Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava
imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de todos. Camilo teve
medo, e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as visitas à casa de
Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que o motivo era
uma paixão frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências
prolongaram-se, e as visitas cessaram inteiramente. Pode ser que entrasse
também nisso um pouco de amor-próprio, uma intenção de diminuir os
obséquios do marido, para tornar menos dura a aleivosia do ato (ASSIS,
2016 p. 379).
Assim como as alucinações de José compreende como ponto de partida a visão de
João na roda com Juliana, o abatimento de Camilo se inicia no momento em que recebe a
carta anônima. Na perspectiva cronológica do conto, as aflições de Camilo preservam-se
por um tempo indeterminado (semanas, meses?) até que a personagem recebe um bilhete
de Vilela com os seguintes dizeres: “Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem
demora.” (ASSIS, 2016, p. 380).
Essas poucas palavras escritas afirmam e confirmam a engenhosidade dos textos de
Machado. É pertinente observar que a leitura de A cartomante exige um alto grau de
sensibilidade do leitor e isso se faz necessário para a compreensão do turbilhão de
pensamentos que invadiram a mente de Camilo ao receber tal bilhete.
Diante disso, o narrador anota que
Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, advertiu que teria sido
mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava
matéria especial, e a letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe
trêmula. Ele combinou todas essas cousas com a notícia da véspera
(ASSIS, 2015, p. 380).
Diante dessa narração, é conveniente constatar que as observações de Camilo, (o
motivo de Vilella chama-lo em casa, a letra trêmula) estão atreladas à ligação amorosa
entre a personagem e Rita. O próprio Camilo adota sentimentos temerários que convergem
com o horror da possível descoberta da traição de Rita pelo marido.
Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e
lacrimosa, Vilela indignado, pegando da pena e escrevendo o bilhete,
certo de que ele acudiria, e esperando-o para matá-lo. Camilo estremeceu,
tinha medo: depois sorriu amarelo, e em todo caso repugnava-lhe a idéia
de recuar, e foi andando. De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia
achar algum recado de Rita, que lhe explicasse tudo. Não achou nada,
nem ninguém. Voltou à rua, e a idéia de estarem descobertos parecia-lhe
cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da
própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser que Vilela conhecesse
agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente,