POLÍTICA MONETÁRIA E TAXA BÁSICA DE JUROS NO BRASIL: UMA ANÁLISE DO PAPEL DAS TAXAS DE JUROS EM UM REGIME DE METAS DE INFLAÇÃO

Djanira Leandro1; José Antonio Nunes de Souza2; Francisco Danilo da Silva Ferreira3; Vinícius Rodrigues Vieira Fernandes4.
1 - Economista pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Email: djanira.leandro@gmail.com
2 - Mestre em economia e professor assistente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. Email: joseantonio@uern.br
3 - Mestre em economia e professor assistente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. Email: ffdaniloferreira@gmail.com
4 - Doutor em economia e professor Adjunto do departamento de economia da Universidade Federal de Roraima. Email: vinirvf@gmail.com

Resumo

O presente estudo teve como objetivo geral da pesquisa analisar o papel das taxas de juros na política monetária brasileira após a implantação do regime de metas de inflação. O ponto de partida usado foi a discussão teórica sobre a neutralidade da moeda e do Novo Consenso Macroeconômico. Os dados estatísticos foram coletados junto ao Banco Central e demais órgão oficiais de estatística acerca das taxas de juros, inflação, depósitos compulsórios, redesconto e mercado aberto. Os resultados demonstram que após a adoção do regime de metas de inflação, a política monetária tem sido usada no controle das taxas de inflação tendo a taxa de juros como variável chave. A análise dos dados permitiu ainda observar que as taxas de juros são fixadas conforme o movimento da inflação, sendo elevadas quando a inflação cresce e sendo reduzidas quando a inflação recua, e que as regras estabelecidas dentro de um regime de metas de inflação favorecem a confiança dos agentes econômicos na condução da política monetária.

Palavras-chaves: Taxa de juros básica; Meta de inflação; Instrumentos de política monetária.


MONETARY POLICY AND BASIC INTEREST RATE IN BRAZIL: AN ANALYSIS OF THE ROLE OF INTEREST RATES IN AN INFLATION TARGET SCHEME


Abstract

The present study aimed to analyze the role of interest rates in Brazilian monetary policy after the implementation of the inflation targeting regime. The starting point was the theoretical discussion about currency neutrality and the New Macroeconomic Consensus. Statistical data were collected from the Central Bank and other official statistical agencies on interest rates, inflation, compulsory deposits, rediscount and open market. The results show that after the adoption of the inflation targeting regime, monetary policy has been used to control inflation rates with the interest rate as the key variable. The analysis of the data also allowed us to observe that interest rates are fixed according to the movement of inflation, being high when inflation increases and being reduced when inflation recovers, and that the rules established within an inflation targeting regime favor confidence of economic agents in the conduct of monetary policy.

Keywords: Basic interest rate; Inflation Target; Monetary policy instruments.

JEL: E5, E52, E58.


1. INTRODUÇÃO

As elevadas taxas de inflação observadas na economia brasileira ao longo da década de 1980 e início da década de 1990 fizeram com que todos os esforços de política econômica se voltassem ao seu combate. Observou-se neste período, uma sucessão de planos econômicos que falharam no combate à inflação, até que a implantação do plano real em 1994 obteve êxito na redução das elevadas taxas de inflação (GIAMBIAGI,2005).

Desde então, mesmo após o êxito do plano real no combate à inflação, a política econômica adotada pelos governos pós-plano real tem colocado a inflação como uma das metas principais de política monetária. Tal meta pode ser observada pelo rígido controle dos instrumentos de política monetária, sobretudo a taxa de juros.

De fato, o controle das taxas de juros tem se colocado como o principal instrumento de política monetária pela autoridade monetária brasileira, a saber, o Banco Central, o qual é o responsável pela execução da política monetária, sobretudo, de manter a estabilidade do poder de compra da moeda (FERRARI FILHO, 1996; NEVES E OREIRO, 2008).

Para alcançar esse objetivo, o controle das taxas de juros tem sido o instrumento mais efetivamente usado pela autoridade monetária.

A adoção do regime de metas inflação adotado em 1999, se consolida a partir de 2003 como instrumento de política monetária liderado pelo controle das taxas de juros (GIAMBIAGI, 2005).

