“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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Xavier (2014, 2016). Em razão de os dados aqui analisados consistirem em
produções de três sinalizantes surdos com idade entre 16 e 17 anos, o presente
estudo objetiva, ao realizar essa comparação, verificar também se a diferença
etária entre os dois grupos tem alguma influência na manifestação na variação no
número de mãos motivada pela coarticulação. Precisamente, a presente pesquisa
pretende testar as hipóteses mencionadas na seção anterior, mas aqui repetidas
para conveniência do leitor:
1. A variação no número de mãos dos sinais PRECISAR, QUERER
e decorrem da coarticulação com o número de mãos do sinal
anterior e/ou posterior;
2. A influência (coarticulação) do número de mãos do sinal anterior
e/ou posterior é afetada pelo aumento na taxa de sinalização;
3. Sinalizantes mais jovens apresentam comportamentos diferentes
em relação aos mais velhos em relação à coarticulação no número
de mãos.
3. METODOLOGIA
Dados
2
Além dos dados analisados nos trabalhos de 2014 e 2016, Xavier coletou
de três sujeitos com idade entre 16 e 17 anos produções de quatro enunciados
com o sinal PRECISAR, quatro com QUERER e sete com JÁ, repetidos cinco
vezes em duas taxas, normal e rápida. Cabe lembrar que esses enunciados
foram produzidos em meio a 10 enunciados distratores, desconsiderados neste
trabalho. Embora fossem esperadas 450 produções, alguns enunciados não
foram realizados pelos participantes, o que reduziu esse número para 427.
2
Os dados aqui analisados foram coletados durante a realização da pesquisa de doutoramento de
Xavier, intitulada “Uma ou duas? Eis a questão! Um estudo do parâmetro número de mãos na
produção de sinais da língua brasileira de sinais (libras)”. Todos os sujeitos que participaram do
estudo assinaram um termo de consentimento esclarecido, traduzido para a libras. Os sujeitos
menores de idade na época tiveram seu respectivo termo assinado pelos pais.
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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Sujeitos
Os dados aqui analisados foram coletados de três sinalizantes surdos: um
homem (JM) e duas mulheres (VT e MC). Todos nasceram de pais ouvintes,
adquiriram a libras na escola de surdos entre 4 e 7 anos de idade, através da
interação com outras crianças surdas. A idade dos sujeitos quando da realização
do experimento variou entre 16 e 17 anos. VT nasceu na cidade de São Paulo e
residia nessa cidade até o momento de sua participação no estudo. JM e VT não
nasceram na cidade de São Paulo. Embora tenham nascido, respectivamente,
em Recife, PE, e Belo Horizonte, MG, se mudaram para São Paulo ainda muito
pequenas (JM com 1 ano e MC com 3 anos) e, residiam lá até o momento de sua
participação no experimento. JM e VT reportam que conseguem articular a fala e
ler lábios bem e MC, pouco. Todos estavam no último ano do ensino médio e
todos os sujeitos reportaram ter contato com outros surdos e muito contato entre
si.
Análise
A análise dos dados se deu por meio do Elan, software livre que permitiu a
delimitação dos enunciados, ou seja, o estabelecimento de seu início e de seu
fim. Seguindo os critérios discutidos em Xavier, Tkachman e Gick (2015), essa
delimitação considerou como início de cada enunciado o primeiro frame em que a
mão e/ou o antebraço move(m)-se saindo do repouso e como seu fim o frame
anterior àquele em que a mão e/ou o antebraço aparece(m) movendo-se em
direção ao repouso. Com isso, obteve-se a duração de todos os enunciados
produzidos tanto na taxa normal, quanto na rápida. Esses valores foram
submetidos ao teste estatístico Mann-Whitney (α=0,5), com o objetivo de checar
se realmente os participantes atenderam à solicitação de Xavier, aumentando sua
taxa de sinalização na segunda sessão.
