vol.
4, n. 1, Janeiro-Abril/2020
DOI: https://doi.org/10.30781/repad.v4i1.9572
REVISÃO BIBLIOMÉTRICA SOBRE O TÉRMINO
ANTECIPADO DE PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS
Felipe do Amaral Costa
felipeamaralcosta@gmail.com
http://orcid.org/0000-0002-4651-2947
Universidade de Brasília
Brasília, Distrito Federal, Brasil
Carlos Henrique Rocha
http://orcid.org/0000-0002-1143-2058
Universidade de Brasília
Brasília, Distrito Federal, Brasil
RESUMO
As parcerias público-privadas (PPPs)
têm sido uma estratégia adotada por governos de diversos países como uma
alternativa para execução de projetos voltados à área de infraestrutura e
serviços públicos. Embora, seja uma prática consolidada há anos, com diversos
casos exitosos, muitas parceiras são terminadas antes do prazo estipulado em
contrato em função de riscos e incertezas inerentes a esse tipo de arranjo.
Buscou-se com este estudo a realização de uma revisão sistemática da
literatura, com o uso da Teoria do Enfoque Meta Analítico Consolidado (TEMAC),
para analisar a produção bibliográfica sobre o término antecipado das PPPs. As
bases investigadas foram a Web of Science
e Scopus, sendo identificadas
respectivamente 72 e 124 registros relevantes produzidos entre 1991 e 2019. Os
resultados indicam uma relação intrínseca do tema com o gerenciamento de
riscos, tema com produção científica significativa. No entanto, poucas
publicações específicas sobre o término foram identificadas. Destacam-se a análise
das causas da extinção e a questão da compensação. Lacunas no conhecimento
foram identificadas, principalmente a respeito da análise do término antecipado
aplicado ao contexto brasileiro.
Palavras-chave: Parcerias público-privadas; término
antecipado; riscos; TEMAC; revisão sistemática da literatura
BIBLIOMETRIC REVIEW ON PUBLIC-PRIVATE PARTNERSHIPS
EARLY TERMINATION
ABSTRACT
Public-private
partnerships (PPPs) have been a strategy adopted by governments of several
countries as an alternative for the execution of infrastructure projects and
public services. Although it has been a consolidated practice for years, with
many successful cases, many partnerships are terminated earlier than expiry
date due to risks and uncertainties inherited in this type of arrangement. This
study sought to conduct a systematic literature review, using the Consolidated
Analytical Target Approach Theory (TEMAC), to analyze the literature on the
early termination of PPPs. The bases investigated were the Web of Science and
Scopus. As a result 72 and 124 relevant records, produced between 1991 and
2019, were respectively identified. The results indicate an intrinsic
relationship between the theme and risk management, a theme with significant
scientific production. However, few specific publications on termination have
been identified. We highlight the analysis of the causes of extinction and the
issue of compensation. Gaps in knowledge were identified, especially regarding
the early termination phenomena in Brazilian’s PPPs context.
Keywords: Public-private partnerships; early termination;
risks; TEMAC; systematic literature review
Submetido: 03/01/2020
Aceito: 30/01/2020
Publicado: 31/01/2020
introdução
A participação do setor privado na realização de obras públicas é
frequentemente referida como PPP. Nessas parcerias, o papel da administração
pública geralmente se baseia em um contrato de concessão. A depender do
arranjo, pode compreender o financiamento, concepção (projeto), construção,
operação e transferência do objeto contratado. Em contrapartida, o parceiro
privado pode ser remunerado por meio da cobrança de tarifa dos usuários e
adicionalmente por intermédio de contraprestações do governo pelos serviços
prestados (GATTI, 2008). As PPPs têm sido adotadas globalmente a partir das
décadas de 80 e 90 como um alternativa exitosa para a provisão de serviços
públicos e infraestrutura nas áreas de transportes, energia, saneamento,
telecomunicações e serviços públicos em geral (DE BETTIGNIES; ROSS, 2009;
AURIOL; PICARD, 2013; XIONG et al., 2016).
Os contratos de PPPs possuem características peculiares: altos
investimentos, longos períodos de payback
e duração contratual, múltiplos patrocinadores (LIU et al., 2017). Naturalmente, tais características tornam esse
tipo de arranjo mais exposto a riscos. A materialização de um ou mais riscos
podem inviabilizar o retorno previsto para o investimento realizado, forçando o
projeto a ser terminado antes da data prevista em contrato (SONG et al., 2017).
No decorrer da história, verificam-se diversos registros de projetos que foram
terminados antecipadamente por algum tipo de intercorrência (ZHANG, 2005b;
VALIPOUR et al., 2015).
No Brasil, o desenvolvimento de parceiras entre o governo e a iniciativa
privada tem sido uma alternativa amplamente utilizada para o fomento da
infraestrutura e dos serviços públicos. A legislação brasileira aborda a
questão por meio das leis nº 8.997/1995 (BRASIL, 1995), que dispõe sobre o regime
de concessões, e a nº 11.079/2004 (BRASIL, 2004), que institui as normas para
celebração de parceiras público-privadas. Para fins deste artigo, ambos os
regimes de contratação são considerados em seu sentido mais amplo, como uma
parceria entre um ente público e um privado, não havendo distinção entre os
regimes legais.
Assim como em outros países, o Brasil tem presenciado o colapso de
algumas dessas parcerias. Por exemplo, no setor rodoviário, a concessão da
rodovia BR-153, trecho Anápolis/GO até Aliança do Tocantins/TO, concedida no
ano 2014, foi declarada caducada em 2017 (BRASIL, 2017a). Mais recentemente, a
concessionária responsável pela concessão da rodovia BR-040, trecho Brasília -
DF e Juiz de Fora - MG, também iniciada em 2014, declarou o interesse em
abandonar a concessão alegando dificuldades financeiras em virtude da
movimentação de veículos aquém do previsto (VIA040, 2019). Situação semelhante
também é vivenciada no setor aeroportuário. A concessionária responsável pelo
Aeroporto Internacional de Viracopos (Campinas/SP) também iniciou processo para
devolução da concessão (CONCESSIONÁRIA AEROPORTOS BRASIL VIRACOPOS, 2017).