Atualmente a política monetária brasileira tem buscado conduzir suas decisões de taxas de juros avaliando aspectos ligados ao desempenho das variáveis macroeconômicas, mas de forma especial a manutenção da meta de inflação estipulada (NEVES E OREIRO, 2008).

Essa regra de controle das taxas de inflação a partir do ajustamento da taxa de juros básica da economia parte da ideia de que as oscilações no núcleo da inflação se dão por pressões da demanda agregada sob o nível geral de preços da economia. Cabe frisar que o fenômeno da inflação pode ser resultado de um conjunto de fatores, no entanto excluindo-se os efeitos de fatores sazonais, o que interessa é combater os componentes de efeito mais prolongado sobre as taxas de inflação.

Assim, a hipótese desse estudo é que a adoção de um regime de metas de inflação no Brasil, coloca a taxa de juros como variável central na condução da política monetária ao passo que os demais instrumentos clássicos de política monetária foram gradualmente perdendo peso nesse cenário.

Diante do exposto o objetivo geral deste estudo é investigar a importância das taxas de juros no controle inflacionário no Brasil após a adoção do regime de metas de inflação.

A metodologia a ser utilizada será uma análise descritiva das informações acerca da trajetória da inflação e da taxa básica de juros no período proposto, a fim de se verificar a relação entre as oscilações da taxa de inflação frente a política de juros das autoridades monetárias.

A seguir é realizado uma revisão da literatura abordando o novo consenso macroeconômico e o regime de metas de inflação no Brasil, logo após é feita uma análise recente dos principais instrumentos de política monetária no Brasil, em seguida segue os resultados encontrados e as conclusões finais.


2. O NOVO CONSENSO MACROECONÔMICO, O SISTEMA DE METAS DE INFLAÇÃO E A TAXA DE JUROS.

Por novo consenso macroeconômico (NCM) entende-se a síntese da contribuição das diferentes vertentes de pensamento econômico, e que permitiram se chegar a um ponto comum na concepção dos de grande parte dos economistas, acadêmicos e dos bancos centrais acerca da condução da política monetária (AMORIM, 2002; TEIXEIRA E MISIO, 2011).

De forma geral o NCM interpretado a partir da condução da política monetária pode ser entendido como o controle inflacionário se tornando o objetivo único da política monetária (PIZA e DIAS, 2006).

Assim o NCM decorre de um núcleo central da análise macroeconômica que possui pontos aceitos tanto por economistas as autoridades monetárias (Bancos Centrais). Tais pontos são balizados tanto pela neutralidade da moeda no longo prazo e a não-neutralidade no curto prazo (PIZA e DIAS, 2006; AMORIM, 2002).

Ainda dentro da concepção do NCM, Mikhailova e Piper (2012) apontam os elementos que segundo Taylor (1997) seriam os princípios do NCM : 1) No longo prazo o produto é determinado pela função de produção da economia; 2) a curva de Phillips de longo prazo é vertical, não havendo, portanto, relação entre inflação e desemprego no longo período; 3) a curva de Phillips de curto prazo é negativamente inclinada; 4) as expectativas dos agentes reagem às ações de política econômica, tanto fiscal como monetária; e 5) a política econômica deve obedecer a regras, sendo que a política monetária deve ser realizada de acordo com uma função de reação, a qual estabelece a regra como a taxa de juros.

A referida autora conclui que estes princípios tem um forte caráter monetarista, sobretudo acerca da eficácia da política monetária no longo prazo, argumentando que tal efeito se daria sobre o nível de preços. Argumenta ainda que na visão de Taylor a execução da política monetária deveria se dar por (função de reação) monetárias.

Nesta discussão Oreiro e Neves (2008) explicam que a execução de uma política monetária tendo por base o NCM tem como objetivo principal o controle das taxas de inflação, dentro da perspectiva monetarista, que tem a inflação como um fenômeno tipicamente monetário. Os autores explicam ainda que o controle da taxa de juros, a despeito dos demais instrumentos, se torna o principal mecanismo de política monetária utilizados pelos bancos centrais para controlar a inflação no longo prazo, no longo prazo o nível de produto e emprego da economia seria afetado pelos fatores do lado da oferta.

É justamente neste ponto que se insere a discussão do regime de metas de inflação. Na verdade, diante dos autores já citados até o momento e tendo como base as definições de regras de política econômica, pode-se entender o regime de metas de inflação como uma regra monetária, tal como sugerida por Taylor a ser seguida pela autoridade monetária. O regime de metas de inflação consiste tão somente de uma meta oficial de inflação a ser atingida pelo Banco Central, que coordena seus instrumentos de política monetária (principalmente a taxa de juros) neste sentido.

