v. 7, n. 1, Janeiro-Abril/2023

O Empreendedorismo e suas principais vertentes teóricas: uma visão crítica

 

Hígor Cordeiro de Souza

higorcordeiro@gmail.com

http://lattes.cnpq.br/5288099289528313

Instituto Federal de Rondônia

Porto Velho/RO

 

 

RESUMO

O presente artigo busca fazer o resgate teórico dos conceitos e principais abordagens do empreendedorismo a partir de uma abordagem bibliográfica enquanto privilegia a abordagem crítica sobre o tema. Ao longo do texto, são tratadas as seguintes abordagens empreendedoras: econômica, comportamental, de processo, da prática e, por fim, a abordagem crítica. Neste artigo foi adotada uma perspectiva teórica alinhada aos Critical Management Studies (CMS) e aos Critical Entrepreneurship Studies (CES) como pano de fundo norteador das discussões. Por isso, apresento as origens históricas, conceituações e principais abordagens do empreendedorismo, não para fazer meramente um relato descritivo e funcional, mas sobretudo para trazer à reflexão seu caráter etnocêntrico, classista e excludente, bem como seu perfil ideológico, político, discursivo e formador de subjetividades.

 

PALAVRAS-CHAVE: Empreendedorismo; empreendedor; estudos críticos em empreendedorismo.

 

Entrepreneurship and its main theoretical aspects: a critical view

 

ABSTRACT

This article seeks, through bibliographic research, to make the theoretical rescue of the concepts and main approaches of entrepreneurship, privileging a critical approach on the subject. Throughout the text I deal with the following entrepreneurial approaches: economic, behavioral, process, practice and finally the critical approach. In this article I adopt a theoretical perspective aligned with Critical Management Studies (CMS) and Critical Entrepreneurship Studies (CES) as a guiding background for the discussions, so I present the historical origins, conceptualizations and main approaches of entrepreneurship not to merely make a descriptive and functional, but above all to bring to reflection its ethnocentric, classist and excluding character, as well as its ideological, political, discursive and subjectivity-forming profile.

 

KEYWORDS: Entrepreneurship; entrepreneur; critical entrepreneurship studies.

 

Submetido: 26/10/2022

Revisões Requeridas: 06/03/2023

Aceito: 24/03/2023

Publicado: 30/04/2023

 

1    INTRODUÇÃO

Neste artigo tomo a perspectiva crítica como pano de fundo norteador das discussões aqui propostas. Desta forma, pretendo fugir do tom pretensamente “neutro” (Ogbor, 2000) que os textos mais funcionalistas sobre o tema (Jennings; Perren & Carter, 2005) costumam adotar, uma vez que parto da premissa de que o empreendedorismo é uma ideologia recente do capitalismo com um discurso próprio que deve ser criticado (Costa & Saraiva, 2012).

O empreendedorismo é visto como um dos mais dinâmicos campos de conhecimento, já possuindo uma considerável tradição no meio acadêmico organizacional (Audretsch, 2012) de tal sorte que é possível se encontrar pesquisas na área sob os mais variados prismas e abordagens. Tamanha é a permeabilidade do empreendedorismo, tanto em assuntos do campo econômico como do campo social (Berglund & Verduijn, 2018), que chega a ser difícil citar uma área em que não existam propostas de “abordagens empreendedoras”, assim temos que o empreendedorismo para muitos autores é visto como a abordagem ideal para todas as profissões e ocupações ao ponto de falar-se em educação empreendedora; estudante empreendedor; enfermeiros empreendedores, professor empreendedor, cientistas empreendedores, trabalhador empreendedor, serviço público empreendedor etc.

Assim, o empreendedorismo se impõe como uma lógica a ser assimilada na prática e no discurso na constituição do próprio eu, ressignificando até mesmo as concepções de sucesso e fracasso individuais, exaltando o fracasso enquanto aprendizado e ocultando suas consequências negativas (Olaison & Sorensen, 2014). Nesse contexto, embora para Steyaert não exista consenso sobre o que seja (Germain & Jacquemin, 2017), a perspectiva crítica, busca-se revelar as contradições que fundamentam o empreendedorismo, sendo útil para a superação de paradoxos (Verduijn, Dey, Tedmanson & Essers, 2014) e pondo em xeque todas a suposições que costumam ser tomadas como garantidas (Ogbor, 2000).

Dentre as frentes de pesquisa podemos afirmar que a visão de Schumpeter (1982), pautada pela inovação e pelo famoso movimento econômico conhecido como “destruição criativa” é uma das formas mais difundidas e aceitas de se conceber e conceituar o empreendedor e o empreendedorismo, muito embora não seja a única explicação no rol das teorias econômicas sobre o assunto. Portanto, além da abordagem econômica também são discutidas aqui as perspectivas comportamentais de processo da teoria prática e, finalmente, a abordagem crítica do empreendedorismo. Em cada uma dessas abordagens busco evidenciar suas principais contribuições para o campo do empreendedorismo, sem deixar entretanto, de apontar seus aspectos críticos e limitações.

Para além das abordagens tradicionais, no campo teórico mais heterodoxo, o empreendedorismo já foi retratado como fenômeno com características sociais que permeiam o cotidiano (Steyaert & Katz, 2004). Há estudos críticos que exploram seu lado obscuro (Montiel Méndez et al., 2020), perspectivas feministas apontando a inferiorização das mulheres (Calás, Smircich & Bourne, 2009; Ahl, 2006) e mesmo no campo da educação, a crítica sobre o empreendedorismo também se faz presente (Berglund, Hytti & Verduijn, 2021).

Embora sejam vastas as teorias e metodologias empregadas, o empreendedorismo é considerado um campo extremamente complexo e sem consenso de entendimento quanto à sua própria constituição (Audretsch, 2012), existindo divergências quanto à sua origem histórica e mesmo sobre a definição do seu conceito (Herbert & Link, 1989). Neste artigo, apresento as origens históricas, conceituações e principais abordagens do empreendedorismo, não para fazer meramente um relato descritivo, mas sobretudo para ressaltar seu caráter etnocêntrico, classista, excludente (Berglund & Verduijn, 2018) ideológico, político, discursivo e formador de subjetividade.

Assim, ao mesmo tempo em que nos interessa descrever e caracterizar histórica e teoricamente o empreendedorismo, também é de interesse notar como autores da linha mainstream deliberadamente acolhem certas práticas  como “empreendedoras”, enquanto desconsideram outras (Jones & Spicer 2009). Assim, neste artigo o empreendedorismo é entendido como um discurso e uma prática que se faz presente nas políticas governamentais (Armstrong, 2005), impregnado pela ideologia econômica e social neoliberal (Costa & Saraiva, 2012) constituindo-se num novo tipo de racionalidade (Dardot & Laval, 2016) baseada na competição e no extremo individualismo da lógica de mercado.

 Neste contexto também cabe destacar que enquanto se constitui como discurso governamental o empreendedorismo tem servido como justificativa para “transformar em empreendedores”  trabalhadores precarizados, esvaziando ainda mais o conceito de empreendedorismo e cada vez mais o distanciando de sua concepção mais clássica, relacionada à inovação e criação de novos negocios.

 

2    O TERMO EMPREENDEDOR(ISMO)

Na área acadêmica pode-se dizer que o empreendedorismo teve início logo após a segunda guerra mundial na universidade de Harvard no ano de 1948, quando sob o comando de Arthur Cole passou a existir o “Research Center in Entrepreneurial History” (Fayolle, 2007, p. 6). Quanto à sua abrangência e influência em outras áreas do conhecimento, verifica-se que além das óbvias áreas de gestão e economia, o empreendedorismo também ocupa uma posição de crescente importância nas agendas de pesquisa em áreas como antropologia, história, psicologia e sociologia (Herbert & Link, 1989) o que reforça o argumento de sua interdisciplinaridade (Berglund & Verduijn, 2018) e também revela a tendência à “empreendedorização” das demais áreas do conhecimento.

