 abaixo.
Figura 4 – Verbos manuais SUBIR
NAÁRVORE
E ANDAR
DEBICICLETA
Fonte: as autoras (2018)
Essa comparação revelou os tipos de erro, os quais foram organizados em
duas categorias: I) Omissão de representatividade e II) Omissão de iconicidade.
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5
Glosa notada conforme convenção adotada por Silva (2018).
Em nossa identificação e descrição de erros lexicais, focamos na comparação entre
os parâmetros fonético-fonogicos tipicamente usados na língua para formação do sinal e
o apresentado pelo ouvinte em relação aos verbos SUBIR
NAÁRVORE
5
e ANDAR
DEBICICLETA
,
ilustrados pelas imagens A e B da Figura 1 abaixo.
Figura 4 Verbos manuais SUBIR
NAÁRVORE
E ANDAR
DEBICICLETA
(A)
SUBIR
NAÁRVORE
(B)
ANDAR
DEBICICLETA
Fonte: as autoras (2018)
Essa comparação revelou os tipos de erro, os quais foram organizados em duas
categorias: I) Omissão de representatividade e II) Omissão de iconicidade.
Figura 5 Omissão de representatividade na realização do verbo SUBIR
NAÁRVORE
6
(A)
(B)
(C)
Fonte: Silva (2018)
Em línguas orais, a troca de grafemas pode comprometer a produção em L2. Um
exemplo em relação ao inglês seria confortable” em vez de comfortable”. Em relação à
Libras, a troca de alguns parâmetros pode comprometer a boa formação do sinal bem como
sua representatividade. Em (A), por exemplo, Matheus utiliza a iconicidade para expressar
a árvore e a pessoa, mas o movimento que escolheu para fazer a ação de subir não é
representativa já que o movimento das pernas está ausente. Pela forma como o movimento
do dedo indicador foi realizado, parece que o corpo é transportado acima e não por meio
das próprias pernas. Em (B), Isabela utiliza a representatividade da ão de subir com as
5
Glosa notada conforme convenção adotada por Silva (2018).
6
Esse exemplo pode ser considerado um verbo manual pois conta de demonstrar o objeto ÁRVORE e a
ação de SUBIR desempenhada pelo referente, ou seja, mesmo não sendo ação feita com mão, trata-se da
imitação.
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Figura 5 – Omissão de representatividade na realização do verbo SUBIR
NAÁRVORE
6
(A)
(B)
(C)
Fonte: Silva (2018)
Em línguas orais, a troca de grafemas pode comprometer a produção em
L2. Um exemplo em relação ao inglês seria “confortable” em vez de “comfortable”.
Em relação à Libras, a troca de alguns parâmetros pode comprometer a boa
formação do sinal bem como sua representatividade. Em (A), por exemplo,
Matheus utiliza a iconicidade para expressar a árvore e a pessoa, mas o
movimento que escolheu para fazer a ação de subir não é representativa que o
movimento das pernas está ausente. Pela forma como o movimento do dedo
indicador foi realizado, parece que o corpo é transportado acima e não por meio
das próprias pernas. Em (B), Isabela utiliza a representatividade da ação de subir
com as pernas, entretanto, pelo movimento empregado, tem-se a interpretação da
ação de saltitar (pular com dificuldade), haja vista que não empregou o
movimento de dedos que remete à ideia do movimento das pernas. Em (C),
Rafael expressa-se com ausência do sinal de árvore, e isso comprometeu a
representatividade do sinal.
Figura 6 – Omissão de iconicidade na realização do verbo ANDAR
DEBICICLETA
Fonte: Silva (2018)
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6
Esse exemplo pode ser considerado um verbo manual pois conta de demonstrar o objeto
ÁRVORE e a ação de SUBIR desempenhada pelo referente, ou seja, mesmo não sendo ação feita
com mão, trata-se da imitação.
pernas, entretanto, pelo movimento empregado, tem-se a interpretação da ação de saltitar
(pular com dificuldade), haja vista que não empregou o movimento de dedos que remete à
ideia do movimento das pernas. Em (C), Rafael expressa-se com ausência do sinal de
árvore, e isso comprometeu a representatividade do sinal.
Figura 6 Omissão de iconicidade na realização do verbo ANDAR
DEBICICLETA
(A)
(B)
(C)
(D)
(E)
Fonte: Silva (2018)
Em línguas orais, os acréscimos pode comprometer a produção em L2. Um
exemplo em relação ao inglês seria “apartamento” em vez de apartment. Em relação à
Libras, o acréscimo de um sinal pode comprometer a boa formação do verbo bem como
sua iconicidade.
Nas imagens em 3a-c, por exemplo, os ouvintes utilizam o sinal de
UMAPESSOA
ANDANDO
APÉ
antes de realizar o sinal de BICICLETA. Ao inserir o dedo
indicador na vertical, durante a sinalização, eles deixam de formar o verbo
ANDAR
DEBICICLETA
de forma clara, pois ele diz respeito à ação do corpo de movimentar-se
sem nenhum meio de transporte. Em (D), observa-se que o sinalizante tentou marcar a
iconicidade pela demonstração do objeto que transporta, entretanto, como não há menção à
pessoa que chega sentada na bicicleta , o uso do léxico parece ser inadequado. O sinal
em 3e, além de apresentar a ausência da marca do objeto, destaque ao movimento de
pernas, contudo, o faz pela representação do local fixo, ou seja, sua mão não se desloca no
espaço e isso transmite a ideia de alguém que pedala sem sair do lugar.
4.2 Da explicação e da avaliação
Nesta seção, a análise tem o objetivo de responder a nossa segunda pergunta de
pesquisa: como as produções de verbos manuais dos ouvintes sinalizantes de Libras como
L2 podem ser explicadas segundo a Teoria de Análise de Erros? Nesse sentido, vamos nos
ater aos erros intralinguais.
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“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
213!
Em línguas orais, os acréscimos pode comprometer a produção em L2. Um
exemplo em relação ao inglês seria “apartamento” em vez de “apartment”. Em
relação à Libras, o acréscimo de um sinal pode comprometer a boa formação do
verbo bem como sua iconicidade.
Nas imagens em 3a-c, por exemplo, os ouvintes utilizam o sinal de
UMAPESSOA
ANDANDO
APÉ
antes de realizar o sinal de BICICLETA. Ao inserir o dedo
indicador na vertical, durante a sinalização, eles deixam de formar o verbo
ANDAR
DEBICICLETA
de forma clara, pois ele diz respeito à ação do corpo de
movimentar-se sem nenhum meio de transporte. Em (D), observa-se que o
sinalizante tentou marcar a iconicidade pela demonstração do objeto que
transporta, entretanto, como não menção à pessoa que chega sentada na
bicicleta –, o uso do léxico parece ser inadequado. O sinal em 3e, além de
apresentar a ausência da marca do objeto, dá destaque ao movimento de pernas,
contudo, o faz pela representação do local fixo, ou seja, sua mão não se desloca
no espaço e isso transmite a ideia de alguém que pedala sem sair do lugar.
4.2 Da explicação e da avaliação
Nesta seção, a análise tem o objetivo de responder a nossa segunda
pergunta de pesquisa: como as produções de verbos manuais dos ouvintes
sinalizantes de Libras como L2 podem ser explicadas segundo a Teoria de
Análise de Erros? Nesse sentido, vamos nos ater aos erros intralinguais.
A identificação dos erros que são aqui apresentados baseia-se na hipótese
de que transferência interna durante a realização dos sinais. Além dos
exemplos apresentados acima, os que seguem em relação a PEGAR e
COLOCAR acomodam também essa explicação. Para iniciar, note-se na figura
4, a realização do sinal de PEGAR e COLOCAR com manutenção da iconicidade,
gestualidade e representatividade e, na sequência, a forma como apareceu nos
dados.
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“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
214!
Figura 7 – Verbos manuais PEGAR e COLOCAR com manutenção da iconicidade, gestualidade e
representatividade
Fonte: as autoras (2018)
O sinal de PEGAR é realizado com a iconicidade, gestualidade e
representatividade de quem pega um objeto redondo no alto e o traz para perto
de si, para colocá-lo em um ponto no espaço que está, arbitrariamente, definido à
cesta. O sinal de COLOCAR, da mesma forma, demonstra uma imitação da ação
de segurar um objeto pela sua lateral e levá-lo a um outro ponto (que pelo
contexto era na bicicleta). O objeto que está sendo colocado na bicicleta é a cesta
e, portanto, a iconicidade, gestualidade e representatividade dão conta de
demonstrar que se trata de suas alças sendo seguradas.
Os sinais apresentados na interlíngua dos ouvintes estão representados na
figura abaixo, que demonstra erros de generalização.