Para lidar com essa realidade, alternativas para flexibilizar e tornar
mais célere o processo de extinção das concessões têm sido objeto de intensa
discussão entre governo e concessionários. Essas discussões resultaram na lei
nº 13.448/2017 (BRASIL, 2017b), que institui a relicitação e ampliou as
hipóteses de extinção antecipada para atração de investimentos. Recentemente, a
lei foi regulada pelo Decreto nº 9.957/2019 (BRASIL, 2019), que conferiu a
responsabilidade pela condução do processo de relicitação às agências
reguladoras, que até o momento têm trabalhado para definir as regras e
procedimentos para a condução desses processos.
Além de ser um tema de relevância no contexto nacional, nota-se que os
esforços da produção científica sobre PPPs em nível global estão concentrados
principalmente em assuntos voltados ao desenho dos contratos, à gestão de
riscos e à análise de desempenho desses contratos. Pouca atenção foi dada até o
momento à questão do término e renegociação das PPPs. Justamente esses aspectos
têm se mostrado uma forte tendência em função das dificuldades vivenciadas por
governos e setor privado na gestão desses projetos de alta complexidade e
consequentes renegociações contratuais (SILVA NETO et al., 2016).
No atual contexto de mudanças no ambiente político e regulatório sobre
as PPPs, faz-se importante identificar a literatura relevante. É necessário
buscar trabalhos, metodologias e experiências similares, que possibilitem a
comparação com contextos semelhantes e diferentes ao brasileiro e que se
possibilite ter uma visão holística sobre a questão do término antecipado de
contratos de parcerias público-privadas. Para tanto, este artigo recorreu à
revisão sistemática da literatura a partir da aplicação da Teoria do Enfoque
Meta Analítico (TEMAC). A escolha por esse método deu-se pela sua facilidade de
aplicação e a sua abordagem integradora, que é um ponto de críticas a outros
métodos de análise bibliométrica (MARIANO; SANTOS, 2017).
Como objetivo específico deste artigo, busca-se identificar publicações
relacionadas à análise das práticas e procedimentos adotados para o caso do
término antecipado, sobretudo acerca dos métodos quantitativos para definição
da indenização referente aos investimentos realizados e não amortizados em PPPs
extintas precocemente. Esse é, justamente, um dos pontos que tem gerado maior
discussão na atual agenda das agências reguladoras.
Além desta primeira sessão de caráter introdutório, o artigo tem mais
três seções. A segunda seção é voltada para descrição dos procedimentos
metodológicos usados para a elaboração da pesquisa. Na terceira seção, os
resultados encontrados são apresentados e analisados. A discussão sobre os
resultados encontrados é realizada na quarta seção e, por fim, na quinta seção,
são apresentadas as conclusões e as diretrizes para futuros trabalhos.
procedimentos metodológicos
A metodologia considerada para esta pesquisa, de abordagem
qualitativa e caráter exploratório, baseou-se no modelo da Teoria do Enfoque
Meta Analítico (TEMAC) proposta por Mariano e Santos (2017). Os autores
identificaram uma fragilidade na capacidade que muito dos métodos e ferramentas
utilizados para consolidar as pesquisas de integrar o conteúdo de modo
igualitário no que se refere ao mapeamento do conhecimento nas diferentes áreas
do conhecimento, idiomas ou tipos de documentos. Dessa forma, buscaram
consolidar e integrar as diferentes sistemáticas para análise bibliográfica com
base no Enfoque Meta Analítico (EMA). Trata-se de uma solução simples e bem
fundamentada nos princípios, leis bibliométricas e tecnologicamente integrada
com o emprego de softwares 100%
gratuitos.
A metodologia é dividida em três etapas, a saber: i) preparação da
pesquisa: busca-se nessa etapa definir o descritor (string) mais adequado ao tema, estabelecer o horizonte de tempo
pesquisado e as bases e áreas do conhecimento serão utilizadas; ii)
apresentação e inter-relação dos dados: podem ser usadas nessa etapa os
métodos baseados na análise das revistas mais relevantes, análise das revistas
que mais publicam sobre o tema, evolução do tema ano a ano, documentos mais
citados, autores que mais publicaram versus autores que mais foram citados,
países que mais publicaram, conferências que mais contribuíram, universidades
que mais publicaram, agências que mais financiam a pesquisa, áreas que mais
publicam e a frequência de palavras chaves; iii) detalhamento, modelo
integrador e validação por evidencias: nessa etapa são aprofundadas as análises
de modo a possibilitar o melhor entendimento sobre o tema pesquisado. Pode
compreender a seleção dos autores que não podem faltar na revisão, as
principais abordagens, linhas de pesquisa, validação via evidencias e entrega
do modelo integrador por meio da comparação dos resultados das diferentes
fontes.
Análise e Apresentação dos Dados
Nos itens seguintes são apresentados e analisados os dados de acordo com
cada etapa anteriormente descrita da TEMAC.
Preparação da
Pesquisa
Considerou-se para a construção do string
de pesquisa palavras na língua inglesa associando as diversas nomenclaturas
existentes na literatura para as parcerias público-privadas (SILVA NETO et al.,
2016) e termos voltados à extinção contratual. O termo considerado para
consulta nas bases de dados foi (“Infrasrtucture
Project” OR “Concession” OR “PPP”OR “PFI” OR “Public-Private
Partnership”) AND (“Abandonment” OR “Exit” OR “Termination” OR “Extinction” OR
“Bunkrupt” OR “Insolvency”).
