Vol. 3, n.
1, Abril/2019
REDES
SOCIAIS E PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO EM PEQUENOS E MÉDIOS ESTABELECIMENTOS RURAIS
NA REGIÃO SUDESTE DE MATO GROSSO
Raimundo Moriman Goes Junior
Universidade Federal de Mato Grosso
https://orcid.org/0000-0002-0715-3320
André Luis Ribeiro
Lacerda
Universidade Federal de Mato Grosso
https://orcid.org/0000-0002-6145-4810
RESUMO
O
tema da pesquisa localiza-se na interseção entre a Sociologia Econômica e
Sociologia das Organizações e tem como objetivo investigar o processo social de
modernização, a partir da teoria das redes, em estabelecimentos rurais que
produzem leite, grãos, peixe, com tamanho até 250 hectares, localizados na
região sudeste do estado de Mato Grosso, basicamente nas cidades de Campo Verde
e Juscimeira. Nos orientamos pela seguinte problemática de pesquisa: Por que
alguns estabelecimentos rurais se modernizam e outros não? Partimos da
sociologia econômica e a teoria dos laços sociais de Mark Granovetter para
lançar a hipótese geral de que a estrutura social e as redes em que os
responsáveis pelos estabelecimentos rurais estão inseridos explicam a modernização.
Trata-se de estudo prévio desenvolvido na construção de dissertação de Mestrado
do PPG em Sociologia da UFMT, portanto, esta pesquisa possui caráter
exploratório, com intuito de familiarizarmos com nosso objeto de pesquisa. Como
instrumento metodológico, utilizamos a observação estruturada, a fim de
verificarmos o processo de modernização nos estabelecimentos rurais, bem como a
existência de redes sociais.
Palavras-chave: Redes Sociais; Organizações; Estabelecimentos Rurais; Processo de Modernização.
SOCIAL NETWORKS AND MODERNIZATION
PROCESSES IN SMALL AND MEDIUM SIZED RURAL ESTABLISHMENTS IN THE SOUTHEASTERN
REGION OF MATO GROSSO
ABSTRACT
This paper theme is between two central areas,
Economic Sociology and Sociology of Organizations and aims to investigate the
social change and modernization processes in rural establishments which produce
cow's milk, grains and fish and are up to 250 hectares, localized in the
southeast of the state of Mato Grosso, basically in the cities of Campo Verde
and Juscimeira. We are directed by the following problem: Why do some rural
establishments modernize and others do not? In the light of this problem, we
use Mark Granovetter's economic sociology and tie theory to investigate the
general hypothesis that the modernization level of rural establishments may be
explained by the social networks in which the ones responsible for them are
involved. This research has the exploratory aim to get familiar with the study
object. Structured observation was adopted in order to verify the existence of
social networks in rural areas and whether these interactions between the
agents may influence the modernization of their rural establishments.
Datas
Editoriais Submetido: 29/12/2018 Aceito: 14/04/2019 Publicado: 28/04/2019
Keywords: Social Networks; Rural Establishments; Modernization.
INTRODUÇÃO
A
modernidade propôs novos caminhos ao setor agropecuário, para pensarmos alguns
desses caminhos olharemos para os estabelecimentos rurais como organizações, no
sentido em que a concebe a sociologia das organizações.
Da
mesma forma, a sociologia econômica e a teoria das redes nos permite investigar
um aspecto interessante no desenvolvimento rural, o processo de modernização
das ocupações e dos estabelecimentos rurais através da estrutura, redes e
interações sociais.
Os
estabelecimentos rurais são partes integrantes do mercado, seja em relação ao
mercado externo ou interno, o setor agrícola influencia diretamente na economia
nacional.
Em
estudo sobre o mercado leiteiro, Magalhães (2007) destaca como as habilidades
sociais são importantes para que não só o grande, mas também o pequeno produtor
subsista ante as inúmeras adversidades do mercado. Reforçando este conceito,
Garcia-Parpet (2003 apud MAGALHÃES, 2007, p. 20) salienta que todos os mercados
são regulados por estruturas sociais, a dinâmica de um mercado é
permanentemente influenciada por agentes que se reorganizam, criam laços, fazem
acordos, formam redes de comunicação, reduzem a transparência e reforçam
vínculos com o objetivo de eliminar concorrência.
Hannan
e Freeman (1977) em sua obra sobre a ecologia organizacional argumentam no
sentido de que é o ambiente que determina quais organizações sobreviverão ou
não, permanecendo aquelas mais adaptadas.
Nesse
sentido, a revolução verde desencadeou mudanças no espaço rural, permitindo o
aumento da produção agrícola nos moldes industriais. Criou-se um dualismo entre
aqueles que produziam muito e obtiveram êxito da modernização e aqueles que não
se enquadram nesse parâmetro, com ausência de insumos tecnológicos,
maquinários, adubos e, por isso, produziam pouco.
Essas
mudanças acarretaram alterações significativas na dinâmica produtiva não apenas
em grandes estabelecimentos, mas também, em pequenos e médios estabelecimentos,
possibilitando o potencial aumento da produtividade pela via do progresso
tecnológico. À vista disso, parte do setor agrícola direcionou suas produções
para exportações e àqueles que não seguiram nessa direção ficaram restritos à
produção local.
Esse
evento desencadeou o dilema da agroindustrialização, consistente na
industrialização de seu estabelecimento rural a fim de direcionar suas
produções ao mercado externo ou aproveitar vantagens comparativas da
agricultura industrial e aprimorar os pequenos setores da agricultura.
(SILVEIRA. 2014, p. 376).
Essas
modificações ocorridas no espaço rural associadas à intensificação de capital e
mudança nos processos produtivos na agricultura comercial, foi concebida por
certas abordagens como “modernização dolorosa” (SILVA, 1982). Nesse sentido,
Silva (1982) argumentou que a modernização não funcionaria da forma como
esperado, por várias razões, o que tornará possível o fim de pequenas e médias
propriedades rurais.