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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4. RESULTADOS
Como dito anteriormente, este trabalho objetivou testar três hipóteses. A
primeira delas diz respeito à possibilidade de explicar a realização com uma ou
duas mãos dos sinais PRECISAR, QUERER e pela coarticulação, ou seja,
pela antecipação ou perseveração do número de mãos dos sinais seguinte ou
anterior, respectivamente. Essa hipótese parece se confirmar nos dados
apresentados na figura 2.
Figura 2 – Produções de JM em que o contexto determina o número de mãos com que o sinal
QUERER é realizado. Em (a), entre sinais monomanuais, com uma mão; em (b), entre sinais
bimanuais, com duas mãos.
ANÁLISE
A análise dos dados se deu por meio do Elan, software livre que permitiu a
delimitação dos enunciados, ou seja, o estabelecimento de seu início e de seu fim. Seguindo
os critérios discutidos em Xavier, Tkachman e Gick (2015), essa delimitação considerou
como início de cada enunciado o primeiro frame em que a mão e/ou o antebraço move(m)-se
saindo do repouso e como seu fim o frame anterior àquele em que a mão e/ou o antebraço
aparece(m) movendo-se em direção ao repouso. Com isso, obteve-se a duração de todos os
enunciados produzidos tanto na taxa normal, quanto na rápida. Esses valores foram
submetidos ao teste estatístico Mann-Whitney (α=0,5), com o objetivo de checar se realmente
os participantes atenderam à solicitação de Xavier, aumentando sua taxa de sinalização na
segunda sessão.
4. RESULTADOS
Como dito anteriormente, este trabalho objetivou testar três hipóteses. A primeira
delas diz respeito à possibilidade de explicar a realização com uma ou duas mãos dos sinais
PRECISAR, QUERER e pela coarticulação, ou seja, pela antecipação ou perseveração do
número de mãos dos sinais seguinte ou anterior, respectivamente. Essa hipótese parece se
confirmar nos dados apresentados na figura 2.
Figura 2 Produções de JM em que o contexto determina o número de mãos com que o sinal QUERER é
realizado. Em (a), entre sinais monomanuais, com uma mão; em (b), entre sinais bimanuais, com duas mãos.
EU QUERER VIAJAR EUROPA
(a)
FAMÍLIA QUERER MUDAR EUROPA
(b)
Fonte: Produzida pelos autores.
Fonte: Produzida pelos autores.
A segunda hipótese diz respeito à possibilidade de a coarticulação ser
desencadeada ou potencializada pelo aumento da taxa de sinalização. Para
verificar se, de fato, os sujeitos aumentaram a taxa de sinalização ao produzirem
os dados da segunda sessão do experimento de Xavier (2014, 2016), as
durações dessas produções foram comparadas com as produções da primeira
sessão através do teste estatístico Mann-Whitney (α=0,5). Os resultados, tanto
por sujeito, quanto em conjunto, indicam que uma diferença duracional entre
os dois conjuntos de dados (W = 1434.5, p= 0.003281), o que permite considerar
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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o aumento da taxa como fator responsável pelo desencadeamento ou possível
aumento de coarticulação em algumas produções. Esse parece ser o caso da
realização do sinal PRECISAR por JM (Figura 3). Embora na taxa normal e em
contexto favorável à variante monomanual (1_1) esse sinal tenha sido produzido
pelo referido sujeito com duas mãos (3a), na taxa rápida ele foi realizado no
mesmo contexto com uma mão (3b).
Figura 3 – Produções de JM em que o aumento da taxa influencia o número de mãos com que o
sinal PRECISAR é realizado. Em (a), entre sinais monomanuais e na taxa normal, com duas
mãos. Em (b), no mesmo contexto, mas na taxa rápida, com uma mão.
A segunda hipótese diz respeito à possibilidade de a coarticulação ser desencadeada
ou potencializada pelo aumento da taxa de sinalização. Para verificar se, de fato, os sujeitos
aumentaram a taxa de sinalização ao produzirem os dados da segunda sessão do experimento
de Xavier (2014, 2016), as durações dessas produções foram comparadas com as produções
da primeira sessão através do teste estatístico Mann-Whitney (α=0,5). Os resultados, tanto
por sujeito, quanto em conjunto, indicam que há uma diferença duracional entre os dois
conjuntos de dados (W = 1434.5, p= 0.003281), o que permite considerar o aumento da taxa
como fator responsável pelo desencadeamento ou possível aumento de coarticulação em
algumas produções. Esse parece ser o caso da realização do sinal PRECISAR por JM (Figura
3). Embora na taxa normal e em contexto favorável à variante monomanual (1_1) esse sinal
tenha sido produzido pelo referido sujeito com duas mãos (3a), na taxa rápida ele foi
realizado no mesmo contexto com uma mão (3b).