Evidente que essa regra de fixação de taxas de juros e controle inflacionário tem um forte componente de confiança implícito. De fato, na visão de autores tais como Cardim (2007), Neves e Oreiro (2008) para que políticas econômicas dessa natureza tenham efeito esperado, sobretudo no horizonte de longo prazo, é importante que os agentes econômicos tenham confiança nas ações das autoridades monetárias. Ou seja, a credibilidade passada por estas instituições deve ser tal que não confunda as decisões dos agentes, fazendo com que eles venham a seguir na contramão da política adotada.

Dessa forma, a concepção do regime de metas de inflação tem como ponto de apoio os princípios do NCM, atribuindo importância significativa a adoção da política monetária como mecanismo de política econômica, justificando sua utilização pela sua maior flexibilidade e sua neutralidade no longo prazo, mesmo considerando a defasagem de seus efeitos (NEVES E OREIRO, 2008).


2.1 O sistema de Metas de inflação no Brasil

Com a adoção do sistema de metas de inflação no Brasil em junho de 1999, o Conselho Monetário Nacional (CMN) passou a definir um escopo para a variação do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), passando a lidar com as decisões de política monetária do Banco Central (BC) tomadas todos os meses pelo Comitê de Política Monetária (COPOM). “Este toma decisões acerca da taxa Selic (Serviço Especial de Liquidação e Custódia) com base em um modelo no qual a hipótese adotada quanto à taxa de juros e à cotação cambial gera um certo resultado da inflação, nos termos desse modelo” (GIAMBIAGI, 2005).

Em 1990 as crises monetário-cambiais dos países latino-americanos fizeram com que as Autoridades Monetárias passassem a reconsiderar a lógica das políticas de estabilização, se, por um lado, a ancoragem cambial estabelecia a dinâmica inflacionária, por outro, ela passou a ser uma das protagonistas das intensas crises cambiais. Então, algumas Autoridades Monetárias adotaram âncoras nominais como alternativas capazes de assegurar o processo de estabilização inflacionária, sem gerar assimetrias crônicas de balanço de pagamentos (PHILIP ARESTIS ETAL, 2006).

No Brasil em 1994, com a implantação do Plano Real, o governo adotou a política de ancoragem nominal do câmbio, pondo a taxa de câmbio a serviço do combate à inflação. A fixação das taxas de câmbio definiu-se por mostrar menor rigidez, sendo corrigido em curtos períodos de tempo após 1996, conhecido por crawling peg ativo (PHILIP ARESTIS ETAL 2006).

Diversos países desenvolvidos adotaram o regime de metas de inflação tornando-o, uma referência monetária, uma opção bem relevante para os países da América Latina. Uma das condições propostas pelo referido regime, são as regras de rigidez monetária que exigem uma taxa de câmbio flutuante, necessária para equilibrar o setor externo. O regime de metas de inflação foi adotado pelo Brasil em 1999.

Diante da instabilidade econômica e com a possibilidade de uma explosão inflacionária, as Autoridades Monetárias, colocaram em ação, em junho de 1999, o regime de metas de inflação, com o objetivo de manter a inflação sob controle. Ao mesmo tempo, o Banco Central alçou a taxa de juros de curto prazo para organizar o choque da desvalorização cambial. De início, ocorreu uma ligeira valorização da taxa de câmbio e a inflação, apesar de sua ascensão no início de 1999, terminou o ano abaixo de 10% (FERRARI-FILHO et al, 2006).

Segundo o BACEN o regime de metas para a inflação é um regime monetário no qual o Banco Central se compromete a atuar de forma a garantir que a inflação efetiva esteja em linha com uma meta pré-estabelecida, anunciada publicamente. No Brasil a estabilidade de preços foi escolhida como objetivo primordial da política monetária. Assim, a meta para a inflação é definida em termos da variação anual do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do país calculado pelo IBGE, o qual foi escolhido por ser o de maior abrangência, sendo a medida mais adequada para avaliar a evolução do poder aquisitivo da população.

De fato, a maioria dos bancos centrais faz uso da taxa de juros de curto prazo como ferramenta fundamental de política. Desta forma o regime brasileiro de metas de a inflação emprega a taxa básica de juros da economia SELIC (Sistema Especial de Liquidação e Custódia) como utensílio vital de política monetária, equilibrando a taxa de juros no mercado de reservas bancárias. O COPOM (Comitê de Política Monetária) determina a meta para a taxa Selic, e cabe à mesa de operações de mercado aberto do Banco Central condicionar a taxa Selic diariamente próxima à meta.

Conforme disposto pelo Banco Central, COPOM é o órgão do Banco Central, composto pelo seu Presidente e diretores, que definem, a cada 45 dias a SELIC, suas reuniões ocorrem normalmente em dois dias consecutivos e o calendário de reuniões de um ano é publicado até o mês de junho do ano anterior. O Comitê dispõe de um vasto conjunto de informações para fundamentar suas decisões.

As decisões são divulgadas no mesmo dia por meio de Comunicado eletrônica, tendo até seis dias úteis após a reunião para a divulgação das Atas. Ao todo, são oito reuniões ao ano. Definida a taxa SELIC o Banco Central atua diariamente através de operações de mercado aberto, comprando e vendendo títulos públicos federal procurando manter a taxa de juros rente do valor definido em reunião.


3. CONTROLE INFLACIONÁRIO E OPERACIONALIDADE DA POLÍTICA MONETÁRIA

Por política monetária pode-se entender o controle dos agregados monetários por parte da autoridade monetária com a finalidade de atingir determinadas metas e objetivos de política econômica.

Conforme se apontou anteriormente, Oreiro e Neves (2008) colocam que a política monetária baseada no NCM tem como principal objetivo o controle inflacionário, sendo a taxa de juros o mecanismo central. De fato, desde a experiência inflacionária do plano real, o controle inflacionário tem sido o alvo principal da política monetária, tal evidência pode ser inferida, por exemplo, a partir da pesquisa de Modenesi e Modenesi (2012) onde os autores explicitam a rigidez na política monetária brasileira explicando que a manutenção de taxas elevadas de juros podem estar relacionadas a busca da estabilidade monetária.

Para compreender a amplitude dos instrumentos de política monetária e seus efeitos sobre os agregados monetários, sobretudo, a inflação, é necessário elencar cada um e seus possíveis efeitos. Neste caso será tratada a forma como estes instrumentos através da transmissão da política monetária, podem afetar a inflação. Os instrumentos clássicos de política monetária são : os depósitos compulsórios, as operações de mercado aberto (open market) e as taxas de redesconto.

Os depósitos compulsórios conforme explicam Cardim (2007) são depósitos sob a forma de reservas que os bancos devem recolher junto ao Banco Central. Esses depósitos são realizados força de lei podendo ser feitos em espécie ou títulos indicados pelo Banco Central.

Segundo Garcia (1994) as principais funções dos depósitos compulsórios estão ligadas a capacidade de controle da oferta de moeda e de crédito na economia. No primeiro caso, as variações na taxa de compulsórios tem efeito sobre a base monetária, e no segundo caso afeta diretamente a capacidade dos bancos de ampliar volume de credito e, portanto, a moeda em circulação.

Neste caso, se a pretensão da autoridade monetária consiste em um controle mais rígido da oferta de moeda, sobretudo controle de crédito e liquidez ela deve ampliar as alíquotas de depósitos compulsório dos bancos. Caso deseje ampliar a liquidez ela tenderá a reduzir as alíquotas referentes ao depósito compulsório.

A partir de 1999 a economia brasileira passa a adotar o regime de metas de inflação, sinalizando uma forte preocupação na manutenção da estabilidade da moeda. Dentro deste cenário os depósitos compulsórios e a taxa de juros passam a exercer um papel importante na condução da política monetária (POHLMANN e TRICHES, 2008).

Ao longo do tempo, a condução da política monetária em termos de depósitos compulsórios vem mostrando uma redução da utilização desse instrumento. O principal argumento é que o recolhimento compulsório reduz a competitividade do sistema bancário quando se considera o custo que incide sobre os bancos comerciais, bem como as inovações do sistema financeiro (CARDIM, 2007; GARCIA, 1994).