Figura 8 – Erros de generalização
Fonte: Silva (2018)
No contato com a Libras, por meio instrucional, o aprendiz recebe input em
relação à produção de verbos que se relacionam a sua forma genérica. É o caso,
por exemplo do sinal de PEGAR, que normalmente se faz com os dedos
fechando-se em direção ao seu corpo. Ocorre, todavia, que essa forma do sinal
de PEGAR normalmente é modificado para dar conta da expressão de forma
visual, icônica, gestual e representativa. Então, para expressar “pegar um livro”,
por exemplo, a configuração de mão deverá ser diferente daquela utilizada para
A identificação dos erros que são aqui apresentados baseia-se na hipótese de que
transferência interna durante a realização dos sinais. Além dos exemplos apresentados
acima, os que seguem em relação a PEGAR e COLOCAR acomodam também essa
explicação. Para iniciar, note-se na figura 4, a realização do sinal de PEGAR e COLOCAR
com manutenção da iconicidade, gestualidade e representatividade e, na sequência, a forma
como apareceu nos dados.
Figura 7 Verbos manuais PEGAR e COLOCAR com manutenção da iconicidade, gestualidade e
representatividade
(A) - PEGAR
(B) - COLOCAR
Fonte: as autoras (2018)
O sinal de PEGAR é realizado com a iconicidade, gestualidade e representatividade
de quem pega um objeto redondo no alto e o traz para perto de si, para colocá-lo em um
ponto no espaço que está, arbitrariamente, definido à cesta. O sinal de COLOCAR, da
mesma forma, demonstra uma imitação da ação de segurar um objeto pela sua lateral e
levá-lo até um outro ponto (que pelo contexto era na bicicleta). O objeto que está sendo
colocado na bicicleta é a cesta e, portanto, a iconicidade, gestualidade e representatividade
dão conta de demonstrar que se trata de suas alças sendo seguradas.
Os sinais apresentados na interlíngua dos ouvintes estão representados na figura
abaixo, que demonstra erros de generalização.
Figura 8 Erros de generalização
(A) - PEGAR
(B) - COLOCAR
Fonte: Silva (2018)
No contato com a Libras, por meio instrucional, o aprendiz recebe input em relação
à produção de verbos que se relacionam a sua forma gerica. É o caso, por exemplo do
A identificação dos erros que são aqui apresentados baseia-se na hipótese de que
transferência interna durante a realização dos sinais. Além dos exemplos apresentados
acima, os que seguem em relação a PEGAR e COLOCAR acomodam também essa
explicação. Para iniciar, note-se na figura 4, a realização do sinal de PEGAR e COLOCAR
com manutenção da iconicidade, gestualidade e representatividade e, na sequência, a forma
como apareceu nos dados.
Figura 7 Verbos manuais PEGAR e COLOCAR com manutenção da iconicidade, gestualidade e
representatividade
(A) - PEGAR
(B) - COLOCAR
Fonte: as autoras (2018)
O sinal de PEGAR é realizado com a iconicidade, gestualidade e representatividade
de quem pega um objeto redondo no alto e o traz para perto de si, para colocá-lo em um
ponto no espaço que está, arbitrariamente, definido à cesta. O sinal de COLOCAR, da
mesma forma, demonstra uma imitação da ação de segurar um objeto pela sua lateral e
levá-lo até um outro ponto (que pelo contexto era na bicicleta). O objeto que está sendo
colocado na bicicleta é a cesta e, portanto, a iconicidade, gestualidade e representatividade
dão conta de demonstrar que se trata de suas alças sendo seguradas.
Os sinais apresentados na interlíngua dos ouvintes estão representados na figura
abaixo, que demonstra erros de generalização.
Figura 8 Erros de generalização
(A) - PEGAR
(B) - COLOCAR
Fonte: Silva (2018)
No contato com a Libras, por meio instrucional, o aprendiz recebe input em relação
à produção de verbos que se relacionam a sua forma genérica. É o caso, por exemplo do
! ! ! ! ! !!!!!!!!!!!!!! !
“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
215!
produzir o PEGAR sem flexão. O que se nota nos dados é que os ouvintes
deduziram as regras dos verbos manuais a partir de sua vivência com a língua, ou
seja, cometeram erros intralinguais. Na figura (A), Isabela começa o sinal de
PEGAR com os dedos abertos, mas, ao movimentá-los para o ponto de
articulação que representa o bolso, ela fecha os dedos e, representativamente,
isso implica em transmitir a mensagem de que as peras foram amassadas.
Tal fato repete-se em relação ao verbo COLOCAR, que tem incontáveis
possibilidades de realização, as quais serão influenciadas pelo contexto
discursivo e que pedem que seus traços conservem alta carga visual, icônica,
gestual e representativa. Isabela, entretanto, em (B), realiza o verbo apenas de
forma icônica e gestual. A sinalizante passa a ideia de que se trata do movimento
de segurar um objeto redondo, mas não representa a ação desempenhada pelo
menino de segurar a cesta pelas alças.
Nesse caso, parece que os ouvintes empregaram todo o repertório e todas
as regras que conheciam, numa situação nova, ou seja, na contação de uma
narrativa que envolve elementos estranhos ao cotidiano de quem vive em um
centro urbano. Por conta do desconhecimento das restrições, acabaram omitindo
as características necessárias aos verbos manuais. Acredita-se também que,
além da generalização, esteja ocorrendo uso limitado dos recursos psicológicos
que corroboram a efetiva sinalização. Quer dizer, a explicação dos erros é de
ordem linguística e cognitiva.
Isto posto, interessa-nos também responder à terceira pergunta de
pesquisa traçada para este estudo, que é “Como as produções de verbos
manuais dos ouvintes sinalizantes de Libras como L2 são avaliadas por juízes
surdos?”. Para tanto, apresentamos os resultados da avaliação dos juízes,
começando pelo primeiro verbo, ANDAR
DEBICICLETA
.
! ! ! ! ! !!!!!!!!!!!!!! !
“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
216!
Figura 9 – Amostras
7
para avaliação referência verbo ANDAR
DEBIBICLETA
Fonte: as autoras (2018)
Os resultados obtidos em relação à pergunta “qual dessas formas você
acha melhor”, excetuando-se NP4 que votou em A, os demais escolheram a
amostra C.
Os participantes PS1 e PS2 avaliaram que nenhuma das 4 amostras de
sinalização correspondem ao trecho do filme pois, segundo eles, além da
sinalização de C, seria necessária a realização do sinal de BICICLETA bem como
a incorporação da ação com o corpo. O PS4, após avaliar, complementou com
argumentos que concordam a consideração de PS1 e PS2:
Quero complementar dizendo que poderia ser feito apenas a
incorporação do menino andando de bicicleta, usando as mãos
para representar as pedaladas, expressão fácil de menino,
fazendo o mesmo trajeto, isso deixaria uma compreensão mais
clara.
Participante PS4
A participante NP4 também argumentou a favor da incorporação, e deu
exemplos de possibilidades. Para ela, a realização do sinal apresentado em A
seria a introdução das descrições das características do menino. Em suas
palavras:
É A, eu acho melhor assim, porque os outros vídeos, eu vi,
maioria falta o uso de classificadores, mas eu sinto que a melhor
forma é A, porque todos faltam classificadores, porque precisa
falar assim, por exemplo: menino pequeno (incorporou o menino)
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
7
Antes de apresentar as amostras, o trecho do filme da História da Pera em que o menino
aparece andando de bicicleta foi exibido aos juízes.
Figura 9 Amostras
7
para avaliação referência verbo ANDAR
DEBIBICLETA
AMOSTRA A
AMOSTRA B
AMOSTRA C
AMOSTRA D
Fonte: as autoras (2018)
Os resultados obtidos em relação à pergunta “qual dessas formas você acha
melhor”, excetuando-se NP4 que votou em A, os demais escolheram a amostra C.
Os participantes PS1 e PS2 avaliaram que nenhuma das 4 amostras de sinalização
correspondem ao trecho do filme pois, segundo eles, além da sinalização de C, seria
necessária a realização do sinal de BICICLETA bem como a incorporação da ação com o
corpo. O PS4, após avaliar, complementou com argumentos que concordam a consideração
de PS1 e PS2:
Quero complementar dizendo que poderia ser feito apenas a incorporação
do menino andando de bicicleta, usando as mãos para representar as
pedaladas, expressão fácil de menino, fazendo o mesmo trajeto, isso
deixaria uma compreensão mais clara.
Participante PS4
A participante NP4 também argumentou a favor da incorporação, e deu exemplos
de possibilidades. Para ela, a realização do sinal apresentado em A seria a introdução das
descrições das características do menino. Em suas palavras:
É A, eu acho melhor assim, porque os outros vídeos, eu vi, maioria falta o
uso de classificadores, mas eu sinto que a melhor forma é A, porque
todos faltam classificadores, porque precisa falar assim, por exemplo:
menino pequeno (incorporou o menino) chapéu, pedalando. Esse é
7
Antes de apresentar as amostras, o trecho do filme da História da Pera em que o menino aparece andando de
bicicleta foi exibido aos juízes.
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“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
217!
chapéu, pedalando. Esse é classificador correto, mas esses
vídeos têm muitos sinais e pouco classificador.
Participante NP4
As amostras B e D não foram consideradas como melhor forma de
expressão do trecho, por serem, segundo os juízes, “estranhas”, “não fazerem
sentido”, “não terem clareza”, “não combinarem” (NP1 e NP2). E a razão de A ter
sido considerada por 50% dos juízes se pelo fato de essa amostra ser “mais
clara” (NP1), “mais visual” (PS3), e “é melhor” (NP3).
Em relação ao verbo SUBIR
NAÁRVORE
, as amostras apresentadas foram as
seguintes:
Figura 10Amostras
8
para avaliação referência verbo SUBIR
NAÁRVORE
Fonte: as autoras (2018)
Os resultados obtidos em relação à pergunta “qual dessas formas você
acha melhor” foram unânimes em relação à amostra B. Além de avaliar B como
melhor forma de sinalização para representar o trecho, NP1 acrescentaria o sinal
de escada de forma a preservar ainda mais a visualidade da cena. O juiz NP2
explicou que a amostra B é mais “clara” e “combina”, enquanto as demais são
impossíveis e engraçadas. Para NP3 a mostra B é “visual”, e por isso representa
melhor o verbo manual. NP4 também destacou a clareza da realização
demonstrada em B.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
8
Antes de apresentar as amostras, o trecho em que o menino aparece subindo na árvore foi
exibido aos juízes.
classificador correto, mas esses vídeos têm muitos sinais e pouco
classificador.
Participante NP4
As amostras B e D não foram consideradas como melhor forma de expressão do
trecho, por serem, segundo os juízes, “estranhas”, “não fazerem sentido”, “não terem
clareza”, “não combinarem (NP1 e NP2). E a razão de A ter sido considerada por 50%
dos juízes se dá pelo fato de essa amostra ser mais clara” (NP1), “mais visual” (PS3), e “é
melhor(NP3).
Em relação ao verbo SUBIR
NAÁRVORE
, as amostras apresentadas foram as
seguintes:
Figura 10 Amostras
8
para avaliação referência verbo SUBIR
NAÁRVORE
AMOSTRA A
AMOSTRA B
AMOSTRA C
AMOSTRA D
Fonte: as autoras (2018)
Os resultados obtidos em relação à pergunta “qual dessas formas você acha melhor
foram unânimes em relação à amostra B. Além de avaliar B como melhor forma de
sinalização para representar o trecho, NP1 acrescentaria o sinal de escada de forma a
preservar ainda mais a visualidade da cena. O juiz NP2 explicou que a amostra B é mais
“clara” e “combina”, enquanto as demais são impossíveis e engraçadas. Para NP3 a mostra
B é “visual”, e por isso representa melhor o verbo manual. NP4 também destacou a clareza
da realização demonstrada em B.
8
Antes de apresentar as amostras, o trecho em que o menino aparece subindo na árvore foi exibido aos
juízes.
! ! ! ! ! !!!!!!!!!!!!!! !
“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
218!
Para PS1 a melhor amostra é B, mas a necessidade de inserção da
expressão também referenciada pelo corpo (em que o corpo imita a ação).
PS1 concorda com PS2 e, portanto, não avaliou as amostras dadas.
Quanto à realização do verbo manual SUBIR
NAÁRVORE
, houve consenso entre os
juízes para a realização tal qual da amostra B, entretanto, ela foi usada apenas
por dois dos sinalizantes ouvintes. Os outros 3 apresentaram as amostras A, C e
D que são consideradas, segundo os juízes, não claras.
Em relação ao verbo COLOCAR, as amostras apresentadas foram as
seguintes:
Figura 11Amostras
9
para avaliação referência verbo COLOCAR
Fonte: as autoras (2018)
Os resultados obtidos em relação à pergunta “qual dessas formas você
acha melhor”, excetuando-se PS1 que elegeu a amostra D, foram iguais na
escolha da amostra C.
Ainda que a amostra dada em C, segundo NP2, PS2 e PS3, careça de
maior detalhamento, ela foi a preferida pela maioria por apresentar clareza e
“eficiência”, ser “fácil de compreender”, e ser “igual ao vídeo original”. Nas
palavras de um dos participantes:
[Melhor é C porque] o menino pega o cesto com as peras e coloca
na bicicleta. Porque combina com o contexto visual do filme.
Segue uma ordem sintática e classificadores. Deixando o contexto
mais visual.
Participante PS4
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
9
Antes de apresentar as amostras, o trecho do filme da História da Pera em que o menino
aparece colocando a cesta na bicicleta foi exibido aos juízes.
Para PS1 a melhor amostra é B, mas há a necessidade de inserção da expressão
também referenciada pelo corpo (em que o corpo imita a ação).
PS1 concorda com PS2 e, portanto, não avaliou as amostras dadas. Quanto à
realização do verbo manual SUBIR
NAÁRVORE
, houve consenso entre os juízes para a
realização tal qual da amostra B, entretanto, ela foi usada apenas por dois dos sinalizantes
ouvintes. Os outros 3 apresentaram as amostras A, C e D que são consideradas, segundo os
juízes, o claras.