Figura 3 Produções de JM em que o aumento da taxa influencia o número de mãos com que o sinal
PRECISAR é realizado. Em (a), entre sinais monomanuais e na taxa normal, com duas mãos. Em (b), no
mesmo contexto, mas na taxa rápida, com uma mão.
EU PRECISAR VIAJAR EUROPA
(a)
EU PRECISAR VIAJAR EUROPA
(b)
Fonte: Produzida pelos autores.
A terceira hipótese a ser testada neste trabalho se vincula à possível influência da
faixa etária na ocorrência ou não de coarticulação envolvendo o número de mãos. A testagem
dessa hipótese depende, primeiramente, de uma caracterização das produções de cada sujeito
aqui analisado, para posterior comparação com os resultados de Xavier (2014, 2016).
Fonte: Produzida pelos autores.
A terceira hipótese a ser testada neste trabalho se vincula à possível
influência da faixa etária na ocorrência ou não de coarticulação envolvendo o
número de mãos. A testagem dessa hipótese depende, primeiramente, de uma
caracterização das produções de cada sujeito aqui analisado, para posterior
comparação com os resultados de Xavier (2014, 2016).
JM
A análise das produções de JM dos enunciados contendo o sinal
PRECISAR revelaram quase absoluta falta de sensibilidade ao contexto. Como
se vê na figura 4, com exceção de uma única produção na taxa rápida em
contexto favorável à variante monomanual (1_1), o sujeito realizou o sinal em
questão sempre com duas mãos nas duas taxas em todos os contextos. Diante
desse resultado, pode-se concluir que, para JM, nem o contexto nem o aumento
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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na taxa influenciaram significativamente a variação no número de mãos do sinal
PRECISAR.
Figura 4 Frequência das variantes mono e bimanual do sinal PRECISAR produzidas por JM nas
taxas normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
JM apresentou um pouco mais de sensibilidade ao contexto nas produções
do sinal QUERER, que o realizou na taxa normal com uma mão, ainda que
poucas vezes, em dois dos três contextos em que isso era esperado: 1_1 e 2_1
(Figura 5a). O aumento da taxa, por sua vez, afetou pouco o primeiro contexto e
anulou a influência do sinal posterior nas produções do segundo, uma vez que
apenas a variante bimanual foi empregada (Figura 5b).
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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Figura 5 Frequência das variantes mono e bimanual do sinal QUERER produzidas por JM nas
taxas normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
A sensibilidade ao contexto se mostrou maior nas produções envolvendo o
sinal JÁ. Como mostram os gráficos na figura 6, nos contextos em que a variante
bimanual desse sinal era esperada (a-f) ela foi predominante na taxa normal (6a)
e, aumentada em dois contextos ‘c’ e ‘f’ na taxa rápida. Interessantemente, no
contexto ‘g’, que favorece a variante monomanual, observa-se que sua alta
frequência na taxa normal decresce na taxa rápida.
Figura 6 Frequência das variantes mono e bimanual do sinal JÁ produzidas por JM nas taxas
normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
VT
Como mostram os gráficos nas figuras 7 e 8, VT não apresentou
sensibilidade nem ao contexto nem ao aumento na taxa de sinalização tanto nas
produções envolvendo o sinal PRECISAR, quanto nas produções envolvendo o
sinal QUERER. Em ambas as situações, foi empregada apenas a variante
bimanual dos sinais em questão.