Outro Ponto que pode ser considerado na queda da utilização dos depósitos compulsórios, é a ideia do NCM, que objetiva mais o controle da inflação via taxa de juros e não o controle monetário. Isto decorre da ideia de que os depósitos compulsórios serviriam mais para o controle das reservas bancárias que das taxas de inflação de forma direta (CARDIM, 2007; OREIRO e NEVES, 2008).

No Brasil, a utilização dos depósitos vem seguindo a tendência internacional de perda de importância na condução da política monetária. O gráfico 01 mostra a trajetória das alíquotas do deposito compulsório no Brasil pós plano real. As informações permitem inferir a redução das alíquotas de compulsório no controle dos agregados.

Gráfico 1 - Alíquota de Depósitos Compulsórios no Brasil 1994/2018.

Fonte: Banco Central do Brasil.

Assim, fica evidente a adoção do regime de metas de inflação e centralidade da utilização das taxas de juros no controle monetário, deixaram de dar maior relevância na utilização desse instrumento de política monetária. Nesses termos, é razoável supor que o controle mais rígido das reservas bancárias poderia induzir a uma perda de competitividade do setor bancário frente à outras instituições de créditos nacionais ou internacionais.

Já as operações de redesconto representam um dos instrumentos de política monetária, no qual o Banco Central concede empréstimos acima da taxa exercida no mercado para os bancos comerciais que enfrentam problemas de liquidez podendo ser momentâneos ou não, por exemplo, quando a demanda por recursos depositados não cobre sua escassez. A taxa que é cobrada por esses empréstimos é chamada de taxa de redesconto (CARDIM, 2007).

Originalmente o redesconto foi criado com a finalidade de providenciar recursos para o sistema financeiro em última instância, porém com o passar do tempo e com a criação dos seguros-depósitos ele foi assumindo um papel crível como instrumento de política monetária (SILVA FILHO, 1996).

Ainda segundo o referido autor, as operações de redesconto funcionam dentro do sistema financeiro como uma forma de “válvula de segurança”, sobretudo, para atender insuficiência de liquidez dos bancos, os quais nessas situações tendem a demandar recursos do Banco Central. Estas operações normalmente exercem influência indireta na regulação da oferta de moeda da economia.

Assim como verificado nos depósitos compulsórios, a utilização das operações de redesconto foi amplamente utilizada desde a implantação do plano real até meados de 1998/1999. Após a adoção do regime de metas de inflação em 1999, os dados mostram uma redução significativa das operações de redesconto, o que evidencia que após o comprometimento da autoridade monetária com a meta de inflação a partir de 1999, esse instrumento de política monetária passou a ser menos utilizado dando lugar a utilização em maior grau das taxas de juros.

Gráfico 2 - Operações de redesconto do Banco Central- R$ (milhões).

Fonte: IPEDATA. Banco Central.

Em relação ao redesconto De Holanda Barbosa (1996), Silva filho (1996) diz que o Banco Central pode exercer dois tipos de política:

O BACEN pode usar o redesconto para controlar de forma indireta a oferta monetária. Seu manuseio compõe-se de três elementos (LIMA E DA SILVA, 2010):

Assim mediante o que foi observado as operações de redesconto representam um instrumento de política monetária importante no controle da liquidez e das reservas do sistema financeiro, mas que após 1999 tem sido deixado em segundo plano frente ao uso das taxas de juros e as operações de redesconto, como já se referiu acima.

Finalmente, as operações de mercado aberto (open Market) é um dos instrumentos de política monetária mais amplamente utilizados. Basicamente essas operações se referem a compra e venda de títulos públicos ou privados (não é o caso do Brasil) realizados pelo Banco Central no controle da oferta de moeda (CARDIM, 2007; ROSSETI E LOPES, 1998).

Segundo Lopes da Silva (2010) no curto prazo, as operações de mercado aberto é um dos instrumentos mais importantes para o controle da liquidez das taxas de juros. Para ‘‘enxugar’’ o excesso de moeda em circulação no mercado, o Banco Central atua vendendo títulos públicos, na mesma proporção dos títulos comprados tanto pelos bancos comerciais, quanto pelo público, retirando o excesso de dinheiro em circulação, e contendo assim os meios de pagamento.

O contrário ocorre, quando o Bacen quer aumentar o volume de moeda em circulação. Então compra os títulos e “inunda’’ o mercado com dinheiro, aumentando as reservas bancárias e contribuindo para a expansão monetária. A agilidade dessas operações reduz a volatilidade da taxa de juros fazendo-a flutuar entorno da meta definida.