Em relação ao verbo COLOCAR, as amostras apresentadas foram as seguintes:
Figura 11 Amostras
9
para avaliação referência verbo COLOCAR
AMOSTRA A
AMOSTRA B
AMOSTRA C
AMOSTRA D
Fonte: as autoras (2018)
Os resultados obtidos em relação à pergunta “qual dessas formas você acha
melhor”, excetuando-se PS1 que elegeu a amostra D, foram iguais na escolha da amostra
C.
Ainda que a amostra dada em C, segundo NP2, PS2 e PS3, careça de maior
detalhamento, ela foi a preferida pela maioria por apresentar clareza e “eficiência”, ser
“fácil de compreender”, e ser “igual ao vídeo original”. Nas palavras de um dos
participantes:
[Melhor é C porque] o menino pega o cesto com as peras e coloca na
bicicleta. Porque combina com o contexto visual do filme. Segue uma
ordem sintática e classificadores. Deixando o contexto mais visual.
Participante PS4
9
Antes de apresentar as amostras, o trecho do filme da História da Pera em que o menino aparece colocando
a cesta na bicicleta foi exibido aos juízes
! ! ! ! ! !!!!!!!!!!!!!! !
“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
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219!
As justificativas quanto ao fato de a amostra A não ser boa foram as de que
o sinal representa que pega a cesta e solta no chão igual. Parece deixar no chão,
não gostei” (NP1). A justificativa quanto ao fato de a amostra B não ser boa é de
que no vídeo “não fala sobre levantar bike, colocar cesta, nada”. (NP1), e quanto
à D não ser a melhor expressão dá-se em razão de que “não sei por que isso,
parece outro material” (NP1).
No que concerne ao verbo PEGAR, seguem as amostras apresentadas e
as avaliações dadas pelos juízes:
Figura 12Amostras
10
para avaliação referência verbo PEGAR
Fonte: as autoras (2018)
Quadro 1 – Avaliação dos surdos (professores e não professores) quanto a produção dos ouvintes
para o verbo manual PEGAR
PARTICIPANTE
AMOSTRA A
AMOSTRA B
AMOSTRA D
PS2
X
X
PS3
X
PS4
X
X
NP1
X
X
NP2
X
NP3
X
NP4
X
Fonte: as autoras (2018)
A participante NP1 apresentou muita dúvida durante a avaliação devido ao
fato de que para ela a melhor sinalização para esse verbo manual se daria com a
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
10
Antes de apresentar as amostras, o trecho do filme da História da Pera em que o homem
aparece pegando peras foi exibido aos juízes.
As justificativas quanto ao fato de a amostra A não ser boa foram as de que o sinal
representa que pega a cesta e solta no chão igual. Parece deixar no chão, não gostei”
(NP1). A justificativa quanto ao fato de a amostra B não ser boa é de que no vídeo “não
fala sobre levantar bike, colocar cesta, nada. (NP1), e quanto à D o ser a melhor
expressão dá-se em razão de que “não sei por que isso, parece outro material” (NP1).
No que concerne ao verbo PEGAR, seguem as amostras apresentadas e as
avaliações dadas pelos juízes:
Figura 12 Amostras
10
para avaliação referência verbo PEGAR
AMOSTRA A
AMOSTRA B
AMOSTRA C
AMOSTRA D
Fonte: as autoras (2018)
Quadro 1 Avaliação dos surdos (professores e não professores) quanto a produção dos ouvintes
para o verbo manual PEGAR
PARTICIPANTE AMOSTRA A AMOSTRA B AMOSTRA D
PS2 X X
PS3 X
PS4 X X
NP1 X X
NP2 X
NP3 X
NP4 X
Fonte: as autoras (2018)
A participante NP1 apresentou muita dúvida durante a avaliação devido ao fato de
que para ela a melhor sinalização para esse verbo manual se daria com a junção de alguns
tros presentes nas amostras. Para a juíza, a demonstração de PEGAR está melhor
10
Antes de apresentar as amostras, o trecho do filme da História da Pera em que o homem aparece pegando
peras foi exibido aos juízes
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“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
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220!
junção de alguns traços presentes nas amostras. Para a juíza, a demonstração de
PEGAR está melhor evidenciada em A, entretanto, a demonstração de que as
frutas eram colocadas no avental de quem as pegava é importante (e esse traço
aparece na amostra D), mas o movimento realizado na execução do sinal não
está correto:
Tem vários jeitos de pegar, no vídeo original, eu vi que tem um
avental pra colocar as fruta e procurar e pegar fruta e colocar no
avental combina com a resposta D, mas não muito pegando
rápido e direto. [...] A também, mas fez pegar, segurar, esperar e
colocar no avental, eu vi o vídeo original é pegar e colocar no
avental, um por um, o D é direto pegar e colocar. É A ou D. -
Participante NP1
O critério de avalição de NP2 foi a configuração de mão. Para ele, o fato de
o sinalizante fechar os dedos ao final do movimento, como ocorre em A, C e D,
transmite a ideia de que parece destruir a fruta”, enquanto a amostra em B é
mais clara. NP3 vai na mesma esteira e justifica que a B é a melhor amostra por
ser “bom desse jeito que combina com o vídeo original”. O avaliador PS4 também
pensa que essa amostra (e a A também) “combinam, são visuais”.