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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Figura 7Frequência das variantes mono e bimanual do sinal PRECISAR produzidas por VT nas
taxas normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
Figura 8 – Frequência das variantes mono e bimanual do sinal QUERER produzidas por VT nas
taxas normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
Observou-se variação no número de mãos motivada pelo contexto apenas
nas produções dos enunciados contendo o sinal JÁ. Conforme se pode ver nos
exemplos a seguir, o sinal em questão foi produzido com uma mão no contexto
que favorecia a variante monomanual, 1_1 (Figura 9a), e com duas no contexto
que favorecia a variante bimanual, 2_2 (Figura 9b).
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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Figura 9 Produções de VT em que o contexto influencia a realização do sinal JÁ. Em (a), entre
sinais monomanuais e na taxa normal, com uma mão. Em (b), entre sinais bimanuais e na taxa
normal, com duas mãos.
Figura 8 Frequência das variantes mono e bimanual do sinal QUERER produzidas por VT nas taxas normal
(a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
Observou-se variação no número de mãos motivada pelo contexto apenas nas
produções dos enunciados contendo o sinal JÁ. Conforme se pode ver nos exemplos a seguir,
o sinal em questão foi produzido com uma mão no contexto que favorecia a variante
monomanual, 1_1 (Figura 9a), e com duas no contexto que favorecia a variante bimanual,
2_2 (Figura 9b).
Figura 9 – Produções de VT em que o contexto influencia a realização do sinal JÁ. Em (a), entre sinais
monomanuais e na taxa normal, com uma mão. Em (b), entre sinais bimanuais e na taxa normal, com duas
mãos.
PIMENTA EU COMER
(a)
FESTA FAMÍLIA DIVULGAR
(b)
Fonte: Produzida pelos autores.
Fonte: Produzida pelos autores.
Como mostra o gráfico em 10, apesar da geral predominância da variante
monomanual do sinal JÁ e da exclusividade desta no contexto em que era
esperada (1_1), a variante bimanual ocorreu em contextos que a favoreceram em
ambas as taxas. A comparação entre as produções nas diferentes taxas,
entretanto, indica que seu aumento não afetou de forma significativa a influência
do número de mãos dos sinais adjacentes sobre o sinal JÁ.
Figura 10Frequência das variantes mono e bimanual do sinal JÁ produzidas por VT nas taxas
normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
138
MC
Assim como nas produções de VT envolvendo os sinais PRECISAR e
QUERER, MC não apresentou sensibilidade nem ao contexto nem ao aumento
na taxa de sinalização. Como mostram os gráficos nas figuras 11 e 12, em ambas
as situações, foi empregada apenas a variante bimanual dos sinais em questão.
Figura 11 – Frequência das variantes mono e bimanual do sinal PRECISAR produzidas por MC
nas taxas normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
Figura 12 – Frequência das variantes mono e bimanual do sinal QUERER produzidas por MC nas
taxas normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
A variação no número de mãos motivada pelo contexto fonético-fonológico
foi atestada nas produções de MC dos enunciados contendo JÁ. Como se
pode ver no gráfico em 13a, as variantes mono e bimanual ocorrem em contextos
em que elas são favorecidas na taxa normal, com exceção ao contexto em que o
sinal é produzido entre outros realizados com duas mãos (2_2). O aumento na
taxa de sinalização potencializou a influência do sinal seguinte sobre JÁ, dado
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
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que aumentou a frequência da variante bimanual nos contextos que a favoreciam
(Figura 13b).
Figura 13 – Frequência das variantes mono e bimanual do sinal JÁ produzidas por MC nas taxas
normal (a) e rápida (b) em diferentes contextos
(a) (b)
Fonte: Produzida pelos autores.
Isso é ilustrado pelos exemplos em 14, no qual se vê, na taxa normal, o
sinal sendo produzido com uma mão, apesar de ser seguido pelo sinal
bimanual ENSINAR (Figura 14a), e, com o aumento da taxa, sendo realizado com
duas mãos, por influência desse sinal (Figura 14b).
Figura 14 Produções de MC em que o aumento na taxa de sinalização influencia a realização do
sinal JÁ com duas mãos. Em (a), na taxa normal, mesmo seguido do sinal bimanual ENSINAR, é
produzido com uma mão. Em (b), no mesmo contexto, mas na taxa rápida, é articulado com duas
mãos.