As estatísticas disponíveis para a utilização das operações de mercado aberto apresentadas no Gráfico 3, mostram como o Banco Central tem usado amplamente esse instrumento no controle das taxas de juros e através destas no controle inflacionário.

Gráfico 3 - Títulos/federais - Operações - Mercado Aberto - fim período - (%).

Fonte: IPEDATA. Banco Central do Brasil.

Diante do exposto, se o Banco Central quer aplicar uma política expansionista, ele atua comprando títulos, aumentando a moeda em circulação, reduzindo os juros e consequentemente aumentando também os investimentos. Porém o oposto corre se ele aplicar uma política restritiva, vendendo os títulos, o Bacen retém mais moeda, aumentando a taxa de juros e reduzindo o investimento.

Assim, fica claro que a adoção do regime de metas inflacionárias juntamente com a ideia do NCM, colocaram mais importância a taxa básica de juros da economia no controle inflacionário, ao passo de os demais instrumento de política monetária foram usados em menor escala.


4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Anteriormente se discutiu a condução da política monetária com base no NCM. Resumidamente tal política consiste na orientação da política monetária focalizada no controle da inflação, usando a taxa de juros para atingir tal objetivo. Agora será discutido como a taxa de juros tem sido usada no controle inflacionário.

Em estudo que trata da rigidez da política monetária Modenesi e Modenesi (2012) argumentam que mesmo após o sucesso alcançado pelo plano real em termos da estabilidade de preços, a política de juros altos tem se mantido ao longo dos anos subsequentes. Os autores explicam ainda que a manutenção de juros demasiadamente elevados representa um alto custo, pelo fato de a política de estabilização de preços não estar associada a outros objetivos macroeconômicos.

O Gráfico 4 apresenta a trajetória da taxa básica de juros (SELIC) fixada pelo COPOM logo após a adoção do regime de metas de inflação.

Gráfico 4 - Taxa básica de Juros (SELIC) - Fixada pelo COPOM - (% a.a.).

Fonte: IPEADATA. Banco Central.

Os dados apresentados permitem observar que a taxa de juros SELIC fixada pelo COPOM se manteve elevada nos períodos iniciais da adoção do regime de metas de inflação. De fato, conforme argumenta Bresser e Nakano (2002) a manutenção de elevadas taxas juros, sobretudo, nos primeiros anos da série analisada conforme o Gráfico 4, se dão em virtude de alguns fatores, dos quais destacam-se: controle da demanda agregada e a busca por fluxos de capitais para as contas externas do balanço de pagamentos.

Barboza (2015) aponta na literatura que, a manutenção de altas taxas de juros tem visões distintas que envolvem fatores como: alta dívida pública, desequilíbrio das contas externas, controle da demanda, variações cambiais, conversibilidade da moeda nacional, etc. No entanto os autores argumentam que a despeito desses fatores a manutenção de altas taxas de juros, observados desde 1999, se deve a mecanismos de transmissão de política monetária parcialmente obstruídos que exigem altas taxas de juros para manter a inflação na meta.

Dentro da ideia do NCM apresentado anteriormente cabe inicialmente explicitar o comportamento da taxa de inflação (IPCA) já nos períodos posteriores a adoção do regime de metas de inflação, conforme apresentado no Gráfico 5.

Gráfico 5 - Trajetória da Inflação - IPCA - (% a.m.) no período de 2000 a 2018.

Fonte: IPEDATA. Banco Central.

Os dados apresentados mostram que a taxa de inflação mensal no Brasil mesmo com significativa oscilação, tem se mantido baixa ao longo do período analisado. Cabe frisar que é justamente no início dos anos 2000 onde já vigorava o regime de metas de inflação que o controle das taxas de juros se torna mais rígido e conforme aponta Barbosa (2015) essas se encontram num patamar bastante elevado quando comparadas com outros países. Mesmo considerando diversas posições acerca da motivação da manutenção das elevadas taxas de juros no Brasil explicadas por Barbosa (2015) e por Bresser e Nakano (2002), a ideia de que a política monetária conduzida sobretudo pelas taxas juros para manter a inflação na meta conforme preconiza o NCM, poderia explicar tal comportamento da inflação.