Helfand,
Pereira e Soares (2014. p. 557) argumentam no sentido de que as diferenças
entre estabelecimentos que produzem muito e pouco estavam mais relacionados a
tomada de decisões sobre tecnologia e insumos e menos características
observáveis dos produtores. Em seus estudos, os autores delimitaram o universo
da pesquisa a estabelecimentos rurais acima de 5 ha e menor que 500, pois o
foco de suas investigações eram os pequenos e médios estabelecimentos. Isso
permitiu observar que mesmo os grandes estabelecimentos rurais, em relação ao
tamanho, produzissem pouco e pequenos e médios estabelecimentos fossem capaz de
produzir muito.
O
trabalho desenvolvido por Hannan e Freeman (1977) permite entender a variação
desse crescimento ao argumentar que quando há o nascimento de grandes
organizações, elas apresentam uma ameaça competitiva às organizações de médio
porte, mas dificilmente para aquelas de pequeno porte.
Quanto
a essa resistência podemos destacar o crescimento da produção de alimentos
orgânicos, a produção desses alimentos cultivados sem a interferência de
agrotóxicos e em pouca e média quantidade fez com que aumentassem
consideravelmente o preço e valor desses produtos.
Helfand,
Pereira e Soares (2014, p. 543) argumentam que “a análise entre classes de área
dos estabelecimentos de grande escala mostra que 89% deles tinham menos de 500
ha de terra”. Esse resultado sugere que existe um grupo de pequenos e médios
estabelecimentos que produzem muito e parecem ser altamente competitivos.
Os
argumentos de Helfand, Pereira e Soares (2014, p. 557) demonstram que há muito
mais por trás da “modernização” que não pode ser resumida apenas pelos aspectos
da ascensão capitalista e isso nos permite concluir que pequenos e médios
estabelecimentos em tamanho podem ascender ao invés de desaparecer.
No
mesmo sentido, a sociologia das organizações nos fornece um suporte teórico
significativo ao pensarmos nos estabelecimentos rurais como organizações, em
razão dos padrões de atividade e ordem normativa, além de utilizar o sistema de
análise delimitados pela geografia (estrutura), pelas fronteiras e pelo
mercado. (HANNAN; FREEMAN. 1977)
A
fim de verificarmos os aspectos teóricos que nos guiam, realizamos uma
delimitação no universo da pesquisa em duas cidades da região sul do estado de
Mato Grosso: Campo Verde e Juscimeira. Duas cidades próximas que convivem com
um nível maior e menor de modernização. A partir disso, fomos orientados pela
seguinte problemática: por que alguns estabelecimentos rurais se modernizam e
outros não?
O
objetivo geral é observar os processos sociais de modernização em estabelecimentos
rurais que produzem grãos, leite e peixe, com tamanho até 250 hectares,
localizados na região sudeste do estado de Mato Grosso, basicamente nas cidades
de Campo Verde e Juscimeira.
Quanto
aos objetivos específicos: a) apresentar o objeto de pesquisa aos produtores, a
fim de que seja permitido a nossa entrada nos estabelecimentos, criando-se um
laço de confiança; b) observar a dinâmica social e ocupacional dos produtores
rurais; c) observar as redes sociais dos produtores; d) analisar dados e outros
estudos sobre o tema que possam contribuir no desenvolvimento e conclusão das
hipóteses sugeridas.
As
cidades de Campo Verde e Juscimeira estão localizadas na região sudeste do
Estado de Mato Grosso, separadas por 80 quilômetros de distância. Nas proximidades
de Juscimeira há outras três cidades que compõe o Vale do São Lourenço, sendo
elas: Dom Aquino, São Pedro da Cipa e Jaciara. Predomina na região do Vale do
São Lourenço a produção leiteira e criação de gado, boa parte dos produtores
são cooperados a Cooperativa Mista Agropecuária de Juscimeira, a COMAJUL.
Por
outro lado, temos Campo Verde que produz um elevado número de grãos de soja, o
Censo Agro 2017 constatou que Campo Verde produziu 643.513,564 toneladas de
soja. É certo que a dinâmica social e econômica da cidade de Campo Verde dispõe
de maior possibilidade de rentabilidade e maior abertura ao mercado, nas mais
variadas áreas. Trata-se de uma característica do agronegócio, onde a riqueza é
melhor distribuída, ante as inúmeras ocupações que sustentam esse mercado.
Diferentemente
do que ocorre na produção de leite e agropecuária de corte, onde a renda é mais
concentrada dificultando a expansão da riqueza para outras estruturas além
daqueles que são proprietários e produtores diretos. Destaca-se, a baixa
rentabilidade do mercado leiteiro em contraposição a soja e pecuária.
REFERENCIAL TEÓRICO
O
estudo desenvolvido por Helfand, Pereira e Soares (2014) sobre pequenos e
médios produtores na agricultura brasileira nos proporciona um ótimo embasamento
empírico para iniciarmos nossas investigações.
Os
autores demonstraram que cerca de 75% dos produtores rurais possuem apenas o
ensino fundamental completo ou incompleto como educação formal. Outro aspecto,
demonstrado pelos autores é que tamanho da propriedade não é sinônimo de
tamanho de produção e que mesmo pequenas propriedades podem produzir muito.
(HELFAND; PEREIRA; SOARES. 2014, p. 555)
Nesse
contexto, levando em consideração esses dois pressupostos basilares tamanho
(ha) e escala (R$), apesar de relacionados, estão longe de serem perfeitas,
partimos das redes e estrutura social para lançar a hipótese geral de que as
redes sociais em que os responsáveis pelos estabelecimentos rurais estão
inseridos explicam sua modernização.