Porém, mesmo sendo uma área estudada já há algum tempo pela academia e com impacto em diversas áreas de conhecimento, definir a palavra empreendedorismo ainda é um desafio e uma obsessão para os autores da área, pois mesmo sabendo-se que o termo já era usado há mais de dois séculos (Bull & Willard, 1993), a questão da indefinição dos termos é algo que ainda se impõe. Segundo Ogbor (2000) as grandes perguntas que se levantam quando se tenta explicar o conceito “empreendedorismo” são “quem” é o empreendedor e o “que” constitui o empreendedorismo. Jones e Spicer (2005) sugerem que “empreendedor” é um termo vazio de significado, uma ausência, um espaço em aberto e o empreendedorismo por sua vez, seria um discurso “não coerente e instável”, o que pode nos ser útil para compreender tamanha elasticidade de um termo que se pretende aplicar a tudo e todos.

Em seu artigo, após revisitar as principais definições históricas do empreendedorismo, Long (1983, p. 55) afirma que três são os temas recorrentes que têm se combinado em praticamente todas as teorias do empreendedorismo: “(1) incerteza e risco, (2) competência gerencial complementar e (3) oportunismo criativo”. Corroborando Long (1983) Cunningham & Lischeron (1991) apontam que assumir riscos é uma das características mais citadas na literatura sobre empreendedorismo, ao que pode-se concluir que uma definição aceitável do empreendedor, a nível mainstream, seria a de um indivíduo que aceita se submeter a um certo grau de incerteza e risco, com alguma competência gerencial, senso de oportunidade e criatividade.

Muito embora a economia moderna reconheça sua centralidade no processo econômico (Amatory & Colli, 2011) e tenha diversas teorizações sobre a função do empreendedor, existem linhas de pensamento que vão além e conceituam o empreendedorismo como um fator de produção em si, de certa forma igualando-o aos clássicos fatores produtivos terra, trabalho e capital (Herbert & Link, 1989), porém situação muito diferente se dava nos períodos clássicos da economia.

Inicialmente, para a economia neoclássica a função e o conceito do empreendedor não recebiam tanto destaque, pois o foco era a empresa onde os fatores de produção eram processados para ao fim se transformarem em produtos. Neste contexto mais estável e previsível, o empreendedor era visto apenas como o regulador de fatores de produção e preço contribuindo para o funcionamento de um processo de produção e venda que fosse o mais eficiente possível (Amatori & Colli, 2011). Schumpeter por sua vez, é quem dá protagonismo ao empreendedor no processo econômico, com sua definição do empreendedor como alguém que organiza os fatores de produção de forma inovadora produzindo rupturas e descontinuidades (Bull & Willard, 1993; Amatori & Colli, 2011).

Pode-se considerar a existência de uma abordagem de extremos opostos quando se compara a posição de Schumpeter e Adam Smith sobre o empreendedorismo. Schumpeter observou que para os clássicos Adam Smith e David Ricardo, o processo econômico acontecia de forma praticamente autônoma, sendo função do empresário o aporte de capital e a mera espera pelos movimentos automáticos e naturais da economia. Para os fundadores da ciência econômica, embora considerassem de grande valia a nível micro as habilidades individuais (empreendedoras), pouco importavam quando se pensava a economia como um todo (Amatori & Colli, 2011).

Para Puello-Socarrás (2008, p. 103) a teoria do empreendedorismo apresenta uma série de diferentes ramificações, porém se assenta sobre uma gama de fundamentos comuns, como se vê na lista a seguir:

a) Empreender não é simplesmente abrir uma firma. Mas consiste em se lançar às incertezas uma vez que não se dispõe de todas as informações necessárias devido às assimetrias naturais do processo. Empreender é arriscar sem ter a segurança de que tudo dará certo, uma vez que não se pode perscrutar com muita clareza o futuro.

b) O empreendedor, por sua vez, é alguém com as ferramentas certas e muita confiança para sondar corretamente o futuro inseguro e desconhecido.

c) O ato de empreender configura-se por “buscar alcançar um novo estado futuro” com base no agir do empreendedor. Conforme diz Von Mises (2017, p.23): “a economia é a ciência da ação humana”, e uma parte essencial disso é a prospecção do futuro como resultado das ações no presente. Assim, como todas as ações têm impacto no futuro, todas podem guardar relação com o empreendimento. Daí que a “visão de futuro” seja resultado do encadeamento das ações “selecionadas” pelo empreendedor, dentro de uma gama de opções possíveis.

d) O estado de alerta (alertness) para detectar novas oportunidades de negócio, ainda não percebida pelos demais, é uma das características marcantes dos empreendedores de sucesso. Portanto sua ação de assumir riscos frente a situações desconhecidas é o fator determinante para maiores ganhos e retornos sobre os investimentos. Neste cenário, o perfil inovador é a característica primordial dos empreendedores.

e) Finalmente, uma característica importante do empreendedorismo é sua função na “produção social”, a qual se mostra com características profundamente arraigadas em situações de mercado e contratuais. Portanto, o empreendedor é quem lidera a produção social, tendo o papel de “coordenar” a organização do trabalho e dos demais fatores de produção por meio da criação da firma.

Criticamente pode-se afirmar que o termo empreendedor nos remete à figura do herói, que pode ser visto como o homem branco europeu que chegou, “descobriu” e “conquistou” a América, constituindo assim o arquétipo agressivo, assertivo e conquistador característico do que costumamos definir como empreendedor atualmente (Ogbor, 2000, p. 617). Por outras vezes, o empreendedorismo é visto como uma forma de se exercer superpoderes como a capacidade de perscrutar o futuro e dominar a natureza. Tendemos assim a naturalizar o empreendedor como alguém com atributos heroicos, do sexo masculino, europeu ou norte-americano, disposto a correr riscos e apto a sobreviver numa espécie de mundo onde a seleção natural darwiniana se mostra como a regra e a receita para o sucesso (Ogbor, 2000).

Embora tradicionalmente ainda conceitue-se os empreendedores como pessoas treinadas para identificar oportunidades e saber como aproveitá-las (Fillion, 2000) tentativas de aplicar pedagogias críticas ao ensino do empreendedorismo sinalizam que novas formas de se ensinar e conceber o empreendedorismo estão sendo pensadas (Verduijn & Berglund, 2018) com vistas a reconstruir o significado do termo, retirando-o de seu paradigma funcionalista (Jennings; Perren & Carter, 2005) e ousadamente fazendo surgir um novo tipo de empreendedor e empreendedorismo menos preocupado em reproduzir o status quo (Costa & Saraiva, 2012) e mais consciente de suas contradições e seu entorno político e social (Spicer, 2012).

Por fim, embora existam várias definições sobre o empreendedorismo, muitas vezes ambíguas e pouco operacionais (Herbert & Link, 1989), nenhuma foi capaz de se impor e prevalecer, por isso diz-se que tal dificuldade torna nebulosos os limites do campo de estudo. Portanto, as diferentes abordagens interpretativas sobre o tema sugerem que um consenso sobre o conceito parece ser algo ainda muito distante e praticamente impossível de se alcançar (Venkataraman, 2019).

 A despeito de tudo o que foi mencionado anteriormente o empreendedorismo é um tópico que cresce tanto no ramo teórico, como na prática profissional independentemente do nível de clareza e consenso de seus conceitos. Um dos principais motivos que se pode atribuir a essa escalada emprendedora é sua utilização enquanto política para a criação de cidadãos cada vez mais “autónomos” e “independentes”, ou seja, pessoas cada vez mais autoresponsabilizadas com a consciencia de que devem empreender para atingir tanto metas pessoais como profissionais.