Para NP4, o critério de avaliação foi a expressão facial. Segundo a juíza,
as demais amostras têm “falta de detalhes”. Para PS1, a falta de expressão em B
e em C comprometeu sua realização, e não escolheu o melhor pois “todos não
são muito claros, não sei qual o melhor deles”. Esses dois pontos, a expressão
facial e a configuração de mão, apareceram também nas considerações dos
avaliadores professores. Para o PS2:
Prefiro D porque usa a cabeça para procurar e depois pegar as
frutas, também B por causa configuração de o, mas falta
procurar, precisa incorporar como se estivesse procurando as
frutas, melhor a B.
Participante PS2
A avaliadora PS3 concorda. Note-se isso pelo uso das palavras destacadas
no excerto:
Acho a letra B boa. Subindo na arvore e retirando as peras com
uma mão e colocando no cesto representado com a outra mão e
olhando para onde estão as frutas.
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“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
221!
Participante PS3
A representação a que a professora se refere pode ser considerada parte
da configuração de mão e a direção do olhar como componente da expressão
facial.
Finalizada esta parte, que reforça e comprova que a produção de verbos
manuais em Libras precisa ser feita com iconicidade, gestualidade e
representatividade para que torne a sinalização mais clara, importa agora dar
resposta a nossa última questão de pesquisa: quais seriam as possíveis
intervenções pedagógicas para o tratamento das produções dos verbos manuais
dos ouvintes?
5. AS PRODUÇÃO DE VERBOS MANUAIS E AS IMPLICAÇÕES
PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO DE LIBRAS COMO L2 PARA OUVINTES
Sem dúvida, a questões da metodologia de ensino em Libras como L2
ainda é uma discussão escassa no Brasil (GESSER, 2010), e as poucas
publicações sobre o assunto ancoram-se nos mesmos pressupostos didáticos de
ensino de línguas orais. Apesar disso, nesta parte do texto, vamos tentar deixar
algumas sugestões de encaminhamentos pedagógicos para o trabalho com o
ensino de Libras a ouvintes, tendo como pano de fundo uma abordagem que
privilegie o discurso e o método comunicativo.
Seguindo os pressupostos de Silva (2018, p. 203) de que “(...) o uso dos
verbos manuais sem a manutenção de sua forma mais icônica (...) pode
representar possíveis defasagens no ensino de Libras como L2, que seriam talvez
corrigidas por meio da formação continuada de professores de Libras”, nossa
primeira recomendação é que a qualificação em serviço seja uma constante na
prática profissional de professores que ministram Libras a ouvintes.
Nessas formações, um dos temas que os professores poderiam ter acesso
é a forma de trabalhar com narrativas durante o ensino de Libras. Isso porque
Scherer et al. (2011), discutindo o processamento de uma segunda língua,
afirmam que “narrativas são utilizadas extensivamente para a comunicação
! ! ! ! ! !!!!!!!!!!!!!! !
“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
222!
humana; tanto a compreensão como a produção oral
11
”. Ora, se a nossa
experiência pode ser influenciada pelo ato de compreender e produzir narrativas,
entende-se que as inventividades metodológicas para o ensino de Libras podem
se dar a partir desse tipo de discurso. Recomenda-se que as produções de
narrativas por aprendizes ouvintes ocorram a partir de input significativo, quer
dizer, de amostras de sinalização fluente.
Uma outra questão a ser considerada é o trabalho explícito com as
características gramaticais da Libras, nos mesmos moldes desenvolvidos por
Neves (2011). A autora trabalhou com a iconicidade, a simultaneidade e o uso de
expressões faciais no ensino da Libras para ouvintes e, comparando o
desempenho no início e no final do curso, percebeu que houve um efetivo
aumento na fluência na língua. Esse é um ponto bastante importante, uma vez
que os avaliadores surdos consideraram a configuração de mão e a expressão
facial componentes fonológicos da Libras no julgamento de melhores
amostras de realização dos verbos manuais. Faz-se também importante fomentar
que os alunos realizam incorporação de personagens, que esse recurso de
referenciação foi também considerado na avaliação de melhor produção de
verbos manuais.