Figura 14 Produções de MC em que o aumento na taxa de sinalização influencia a realização do sinal JÁ com
duas mãos. Em (a), na taxa normal, mesmo seguido do sinal bimanual ENSINAR, é produzido com uma mão.
Em (b), no mesmo contexto, mas na taxa rápida, é articulado com duas mãos.
CAMINHO EU
5
ENSINAR
(a)
CAMINHO EU ENSINAR
(b)
Fonte: Produzida pelos autores.
COMPARAÇÃO COM OS SUJEITOS ANALISADOS POR XAVIER (2014, 2016)
Conforme se pode concluir a partir da comparação dos quadros 2 e 3, de maneira
geral, os sujeitos aqui analisados não diferiram muito dos analisados por Xavier (2014, 2016)
em relação aos sinais PRECISAR e QUERER, pois majoritária ou unicamente os produziram
com duas mãos, não exibindo, assim, sensibilidade nem ao contexto nem ao aumento na taxa
de sinalização. Já em relação ao sinal JÁ, observa-se que JM e VT se assemelham a MM, AD
e ML do estudo de Xavier, quando produziram tal sinal na taxa normal. Entretanto, JM e VT
diferem destes, por não terem apresentado qualquer impacto significativo na coarticulação
com o aumento da taxa de sinalização. MC, por sua vez, se assemelha mais à BL do estudo
de Xavier por coarticular em todos os contextos, ainda que o tenha feito em menor grau, e por
apresentar aumento da coarticulação com o aumento na taxa de sinalização. Sendo assim, a
terceira hipótese deste trabalho não se confirma, uma vez que os grupos pertencentes a
diferentes faixas etárias não parecem divergir entre si.
5
A mão não-dominante está realizando uma parte do sinal CAMINHO, fenômeno denominado como
perseveração (XAVIER, 2014).
Fonte: Produzida pelos autores.
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
140
5. COMPARAÇÃO COM OS SUJEITOS ANALISADOS POR XAVIER (2014,
2016)
Conforme se pode concluir a partir da comparação dos quadros 2 e 3, de
maneira geral, os sujeitos aqui analisados não diferiram muito dos analisados por
Xavier (2014, 2016) em relação aos sinais PRECISAR e QUERER, pois
majoritária ou unicamente os produziram com duas mãos, não exibindo, assim,
sensibilidade nem ao contexto nem ao aumento na taxa de sinalização. em
relação ao sinal JÁ, observa-se que JM e VT se assemelham a MM, AD e ML do
estudo de Xavier, quando produziram tal sinal na taxa normal. Entretanto, JM e
VT diferem destes, por não terem apresentado qualquer impacto significativo na
coarticulação com o aumento da taxa de sinalização. MC, por sua vez, se
assemelha mais à BL do estudo de Xavier por coarticular em todos os contextos,
ainda que o tenha feito em menor grau, e por apresentar aumento da
coarticulação com o aumento na taxa de sinalização. Sendo assim, a terceira
hipótese deste trabalho não se confirma, uma vez que os grupos pertencentes a
diferentes faixas etárias não parecem divergir entre si.
Quadro 3 – Sumário das produções dos sujeitos JM, VT e MC
SUJEITO
PRECISAR
QUERER
Normal
Rápida
JM
Duas mãos
(predominantemente)
Duas mãos
(predominantemente)
Coarticulou
expressivamente
em quase todos
os contextos
Coarticulação não
aumentou
expressivamente
VT
Duas mãos
Duas mãos
Coarticulou em
todos os
contextos de
forma moderada
na maioria deles
Coarticulação não
aumentou
expressivamente
MC
Duas mãos
Duas mãos
Coarticulou em
todos os
contextos de
forma moderada
na maioria deles
Coarticulação
aumentou
expressivamente
Fonte: Produzido pelos autores
xxx
Sem variação
Variação por coarticulação
Hipótese não se verificou
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
141
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Xavier (2014, 2016) analisou a variação no número de mãos em sinais da
libras e testou se ela pode ser, em alguma medida, explicada pela influência do
contexto fonético-fonológico em que são produzidos, referida pelo autor como
coarticulação. A partir dos resultados desse trabalho e de dados coletados pelo
autor, mas até então não analisados por ele, este estudo objetivou testar três
hipóteses, a saber, (1) A variação no número de mãos dos sinais PRECISAR,
QUERER e JÁ decorrem da coarticulação com o número de mãos do sinal
anterior e/ou posterior; (2) A influência (coarticulação) do número de mãos do
sinal anterior e/ou posterior é afetada pelo aumento na taxa de sinalização; (3)
Sinalizantes mais jovens apresentam comportamentos diferentes em relação à
coarticulação no número de mãos, quando comparados a sinalizantes mais
velhos.