A
fim de estabelecermos um parâmetro à verificação do processo social de
modernização nos estabelecimentos rurais, utilizamos os atributos do homem
moderno, segundo o conceito de Inkeles e Smith (1981, p. 16).
Nos
pautamos pelos conceitos de Inkeles e Smith (1981) para definirmos o que torna
um estabelecimento rural moderno. Os atributos apresentados pelos autores
possibilitam uma maior possibilidade de crescimento econômico, gerencial, de
mercado e social. Consequentemente, o comportamento econômico do produtor ante
as inúmeras adversidades de suas ocupações agrícolas irá determinar o sucesso
de seu estabelecimento rural.
No
mesmo contexto, a partir da sociologia econômica e teoria das redes pudemos
pressupor se as ações econômicas tomadas dentro de um contexto produtivo irão
proporcionar maior ou menor grau de modernização no estabelecimento rural.
Dessa
forma, Mark Granovetter (1985) se empenha em identificar as formas de inserção
social das ações econômicas e a influência destas relações sociais nos
resultados econômicos. A teoria econômica neoclássica e neoinstitucionalista
pressupõe que a ação econômica do agente é pautada pelos interesses do ator,
resultando no que Granovetter denomina de ator subatomizado.
Por
outro lado, a sociologia, de modo geral, atribui ao ator a concepção
supersocializada, ou seja, trata-se de uma concepção dos atores serem sensíveis
às opiniões dos outros e, portanto, “obedientes às diretrizes ditadas por
sistemas desenvolvidos de normas e valores, interiorizados por meio da
socialização de forma que a obediência não é percebida como um peso”
(GRANOVETTER. 1985, p.483)
Nesse
contexto, Granovetter propôs que todos os processos de mercado são passíveis de
análise sociológica e que essas análises revelam elementos centrais, e não
periféricos. Dessa forma, é possível, teoricamente, afirmarmos que as decisões
que refletem na modernização de um estabelecimento rural, são passíveis de
análise sociológica, a qual exploramos através da teoria das redes.
Em
sua obra sobre a força dos laços fracos, Granovetter (1973) salienta que o tipo
de especialistas empregados pela organização restringe tanto a natureza da
informação provável de ser obtida, quanto o tipo de informação capaz de ser
processada e utilizada.
Ao
analisarmos os estabelecimentos rurais como organizações podemos restringir o
tipo de informação a estrutura social e ao ambiente na qual essas organizações
rurais estão inseridas, limitando-se, assim, o nível de modernização a ser
concebido por um produtor rural, constituindo toda a dinâmica gerencial e
produtiva de seu estabelecimento. Nesse contexto teórico, o nível de
modernização de um estabelecimento rural pode ser compreendido e consolidado a
partir da estrutura social e redes na qual o produtor está inserido.
Quanto
à modernização, destacamos a obra de Everett Rogers (1983) difusão da inovação.
Rogers (1983) analisa o processo da difusão da inovação nas estruturas sociais
e, em seu primeiro capítulo nos apresenta os elementos da difusão. O autor destaca que, mesmo que mais vantajoso
e racional, ainda há resistência no implemento de técnicas modernas que
otimizem as atividades e as tornem mais eficientes.
Nesse
sentido, Rogers nos apresenta o exemplo do milho híbrido implementado na
produção agrícola em Iowa, estudo realizado por Ryan e Gross (1943). O milho
híbrido apresentava um percentual de 20%, por acre, de colheita superior ao
milho normal, além da qualidade do produto ser melhor.
Em
1941, Bryce Ryan e Neal Gross entrevistaram 259 produtores vivendo em duas
pequenas comunidades em Iowa, as entrevistas consistiram em responder quando e
como eles tinham adotados o milho híbrido e fornecer certas informações sobre
eles e as operações de sua produção.
Desse
montante, apenas 02 produtores adotaram o milho híbrido entre 1928 e 1941. Após
cinco anos, apenas 10% dos produtores de Iowa tinham adotado a técnica
inovadora. Então, nos próximos três anos, houve um aumento de 40% de nível de
adoção. Mesmo que o milho híbrido possuía evidente vantagem, houve um período
considerável, cerca de 08 anos para que a técnica de cultivo inovadora fosse
implementada na produção agrícola.
Rogers
(1943, p. 33) destaca que o canal de comunicação ocorre de forma diferente em
vários estágios no processo de inovação-decisão e que o agricultor comum ouviu
primeiro, sobre o milho híbrido, de um vendedor, mas os vizinhos foram os
canais mais frequente o que determinou a persuasão na tomada de decisão.
Os
vendedores foram mais importantes para aqueles que adotaram a inovação primeiro
e os vizinhos foram os mais importantes no processo de tomada de decisão para
aqueles que aderiram o milho híbrido depois pois “não há dúvida que o
comportamento de um individual em interação com a população afeta o
comportamento de seus companheiros [...]” (ROGERS. 1943, p. 33). O fato é que a
aceitação por um ou mais produtores ofereceu novos estímulos para aquisição e
utilização do produto por outros.
A
estrutura social, definida por Rogers (1943, p.25) “se trata de um processo
padrão de uma unidade no sistema. Esta estrutura nos proporciona regularidade e
estabilidade no comportamento humano e no sistema social”.
Nesse
mesmo caminho, Granovetter nos apresenta a sua teoria dos laços (1973) onde
propõe que atores sociais que possuem mais relações de laços fracos tendem a
ter mais acesso à inovação que aqueles que estão restritos ao seu grupo de
laços fortes.
Granovetter
(1973) demonstrou que a informação circula melhor quando se recorre a “laços
fracos”, isto é, no interior de redes pouco densas, mas com diversos contatos,
como é o caso entre amigos não íntimos e conhecidos.