 

3    PRINCIPAIS ABORDAGENS TEÓRICAS DO EMPREENDEDORISMO

O empreendedorismo é um assunto com múltiplas abordagens dentro do universo dos estudos organizacionais (Gomes, 2005; Fayolle, 2007), portanto raros são os consensos sobre seus conceitos, estruturas, processos e origens. A discussão a seguir não tem a pretensão de esgotar o assunto, mas tão somente apresentar de forma mais ou menos estruturada as variadas e mais importantes perspectivas sobre o empreendedorismo, conforme antecipa a Figura 01 a seguir.

Abordagens do Empreendedorismo

Principais autores

Termos Chave

Abordagem Econômica

Schumpeter; Kizrner; Say e Cantillon

Inovação, destruição criativa, oportunidade e alerta.

Abordagem Comportamental

Mcclelland; Murray

Traços psicológicos, comportamentos, desejo de realizações.

Abordagem do Processo

Gartner; Shane & Eckhardt

Etapas de criação de empresa, Foco na ação do empreendedor

Abordagem Prática

Nicolini; Gherardi; Reckwitz

Nexus de práticas; contexto da prática; ação humana criando a prática

Abordagem Crítica do Empreendedorismo

Ogbor; Jones & Spicer; Murtola; Armstrong

Emancipação humana, Discurso, relações de poder, dominação, ideologia

Figura 01. Abordagens do empreendedorismo

Fonte: elaborado pelo autor.

Destaca-se que a divisão em abordagens não representa uma cronologia teórica nem tampouco busca demonstrar uma evolução natural e contínua dos conceitos de empreendedorismo, da qual discordo, mas antes visa estruturar a discussão em torno de eixos que acredito serem as principais fontes de teorização do empreendedorismo. Assim, com base nos estudos de Landström (2005); Fayolle (2007); Bjerke (2007); Vale (2014) dentre outros, dividimos as perspectivas teóricas empreendedoras em 5 abordagens, a saber: Abordagem econômica; Abordagem comportamental; Abordagem do processo; Abordagem da prática e Abordagem crítica, sobre as quais discorrerei a seguir.

 

3.1 Abordagem Econômica do Empreendedorismo

O empreendedorismo tem suas fundações históricas na economia (Fayolle, 2007) e até bem pouco tempo era visto somente como uma “função econômica que produzia utilidade” (Jones & Spicer, 2009), não recebendo grande destaque por parte da maioria dos autores da chamada era clássica da economia. Ademais, Baumol (1993) afirma que dentro da teoria econômica, o empreendedor é visto basicamente de duas formas: primeiro, como o criador de empresas e organizador do processo produtivo e depois, como o agente inovador que introduz mudanças. Ressalta-se que nos primeiros dois séculos de existência da economia enquanto campo formal de estudos, apenas os economistas se dedicaram ao empreendedorismo, e deste período destacam-se Richard Cantillon (1680–1734); Jean Baptiste Say (1767–1832); Joseph Schumpeter (1883–1950) e Israel Kirzner (b. 1930) (Bjerke, 2007), sobre os quais irei discorrer brevemente a seguir.

Richard Cantillon foi um banqueiro irlandês que pela primeira vez deu ao empreendedorismo um conceito com conteúdo analítico, destacando a função empreendedora no desenvolvimento econômico (Bjerke, 2007). Foi também o teórico que se empenhou em descrever o empreendedor associando-o ao risco e às variações de oferta e demanda do mercado (Costa, Barros & Carvalho, 2011). Para ele, o empreendedor é alguém que assume o risco de um empreendimento, adquirindo um bem por um determinado preço para depois o vender por um preço desconhecido (Vale, 2014, p. 877). Dito de outra forma, para Cantillon o empreendedor poderia ser qualquer pessoa que assumisse o risco envolvido em empregar recursos numa determinada empreitada sem saber se ao final todo o esforço valeria a pena. Assim, na visão de Cantillon, tanto o artesão, o comerciante ou agricultor poderiam se encaixar no perfil empreendedor por ele traçado (Costa, Barros & Carvalho, 2011). Seu trabalho mais famoso foi o “Ensaio sobre a natureza do comércio em geral”, publicado em 1755, cerca de 21 anos após sua morte. Nele, Cantillon reconhece que os desequilíbrios entre a oferta e a demanda geram oportunidades, cabendo ao empreendedor aproveitá-las e assim reintroduzir o equilíbrio no mercado competitivo (Landström, 2005).

 

Jean-Baptiste Say foi um manufatureiro e professor de economia francês da cidade de Nantes (Amatori & Colli, 2011). Para ele, o empreendedor é o empresário que se coloca em meio ao fluxo econômico com o objetivo de alcançar o equilíbrio de mercado, exercendo a função de mediador entre grupos de produtores e entre consumidores e produtores (Costa, Barros & Carvalho, 2011). Na visão de Say, o empreendedor é alguém que combina os diferentes fatores de produção com a finalidade de produzir um determinado bem. Antecipando Schumpeter, Say também defendia que é papel do empreendedor se apoiar em invenções para introduzir inovações no mercado (Vale, 2014). O teórico francês destacava que as três principais atividades econômicas são: (1) A pesquisa geradora de conhecimento; (2) O empreendedorismo que aplica o conhecimento a produtos úteis por meio da combinação inovadora dos fatores de produção e (3) os trabalhadores fazendo a manufatura dos produtos (Bjerke, 2007). Em suma, para Say o empreendedor era um organizador do meios de produção sempre focado na criação de novos produtos ou serviços que possuíssem valor ou utilidade (Landstrom, 2005).

 

Joseph Schumpeter é certamente o mais importante estudioso e teórico do empreendedorismo (Ogbor, 2000). Nascido na Áustria e atuando como professor na Universidade de Harvard durante 20 anos, era um intelectual de conhecimentos amplos e tinha como áreas de interesse não somente a economia mas também a história clássica, o direito, a história da arte e a sociologia (Bjerke, 2007). Para ele, os empreendedores, identificando oportunidades, eram a chave para o que denominou “destruição criativa” (Fayolle, 2007). Com seu pensamento radical, Schumpeter abalou os alicerces da teoria econômica tradicional ao advogar que o desequilíbrio trazido pelas inovações dos empreendedores era o ponto central da economia, determinando a ruptura como requisito para uma economia saudável, retirando a centralidade das ideias de equilíbrio e otimização anteriores (Drucker, 2014). Para Schumpeter, o fator mais importante no empreendedorismo é a inovação, independentemente do agente que a introduz, podendo ser um gerente assalariado, uma equipe ou mesmo uma entidade política (Amatori & Colli, 2011). Um fato curioso porém, é que para o autor o empreendedorismo se resume apenas ao momento em que se introduz uma inovação no mercado, ou seja, uma vez feita a inovação o agente deixaria de ser um empreendedor passando a ser um mero administrador (Bjerke, 2007). Assim, para Schumpeter há uma clara distinção entre empreendedor, inventor, capitalista e gestor. O empreendedor introduz a inovação, o inventor cria inovações, o capitalista tem o papel de financiador e, por fim, o gestor ficaria a cargo da administração dos processos (Vale, 2014). Em suma, empreender é inovar e inovar é promover a implementação de novos arranjos a nível econômico (Amatori & Colli, 2011). Schumpeter, portanto, entendia a economia a partir da ideia dos fluxos circulares, onde inicialmente há um equilíbrio entre os atores, preços, oferta e demanda formando assim um cenário de estabilidade e fluxo circular contínuo. Neste contexto, a introdução de mudanças por parte dos empreendedores deixaria todo o sistema em desequilíbrio, obrigando todos os atores a se adaptarem à nova realidade (Landstrom, 2005). Assim pode-se dizer que o maior impacto do processo empreendedor para Schumpeter é o de transformar a economia de dentro para fora, alterando as estruturas de preços e de incentivos para os empreendedores (Metcalfe, 2004). Em resumo, Schumpeter compreende o desenvolvimento econômico não como mero crescimento da economia, mas como resultado das diferentes recomendações e usos dos fatores de produção que podem se dar com: a introdução de um novo produto, ou um produto antigo com novas funções; uma nova forma de produzir; a inauguração de um novo nicho de mercado; a renovação das fontes de matéria primas ou ainda com inovações nas estruturas organizacionais (Costa et al., 2012; Landstrom, 2005; Amatori & Colli, 2011; Costa, Barros & Carvalho, 2011). Por fim, a destruição criativa de Schumpeter se dá com a introdução de uma inovação radical na economia, que por não ser facilmente assimilada pelos demais agentes põe em vantagem o empreendedor/inovador que passa a ter as maiores taxas de lucros, gerando estresse no fluxo circular e  alterando assim, seu equilíbrio (Borges, Cappelle & Campos, 2019). Obviamente neste processo em que “os empreendedores são os perturbadores do mercado e agentes de desequilíbrio criativo” (Vale, 2014, p. 879) as empresas comprometidas com o modelo anterior não conseguem se adaptar e são extintas, enquanto as sobreviventes se reorganizam, restabelecendo o equilíbrio do ciclo econômico criando as condições para as inovações e rupturas futuras.