As bases de dados Web of Science
e Scopus foram consultadas para e
elaboração deste trabalho. Optou-se pela escolha dessas devido à consistência e
a qualidade dos dados fornecidos (MARIANO; SANTOS, 2017). A pesquisa inicial
resultou em 351 registros na Web of
Science resultou e 588 na Scopus.
Em um primeiro momento, verificou-se que alguns dos registros encontrados não
tinha correlação com o tema pesquisado, mas qualquer tentativa de alteração no string de busca levava a exclusão de
publicações preliminarmente avaliadas com relevantes no resultado da pesquisa.
Dessa forma, optou-se por manter o string
de forma mais abrangente e procedeu-se com uma análise individual do conteúdo
do abstract de todos os registros
resultantes da busca. Como resultado final, foram selecionados 72 artigos
correlatos ao objeto de pesquisa na Web
of Science e, 124 na Scopus.
Optou-se por não utilizar qualquer tipo de delimitação temporal sobre a para se
ter uma noção da evolução pesquisa, sobretudo por se tratar de um assunto ainda
pouco estudado.
Apresentação e
Inter-relação dos Dados
Para Mariano e Santos (2017), há uma grande variedade de opções e
ferramentas para apresentação e inter-relação de dados. No entanto, existem
alguns resultados que são praxe nas revisões bibliométricas de enfoque
meta-analítico e, de certa maneira, já são esperadas por pesquisadores e
editores em geral. Esses resultados são apresentados na sequência desta seção.
Salienta-se também que todos os fatores considerados nesta etapa obedecem algum
princípio ou lei bibliométrica.
As revistas que mais
publicaram sobre o assunto foram: Journal
of Management in Engineering, Journal of Construction Engineering and
Management e Transportation Research
Record. Essas revistas lideram as listas de periódicos com o maior número de
citações nas duas bases. Além do número de registros, as fontes de publicação
foram avaliadas quanto ao número de citações e o grau de relevância de cada
periódico por meio de índices bibliométricos. O índice adotado para avaliação
dos periódicos da Web of Science foi
o JCR (Journal Citation Reports),
enquanto na Scopus utilizou-se o SJR
(Scimago Journal & Country Rank). A Tabela 1 e a Tabela 2 exibem os resultados
obtidos, respectivamente para Web of
Science e Scopus.
Ao todo, os registros selecionados na base Web of Science totalizaram 544 citações. Dessas, 132 foram citações
a periódicos publicados na Journal of
Construction Engineering and Management ASCE, que lidera o quesito. Os
documentos selecionados na Scopus totalizaram
1.170 citações, liderados também pelo mesmo periódico com 264 publicações. Quanto a qualidade do periódico, embora
avaliados por meio de índices bibliométricos distintos, em ambas as bases o
item é liderado pelo Journal of
Management in Engineering, seguido pelo Journal
of Construction Engineering and Management.
Nota-se que o tema de pesquisa proposto possui um caráter
multidisciplinar. Trata-se de um assunto estudado por diversas áreas do
conhecimento. Uma análise por área de pesquisa na base Web of Science mostra que os 72 registros selecionados pertenciam
as áreas de Engineering Civil (25 registros), Egineering Industrial (14 registros), Construction
Building Technology (9 registros), Management
(9 registros) e Economics (9
registros). A Tabela 3 indica o ranking das cinco publicações mais
relevantes em termos de fator de impacto para as duas principais áreas de
pesquisa em termos de números de registros.
Os periódicos pesquisados não se situam entre os cinco mais relevantes
das áreas de pesquisa, embora se tenha evidências que o tema pesquisado é
frequentemente objeto de publicações em periódicos de relevância dentro da
categoria, com a maioria dos periódicos consultados situados entre o primeiro e
segundo quartil de suas categorias.
A Tabela 4 e a Tabela 5 apresentam os
documentos mais citados respectivamente nas bases Web of Science e Scopus.
Constata-se que os trabalhos do autor Zhang, X. (ZHANG, 2005a; ZHANG, 2005b)
estão entre os três mais citados em ambas as bases.
Tabela 1. Fontes que mais publicam sobre o tema
– Web of Science
Fonte de Publicação |
Nº Registros |
% Total Registros |
Nº Citações |
JCR |
|
1 |
Journal of Management in Engineering |
6 |
8,33 |
64 |
3,269 |
2 |
Journal of Construction Engineering and Management |
4 |
5,56 |
39 |
2,734 |
3 |
Transportation Research Record |
3 |
4,17 |
8 |
0,748 |
4 |
Journal of Civil Engineering and Management |
2 |
2,78 |
56 |
2,029 |
5 |
Journal of Construction Engineering and Management
ASCE |
2 |
2,78 |
132 |
0,876 |
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Tabela 2. Fontes que mais publicam sobre o tema
– Scopus
Fonte de Publicação |
Nº Registros |
% Total Registros |
Nº Citações |
SJR |
|
1 |
Journal of Construction Engineering and Management |
7 |
5,65 |
264 |
1,044 |
2 |
Journal of Management in Engineering |
5 |
4,03 |
78 |
1,271 |
3 |
Transportation Research Record |
4 |
3,23 |
11 |
0,537 |
4 |
Construction Management and Economics |
3 |
2,42 |
168 |
0,777 |
5 |
Research in Transportation Economics |
3 |
2,42 |
35 |
0,983 |
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Tabela 3. Ranking de periódicos por área de
pesquisa (JCR)
Ranking |
Áreas de Pesquisa |
|||
Engineering Civil |
Egineering Industrial |
|||
Título Publicação |
JCR |
Título Publicação |
JCR |
|
1 |
Computer-Aided Civil and Infrastructure
Engineering |
6,208 |
IEEE Transactions on Industrial Informatics |
7,377 |
2 |
IEEE Transactions on Intelligent Transportation
Systems |
5,744 |
Technovation |
5,250 |
3 |
Building and Environment |
4,820 |
International Journal of Production Economics |
4,998 |
4 |
Transportation Research Part B-Methodological |
4,574 |
Journal of Materials Processing Technology |
4,178 |
5 |
Energy and Buildings |
4,495 |