O
recurso a “laços fortes”, caraterísticos de redes relacionais muito densas –
como amigos íntimos e familiares, por exemplo, conduz a um “fechamento” que não
favorece a propagação da informação. (PEIXOTO, EGREJA, 2012)
Nesse
contexto, podemos sugerir que atores sociais responsáveis por estabelecimentos
rurais em redes sociais em que há menor modernização caracteriza a dinâmica
social e tenderão a se modernizar menos, enquanto o contrário ocorre com os
atores sociais presentes em redes sociais em que há maiores índices de
modernização.
A
Figura 1 ilustra a teoria dos laços de Granovetter. Assim, E, C, F, A e D
interagem entre si e, portanto, possuem laços fortes. Da mesma forma, I, J, B,
G e H. Sendo que, E e I, A e B são as pontes entre os grupos o que possibilita
uma fluência e difusão da informação entre os dois grupos.
Isso possibilita a interação de informações de atores sociais que não possuem contato direto, o que constitui um laço fraco. Este é o princípio da teoria dos laços de Granovetter e o que ele denomina de Força dos Laços Fracos.
Figura 1. Diagrama da teoria dos laços proposta por Granovetter
Fonte:
Kaufman (2012)
A
Figura 1 representa o aspecto de uma estrutura social, essa estrutura se refere
a uma rede de relações de atores que podem influenciar nas ações econômicas.
Importante destacar que, com o advento da modernização e as mais variadas
formas de comunicação, a possibilidade de manter um laço fraco à longa
distância é mais fácil e possibilita uma maior interação e fluência das
informações entre os grupos.
Por
outro lado, a fim de constatar aspectos da modernidade nos atores sociais
utilizamos como parâmetro os atributos do homem moderno descrito por Inkeles e
Smith (1981, p. 16), quais sejam: a) manter-se informado sobre o mundo; b) ter
parte ativa como cidadão; c) valorizar educação e capacitação técnica; d) ter
aspirações a progredir economicamente; e) enfatizar responsabilidade individual
e enxergar as virtudes do planejamento; f) aprovar as mudanças sociais e ser
aberto a novas experiências; g) manifestar um sentido de eficiência pessoal; h)
liberdade de submissão à autoridade da família, clã, liberdade de autonomia e de
direitos para aqueles com situação social inferior à sua.
Mesmo
que o procedimento metodológico utilizado nos proporcionou observar apenas
alguns dos aspectos da modernização proposto por Inkeles e Smith (1981), a
utilização desses pressupostos como parâmetros teóricos pôde nos sugerir uma
maior ou menor adesão de insumos tecnológicos no desenvolvimento das atividades
produtivas, a partir das características observáveis dos produtores.
Lacerda
e Lima (2015) destacam as considerações sócio psicológico de Inkeles e Smith
(1981) que considera a modernização basicamente como um processo de mudança
"na maneira de perceber, expressar e avaliar. O moderno é definido como um
modo de funcionamento individual, um conjunto de disposições para agir de
determinada maneira". (INKELES; SMITH, 1981, p. 16)
Assim,
um estabelecimento rural gerido por um ator inserido em redes sociais mais
modernas e com mais interações devem ter mais acesso a conhecimentos e
aceitação à inovação, já que compartilhado por seus pares, permitindo maior
adequação à realidade social, maior produção, maiores chances de
competitividade e, consequentemente, maiores chances de subsistência.
Da
mesma forma, um estabelecimento rural gerido por um ator social onde não há, ou
há pouca interação com as redes, deve ter mais dificuldade em adquirir
inovações em seu estabelecimento, acesso a conhecimentos e isso permitirá uma
maior tendência a estagnação e seu possível desaparecimento.
Quanto
aos aspectos do homem moderno, consideremos que a ação econômica do produtor
rural é influenciada pela estrutura social que ocasiona uma maior fluência nas
informações. Dessa forma, os aspectos do homem moderno nos estabelecimentos
rurais observados é resultado desse processo de modernização, que pode ser
explicado através da teoria das redes, levando em conta a estrutura social e o
contexto sociocultural dos produtores rurais.
Assim,
os aspectos do homem moderno de Inkeles e Smith não é um fim em si mesmo, mas
um norte que possibilitou observar o processo de modernização nos
estabelecimentos rurais visitados. Além de estar relacionados a modernidade nos
estabelecimentos rurais, alguns aspectos do homem moderno como valorização da
educação, ser parte ativa como cidadão, aprovar mudanças sociais, liberdade de
submissão às autoridades são características da imersão do ator social no
aspecto sub e supersocializado destacado por Granovetter (1985).
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Scott
(2017), quanto à análise de redes, enumera alguns instrumentos metodológicos
apresentando argumentos favoráveis e desfavoráveis a cada método, dando ênfase
às observações. Em contraposição aos Surveys, que se torna trabalhoso onde a
estrutura social é maior, além de ser um procedimento tedioso e cansativo
listar toda rede de relacionamentos do ator. Uma alternativa aos surveys são as
entrevistas abertas (SCOTT. 2017). Todavia, ao analisar as redes sociais,
muitas vezes, o entrevistado não saberá precisar a frequência e densidade de
suas relações, ou não será fidedigno à realidade ao responder as questões. Além
de ser um problema metodológico, isso dificultaria a análise de redes na
perspectiva da teoria dos laços sociais.
De
volta à observação, o autor destaca que fazer observações permite que o
pesquisador contextualize os dados relacionais do ator de tais formas que não
são possíveis obter em pesquisas de survey. Participar de conversas e
discussões por exemplo, possibilita ao pesquisador obter e compreender os
significados culturais dos relacionamentos que são mais difíceis de obter em um
questionário. (SCOTT, 2017, p.45)
Por
essas razões, optamos pela observação estruturada. Bryman (2016, p. 270)
destaca que a observação estruturada é um instrumento metodológico apto para
obtenção de dados na pesquisa quantitativa. Conforme destaca o autor, a observação
estruturada, também conhecida como observação sistemática, é um método para
observar sistematicamente o comportamento dos indivíduos que possibilite
catalogar categorias. Esse método é uma técnica na qual o pesquisador emprega
explicitamente regras formuladas para a observação do comportamento.