 

Israel Kirzner é um economista que deu grande contribuição para a área do empreendedorismo (Hattwick, 1979) e, assim como Schumpeter, segue a tradição econômica austríaca, sendo considerado um discípulo dos ensinamentos de Ludwig von Mises. Entretanto, diferentemente de Schumpeter, para Kirzner (2008) o empreendedor não é um agente de ruptura do equilíbrio econômico, sendo em vez disso o indivíduo responsável por introduzir equilíbrio no jogo econômico. Para o autor o empreendedor é um sujeito oportunista, no bom sentido da palavra, que sempre está em busca de aproveitar os desequilíbrios do mercado (Kirzner, 1973; 1999; 2008). Kirzner destaca que o sentido de alerta, “alertness”, e a busca do equilíbrio são as duas principais marcas do empreendedor, que sempre deve estar atento para oportunidades de lucro ainda não exploradas e não percebidas (Kirzner, 1973). Ele ressalta ainda que o empreendedor de Schumpeter é alerta para coisas que ainda não existem e produz rupturas por meio da inovação, enquanto seu empreendedor é atento ao que já existe, aproveitando oportunidades de desequilíbrio e recuperando a estabilidade econômica (Hattwick, 1979). Amatori e Colli (2011, p. 24) ressaltam que para cumprir o propósito de constante estado de alerta e busca de oportunidades, se faz necessário “criatividade, imaginação e a habilidade para antecipar eventos e identificar as fontes corretas de conhecimento sobre o mercado”. Finalmente, afirmar que o empreendedor não desempenha papel de ruptura não significa que se esteja negando a existência de características como ousadia, criatividade e inventividades, que certamente fazem parte da identidade empreendedora, antes porém o que se afirma é que ao invés de induzir os processos, como na destruição criativa schumpeteriana, o empreendedor de Kirzner é um agente que reage aos desequilíbrios e oportunidades do mercado (Kirzner, 2008).

 

3.2 Abordagem Comportamental do Empreendedorismo

Diferentemente da abordagem econômica que era mais focada em explicar o fenômeno empreendedorismo, a abordagem comportamental buscava definir as características psicológicas do empreendedor e estudar seu comportamento (Costa, Barros & Carvalho, 2011) ao mesmo tempo em que buscava respostas para a pergunta “quem é o empreendedor?” e para responder essa pergunta os psicólogos eram figuras mais bem equipadas do que os economistas ao passo que passaram a desenvolver a linha teórica psicológica do empreendedorismo (Landstrom, 2005). Acredita-se que na maior parte das vezes as pessoas agem de acordo com suas crenças e códigos de conduta. Por isso, diz-se que as necessidades direcionam as atitudes e são determinantes dos comportamentos, assim é justo afirmar que os comportamentos são o resultado de tentativas de satisfazer determinadas necessidades como desejos de poder, reconhecimento, realizações, aceitação ou amor (Cunningham & Lischeron, 1991).

McClelland, um dos principais teóricos da abordagem comportamental do empreendedorismo, apoiou-se nos conhecimentos de Henry Murray que anteriormente já trabalhara com o conceito de necessidade de realização (need for achievement). Para Murray a necessidade por realizações era parte da personalidade das pessoas e funcionava como um botão inicial capaz de despertar comportamentos nos mais variados contextos (Finogenow, 2017). Adeptos da abordagem psicológica comportamental sustentam a crença de que empreendedores teriam traços de personalidade, valores e atitudes diferenciadas em relação à vida e ao trabalho, ao ponto que afirmarem ser possível diferenciar empreendedores de não-empreendedores baseados nesses critérios (Cunningham & Lischeron, 1991).

Para o sociólogo Max Weber eram as características puritanas da moral protestante as responsáveis por tornar o desenvolvimento do capitalismo possível. Mclland por sua vez prefere ancorar sua argumentação, ao menos indiretamente, fora da religião e cita as “normas e valores sociais”, em especial o desejo por realizações, como a base para o desenvolvimento de uma dada sociedade (Landstrom, 2005). A necessidade por realizações (Need for achievement) é, por sua vez, a necessidade de se alcançar altas performances por meio do estabelecimento de metas ousadas e do esforço por atingi-las (Finogenow, 2017). De acordo com McClelland (1961), empreendedores são pessoas com um alto sentido de realização, autoconfiança, habilidade para resolver problemas sozinhos e estão sempre dispostos a correr riscos moderados e obter feedback de suas ações (Fayolle, 2007; Landstrom, 2005).

Em seu livro lançado em 1961 “The Achieving Society” McClelland identifica e descreve três necessidades motivacionais existentes nos indivíduos, sendo elas: necessidade de realização, necessidade de afiliação e necessidade de poder/autoridade. No livro argumenta que as pessoas possuem uma espécie de mistura das três necessidades e têm uma delas como a necessidade dominante. Tais necessidades seriam adquiridas ou aprendidas no contexto social cabendo-nos destacar que a necessidade de realizações estaria baseada em gratificações afetivas, que por sua vez seriam relacionadas com o domínio de tarefas de elevado grau de dificuldade ou no aperfeiçoamento do desempenho em uma dada atividade (Finogenow, 2017).

McClelland argumenta que indivíduos com um sentido de realização demonstram uma maior tendência a se lançar aos seus objetivos de forma razoavelmente independente e lista algumas características que justificariam o comportamento mais “vencedor” dessas pessoas, como: (1) sentido de relação entre autorrealização e bons sentimentos; (2) educação voltada para a autonomia pessoal; (3) sentido de gratificação pelo êxito alcançado e (4) inclinação a se impor desafios. Ao longo de seus estudos McClelland afirma que os empreendedores são diferentes das demais pessoas justamente por apresentarem uma composição de motivação diferenciada. Desta forma atributos como audácia, liderança, coragem para assumir riscos e perseverança são características sempre comuns ao empreendedor (Vale, 2014).

Consequentemente, para McClelland (1961) os países mais bem desenvolvidos são aqueles menos focados em regras institucionais e mais focados na abertura das pessoas umas para com as outras, seus valores e na comunicação. Assim os empreendedores seriam os indutores do desenvolvimento desses países, de modo que quanto mais alto o índice de necessidade de conquistas (need for achievement) maior seria o nível de crescimento e desenvolvimento econômico do país (Landstrom, 2005). De acordo com McClelland é o sentimento de desejo de realização o responsável pelo ímpeto empreendedor. Desta forma, a necessidade de realizações seria o combustível para se conseguir uma boa performance empreendedora. Assim explica-se que a motivação está relacionada com a cultura, crenças, regras e convenções estabelecidas, por isso países e povos diferentes teriam distintos graus de “espírito empreendedor” (Vale, 2014).

