OLDONI, C.; FREITAS, C. E. Em preto e branco: saudade e nostalgia nos gêneros
multimodais. Revista Diálogos (RevDia), “Edição comemorativa pelo Qualis B2”, v. 6,
n. 2, mai.-ago., 2018.
EM PRETO E BRANCO
Saudade e nostalgia nos gêneros multimodais
En blanco y negro: anhelo y nostalgia en los géneros multimodales
Cristiano Oldoni (UFFS)
1
Ernani César de Freitas (UPF)
2
1
Docente da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS); Doutorando em Letras
pela Universidade de Passo Fundo (UPF). cristianooldoni@gmail.com
2
Doutor em Letras (PUCRS), com pós-doutorado em Linguística Aplicada e Estudos da
Linguagem (PUCSP/LAEL); professor permanente do PPGL/UPF. ecesar@upf.br
RESUMO: A construção dos sentidos projetados pelos textos de gêneros multimodais
está intimamente relacionada com o reconhecimento dos sofisticados recursos e
associações intersemióticas mobilizadas na construção do texto. Nesses gêneros, a
compreensão da discursivização de elementos da memória humana a exemplo da
saudade e da nostalgia requer o resgate de projeções pontuais por meio de
procedimentos metodológicos específicos, como propomos neste breve estudo. Para
alcançar o objetivo de identificar a forma de semantização de tais elementos em
ocorrências discursivas intersemióticas, tendo o preto e branco como forma cromática
fundante da construção textual, temos como inspiração as contribuições de Lemke
(2010), Cope e Kalantzis (2000), Jankélévitch (1974) e Lourenço (1999), na base
teórica. A análise aponta para as decisivas colaborações que as intersemioses e a
forma cromática específica analisada dão para a concretude de determinados aspectos
da memória.
PALAVRAS-CHAVE: Gêneros multimodais; Preto e branco; Saudade; Nostalgia;
Sentido.
RESUMEN: La construcción de los sentidos diseñados por los textos de géneros
multimodales está estrechamente relacionada con el reconocimiento de los
sofisticados recursos y asociaciones intersemióticas utilizadas en la construcción del
texto. En eses géneros, la comprensión de la forma como se discursivizan los
elementos de la memoria humana a ejemplo del anhelo, de la nostalgia requiere el
rescate de proyecciones puntuales por medio de procedimientos específicos, como
proponemos en ese estudio. Para alcanzar el objetivo de identificar la forma de
semantización de los elementos citados en ocurrencias discursivas intersemióticas,
considerando el blanco y negro como forma cromática fundamental de la construcción
textual, tenemos como inspiración las contribuciones de Lemke (2010), Cope y
Kalantzis (2000), Jankélévitch (1974) y Lourenço (1999), en el basamento teórico. El
análisis apunta para las decisivas colaboraciones que las intersemioses y la forma
cromática específica analizada dan a la concreción de determinados aspectos de la
memoria.
PALABRAS CLAVE: Géneros multimodales; Blanco y negro; Anhelo; Nostalgia;
Sentido.
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O homem sentiu sempre e os poetas frequentemente cantaram o
poder fundador da palavra, que instaura uma realidade imaginária,
anima as coisas inerentes, faz ver o que ainda não existe, traz de volta
o que desapareceu. É por isso que tantas mitologias, tendo de explicar
que no início dos tempos alguma coisa pôde nascer do nada,
propuseram como princípio criador do mundo essa essência imaterial e
soberana, a Palavra. Não existe realmente poder mais alto, e todos os
poderes do homem, sem exceção, decorrem desse. (BENVENISTE, 1991)
É atraente a ideia de que, por meio do poder essencial da
linguagem, podemos instituir ou renovar a realidade, e, em especial,
fazer ressurgir tudo aquilo que houve, transcorreu, marcou a
trajetória de um povo ou mesmo possivelmente com o mesmo valor
algumas vivências particulares, de teor amplamente subjetivo.
Entretanto, se Benveniste (1991), na epígrafe deste texto, atribui à
palavra o absoluto poder de criação do mundo, as contemporâneas
técnicas e tecnologias que permitem a renovação e remodelagem dos
gêneros discursivos permitem-nos a inferência de que esse prestígio é
extensivo a outras mídias, como representações sígnicas imagéticas e
sonoras, difundidas e perpetuadas pelas intersemioses e pela
incontestável cibercultura.
Parece-nos, assim, incontestável a ideia de que a comunicação
contemporânea encontra sólidos recursos de semantização na
harmonização de planos de sentidos variados. Princípio constante dos
gêneros hipermodernos, essa multiplicidade mostra-se em elementos
como autorreferência, abundância de fontes nas construções
discursivas, alteridade de centros referenciais, além de mecanismos
absolutamente pontuais, como é o caso do emprego de formas
cromáticas na concretização da linguagem intersemiótica.
Nesse cenário específico, a construção de sentidos ultrapassa uma
percepção estética e vincula-se intimamente com uma ideia global de
integração em que são valorizados e enobrecidos fragmentos da
memória em sentido estrito de reminiscência, lembrança,
rememoração postos lado a lado com o presente vivido em inéditas e
incessantes construções perceptíveis a cada nova ação comunicativa. É
considerando essa perspectiva que, no presente artigo, temos como
questão norteadora o princípio de que por meio das associações de
planos variados, os mais plurais sentidos são construídos em gêneros
multimodais, inclusive na discursivização de elementos da memória,
como a saudade e a nostalgia. A partir dessas demarcações referenciais,
objetivamos identificar a forma de semantização de tais elementos em
ocorrências discursivas intersemióticas, tendo o preto e branco como
forma cromática fundante dessa construção.
O estudo aqui apresentado envolve pesquisa qualitativa com
abordagem bibliográfica na análise de corpora, composto por um
videoclipe musical, uma postagem em rede social e uma capa de revista
e aponta para as decisivas colaborações que as intersemioses e a forma
cromática específica que nos dispomos a analisar dão concretude a
determinados aspectos da memória. Por isso, o base de nossa
discussão as contribuições de Jankélévitch (1974) e Lourenço (1999)
acerca da saudade e da nostalgia; também representam forte inspiração
as considerações de Lemke (2010) e de Cope e Kalantzis (2000) sobre