Uma
das vantagens é que permite observar diretamente o comportamento dos atores
sociais, diferentemente da aplicação de questionário que permite apenas a
inferência desses comportamentos. Nos questionários os entrevistados relatam
seus comportamentos, mas há boas razões para crermos que esses relatos podem
não estar inteiramente corretos.
(BRYMAN, 2016, p. 270)
As
regras predeterminadas informam aos pesquisadores sobre o que eles deveriam
procurar e como eles deveriam perceber o comportamento. Cada ator social que é
parte da pesquisa (que chamam de participantes) é observado por um período
predeterminado utilizando as mesmas regras. Essas regras são articuladas no que
normalmente nos referimos como um planejamento de observação, o que suporta
diversas similaridades com a entrevista estruturada e com questões fechadas. As
regras que constituem a observação estruturada são as mais específicas
possíveis a fim de direcionar os pesquisadores exatamente aos aspectos do
comportamento que eles estão procurando.
As
considerações na construção do planejamento da observação estruturada são
similares aqueles envolvidos na produção das entrevistas estruturadas. Bryman
(2016, p. 272) destaca algumas considerações valiosas que devem ser levadas em
conta:
a)
O pesquisador deve ter um foco claro
em quem e o que será observado;
b)
Como na construção de questionários
de perguntas fechadas, a observação deve ser mutuamente exclusiva e inclusiva;
c)
O observador deve estar
familiarizado com o objeto;
d)
A familiaridade com o objeto do
estudo pode ajudar o pesquisador a interpretar melhor o que está acontecendo;
e)
Os passos a serem seguidos devem ser
fáceis de operar;
Há
várias formas de contextualizar a observação estruturada. Para o propósito deste
estudo, achamos apropriado utilizar a observação por um período curto de tempo.
Assim, determinamos os seguintes passos:
a)
Observar aspectos da modernidade, no
exercício de suas ocupações, dos pequenos e médios produtores rurais das
regiões de Campo Verde e Juscimeira;
b)
Quais ocupações são realizadas
nesses estabelecimentos;
c)
Observar se os atributos do homem
moderno descritos por Inkeles e Smith estavam presentes nos participantes;
d)
Observar se membros da família
trabalhavam fora do estabelecimento;
e)
Observar as interações sociais dos
participantes.
Para
observarmos as redes sociais, levamos em consideração aspectos da rede e
centralidade do agente, verificando se havia proximidade, no aspecto
territorial, e através de comunicação entre os atores (MIZRUCHI, 1994, p. 74).
Dessa forma, voltamos nossas observações a estrutura social dos produtores
rurais e procuramos observar a presença de interação com outros produtores
daquela e de outras regiões.
Além
disso, verificarmos qual ocupação que os produtores exerciam foi importante
porque há algumas ocupações rurais que possuem mais abrangência tecnológica que
outras e isso deve ser levado em consideração na medição do nível de
modernização produtiva. A agricultura, por exemplo, possui maior amplitude de
implementos e insumos tecnológicos que a pecuária bovina.
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O
Quadro 1 traz um resumo censitário das duas cidades objeto desta pesquisa e
demonstra que o tamanho e número dos estabelecimentos, população ocupada de
Campo Verde é maior em relação a Juscimeira. É claro que, em razão disso, a
estrutura social e aspectos econômicos poderão ser consideradas maior e a
dinâmica social mais abundante em comparação à Juscimeira. Levamos em
consideração que Campo Verde é mais estruturada e desenvolvida, no sentido de
infraestrutura e redistribuição de renda. As distinções são facilmente
observáveis, mesmo se não levássemos em consideração o tamanho da extensão
rural produtiva e números de produção local, destacados no Quadro 1. Já o
Quadro 2 apresenta elementos dos estabelecimentos rurais pesquisados.
Quadro 1. Características das cidades visitadas
Fonte:
IBGE - Censo Agropecuário (2017)
Quadro 2. Quantidade e características dos estabelecimentos rurais:
Fonte. Elaboração Própria
Na
concepção de modernidade, consideramos os seguintes aspectos: a) estrutura
social; b) atributos do homem moderno; c) presença de maquinários e insumos; d)
forma que os produtores exerciam suas ocupações; e) estética do estabelecimento
rural.
Uma
vez estruturados os passos, realizamos as observações nos estabelecimentos
rurais em dois períodos: manhã e tarde. Assim, as observações foram orientadas
por ocupação, na região de Juscimeira, onde possuíamos um acesso maior aos
produtores, há mais produção leiteira. Portanto, buscamos verificar o nível de
modernização nessa área produtiva, na região das duas cidades Campo Verde e
Juscimeira, a fim de verificarmos alguma diferença nítida entre os
estabelecimentos de cada região.
Os
estabelecimentos, em sua maioria, não possuíam atividade produtiva exclusiva,
foi comum encontrarmos uma propriedade que realizasse mais de uma ocupação. A
partir disso, havia certa prioridade em visitar os produtores do ramo leiteiro
no período da manhã, em razão do horário da atividade. Oito estabelecimentos
são produtores de leite e em algumas propriedades os produtores tiravam leite em
mais de um período, em razão da quantidade de bovinos e leite produzida. Em sua
maioria, os estabelecimentos rurais produziam leite, grãos, para uso próprio da
família, peixes e outros cultivos para consumo, como mandioca e frutas.
Durante
dois dias visitamos três estabelecimentos, nos demais visitamos um no período
da manhã outro no período da tarde, resultando em doze estabelecimentos
visitados no período de 24 a 28 de setembro de 2018.
O
contato com os produtores rurais participantes ocorreu através de um
intermediário. Os autores acompanharam um produtor conhecido que possui uma
propriedade na região de Juscimeira. Na região, pequenos e médios produtores
possuem familiares em todo Vale do São Lourenço, familiares diretos ou
adquiridos através de união de famílias. Esse fator nos foi favorável para
adquirir confiança para adentrarmos nos estabelecimentos com maior
receptividade. Com isso, observamos as rotinas de doze produtores, seguindo os
passos acima descrito, acompanhando-os em suas atividades diárias.
Quatro
propriedades observadas encontravam-se nas proximidades de Campo Verde e oito
na região de Juscimeira. O instrumento metodológico nos proporcionou verificar
a dinâmica social das duas regiões que podiam ser observáveis, na forma em que
a ocupação era exercida, aspectos do produtor e de seu estabelecimento, bem
como em suas interações.
Na
região de Juscimeira, há uma cooperativa de produção leiteira, verificamos que
a ação dessa cooperativa é recorrente e isso pode influenciar no modo em que os
produtores cooperados exercem suas ocupações.
Portanto,
constatamos que:
a)
Em dez estabelecimentos rurais, as
ocupações exercidas não eram exclusivas, por exemplo, onde havia produção
leiteira, também havia plantação de grãos, criação de galinhas, frutas, peixes.
b)
Em nove estabelecimentos observamos
tratores e maquinários agrícolas, insumos e etc, o que levamos em consideração
ao considerar esses estabelecimentos como mais modernos.
c)
Três estabelecimentos geriam suas
produções com certo rigor organizacional, pois, estavam preocupados com a alta
produtividade e redução de custos. Essa característica também foi levada em
consideração ao considerar esses estabelecimentos como mais modernos.
d)
Em oito estabelecimentos, familiares
trabalhavam fora. Pois, diante do horário em que chegávamos aos
estabelecimentos foi possível observar familiares saindo e, ao entardecer,
familiares voltando a sua propriedade.
e)
Em nove estabelecimentos que
acompanhamos, notamos uma maior interação social durante o período que estávamos
presentes. É muito comum a interação entre vizinhos e familiares que também são
produtores.
A
partir dos pressupostos teóricos das redes e no que se refere à modernização é,
razoável, supor que onde há mais interações, há mais fluência e troca de informações
entre os grupos e, portanto, um potencial maior de aceitação à modernidade e à
inovação tecnológica como um todo.
A
questão reside não só nas interações, mas a qualidade das informações e se
essas informações influenciaram nas ocupações agrícolas.
Para
trazermos ao contexto investigado, destacamos o diagrama e o argumento de
Granovetter, (1973) de que especialistas empregados pelas organizações
restringem tanto a natureza da informação quanto o tipo de informação que será
processada e utilizada. Dessa forma, as informações de determinada estrutura
social no âmbito rural estão limitadas e orientadas pelos seus membros.
Durante
a observação, percebemos que muitos produtores na região de Juscimeira
começaram a trabalhar com peixe, em alguns estabelecimentos os tanques estavam
sendo preparados ou haviam pouco tempo de perfuração, iniciando os processos de
cultivo.
O
desenvolvimento da piscicultura naquela região parece estar ocorrendo de forma
conjunta em alguns dos estabelecimentos rurais visitados. Se levarmos em
consideração a teoria, podemos supor que essa ocupação tem sido influenciada
pelas redes.
Estudos
temporais e delimitados podem definir com maior precisão sobre o início e como
houve a difusão desse movimento da piscicultura naquela região, da mesma forma
que foram realizados por Ryan e Gross, em seu estudo sobre a semente de milho
híbrido.
Parece ser comum os estabelecimentos realizarem diversas atividades produtivas, como plantações e cultivo de aves para cultivo próprio, conforme mencionado no “item a” dos Resultados. Essa característica é observada em quase todos os estabelecimentos.
Da
mesma forma, como foi visto, há muita interação entre os produtores naquela
região, seja em razão da proximidade entre os estabelecimentos, ou seja, pela similaridade
das ocupações exercidas, o ramo leiteiro é predominante na região de
Juscimeira. Esse pode ser um fator que aproxime os produtores rurais que
desenvolvem a mesma atividade produtiva.
Na
maioria dos casos, a observação nos sugere a possibilidade de distinção entre
as relações de laços fortes e fracos, seja pela maneira de se relacionar ou
pela distância social que os atores estavam inseridos: produtor rural e
contador, por exemplo, vivem em ambientes comuns, mas em universos distintos, o
que constitui um laço fraco.
Observamos
interações entre vizinhos, outros produtores, membros de cooperativa,
familiares, independentemente de morarem próximo ou longe de seu
estabelecimento.
O
contato entre familiares parece mais frequente. Pois, parte desses familiares
também são produtores rurais. Por meio do telefone e internet, a interação se
torna mais recorrente. Alguns deles, utilizam de variadas redes sociais para
manterem contato com outros produtores e familiares próximos ou de outras
regiões.
Em
onze dos doze estabelecimentos os produtores moravam nas propriedades.
Parece ser razoável considerar um estabelecimento rural como mais moderno diante de sua maior capacidade produtiva e ante instrumentos que facilitem o desenvolvimento de sua ocupação no exercício de suas atividades como tratores, maquinários agrícolas, insumos e etc, conforme destacado no “item b” dos Resultados.
Um aspecto que merece maior atenção foi verificado em estabelecimentos rurais que viviam apenas de uma produção agrícola específica e, possuíam alto grau de comprometimento com o estabelecimento e os gerenciavam com certo rigor organizacional. Esses estabelecimentos só exerciam uma atividade produtiva, conforme “item c” dos Resultados.