Pesquisas baseadas em características psicológicas, entretanto têm sido alvo de muitas críticas conceituais e metodológicas, muito devido ao fato de atualmente boa parte das empresas serem criadas por grupos e times e não apenas por um único indivíduo (Landstrom, 2005). Reforçando o que diz a crítica de Ogbor (2000) a abordagem comportamental evidencia o viés personalista do empreendedorismo, extremamente focado no indivíduo, suas idiossincrasias e qualidades inatas que por si só seriam suficientes para explicar o empreendedorismo, que, como diz Audretsch (2012), é um comportamento que pode surgir em qualquer tipo de contexto organizacional.

Por fim, ao buscar respostas centrando-se no indivíduo, no seu comportamento e em traços psicológicos socioculturalmente herdados ou aprendidos a abordagem comportamental acaba por cair numa espécie de pensamento circular, pois se devido aos contextos sociais e culturais uma sociedade estaria mais propensa a produzir indivíduos com mais “desejo de realizações” e portanto com mais espírito empreendedor, o que em primeiro lugar explicaria tais sociedades possuírem mais capacidade cultural ou social de gerar empreendedores?

Extrapolar este mesmo pensamento para explicar o nível de desenvolvimento de países, grosso modo, parece-nos ser uma conveniente forma de hierarquizar e discriminar as culturas (Ogbor, 2000) de países da periferia do sistema capitalista, ao mesmo tempo em que legitima políticas conservadoras (Tedmanson, Verduyn, Essers & Gartner, 2012) e a posição de domínio dos países mais desenvolvidos. Portanto, aceitar estas premissas seria o mesmo que afirmar que existem culturas e sociedades por si só mais propensas ao desenvolvimento que outras. Tal pensamento ignora os processos de dominação e os desequilíbrios de poder entre os países nos processos históricos, políticos, sociais e econômicos como possíveis variáveis explicativas mais plausíveis para o empreendedorismo. Por fim, o raciocínio, reforçando o credo liberal, opta por explicações individualistas para dar conta de questões cujas respostas dependem de entendimento e explicações estruturais.

 

3.3 Abordagem do Processo Empreendedor

A partir do final dos anos 1980, intensificou-se uma nova onda de estudos sobre o empreendedorismo, desta vez não mais com foco em traços comportamentais e psicológicos, mas numa abordagem baseada em processos (Gartner, 1985; 1988). Tais estudos tinham como características o foco no movimento e na mudança e consideravam o mundo como algo instável, como que num contínuo processo de nascer e morrer (Hjorth, Holt & Steyaert, 2015). Neste contexto, Willian Gartner foi um dos grandes expoentes publicando seu artigo “Who is the entrepreneur? Is the wrong question”, que tinha como principal assunto a visão do empreendedorismo enquanto um processo de criação de novas organizações (Landström, 2005). Embora Gartner já houvesse publicado em 1985 o artigo “A Conceptual Framework for Describing the Phenomenon of New Venture Creation”, com forte ênfase na visão processual do empreendedorismo, no trabalho de 1988, além da visão processual nota-se uma pesada crítica a toda a abordagem comportamentalista empreendedora.

Em seu artigo Gartner (1988) deixa claro que mais importante do que elencar comportamentos, muitas vezes incoerentes entre si, o crucial seria saber o que fazem os empreendedores. Isto não significa que sua abordagem processual negue a existência de comportamentos associados ao empreendedorismo, mas destaca porém que o empreendedorismo deve ser entendido primordialmente como algo que alguém faz e não algo que alguém é. Em suma, Gartner (1988, p. 62) afirma que “para entendermos o empreendedorismo precisamos focar nos processos pelos quais novas organizações são criadas” e por isso os estudos devem “concentrar-se nas atividades que habilitam uma pessoa a criar novas organizações” (Landström, 2005, p.19).

 Gartner (1985) afirma que existem certos passos que formam o processo empreendedor, primeiro o empreendedor identifica uma oportunidade, depois reúne os recursos necessários, comercializa produtos e serviços, produz os produtos, cria uma organização e por fim responde ao governo e à sociedade. Na mesma linha de pensamento Shane e Eckhardt (2003) afirmam que o empreendedorismo é um processo sequencial, embora não seja um processo estável ou linear. O empreendedorismo pode ser encarado como um processo reiterado que se compõe de avaliar, planejar, agir e reavaliar. Envolvendo ainda a criação de uma ideia, calibramento de habilidades pessoais e tomadas de ação presente e futura (Cunningham & Lischeron, 1991), por fim Baron (2007) acrescenta a tomada de decisões e a formulação de estratégias de negócios como importantes etapas do processo empreendedor.

Inicialmente pode-se dizer que os pesquisadores do empreendedorismo buscavam o foco em processos por permitir uma visão mais alargada e pluralista, que os libertasse das amarras das visões baseadas nas teorias econômicas ou nas abordagens behavioristas, a visão processual permitia uma consideração mais ampla e complexa (Fayolle, 2007, p. 34) favorecendo um melhor entendimento do assunto considerando seu contexto no tempo; espaço e sua multidimensionalidade (Fletcher & Seldon, 2016). Atualmente, as pesquisas sobre o processo empreendedor ainda constituem uma importante vertente teórica existindo vários estudos associando-a à teatralidade (Anderson, 2005) e a diversas outras abordagens como: desenvolvimento, evolução, teoria do caos, teoria da complexidade, teorias interpretativas, fenomenológicas, narrativas, discursivas, social construtivistas, pragmáticas, baseadas na prática, radicalismo processual e teoria ator-rede (Steyaert, 2007).

 

3.4 Abordagem Prática do Empreendedorismo

Embora já fossem discutidos em áreas mais ligadas à sociologia e aos estudos culturais pelo menos desde a década de 70 (Reckwitz, 2002; Nicolini, 2012) e até sendo populares quando associadas à “estratégia” e “liderança” (Thompson, Verduijn & Gartner 2020) as Practice Based Approaches ou, como se convenciona chamar em português, Estudos Baseados na Prática – EBP – ainda são escassas quando se considera sua aplicação na análise do empreendedorismo (Marins & Davel, 2019), o tema entretanto tem recebido um crescente interesse dos pesquisadores podendo-se afirmar que é um campo em ascensão (Gartner, Stam, Thompson & Verduyn, 2016).

O interesse nas practice theories aplicadas às organizações se dá em razão da busca por um conhecimento não “racional-cognitivo”, uma vez que nesse tipo de abordagem dá-se mais ênfase ao reconhecimento de aspectos históricos, sociais e culturais do conhecimento (Corradi, Gherardi & Verzelloni, 2010). Para Vogt e Bulgacov (2018, p. 37) a abordagem prática pode ser útil para o entendimento das questões organizacionais devido “sua capacidade de fornecer uma visão processual das questões e de colocar em primeiro plano o papel central das atividades humanas”. A teoria prática propõe alternativas explicativas não duais rejeitando separações como “corpo/mente”, “teoria e ação” (Nicolini, 2012), também rejeitando a visão de um mundo ordenado por normas e regras, afirmando ainda que o estudo da prática compõe-se de “todas as formas de ações humanas” porém sem desconsiderar as “dimensões políticas particulares” (Ortner, 1984, p. 149).

Embora não se possa afirmar a existência de uma teoria unificada da prática (Nicolini, 2012), pode-se dizer que as muitas teorias com abordagens práticas compartilham pontos em comum como: 1 as ações locais são consequências na produção da vida social; 2 dualismos não devem ser aceitos como base para teorizações e 3 as relações existentes na sociedade são mutuamente constitutivas, dependendo umas das outras para existir (Feldman & Orlikowski, 2011). Assim, o empreendedorismo visto como uma disciplina baseada na prática é delineado pela natureza de seu contexto e se beneficia das ferramentas de análise geradas por tal abordagem teórica (Anderson & Ronteau, 2017).