Como discutido na seção sobre procedimentos metodológicos, foram
analisados dados de três sujeitos surdos com idade entre 16 e 17 anos. A análise
desses dados se deu por meio do software livre Elan, que permitiu sua
segmentação e, consequentemente, sua duração nas duas taxas.
Os resultados não confirmaram as hipóteses (1) e (2) para as produções
dos sinais PRECISAR e QUERER, pelos três sujeitos. Em graus variados, a
hipótese (1) se confirmou para as produções do sinal pelos três sujeitos, mas
a hipótese (2) se confirmou para apenas um deles. Por fim, em relação à
hipótese (3), observou-se que ela não se confirmou, uma vez que as produções
dos sujeitos aqui analisados se assemelharam às daqueles analisados por
Xavier.
O diferente comportamento dos sujeitos em relação aos sinais analisados
pode indicar, assim como nos achados de Lucas et al. (2001) sobre a assimilação
na ASL, que a categoria gramatical tem peso na ocorrência ou não desse
processo. Isso parece explicar porque PRECISAR e QUERER, modalizadores,
apresentaram pouca ou nenhuma sensibilidade ao contexto, em comparação a
JÁ, pelo menos nos casos analisados, marcador de perfectividade verbal.
“Surdez e aquisição de línguas” v. 7, n. 2, maio-ago., 2019.
142
Por fim, cabe dizer que estudos como o reportado neste trabalho são de
grande importância para um melhor entendimento da gramática da libras, que
embasarão o desenvolvimento de métodos e materiais didáticos para o seu
ensino tanto como L1 para surdos, quanto como L2 para ouvintes.
REFERÊNCIAS
LUCAS, Ceil; et al. Sociolinguistic variation in American Sign Language.
Washington, DC: Gallaudet University Press, 2001.
KÜHNERT, B.; NOLAN, F. The Origin of Coarticulation. In: HARDCASTLE, W. J.;
HEWLETT, N. (Org.) Coarticulation. Theory, Data and Techniques. Cambridge:
Cambridge University Press, 1999. p. 7-30.
STOKOE, W. Sign Language Structure: An Outline of the Visual Communication
Systems of the American Deaf”. Studies in Linguistics: Occasional Papers, 8,
Washington, DC: Gallaudet University Press, 1960.
XAVIER, A. N. A variação na produção de sinais da Libras à luz da Fonologia
Gestual. Gradus: revista brasileira de fonologia de laboratório, v.1, p. 96-125,
2016.
XAVIER, A. N. Uma ou duas? Eis a questão! Um estudo do parâmetro
número de mãos na produção de sinais da língua brasileira de sinais
(libras). 2014. 146 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Instituto de Estudos da
Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.
XAVIER, A. N.; BARBOSA, F. V. Variabilidade e estabilidade na produção de
sinais da libras. Domínios da Lingu@gem, v. 11, p. 983, 2017.
XAVIER, A. N.; TKACHMAN, O.; GICK, B. Towards convergence of methods for
speech and sign segmentation. In: ACOUSTIC WEEK IN CANADA, 2015, Hallifax.
Proceedings..., Halifax: 2015.
XAVIER, A. N.; BARBOSA, P. A. Diferentes pronúncias em uma língua não
sonora? Um estudo da variação na produção de sinais da Libras, D.E.L.T.A, v.
30, n. 2, p. 371-413, 2014.