Na
área produtiva leiteira, a quantidade de bovinos, qualidade e características
do leite também pode ser caracterizado como um aspecto da modernização. A raça,
alimentação, forma de retirada de leite, manual ou ordenha, fatores ambientais,
podem fazer com que mesmo em quantidades pequenas, a produção de leite seja
maior.
Outro
aspecto, é que grande parte dos estabelecimentos rurais, pelo menos
estabelecimentos da região sudeste do estado de Mato Grosso, estão situados
próximos as cidades, o que também facilitaria a interação social dos produtores
rurais com os centros urbanos e outras redes sociais.
Além
disso, não só nessa região, mas em várias regiões do país, o espaço rural se
funde ao espaço urbano, até mesmo nas metrópoles. É comum residentes rurais
trabalharem na cidade e vice-versa. Essa divisão rural e urbano não é mais tão
evidente e as vezes esses espaços se confundem. Esse fator pode ser observável
tanto em Juscimeira quanto em Campo Verde.
Em oito estabelecimentos foi possível observar que familiares, além do produtor rural, contribuía com a renda familiar e trabalhava fora do estabelecimento, conforme destacado no “item d” dos Resultados.
Esse
fator também pode ser uma variável importante ao estudarmos a modernização no
ambiente rural, uma vez que o fluxo de informações das organizações formais,
nas quais os membros familiares trabalham, e de outros grupos, por exemplo,
podem adentrar no gerenciamento de um estabelecimento rural.
Investigações
mais profundas que abordem em que ocupação os moradores do estabelecimento
rural desenvolvem suas atividades laborativas podem contribuir para a
compreensão da fluência de informações no espaço rural.
Em
apenas um estabelecimento o filho exercia sua ocupação com os pais. Nos demais,
a dificuldade de sucessão do gerenciamento dos estabelecimentos foi verificada
já que os filhos não trabalhavam na ocupação rural. A sucessão também se mostra
uma variável importante no processo de modernização.
A
implementação de técnicas mais eficientes e modernas não faz sentido, mesmo que
mais racional e viável financeiramente, se o produtor rural possua idade
avançada e sem mais perspectivas de desempenhar sua ocupação por um longo
período de tempo.
Um
aspecto que é usualmente atrelado, talvez em razão da sua baixa escolaridade ou
condição sociocultural, é que um produtor rural que exerce sua ocupação desde o
início de sua vida jovem de determinada maneira não irá aceitar mudanças na
forma de exercer sua ocupação, uma vez que tem o feito de determinado modo há
anos.
Todavia,
a difusão da inovação, bem como o processo de modernização pode possibilitar
mudanças exponenciais não só nas ocupações, mas em toda a dinâmica de um
estabelecimento rural.
Isso
é verificável, em nosso objeto de pesquisa, no momento em que as residências
rurais podem possuir as mesmas condições e acessibilidade que as residências
urbanas. Acesso à internet local e móvel, energia elétrica, TV a cabo, que são
meios de comunicação, estão facilmente à disposição no âmbito rural.
Os
atributos do homem moderno (INKELES; SMITH, 1981), sobre manter-se informado
sobre o mundo, valorizar a educação e capacitação técnica e aprovar mudanças
sociais, pode fornecer abertura necessária para que um estabelecimento rural se
adapte e modernize a nova realidade socioeconômica ao interagir com outros
atores sociais que estão além da sua estrutura social.
Nesse
sentido que Rogers (1943, p. 5) afirma que “a comunicação implica em múltiplas
possibilidades de aceitar ou não a inovação”. Além disso, devemos considerar
que a modernização nos estabelecimentos rurais ocorre de forma mais lenta em
relação aos centros urbanos (ROGERS, 1943, p. 23)
Importante
destacarmos a passagem de Rogers para concebermos que a modernização no campo
ocorre, de uma forma ou de outra, no exercício de sua ocupação agrícola ou na
forma de vida de seus habitantes.
Rogers
(1943, p. 23) destaca ainda que “o nível de adoção da inovação é medido através
da inovação em si ou de um sistema, não através do indivíduo”. Por essa razão,
a importância de considerarmos os atributos do homem moderno de Inkeles e
Smith, uma vez que iniciamos as nossas investigações a partir dos produtores
rurais não de alguma inovação específica.
Por
outro lado, mesmo que ocorra um fluxo maior de informação em uma estrutura
social, a difusão da inovação e a modernidade como um todo só poderá ocorrer no
momento em que o ator social, aqui compreendido como produtor rural, aceitar
inferências do mundo externo no exercício de suas ocupações.
Podemos
mencionar o exemplo de um filho que cursa graduação em Administração, Economia
ou qualquer outra área e que esteja empenhado em auxiliar no desenvolvimento do
estabelecimento rural dos pais.
Os
laços sociais obtidos pelos filhos no exercício de sua profissão, na
universidade, ou qualquer outra relação fora do estabelecimento rural possibilita
maior abertura ao implemento de técnicas eficientes no gerenciamento de seu
estabelecimento, seja implemento prático ou na maneira de gerir sua
propriedade.
Estabelecimentos
rurais que não possuíam maquinários ou utilizavam insumos agrícolas, bem como o
aspecto estético de sua propriedade foram considerados como menos modernos.
Durante o período de observação, nove estabelecimentos foram visitados por outros produtores, familiares e membros de cooperativa, conforme mencionado no “item e” dos Resultados.
O
comportamento e a forma como ocorria a interação entre os atores sociais pôde
nos sugerir o grau do laço dessa relação. Alguns estabelecimentos dividiam o
refrigerador de leite, dentre outros insumos agrícolas como o trator, até mesmo
pastagem, isso pode ocasionar uma interação frequente e mais densa.