Reliability Engineering & System
Safety |
4,039 |
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Tabela 4. Documentos mais citados na Web of Science
Nº |
Título |
Autores |
Ano Publicação |
Nº Citações |
1 |
Paving the way for public-private partnerships in
infrastructure development |
Zhang, X. |
2005 |
68 |
2 |
Financial viability analysis and capital structure
optimization in privatized public infrastructure projects |
Zhang, X. |
2005 |
64 |
3 |
Public-private Partnerships and the privatization
of financing: An incomplete contracts approach |
de Bettignies, J.; Ross, T. |
2009 |
41 |
4 |
Private and public interests in water and energy |
Hall, D.; Lobina, E. |
2004 |
35 |
5 |
A theory of BOT concession contracts |
Auriol, E.; Picard, P. |
2013 |
31 |
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Tabela 5. Documentos mais citados na Scopus
Nº |
Título |
Autores |
Ano Publicação |
Nº Citações |
1 |
An option pricing-based model for evaluating the financial viability of
privatized infrastructure projects |
Ho, S.P., Liu, L.Y. |
2002 |
97 |
2 |
Financial viability analysis and capital structure
optimization in privatized public infrastructure projects |
Zhang, X. |
2005 |
87 |
3 |
Paving the way for public-private partnerships in
infrastructure development |
Zhang, X. |
2005 |
77 |
4 |
Public—Private Partnerships: Eight Rules for
Governments |
Vining, A.R., Boardman, A.E. |
2008 |
76 |
5 |
Valuation of the minimum revenue guarantee and the
option to abandon in BOT infrastructure projects |
Huang, Y.-L., Chou, S.-P. |
2006 |
71 |
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
No tocante a origem das publicações, verifica-se que a China e os
Estados Unidos estão bem à frente no número de publicações dos demais. Os dois
países alternam a liderança do ranking
nas bases avaliadas. Reino Unido,
Espanha e Austrália complementam a lista de registros por países ou
territórios, apresentada na Figura 1.
Figura 1. Registros por país ou território
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Os autores que mais publicaram na Web
of Science foram Skibniewski, M., Song, J., Xiong, W., Yuan, J. e Zhang, X.
Ambos possuem três publicações. Na outra base avaliada, Song, J., Wang, S. e
Zhang, X. têm seus nomes associados à quatro registros cada. Quanto as
instituições de origem das publicações, situam-se entre as quatro primeiras em
ambas as bases a Universidad Politécnica
de Madrid (Espanha), Dalian University
of Technology (China), Hong Kong
Polytechnic University (Hong Kong) e
Southeast University (China).
A Figura 2 representa a
evolução temporal do número de publicações e citações anuais nas duas bases. A
primeira publicação registrada em ambas as bases é datada de 1991. Desde então,
o assunto passou por um momento de maturação até o início dos anos 2000, quando
o número de publicações passou a crescer consideravelmente. O crescimento não
foi constante ao longo dos anos, mas principalmente a partir de 2015,
verifica-se uma evolução considerável no número de publicações. De maneira
análoga ao número de publicações, observa-se a partir de 2015 uma crescente no
número de citações.
Figura 2: Evolução publicações (à direita) e evolução de citações (à esquerda)
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
A avaliação da frequência das palavras-chave dos documentos selecionados
foi feita por meio de “word clouds”,
elaboradas com o auxílio da ferramenta Tag
Crowd. Os resultados são ilustrados na Figura 3. Na Web of Science, verifica-se com
frequência a ocorrência das plavras-chave: partnerships,
public-private, risk, infrastructure, management, option, ppp e private; enquanto na Scopus, ocorrem
com maior constância as palavras
partnerships, public-private, infrastructure, option, risk, private.
Figura 3. Word cloud com as palavras-chave (à
esquerda da Web of Science; à direita, Scopus)
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Detalhamento, Modelo
Integrador e Validação por Evidências
Com base nos dados extraídos na Web
of Science e Scopus, foi
utilizado o software VOSviewer para criação de mapas de rede.
Esses mapas facilitam a visualização e análise sobre as linhas de pesquisa que
envolvem o término antecipado de contratos PPPs. Na visualização da rede, os
itens são representados por círculos com o rótulo da publicação. O tamanho do
rótulo e do círculo são determinados pelo peso do item. Quanto maior o círculo,
maior a relevância da publicação. A distância entre os círculos é um indicativo
da relação dos itens. Os itens mais próximos possuem relações mais fortes (ECK;
WALTMAN, 2019).
A análise de co-autoria é um indicativo de autores que publicam em
parceria, formando redes de pesquisadores. Essas redes são apresentadas na Figura 4 (Web of Science) e Figura 5 (Scopus).
A análise das publicações selecionadas na Web of Science indica a existência de quatro clusters de co-autoria.
Dois desses, são formados por autores da Universidad
Politécnica de Madrid, Vassalo, J., Ortega, A. e Soliño, A. Formam o
primeiro e Galera, A. e Baeza, M., o segundo. Esses mesmos grupos são
visualizados na Scopus, exceto por
Baeza, M. Outro cluster é formado pelos autores Chan, A., Xiong, W., Yuan, J. e
Skibniewski, M., associados respectivamente à Hong Kong Polytechnic University, Tongji University, Southeast University e
University of Maryland. O último cluster é centralizado em Song, J., Feng,
Z. e Jin, L. Os dos primeiros são da Dalian
University e o último da Wenzhou Med
University.
Quanto aos dados obtidos na Scopus,
além dos clusters da Politécnica
de Madrid, observou-se outro grupo formado pelos autores da Hong Kong University of Science and
Technology Xiong, W. e Zhang, X. Juntos, os autores publicaram duas vezes sobre
mecanismos de compensação no caso da extinção antecipada de contratos de PPPs.
Figura 4. Mapa da rede de coautoria Web of Science
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Figura 5. Mapa da rede de coautoria Scopus
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
A análise de co-citação é uma métrica de análise de artigos que
frequentemente são citados juntos. É um indicativo de semelhança entre estudos.
Uma co-citação é estabelecida por autores de artigos diferentes dos que ele
liga; em outras palavras, é uma relação extrínseca com os documentos
envolvidos (MARIANO; SANTOS, 2017).
É possível verificar a existência de três clusters principais de
co-citação obtidos dos resultados da Web
of Science e representados na Figura 6. À esquerda da rede
estão agrupados dois clusters. O cluster #1 - verde (BING et al., 2005;
CHAN et al., 2010; MARTINS et al., 2011) e o cluster #2 (vermelho), mais à direita, (ABEDNEGO; OGUNLANA, 2006;
MEDDA, 2007; KE et al., 2010) abordam, principalmente, a questão da alocação de
riscos e a estruturação dos contratos de parceria. O cluster #3 (azul) é formado pelos trabalhos Black e Scholes (1973),
Dixit e Pindyck (1994). Esses trabalhos são considerados referências teóricas
na análise das opções reais, muito utilizadas para análises financeiras em
contratos de PPPs.
Os trabalhos mais relevantes dos cinco clusters encontrados na base Scopus,
apresentados na Figura 7, podem ser melhor
avaliados se agrupados em 3 grandes grupos, dada a interface e proximidade
entre os assuntos da publicações.
Os clusters #1 (vermelho) e #3 (azul) guardam bastante semelhança com a
abordagem dos dois primeiros clusters da WOS. Tratam de trabalhos voltados para
o gerenciamento e alocação de riscos nas PPPs (BING et al., 2005; KE et al.,
2010). Os clusters #2 (verde) e #4
(amarelo), em linhas gerais, abordam a questão da análise de garantias
contratuais oferecidas pelos governos como forma de atrair o capital privado e
a avaliação financeira das PPPs (GARVIN; CHEAH, 2004; GRIMSEY; LEWIS, 2005).
Por último, o cluster #5 (roxo) considera os trabalhos de referência conceitual
sobre opções reais (BLACK; SCHOLES, 1973; DIXIT; PINDYCK, 1994)
Figura 6: Mapa da rede de co-citação Web of Science
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Figura 7: Mapa da rede de co-citação Scopus
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Segundo Mariano e Santos (2017), o coupling
é uma métrica de busca que toma como base a premissa de que artigos que citam
trabalhos iguais, possuem similaridade. Ele mede a associação entre duas
publicações, estabelecidas por meio de sobreposições quanto as referências
realizadas pelos autores.
A partir do coupling pode-se
ter uma perspectiva das frentes de pesquisa que de alguma maneira abordam a
questão do término antecipado dos contratos de parceiras público-privado. A Figura 8 e a Figura 9 representam a rede
de agrupamento bibliográfico para as bases Web
of Science e Scopus respectivamente. Na sequência são identificadas essas
principais linhas de pesquisa e no item seguinte deste artigo se aprofunda na
análise dos principais trabalhos e linhas de pesquisa.
A análise de acoplamento da Web of
Science indicou a existência de 6 clusters principais. O cluster #1
(vermelho) aborda a análise financeira de projetos de PPP por meio da teoria
das opções reais. Ao todo, onze trabalhos estão agrupados nesse cluster com destaque para Huang e outros
(2014) e Colín e outros (2016). Os trabalhos do cluster #2 (verde) estão
voltados para a análise da modelagem dos contratos de parcerias público-privado
e suas consequências enquanto formas de políticas públicas. Destacam-se as
produções de Danau e Vinella (2015) e Shi e outros (2018).
Figura 8. Mapa da rede de acoplamento bibliográfico Web of Science
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Figura 9. Mapa da rede de acoplamento
bibliográfico Scopus
Fonte. Dados da pesquisa (2019)
Os clusters #3 – azul escuro - (VASSALLO et al., 2012a; VALIPOUR et al,
2015; NGUYEN et al., 2018) e #4 - amarelo - (KE et al., 2012), localizados na
parte central da rede, concentram-se na alocação e gestão de riscos nas
parcerias público-privadas. O cluster #5 (roxo) engloba os trabalhos voltados
ao término antecipado dos contratos de PPP (SONG et al., 2017; LIU et al.,
2017; SONG et al., 2018a/b). O cluster #6 (azul claro) avalia a questão de
riscos residuais nos contratos de parceria (YUAN et al., 2015; YUAN et al.,
2018).
A análise do acoplamento bibliográfico na Scopus resultou na formação de 10 clusters. Os cluster #1
(vermelho) e #2 (verde) guardam bastante similaridade com o encontrado na Web of Science. Abordam respectivamente
o uso das opções reais (HO e LIU, 2002; HUANG; CHOU, 2006; HUANG; PI, 2014) e a
questão contratual das parcerias (VINING; BOARDMAN, 2008; DE BETTIGNIES; ROSS
2009;
AURIOL; PICARD, 2013).
Os clusters #3 (azul escuro) e #4 (amarelo) possuem uma linha bem tênue
quanto a sua abordagem. Englobam os trabalhos voltados para a alocação e gestão
de riscos (KE et al., 2012; VALIPOUR et al., 2015). O cluster #5 (roxo), assim
como o #1, também englobam trabalhos voltados a análise da opção real de
término antecipado das parcerias (BLANK et al., 2015; LIU et al. 2017). O
cluster #6 (azul claro), como reportado análise anterior, agrupa os estudos
sobre análise de riscos residuais. A partir da análise dos trabalhos agrupados
nos clusters #7 (laranja) e #8 (marrom), considera-se como um grande cluster
que aborda a questão do término antecipado dos contratos (XIONG ZHANG, 2013;
SONG el., 2017; SONG et al., 2018a/b).
O cluster #9 (magenta) aborda os trabalhos voltados a área de
saneamento, sobretudo através de cases
de projetos voltados à análise dos contratos e as consequências das parcerias.
As PPPs nessa área têm sofrido com a tendência de remunicipalização da
prestação do serviço (HALL LOBINA, 2004). O último cluster, #10 (rosa), é
formado por dois trabalhos (VASSALLO et al., 2012a; VASSALLO et al., 2012b) que
analisaram os impactos da crise econômica espanhola do fim dos anos 2000 nas
concessões rodoviárias do país.
DISCUSSÃO dos resultados
O término antecipado das parcerias público-privadas, como visto na
literatura, é um fenômeno que atinge empreendimentos de países desenvolvidos e
em desenvolvimento. Esses últimos em maior frequência. Com base em dados do
Banco Mundial para países em desenvolvimento, de 1984 a 2010, 334 de 4.874
(6,85%) projetos de PPPs foram cancelados antes do término previsto. Os maiores
índices de término de projetos ocorreram na África Subsaariana (9,35%) e
América Latina e Caribe (8,95%). O fenômeno também é bem abrangente quanto aos
segmentos de projetos atingidos. Os projetos ferroviários (39,50%) e saneamento
básico (10,69%) tiveram o maior percentual de abandonado (XIONG et al., 2016).
Além da distribuição geográfica e por segmento, constata-se que o término
precoce das PPPs pode ocorrer em fases distintas do projeto. Tipicamente, a
maioria dos projetos terminam na fase de operação, embora existam relatos
ocorridos ainda na fase de planejamento/construção (LIU et al., 2017).
Diversos casos de PPPs
encerradas prematuramente por razões diversas, em diferentes partes do globo,
segmentos e estágios do projeto são encontrados na literatura. Por exemplo, na
Inglaterra, o projeto Metronet do
metrô de Londres (VINING; BOARDMAN, 2008) e o National Physical Laboratory (NPL); nos Estados Unidos, as rodovias
South Bay Expressway e 91 Express Lanes (XIONG; ZHANG, 2013); na
China, o Wutong Mountain Tunnel (SONG
et al., 2017); e a PPP de saneamento Águas
Argentinas (HALL; LOBINA, 2004) na Argentina.
O término antecipado de uma parceria público-privada quase sempre é
associado com a materialização de um ou mais riscos, que de alguma forma
frustram as expectativas iniciais de uma ou ambas as partes e as levam ao
abandono do projeto, o que inevitavelmente o associa ao tema gestão de riscos.
A análise bibliométrica indicou a existência uma linha de pesquisa bastante
robusta a respeito da análise de riscos, sobretudo quanto a sua alocação aos
patrocinadores (BING et al., 2005; ABEDNEGO; OGUNLANA, 2006; KE et
al., 2010; VASSALLO et al., 2012a).
Na maior parte dos casos, o princípio geral que rege essa prática é que
o risco recai na parte mais qualificada para gerenciá-lo. A partir da avaliação
extensiva dos riscos contratuais, trabalhos foram feitos no sentido de elaborar
recomendações e boas práticas para estruturação dos contratos de PPPs. Parte
dessas orientações voltam-se para as medidas de contenção e contingência do
risco do término antecipado (ZHANG 2005A; VINING; BOARDMAN, 2008; CHAN et al.,
2010).
Segundo os resultados de pesquisas relativas a priorização de riscos, o
risco de término do contrato é um dos mais críticos nesse tipo de contrato
(VALIPOUR et al., 2015). A análise dos principais motivos que
levam ao término precoce de uma PPP foi objeto de alguns poucos trabalhos
específicos (SONG et al., 2017; SONG et al., 2018b). Os fatores críticos para o
término antecipado podem ser agrupados em três categorias de acordo com a parte
responsável: fatores de inadimplência do governo, como erros de decisão do
governo, inadimplência nos pagamentos, projetos não competitivos, erros de
previsão de demanda, falta de infraestrutura de apoio, fraude e corrupção e o
término voluntário pelo setor público, seja por mudanças nas políticas públicas
ou violação das cláusulas contratuais; fatores de inadimplência do setor
privado, como sobrecustos, problemas de qualidade, deficiências de projeto,
atrasos de cronograma e atividades ilegais; e, por fim, as causas fortuitas,
como desastres naturais, mudança na demanda do mercado, oposição pública,
mudanças regulatórias e nacionalização.
Abordagem sobre a
compensação
Em face de eventos de risco imprevisíveis, os setores público e privado
frequentemente buscam renegociações contratuais e tentam tomar medidas para
solucionar o problema, em vez de finalizar imediatamente o projeto. Geralmente,
o término antecipado ocorre quando as renegociações falham e os governos se
veem forçados a rescindir os contratos por meio da relicitação do projeto ou da
recompra dos projetos, sendo essa última alternativa mais frequente nesses
casos (SONG et al., 2017; SONG et al, 2018a).
Nos casos de término antecipado de PPPs, a determinação da adequada
compensação é um aspecto nuclear para ambas as partes. Somente nos últimos anos
esse assunto passou a atrair a atenção de acadêmicos, por exemplo Xiong e
outros (2016), Liu e outros (2017) e Song e outros (2018a). Mesmo em situações
de término por inadimplência da parte privada, a inexistência de uma
compensação financeira para o ente privado pode beneficiar injustamente a
administração pública. A questão, no entanto, é determinar o valor da compensação
justa (COLÍN et al., 2016).
Dada a relevância do assunto para o êxito das parcerias, se encontra na
literatura recomendações no sentido de estabelecer critérios e mecanismos de
precificação para o término antecipado. É conveniente que esses sejam discutidos
nas fases de negociação contratual e as incertezas levadas em consideração,
inclusive com a previsão de cláusulas contratuais específicas e legislação
(ZHANG, 2005a; XIONG; ZHANG, 2013).
Países como Reino Unido, Austrália, Coréia do Sul (LIU et al., 2017) e
Espanha (VASSALLO, 2012b) normatizaram a questão da compensação em manuais para
estruturação de contratos ou por meio de legislação específica. De modo geral,
os critérios para compensação podem ser sintetizados de acordo com a parte
responsável (SONG et al., 2018a). Caso a extinção seja causada por
inadimplência das obrigações assumidas pelo governo ou pela recompra voluntária
da concessão, o parceiro privado deve ser recompensado pela perda de lucro no
período restante do contrato, débitos remanescentes e custos adicionais em
decorrência do cancelamento do contrato. Se o término é oriundo pela
inadimplência do parceiro privado, é devido a esse a devolução de parte do
investimento inicial. No último caso, em que o término não é oriundo de
inadimplência das partes, as perdas financeiras devem ser divididas entre as
partes pública e privada, e essa última deve ser parcialmente compensada pela
perda de receita, débitos remanescentes e custos adicionais.
Análise
quantitativa sobre a compensação
A compensação para o término antecipado tem sido um ponto controverso em
função da falta de métodos de precificação razoáveis e justos. Como resultado,
as partes se envolvem em intermináveis litígios com perdas econômicas
consideráveis (SONG et al., 2017). De acordo com Xiong e outros (2016), existe
a necessidade de se desenvolver modelos específicos e detalhados para
quantificar a compensação de projetos de PPP terminados antecipadamente. Para
esses autores, os manuais de PPPs são generalistas e abstratos no que se refere
ao assunto. Essa foi outra linha de pesquisa identificada na análise
bibliométrica. Técnicas diferentes são empregadas para a quantificação da
compensação, mas a análise bibliográfica revelou o predomínio do uso da
abordagem pelo valor presente líquido e da opções reais.
Xiong e Zhang (2013) categorizam as diversas abordagens existentes em
duas principais. A abordagem através das demonstrações financeiras, que calcula
a compensação por meio do custo total acumulado do projeto e receitas antes da
data de término de acordo com os demonstrativos financeiros da concessionária,
também conhecido como método do lucro cessante. A segunda abordagem, com base
no valor do fluxo de caixa descontado futuro da concessão, estima a compensação
com base no valor presente líquido dos fluxos de caixa futuro na data de
interrupção definitiva do contrato até a data de término do contrato.
Song e outros (2018a) desenvolveram um modelo para a precificação da
compensação da extinção para os casos de inadimplência das obrigações assumidas
pelo governo ou recompra voluntária (payout).
Sob o ponto de vista da incerteza de demanda, o modelo de compensação foi
desenvolvido com base na análise probabilística da demanda anual, conduzida por
meio da integração da análise Monte Carlo e do valor presente líquido. O modelo
se baseia na ideia de compartilhamento de riscos através da garantia de demanda
mínima e o compartilhamento da receita excedente no término desses contratos.
Nessa mesma linha, Xiong e outros (2016) desenvolveram um modelo de
compensação para o término antecipado de concessões com base no valor de
mercado do ativo. Segundo esse princípio, a compensação do concessionário deve
ser de acordo com o valor de mercado do restante da concessão. O modelo utiliza
técnica de fluxo de caixa descontado com a integração de análises estocásticas
(simulação Monte Carlo), ferramentas de regressão e análise de máxima
verossimilhança para modelar os riscos socioeconômicos e de manutenção e
operação da concessão. O modelo utiliza dados históricos de projetos
finalizados antecipadamente para melhorar a precisão e avaliação dos riscos
inerentes ao projeto.
A teoria das opções reais (TOR) exerce um papel de destaque nas análises
quantitativas da compensação. Derivadas das opções financeiras, as opções reais
são capazes de captar o valor de flexibilidades gerenciais em investimentos
irreversíveis e sob incerteza (DIXIT; PINDYCK, 1994). No caso das parceiras
público-privadas, as opções reais derivam naturalmente da interpretação das
cláusulas dos contratos, que regulam direitos e obrigações das partes. A
abordagem mais frequente encontrada na literatura sobre a utilização da TOR é
por meio da avaliação da viabilidade financeira dos projetos com algum tipo de
garantia oferecida pelo governo em conjunto com a opção de abandono (HO; LIU,
2002; HUANG; CHOU, 2006; BLANK et al., 2015).
Outros autores estudaram exclusivamente a opção de abandono. O direito
de abandono concede ao concessionário a flexibilidade para minimizar custos
afundados sob condições adversas de mercado (DIXIT; PINDYCK, 1994). Por outro
lado, esse direito pode representar um ônus ao governo, ao passo que requer a
previsão de uma contingência orçamentária e pode ser um incentivo ao parceiro
privado a inadimplir arbitrariamente com suas obrigações e comprometer e/ou
suspender a prestação de um serviço público. Muitas vezes essa opção não é
devidamente quantificada nos estudos de viabilidade econômico-financeira com
técnicas convencionais de valuation
(IGREJAS et al., 2017).
Nesse sentido, Huang e outros (2014) avaliaram o efeito de garantias de
execução no valuation de projeto BOT
(Build-Operate-Transfer) estendendo o
modelo clássico de Black-Scholes-Merton (BSM). Igrejas e outros (2017) também
avaliaram o impacto do estabelecimento de multas contratuais na probabilidade
do exercício da opção de abandono de projetos de PPP na área de
telecomunicações. Ambos os trabalhos concluíram que a opção de término do
contrato garante ao concessionário a flexibilidade para gerenciar incertezas do
mercado que podem agregar valor ao projeto, mas são reduzidas ao passo que se
aumenta os valores das garantias e multas. Sob essa perspectiva, os autores
apontam que o equilíbrio entre as garantias e multas e a opção de término é
necessário para, primeiramente, atrair o investimento privado para os projetos
e, em seguida, assegurar os investimentos e performance do concessionário.