Para Gherardi (2019) abraçar uma perspectiva prática significa compreender a organização como um conjunto de práticas múltiplas que acontecem simultaneamente interna e externamente constituindo a própria forma de ordenação dos fluxos organizacionais. Uma prática por sua vez, “consiste na forma como as coisas são descritas e o próprio mundo é compreendido, constituindo-se assim na maneira repetitiva como os corpos se movem, os objetos são manuseados e os indivíduos são tratados” (Reckwitz, 2002, p. 250). Porém, ao mesmo tempo em que reduzem as incertezas, as práticas também funcionam como um mecanismo de desordem e instabilidade visto que são passíveis de mudanças e correspondem às racionalidades em constante mudança de seus agentes (Gherardi, 2019).

Orlikowski (2010) argumenta que a teoria prática possui três abordagens principais sendo a primeira a empírica, responsável por dar protagonismo às ações das pessoas reconhecendo seu papel nas operações das organizações. A segunda é a abordagem teórica, encarregada de explicar o “como” das dinâmicas das atividades organizacionais diárias e uma terceira abordagem sendo a filosófica, esta por sua vez explica o "porquê" das práticas e assume a premissa de que os blocos básicos da realidade social são compostos por práticas, não externas, inerentes aos próprios indivíduos.

Portanto, a perspetiva prática do empreendedorismo implica em padrões de comportamentos corporais além de formas padronizadas de compreensão, know-how e desejos sobre o empreendedorismo. Assim a prática não pode ser reduzida apenas a uma “ação”, mas é uma forma de rotina que se forma a partir de diversos elementos interconectados (Gartner, Stam, Thompson & Verduyn, 2016). Neste sentido Schatzki (2005) argumenta que o ambiente social é composto de vários “nexus” de práticas e disposições materiais sendo que a própria vida social “inerentemente transpira tais nexus”. Assim, toda prática organizada seria um desdobrar de ações abertas que se dão num dado espaço e num dado tempo.

Apoiando-se na ideia de “nexus” de Schatzki (2005) pode-se dizer que o empreendedorismo é um processo aberto que se dá por meio de um nexo de práticas formando estruturas, redes de poder, atores e a própria identidade empreendedora. A teoria prática assim abre espaço para um empreendedorismo “mais do que humano” onde as ações das pessoas fazem parte da produção e transformação dos nexus de práticas. Em resumo o empreendedorismo enquanto prática visa uma melhor compreensão da realidade empreendedora num mundo em constante mudança onde nexus de práticas não-estáticas a todo instante moldam e são moldadas pela atividade empreendedora (Thompson, Verduijn & Gartner, 2020), acrescente-se ainda que a visão prática do empreendedorismo tem a vantagem de o retirar de um paradigma linear e estático buscando compreendê-lo por meio de “dimensões subjetivas, sociais, políticas e institucionais, narrativas, contextuais, processuais e sensíveis” alcançando assim um entendimento mais sofisticado do fenômeno (Marins & Davel, 2019, p. 15)

 

   

3.5 Abordagem Crítica do Empreendedorismo

 

3.5.1 Pressupostos do Empreendedorismo Crítico

Pode-se dizer que as Ciências sociais críticas, ao qual se afiliam as abordagens críticas do empreendedorismo, são formadas por quatro componentes que são: 1 Identificar e desafiar suposições por trás das formas habituais de percepção, concepção e ação; 2 Reconhecer a influência da História, cultura e posição social nas crenças e ações; 3 Imaginar e explorar alternativas disruptivas e extraordinárias capazes de criar novos ordenamentos e 4 ser cético em relação a qualquer forma de conhecimento ou resposta que alegue ser a única verdade ou alternativa disponível (Brookfield, 1987, citado por Alvesson & Deetz, 2000, p. 8). Assim a investigação social crítica busca desafiar e não confirmar as regras estabelecidas, produzir ruptura e não reprodução das convenções e tradições culturais assumindo a discordância ao invés do consenso como ponto inicial (Alvesson & Deetz, 2000).

 O termo “crítico” pode ser associado a diversas tradições teóricas, portanto não é um discurso ou teoria unificada e encontra adesão entre pós-modernos, teóricos críticos da Teoria Crítica propriamente dita (Escola de Frankfurt), Pós estruturalistas e ainda nos Estudos Críticos em Gestão (Critical management studies) (Fletcher & Seldon, 2016). Alvesson (1991) destaca que uma tarefa importante da teoria crítica é fornecer análises críticas das condições sociais e formas de consciência que moldam as crenças e os pensamentos das pessoas e os condicionam aos padrões sociais estabelecidos, formas de racionalidade e suposições tidas como certas.

Os estudos críticos em empreendedorismo têm influências direta dos Estudos Críticos em Gestão (Critical Management Studies – CMS), adotam uma variedade de abordagens teóricas (Berglund & Verduijn, 2018) e embora recentes, já podem ser considerados como um ramo sólido bem estabelecido dos estudos organizacionais (Spicer, 2012). Pode-se dizer que começaram quando pesquisadores passaram a adotar a perspectiva crítica para analisar o que chamavam de “cultura empresarial”. Percebeu-se que a linguagem empresarial estava sendo cada vez mais utilizada fora do seu contexto “natural”, passando a ser utilizada em escolas e hospitais e ainda em setores como de meio-ambiente e desenvolvimento. Marcadamente, os discursos apresentavam uma visão positiva e infalível do empreendedor, o que se espalhou rapidamente (Spicer, 2012; Jones & Spicer, 2009).

O status de verdade inquestionável do empreendedorismo deixava nebuloso várias pontos a respeito de assuntos como ideologia, relações de poder, identidade dentre outros (Tedmanson, Verduyn, Essers & Gartner, 2012) e para dar conta de tais agendas ocultas ou invisibilizadas os estudos críticos em empreendedorismo (Critical Entrepreneurship Studies – CES) são concebidos. Geralmente tais estudos questionam entendimentos dominantes e abrem espaço para novas abordagens (Verduijn & Berglund, 2019), mais relacionadas a sociedade e menos com questões puramente econômicas (Berglund & Verduijn, 2018).

Via de regra, teorias críticas sobre o empreendedorismo tentam explicar como o empreendedorismo se relaciona com formas de poder e dominação e geralmente concentram-se em questões acerca do discurso empreendedor e suas consequências, quais as dimensões afetivas do empreendedorismo e ainda sobre quais são as circunstâncias sob as quais alguém pode ser ou não considerado empreendedor (Spicer, 2012). Uma teoria crítica do empreendedorismo deve ser antes de mais nada emancipatória, buscando libertar as pessoas de ideias mal concebidas e de regimes políticos e econômicos de dominação. Deve ser o oposto das abordagens funcionalistas e interpretativas que visam respectivamente, buscar eficiência e efetidades no primeiro caso, ou simplesmente compreender melhor o empreendedorismo no último caso (Jones & Spicer, 2009).

Jennings, Perren e Carter (2005) apontam que pesquisas com foco mais radical, podem dar um novo ânimo aos pesquisadores e ajudar a construir um reequilíbrio de forças. Aceitar o funcionalismo como único paradigma vigente reduz o campo de visão dos pesquisadores, diminui as possibilidades metodológicas e acaba limitando o próprio desenvolvimento do empreendedorismo. Portanto, possibilitar um maior pluralismo de abordagens e paradigmas ajuda a apontar os caminhos futuros ao mesmo tempo em que abre caminho para o questionamento de verdades tidas como “naturais” e “imutáveis”, típicas da fase “normal” da ciência como nos diria Thomas Khun (Jennings, Perren & Carter, 2005). Neste contexto, a crítica deve ser usada como ferramenta para a “emancipação e libertação ideológica, política e econômica a que o empreendedorismo está submetido” (Dey, 2018, p. 01).

Aqui cabe destacar que “emancipação” não é um termo de uso exclusivo dos estudos críticos em empreendedorismo, sendo também utilizado no sentido hegemônico (Rindova et al., 2009) como a promoção da lógica empreendedora para outras esferas além da criação de novas empresas. Dito de outra forma, “emancipação” para Rindova et al. (2009) é algo como um comportamento catalisador de “destruições criativas”, que em nossa visão nada tem de emancipatório no sentido crítico do termo.