Uma evidência que pode explicar a situação apontada acima é a comparação da taxa de inflação (IPCA) com as metas de inflação e seus respectivos limites (bandas de flutuação), conforme apresentado no Gráfico 6 abaixo.

Gráfico 6 - Histórico das metas de Inflação (%) e IPCA (%) Brasil, 1999 a 2017.

Fonte: Banco Central.

As informações apresentadas sobre o comportamento da taxa de inflação comparada com a meta estipulada pelo governo e suas respectivas bandas de flutuação, mostram que no período observado, a inflação se manteve dentro dos limites de flutuação a maior parte da série temporal analisada e ultrapassou a meta estipulada justamente em momentos de mais incerteza e recessão econômica. Isso sugere que dentro do regime de metas de inflação e com uma política monetária anunciada, sobretudo com as publicações das atas do COPOM, onde governo tem evita surpreender os agentes econômicos, possibilitando uma melhor previsibilidade aos mesmos, o uso da taxa básica de juros da economia tem se mostrado eficaz em fazer com que a inflação brasileira não se desvie fortemente da meta estipulada pela autoridade monetária.

Dessa forma, a análise do comportamento conjunto da taxa de juros (SELIC) e da inflação (IPCA) dá evidências plausíveis que os dois agregados mantém uma relação direta, ou seja, a medida que a taxa de inflação se reduz, isso dá margem para redução na taxa básica de juros da economia pelo COPOM.

Gráfico 7 - Histórico da Taxa de Juros SELIC (COPOM) e IPCA a.a. (%).

Fonte: IPEADATA. Banco Central.

As informações mostram que a taxa de juros tende a seguir a mesma trajetória da inflação. Assim quando a inflação se eleva a taxa de juros também se eleva, e quando a taxa de inflação se reduz, a taxa de juros da mesma forma apresenta uma redução. Tal evidência traz uma ideia de como a política monetária brasileira tem sido conduzida dentro do contexto do regime de metas de inflação, ou seja, a utilização da taxa de juros como variável principal na manutenção da estabilidade do poder de compra da moeda.

Assim, fica claro que, mesmo tenho a sua disposição outros instrumentos de política monetária, o governo tem priorizado o controle da taxa de juros como variável de controle inflacionário, e que ao definir as regras usadas no regime de inflação espera reduzir as incertezas dos agentes econômicos quanto as expectativas e rumos futuros da economia.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo investigar a importância das taxas de juros no controle inflacionário no Brasil após a adoção do regime de metas de inflação. O ponto de partida da análise foi apresentar a literatura acerca do efeito da política monetária na determinação das variáveis reais da economia.

Assim, dentro de um contexto de neutralidade da política monetária para alteração duradoura nas variáveis reais, O NCM atribui importância significativa a adoção da política monetária como mecanismo de política econômica, justificando sua utilização pela sua maior flexibilidade e sua neutralidade no longo prazo, mesmo considerando a defasagem de seus efeitos.

O regime de metas para a inflação adotado no Brasil em 1999 consiste num regime monetário no qual o Banco Central atua de forma a garantir que a inflação efetiva esteja em linha com uma meta pré-estabelecida pelo COPOM, anunciada publicamente. A estabilidade de preços foi escolhida como objetivo mais importante da política monetária, tendo a taxa de juros como variável chave.

As análise preliminares das estatísticas dos instrumentos clássicos da política monetária (depósitos compulsórios, taxas de redesconto e operações de mercado aberto) mostrou que esses instrumentos, a exceção, das operações de mercado aberto, tem sido utilizados em grau cada vez mais reduzido, sobretudo, quando se compara a taxa básica de juros da economia.

Finalmente, as informações da taxa básica de juros (SELIC- COMPOM) obtidas junto ao Banco Central, mostraram como a taxa de juros tem sido conduzida no sentido de manter a inflação dentro dos limites definidos pela autoridade monetária. Outro ponto importante é que a taxa de juros e a taxa de inflação medida pelo IPCA, seguem a mesma tendência, permitindo concluir em momentos de crescimento da inflação a política monetária se dá no sentido de elevação das taxas de juros, e quando a inflação cai, as taxas de juros são reduzidas pela autoridade monetária. Isso revela forte peso que as taxas de juros têm na condução de uma política monetária que busca a manutenção da estabilidade da moeda, como base do processo de estabilização econômica pós plano real.


REFERÊNCIAS

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