Colín e outros (2016) chegaram a resultados semelhantes sobre o valor da
flexibilidade e o equilíbrio entre incentivos e penalidades sobre o término
antecipado. Os autores avaliaram situações de insolvência em concessões
rodoviárias espanholas. O trabalho usou a TOR como uma opção de abandono
garantida pela administração pública ao concessionário conforme a legislação
espanhola aplicado ao caso da rodovia M12, em Madrid. Os resultados mostraram
que a opção de abandono possui valor significativo, cerca de 17,8% do
investimento da concessão, e representa um auxílio implícito por parte da
administração pública, mas perde valor a medida em que se aumenta o valor da
indenização, analisado por uma análise de sensibilidade com percentuais
distintos de multa por rescisão contratual.
Liu e outros (2017) examinaram os mecanismos de precificação para o
término antecipado de projetos de PPPs em cenários de fluxos de caixa
excessivamente altos ou excessivamente baixos, usando a teoria das opções
reais. Segundo os autores, o preço da compensação é definido principalmente,
além do fluxo de caixa do empreendimento, pelo montante investido e o poder de
barganha das partes.
Outras técnicas também foram empregadas para análise da compensação.
Song e outros (2017) propuseram um método para avaliar a compensação do término
antecipado de projetos BOT usando a teoria dos jogos para a construção de um
modelo de jogo de barganha e a utilização da solução de equilíbrio de Nash e
aplicaram o modelo em um estudo de caso do projeto BOT Wotong Mountain Tunnel na China. Song e outros (2016) propuseram um
modelo para quantificar a compensação financeira para o caso de término
antecipado em projetos rodoviários do tipo BOT. O modelo, denominado ARIMA,
avalia o fluxo de caixa do empreendimento com estimativas baseadas em dados
dinâmicos e séries temporais para o volume de tráfego futuro, custos de
operação e manutenção.
Conclusões
A partir da aplicação da metodologia TEMAC, chegou-se à definição de um
perfil sobre a literatura voltada ao término antecipado das parcerias
público-privadas. Para tanto, foram consultadas duas bases de publicações
científicas, Web of Science e Scopus, sendo identificadas
respectivamente 72 e 124 registros relevantes sobre o tema. Para possibilitar a
avaliação, uma série de análises foi aplicada para melhor compreender o
assunto, tais como a distribuição de autores e instituições, frequência de
publicações, periódicos mais relevantes, periódicos com maior número de
publicações e ocorrências de palavras-chave. Para a análise das tendências,
foram aplicadas as análises de coautoria, co-citação e agrupamento
bibliográfico.
Os registros evidenciaram que o assunto possui uma relação intrínseca
com outras linhas de pesquisa dentro da análise de parcerias público-privadas,
sobretudo com a gestão de riscos e análise por opções reais. Contribuições
significativas foram feitas no sentido da análise de cases de contratos malsucedidos, proposição de boas práticas para a
estruturação das parcerias público-privadas, identificação e alocação dos
riscos e a avaliação financeira das flexibilidades gerencias das PPPs.
O tema é abordado na literatura desde o início dos anos 2000, mas,
aproximadamente a partir de 2013, a quantidade de publicações e citações
cresceu de forma expressiva, evidenciando a importância do assunto e a sua
tendência de crescimento. Salienta-se que somente nos últimos anos foram
elaborados estudos específicos e mais aprofundados sobre o término e
renegociação desses contratos, corroborando com a análise de Silva Neto e
outros (2016). Destaca-se aqui os trabalhos voltados sobre a questão de
precificação e o trade-off da
compensação financeira nos casos de extinção contratual.
As abordagens encontradas na literatura utilizaram principalmente os
demonstrativos financeiros e os fluxos de caixa futuros da concessão para
estimativa da indenização. Quanto a métodos quantitativos, verificou-se o
predomínio do uso da abordagem pelo valor presente líquido e da opções. Alguns
dos estudos voltaram suas análises sobre a importância do equilíbrio entre as
garantias contratuais e penalizações sobre o término contratual. É importante
manter o ambiente regulatório propício para a captação do investimento privado
para os projetos, mas também garantir o fiel cumprimento das obrigações
contratuais assumidas.
Os países com maior tradição na implantação de programas de parcerias
público-privadas, como China, Estados Unidos, Reino Unido e Espanha, foram os
que mais contribuíram com publicações científicas. Os autores Song, J., da Dalian University , Wang, S., da Tsinghua University, e Xiong, Z., da Tongji University, todos de instituições
chinesas, mostraram-se na vanguarda da pesquisa sobre o tema. Além de se
situarem entre os autores mais produtivos, os trabalhos por eles produzidos se
destacaram nas análises de co-citação e agrupamento bibliográfico.
A revisão sistemática da literatura apontou para a existência de lacunas
no conhecimento sobre o término antecipado de PPPs. A maior parte das
publicações voltaram seus esforços para análise do fenômeno sob a ótica dos
entes governamentais e públicos, principalmente no tocante à questão
financeira. Não foram identificados estudos voltados sobre as consequências do
término antecipado, sobretudo quanto aos impactos sociais. Análises mais
aprofundadas e sobre o valor residual dos projetos, quantificação da opção de
término nos estudos de viabilidade e os mecanismos de precificação da compensação
são questões para o desenvolvimento de futuras pesquisas. Outro potencial tema
para pesquisas futuras está relacionado principalmente com a proposição de
mecanismos de compensação adequados ao contexto de dificuldades vivenciadas por
algumas parcerias brasileiras. Pode-se pensar também em futuras comparações com
os procedimentos adotados para relicitação das concessões brasileiras.
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