Atrelado ao item do trabalho com a iconicidade e a importância para este
artigo, destaca-se também a pesquisa de Puhl e Ferreira (2016), que explicam
que o uso de sinais icônicos no início do processo de ensino pode ajudar o aluno
ouvinte adquirindo Libras como L2 no ciclo de percepção e interpretação da ação,
logo, na compreensão e na produção de verbos manuais – inferimos nós.
Outro item importante que pode ser considerado no ensino de verbos são
as mudanças morfológicas dadas pelas diversas configurações de mão. Nesse
caso, o professor pode trabalhar com vídeos que contenham a presença de um
mesmo verbo produzido com diferentes objetos, de modo que os alunos
apreendam as alternâncias necessárias para a clareza da produção. Por fim,
entendemos também que o feedback é uma importante ferramenta pedagógica
para o trabalho com verbos manuais, que pode chamar a atenção do ouvinte
para tópicos que o atual esforço cognitivo não está demandando.
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11
Oral pode ser, nesse caso, adaptado à sinalizada.
! ! ! ! ! !!!!!!!!!!!!!! !
“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
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223!
Pensamos que a iconicidade, a gestualidade e representatividade precisam
compor a realização de verbos manuais de modo a tornar a sinalização mais clara
e, se esses são componentes da Libras, então são passíveis de serem ensinados
e merecem atenção no trato pedagógico dos docentes que trabalham com
segunda língua.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve como objetivo analisar a produção de verbos manuais
na sinalização de ouvintes sinalizantes de Libras como L2 e, para atingir tal
objetivo, traçamos perguntas de investigação que foram respondidas por meio
dos dados.
Observaram-se na fundamentação teórica os aspectos lexicais e
discursivos que corroboram a formação de verbos manuais, com destaque à
iconicidade, gestualidade e representatividade. Tratamos também da teoria de
análise de erros, que é uma importante abordagem a qual contribuiu para a
identificação dos erros e para a descrição da natureza do processamento da L2
no aprendiz. Ambos os aportes revelam ineditismo na discussão que envolve a
Libras.
Na parte empírica da pesquisa, consideramos as narrativas da História da
Pera que foram sinalizadas por cinco ouvintes sinalizantes de Libras como L2 e,
com isso, trouxemos resposta à primeira pergunta de pesquisa. Concluímos que
os verbos produzidos por esses ouvintes são desprovidos de representatividade e
iconicidade.
Na parte da análise que buscamos responder à pergunta “como as
produções de verbos manuais dos ouvintes sinalizantes de Libras como L2
podem ser explicadas segundo a Teoria de Análise de Erros?”, concluímos tratar-
se de erros intralinguais, ou seja, transferência interna durante a realização dos
sinais.
Os dados advindos da avaliação feita por oito juízes (4 professores e 4 não
professores) possibilitaram-nos responder à terceira pergunta de pesquisa. Com
isso, concluímos que aqueles verbos que apresentam traços de iconicidade,
gestualidade e representatividade são considerados mais claros, eficazes, e
! ! ! ! ! !!!!!!!!!!!!!! !
“Surdez(e(aquisição(de(línguas”(v.(7,(n.(2,(maio-ago.,(2019.(
!
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visuais, ao passo que aqueles em que essas marcas são ausentes são tidos
como estranhos e sem sentido, uma vez que carecem de incorporação,
configuração de mão e expressão facial adequada.
Esses resultados levaram-nos a pensar acerca de como tais defasagens
podem ser sanadas em sala de aula de ensino de Libras como L2 para ouvintes,
ao que respondemos a última pergunta de pesquisa com proposta de formação
continuada a professores, exploração de narrativas, trabalhos com gramática,
iconicidade, inputs significativos e feedbacks durante as aulas.
Sabemos que análise dos dados realizada para este estudo é incipiente,
uma vez que olhou atentamente para apenas 4 amostras de 4 verbos manuais
(ANDAR
DEBICICLETA
, SUBIR
NAÁRVORE
, COLOCAR E PEGAR), contudo, destaca-se
no cenário de estudos sobre o desempenho em uma língua sinalizada, como a
Libras.
Acreditamos que os resultados desta pesquisa possam contribuir com a
linguística das línguas de sinais e da Libras, especificamente no viés da
Linguística Aplicada, uma vez que a noção erros ainda necessita de refinamento
e, neste estudo, eles foram tratados como pistas para tratativas pedagógicas.
Presumimos, também, que por assentar-se no escopo dos estudos com L2,
este trabalho contribua com as áreas que tratam da aquisição e do ensino da
Libras por ouvintes, sobretudo, o processamento de uma língua de modalidade
espaço visual.
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