Tendo em vista que o empreendedorismo tem sido dominado por visões puramente de mercado e individualistas (Verduijn, Dey, Tedmanson & Essers, 2014) para nós, adeptos do pensamento crítico sobre o empreendedorismo, a “emancipação” buscada não se dá por meio do reforço da lógica que criticamos, o que se busca é a ruptura com o modelo vigente para a reconstrução de algo novo em seu lugar, assim busca-se a resignificação, a reconceituação e a própria “tomada de consciência” dos profissionais e acadêmicos que ainda creem que o caminho seja continuar a fazer o que sempre fizeram. Emancipação portanto, no sentido crítico, tem a ver com a libertação e superação do próprio paradigma empreendedor vigente.

 

3.5.2 Os Estudos Críticos em Empreendedorismo

Nodoushani e Nodoushani (1999), Ogbor (2000) e Armstrong (2005) são considerados os precursores da abordagem crítica do empreendedorismo (Verduijn & Berglund, 2019; Fletcher & Seldon, 2016). Inicialmente Nodoushani e Nodoushani (1999) trabalharam a desconstrução ideológica do mito em torno da figura do empreendedor, Ogbor (2000) por sua vez demonstrou como o discurso do empreendedorismo é etnocentricamente definido e privilegia uma perspectiva ocidental e masculina, em suas próprias palavras o autor nos diz:

 

“Quando o empreendedorismo é definido etnocentricamente como um fenômeno pertencente a um determinado grupo social, não apenas o estudamos dentro dessa fronteira, mas também o praticamos dentro da fronteira conceitual que foi teoricamente construída. O sistema ideativo que criamos por meio de nossos discursos sobre empreendedorismo legitima e institucionaliza não apenas a pesquisa empreendedora, mas também sua práxis. Dessa forma, o uso da linguagem empreendedora em nossos discursos serve como um meio pelo qual as ideologias constituídas na sociedade são reproduzidas e mantidas” (Ogbor, 2000, p. 627, tradução nossa).

 

Armstrong (2005) por sua vez, tratando da realidade inglesa, apontou as formas de uso e instrumentalização do empreendedorismo na política. Para o autor, o empreendedorismo deve acima de tudo ser compreendido enquanto política de Estado se aliando ao capital numa fase em que o modelo fordista não é mais viável para as empresas. Dessa forma, a redução de impostos para os mais ricos, cortes de direitos sociais e limitações do poder dos sindicatos são gradativamente implantadas (Armstrong, 2005). Ademais, políticas de "flexibilização" de leis trabalhistas e direitos previdenciários assim como a precarização e privatização de serviços públicos básicos criam o cenário perfeito para que os indivíduos lançados em uma situação de instabilidade e insegurança vejam a adoção de um “espírito empreendedor” como a solução perfeita para seus anseios, mal sabendo que na verdade estão cada vez mais submetidos a uma forma de dominação que os faz “interiorizar a culpa pela própria desgraça” (Campos & Soeiro, 2016, p. 10).

O discurso do empreendedorismo neste cenário serve como política para “dourar a pílula” e fornecer as justificativas necessárias e convenientes para um modelo de austeridade, assim menos impostos para os mais ricos significariam “incentivos à inovação empreendedora”, e menos acesso a serviços públicos são, na verdade, “libertação da dependência do cidadão e incentivo à resiliência” e por fim, as limitações e entraves aos sindicatos são vistos como “liberação dos indivíduos dos poderes coercitivos coletivistas” (Armstrong, 2005, p. 217).

Temos então que a teoria empreendedora majoritária baseia-se em argumentações sobre o livre mercado, capitalismo e numa ideia de liberdade econômica para todos (Ogbor, 2000), mas é incapaz de produzir reflexividade e análise crítica por ser um conjunto de ideias que se baseiam em preservar e aprofundar as conformidades da realidade social, expressando um conservadorismo que a impede de romper com todas as normas sociais tidas como certas e verdadeiras (Ogbor, 2000).

 

3.5.3 A Abordagem crítica do empreendedorismo e o “Eu Empreendedor”

Atualmente, o empreendedorismo pode ser visto como um “modo de ser”, moldando a própria identidade dos indivíduos (Dardot & Laval, 2016) que cada vez mais aceitam modular seu eu em afinidade com princípios como lucratividade, competição e iniciativa individual e sobretudo aceitam o mercado como entidade suprema (Campos & Soeiro, 2016), validadora do sucesso e do fracasso. A internalização do discurso empreendedor levou a uma mudança de percepção do próprio indivíduo para consigo, levando muitos a se perceberem enquanto “indivíduos/empresa” atribuindo a si próprios características ditas empreendedoras como dinamismo, tolerância ao risco e espírito inovador. Assim mesmo, pessoas que não possuíam empresas ou desempenhavam funções distantes do que se poderia considerar empreendedor passaram a se identificar com a identidade empreendedora (Spicer, 2012; Jones & Spicer, 2009).

Desta forma, o eu empresarial (entrepreneurial self) nos alerta da necessidade de nos tornarmos uma pessoa ambiciosa e responsável por dar à nossa própria vida um caráter empreendedor (Lemke, 2001) ao passo que o sujeito empresa se constitui no modelo a ser perseguido (Berglund, 2013) pelos profissionais. Neste contexto, a formação para o empreendedorismo tem um papel fundamental e busca alterar ativamente a subjetividade dos desempregados. Deixando recair toda a culpa nos indivíduos, a formação e educação empreendedora fomenta a normalização cada vez mais frequentes da exploração no trabalho, assim a educação passa ser adaptativa deixando de ser instrumento para a autonomia dos indivíduos e constituindo-se como forma de aceitação e naturalização do status quo (Campos & Soeiro, 2016).

Dito de outra forma, para o credo neoliberal ser empreendedor nada ou pouco tem a ver com a introdução de inovações no mercado, mais importante é ter uma postura empreendedora, marcadamente individualista e utilitária. Ser empreendedor é enxergar-se a si mesmo enquanto capital humano (Becker, 2009) que precisa se auto-administrar a fim aumentar seu valor ao longo do tempo. Sendo o indivíduo seu próprio capital este deve empenhar-se no constante exercício de investimento em si mesmo, por meio da educação e cursos principalmente, para assim ver seu valor multiplicado (Dardot & Laval, 2016).

Corroborando a hegemonia da ideologia empreendedora um estudo sobre o discurso empreendedor nas empresas júnior brasileiras realizado por Costa & Saraiva (2012) identificou três pontos que valem destaque: (1) há um consenso acerca do protagonismo dos modelos empresariais nas formas de pensar e agir, (2) considera-se o modelo capitalista neoliberal como o mais exemplar e por fim (3) os alunos não acreditam em alternativas fora do modelo capitalista hegemônico. Como tais empresas situam-se em universidades isto pode sugerir que a educação superior pode estar funcionando mais como reprodutora da ideologia dominante do que como espaço de questionamento e debate sobre aquilo que é ensinado (Verduijn & Berglund, 2019).

Por fim, o discurso do empreendedorismo nos diz que qualquer pessoa pode ser bem-sucedida e sempre evoca a promessa de grandes recompensas. Ao mesmo tempo, a figura do empreendedor funciona como um mecanismo que justifica o direcionamento de riquezas para indivíduos específicos, como se os processos de geração de riqueza se originassem de sua própria individualidade (Jones & Murtola, 2012a). Entretanto, o que o empreendedorismo realmente faz é aprofundar a lógica neoliberal que é a origem do problema. Com um discurso baseado na liberdade e no individualismo o empreendedorismo, de forma cada vez mais veemente, aponta que cada indivíduo é o único responsável pelo seu destino e pela situação em que se encontra (Campos & Soeiro, 2016), dessa forma se espalha, se constitui como verdade e se impõe para os indivíduos que o assimilam como a mais nova norma de conduta do mercado e de suas vidas.