A
frequência, densidade e proximidade entre os produtores da região de
Juscimeira, especialmente entre os vizinhos parecem reforçar os aspectos de
laços fortes. Uma investigação mais apurada com esses produtores que interagem
mais pode confirmar a similaridade de suas ações ocupacionais e aspectos
socioeconômicos e culturais, verificando os aspectos teóricos, na prática, de
Granovetter.
Em
apenas um estabelecimento o filho trabalhava com o pai. Nas demais propriedades
os produtores trabalhavam sozinhos, ou contava com auxílio de trabalhadores
contratados. Em apenas dois estabelecimentos haviam trabalhadores contratados.
Na
região de Juscimeira muitos produtores são cooperados de uma cooperativa
leiteira, isso também pode ser uma variável importante ao estudarmos as
interações sociais e o papel dessa instituição não deve ser ignorado.
A
hipótese geral de que os estabelecimentos rurais inseridos em estruturas
sociais mais modernas tendem a caracterizar a dinâmica social e constituem o
nível de modernização dos estabelecimentos restou imprecisa.
Destacamos
algumas razões: há interação social e aspectos da modernização nas duas regiões
observadas, o espaço rural não é tão distante do espaço urbano, as interações
sociais ocorrem com frequência no âmbito rural.
Se
levarmos em conta a estrutura social das duas cidades, Campo Verde e
Juscimeira, poderíamos confirmar que os estabelecimentos rurais de Campo Verde
tenderiam a ser mais modernos que os de Juscimeira. Todavia, a estrutura social
não foi suficiente para justificar o nível de modernização dos estabelecimentos
rurais.
Mesmo
que a dinâmica social seja de maior modernização, há exceções e essas
características são observáveis de forma antagônica nas duas regiões, ou seja,
há estabelecimentos modernos em Juscimeira e Campo Verde, bem como
estabelecimentos menos modernos em Juscimeira e Campo Verde.
As
considerações feitas para enquadrarmos um estabelecimento como mais ou menos
moderno foram suficientes para a proposta deste trabalho. Contudo, o
desenvolvimento de estudos da modernidade no âmbito rural requer a necessidade
de trabalhar com índices para medir com mais precisão o nível da modernização
nos estabelecimentos rurais
Dois
estabelecimentos com rigor organizacional que, inclusive, apresentavam mais
características da modernidade, aqui delimitados, estavam presentes na região
de Juscimeira e apenas um na cidade de Campo Verde.
Os
parâmetros teóricos para concepção do homem moderno e, consequentemente, de um
estabelecimento rural moderno, através da análise de redes, foram suficientes
para atingirmos o objetivo proposto: realizar uma aproximação empírica ao nosso
objeto de estudo e verificarmos a hipótese sugerida.
Por
isso, uma vez presente os atributos do homem moderno, há maior possibilidade de
abertura a modernização nos estabelecimentos rurais. Em que medida e de que
forma isso tem ocorrido na prática é um fato a ser investigado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A
modernidade tem direcionado o setor agrícola para a agroindustrialização, esse
movimento consiste na industrialização do estabelecimento rural a fim de
direcionar suas produções ao mercado externo ou aproveitar vantagens
comparativas da agricultura industrial, a fim de aprimorar os pequenos setores
da agricultura.
Constatou-se
que a população rural no país possui, em sua maioria, baixa escolaridade o que
dificulta a especialização de saberes técnicos no espaço rural. A partir desse
e outros pressupostos, a interação entre os atores pode contribuir para
compreendermos o fácil acesso e a aceitação e à inovação tecnológica.
Além
das interações face a face, a interação possibilitada através da tecnologia,
internet, telefone e outros meios de comunicação permite que produtores rurais
da mesma e diferentes regiões se comuniquem com mais facilidade, permitindo
maior interação entre os grupos e, consequentemente, uma maior fluência de
informações que possibilitem mudanças nos aspectos ocupacionais e
socioeconômicos de um estabelecimento rural.
De
que maneira ocorrem essas mudanças foi o que denominamos de processo de
modernização.
Este
estudo nos permitiu reconhecer que alguns estabelecimentos rurais parecem ser
geridos como verdadeiras organizações, o que possibilitou a difusão de
princípios do agronegócio, atinentes ao gerenciamento organizacional,
tecnologia e racionalidade econômica à “agricultura familiar”.
Esta
pesquisa possibilitou a aproximação do nosso objeto de pesquisa e permitiu
observarmos a realidade socioeconômica e perspectivas dos produtores rurais da
região sudeste do Estado de Mato Grosso, o que possibilitará na construção
futura de trabalhos mais próximos à realidade social daquela região.
Os
resultados obtidos são importantes não só para o prosseguimento deste estudo,
mas com estudos posteriores que visam desenvolver a teoria de redes aplicada
aos produtores rurais e difusão da inovação no âmbito rural.
O
desenvolvimento rural dos pequenos e médios produtores rurais são de grande
importância socioeconômica local, regional e nacionalmente.
A
compreensão sobre como se dá a implementação de tecnologias no campo e por que
alguns estabelecimentos rurais se modernizam e outros não podem auxiliar na
construção de políticas que visem o desenvolvimento rural a fim de facilitar a
difusão tecnológica no campo para essa e futuras gerações.
Por
fim, pesquisas posteriores poderão medir com maior propriedade o maior ou menor
grau de modernização nesses estabelecimentos rurais, levando-se em conta
aspectos individuais e relacionais.
Acredita-se
que a abordagem adotada neste estudo, voltado aos processos de modernização nos
estabelecimentos rurais, fornece um caminho promissor para futuras pesquisas.
Algumas prioridades são evidentes: a) realizar uma categorização que possa
facilitar a análise dos dados relacionais; b) relacionar as variáveis que
possam influenciar no processo de modernização no âmbito rural; c) desenvolver
estudos com indicadores, a fim de medir com precisão o nível da modernização.
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