 

4    CONCLUSÕES

Neste breve ensaio busquei apresentar e discutir o empreendedorismo e suas principais abordagens, as quais novamente listo: Abordagem Econômica, Abordagem Comportamental, Abordagem do Processo, Abordagem da Prática e por fim Abordagem Crítica. Na Abordagem Econômica ficou evidente o peso e a contribuição deixados por Schumpeter com a introdução da ideia de inovação associada à destruição criativa, porém também é notável que é uma abordagem que não foge à sua ideologia ao centrar o fenômeno do empreendedorismo excessivamente no indivíduo e em suas habilidades, certamente contribuindo para a visão contemporânea que se tem do empreendedor como alguém que se faz a si mesmo.

Na abordagem comportamental evidenciou-se o pensamento de McClelland e seu “desejo de realizações” enquanto motivação para o empreendedorismo. A crítica que se faz aqui tentou demonstrar não ser razoável que o empreendedorismo possa ser explicado somente com base em traços psicológicos ou comportamentos, bem como também não se pode justificar que determinadas culturas ou povos sejam mais propensas que outras a produzir indivíduos empreendedores e consequentemente mais propensas ao desenvolvimento. Neste ponto a denúncia do etnocentrismo (Ogbor, 2000) se fez necessária, muito embora se saiba que o discurso ancorado em justificativas ideológicas travestidas de ciência ainda tem um forte apelo na teoria empreendedora.

Quanto à abordagem do processo Gartner (1985) foi destacado primeiro dada sua relevância na temática processual e paralelamente devido ao fato de ser um dos pioneiros na crítica das abordagens comportamentais. Com uma abordagem voltada para a ação, Gartner deixa claro seu posicionamento ao afirmar que o empreendedorismo corresponde a um processo de ações realizadas pelo empreendedor para a abertura de um negócio. Como crítica podemos dizer que a abordagem processual, assim como as anteriores, apesar de antagonizar com a visão comportamental não foi capaz de uma crítica mais profunda, focando apenas e estritamente nos processos de criação de empresas sendo incapaz de questionar os processos estruturais contraditórios que fundamentam o empreendedorismo.

A abordagem prática por sua vez evidenciou-se como uma visão teórica mais arejada do empreendedorismo, mostrando-se mais conectada com o contexto social. Introduziu a noção de práticas corpóreas, rotinas e subjetividades ao empreendedorismo sendo uma visão mais ampla ao considerar cenários políticos, narrativas e nexos de práticas na paisagem empreendedora. Tem o mérito de apresentar e compreender o empreendedorismo enquanto manifestação humana de forma menos linear e pragmática e mais social e culturalmente contextualizada. Cabe destacar, no entanto, que não corresponde a um corpo teórico unificado, e embora exista viés crítico em sua composição, por vezes parece ser extremamente subjetiva e de difícil aplicabilidade no campo prático.

Quanto à abordagem do empreendedorismo crítico, esta se apresenta com a retórica da liberdade (Verduijn, Dey, Tedmanson & Essers, 2014), assim como sua contraparte hegemônica, mas para isso utiliza-se da desconstrução dos discursos (neo)liberais, apontando suas contradições e lados obscuros, explicitando sua falsa neutralidade e revelando suas agendas de caráter conservador e totalizante (Costa & Saraiva, 2012; Jones & Murtola, 2012b) evidencia que o empreendedorismo mainstream enquanto subjetividade neoliberal busca se fundamentar na liberdade do indivíduo, na sua livre iniciativa e constrói toda uma justificativa baseada na racionalidade e na competição de mercado para se mostrar como “única opção” econômica viável (o famoso “there is no alternative” de Margareth Tatcher).

Enquanto na base neoliberal há uma visão “utópica” do empreendedorismo (Verduijn, Dey, Tedmanson & Essers, 2014), onde se busca lutar contra todo tipo de “coletivismo” para que os indivíduos possam agir livremente no mercado e assim empreender gerando riqueza e prosperidade, do lado crítico busca-se evidenciar o caráter “distópico” do empreendedorismo (Verduijn, Dey, Tedmanson & Essers, 2014) argumentando que a lógica empreendedora nem sempre é boa ou mesmo desejável, fazendo a denúncia de que por trás das promessas de sucesso e prosperidade o que de fato existe é uma maior exploração do trabalho, expropriação do bem comum (Jones & Murtola, 2012a) destruição do meio ambiente, extremo individualismo, políticas de austeridade fiscal e cortes de gastos sociais (Armstrong, 2005) etc. Portanto, a abordagem crítica do empreendedorismo evidencia que uma liberdade que só pode ser utilizada para fins de mercado não pode ser chamada de liberdade mas antes configura-se numa forma explícita de dominação, pois sempre coloca preceitos econômicos acima dos humanos (Giron, 2008).

É portanto razoável afirmar que, com base na abordagem crítica do empreendedorismo, o neoliberalismo busca a radicalização do discurso empreendedor. Se para Schumpeter o empreendedor se apresentava de modo muito mais específico ao propor novos arranjos para os fatores produtivos e fazendo surgir a destruição criativa por meio da introdução de inovações na economia, para os economistas da Escola de Chicago o empreendedor é acima de tudo um ideal a ser perseguido por todos os membros da sociedade, sendo assim a conduta considerada mais correta a ser adotada em quaisquer aspectos ou setores da vida dos indivíduos, seja no trabalho, no seio familiar, na escola ou nos relacionamentos. Desta forma a doutrina empreendedora propõe às pessoas tratar a si, aos outros e a tudo como bens, mercantilizando todos os espaços, formas de gestão, instituições e relacionamentos. Como se tudo se resumisse há um grande mercado de ações onde tudo pudesse ser transacionado mediante cálculos de risco, ganhos e perdas feitos pelos indivíduos.

Podemos dizer que o discurso do empreendedorismo é ideológico (Jones & Spicer, 2009), fundamentado num pensamento ocidental e masculino (Ogbor, 2000) e basicamente busca se justificar com a retórica do “esforço individual” e da “iniciativa” porém não reconhece com o devido protagonismo as construções coletivas necessárias para a existência de seus “vencedores” (Jones & Murtola, 2012a). Ao fim de tudo demonstra que para a linha hegemônica é mais fácil e cômodo ter uma narrativa que produza “consentimento” em todos (Campos & Soeiro, 2016), que premie poucos, invisibilize muitos e por fim que seja perfeitamente compatível com a lógica de acumulação e expropriação das riquezas comuns, socialmente construídas (Jones & Murtola, 2012a; Jones & Spicer, 2009).

Após discorrermos sobre as diferentes abordagens do empreendedorismo e sobretudo após apresentar a perpectiva crítica como uma visão alternativa às teorias dominantes sobre o assunto cabe-nos fazer algumas perguntas: seria possível um novo tipo de empreendedorismo menos pautado na competição e no indivualismo? Que políticas seriam necessárias para estimular um empreendedorismo com um perfil mais macroenômico e menos centrado na autorresponsabilização pessoal como receita para o sucesso? E por fim, como mudar a ideología empreendedora de modo que passe a considerar   não somente a concentração de renda como sinónimo de êxito individual? São perguntas para as quais ainda não temos respostas mas que precisam ser feitas para que possamos avançar no sentido de construir entendimentos alternativos sobre o empreendedorismo.

Concluindo, ao lançarmos um olhar sobre as principais teorias empreendedoras verificamos que boa parte está pautada na lógica da competição e do individualismo. A perspectiva crítica por sua vez oferece-nos a chance de questionar esta forma de pensar e embora não apresente uma linha de ação clara sobre “o que fazer” para mudar, serve-nos como um alerta ao apontar os aspectos nem sempre positivos do empreendedorismo. Assim força-nos a repensar práticas e conceitos de modo a considerá-los não como meras realidades naturais, mas como coisas propositalmente construídas e por isso passíveis de mudança.

 

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