v.
7, n. 1, Janeiro-Abril/2023 This work is licensed
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ANÁLISE DA PROPENSÃO DE UNIVERSITÁRIOS EM
EMPREENDER A PARTIR DAS FINANÇAS COMPORTAMENTAIS
Abner
Ferreira dos Santos
abnerstz@hotmail.com
http://lattes.cnpq.br/9511875513668009
Unesp
Jaboticabal/SP
Elimar Veloso Conceição
elimarvc@usp.br
https://orcid.org/0000-0003-0089-0448
http://lattes.cnpq.br/1781793206123493
Índustria e Comércio de
Auto Peças Rei Ltda.
Cajuru/SP
Elton Eustaquio Casagrande
elton.eustaquio@unesp.br
http://lattes.cnpq.br/8335553919867015
https://orcid.org/0000-0003-4523-6802
Unesp/Araraquara
Araraquara/SP
David Ferreira Lopes Santos
david.lopes@unesp.br
http://lattes.cnpq.br/5017639694729451
http://orcid.org/0000-0003-3890-6417
Unesp/Jaboticabal
Jaboticabal/SP
RESUMO
A teoria de finanças comportamentais tem-se
mostrado relevante para compreender decisões “não racionais” dos agentes no
mercado financeiro, porém, em um aspecto contemporâneo, pode-se também
aplicá-la em outros campos, como o do empreendedorismo, estudando o
comportamento dos agentes na tomada de decisões empreendedoras. Como a teoria
das finanças comportamentais estuda a aversão ao risco de agentes econômicos,
estudar o comportamento de agentes no ato de empreender apresenta-se como uma
oportunidade de pesquisa distinta. Portanto, o objetivo desse estudo é avaliar,
por meio das finanças comportamentais, a propensão em empreender de alunos dos
cursos de graduação da FCAV. Para viabilizar a pesquisa foi elaborado um
questionário e aplicado em uma amostra probabilística de 230 estudantes dos 5
cursos de graduação. Os resultados foram analisados por meio da análise
fatorial e a análise discriminante, demonstrando que os vieses comportamentais
e a intenção empreendedora previstas na literatura se apresentam na amostra
investigada. A propensão ao empreendedorismo, junto a amostra pesquisada, se
manifesta fundamentalmente nos jovens do gênero masculino e que já tiveram
alguma experiência com mercado financeiro, por meio de produtos financeiros.
Além disso, verificou-se a importância da formação e escolaridade da figura
paterna na propensão a empreender do jovem.
PALAVRAS-CHAVE: Aversão ao Risco, Criação de Novos Negócios,
Universidade Empreendedora, Formação Universitária, Perfil Empreendedor
ANALYSIS OF
THE PROPENSITY OF UNIVERSITY STUDENTS TO ENDEAVOR THROUGH OF BEHAVIORAL FINANCE
ABSTRACT
The behavioral finance theory has shown to be relevant
to understand “non-rational” decisions of agents in the financial market,
however, in a contemporary aspect, it can also be applied in other fields, such
as entrepreneurship, studying the behavior of agents in making entrepreneurial
decisions. As the behavioral finance theory studies the risk aversion of
economic agents, studying the behavior of agents in the act of entrepreneurship
presents itself as a distinct research opportunity. Therefore, the objective of
this study is to evaluate, through behavioral finance, the propensity to
undertake of students of FCAV undergraduate courses. To make the research
viable, a questionnaire was developed and applied to a probabilistic sample of
230 students from the 5 undergraduate courses. The results were analyzed
through factor analysis and discriminant analysis, demonstrating that the
behavioral biases and entrepreneurial intention predicted in the literature are
present in the investigated sample. The propensity to entrepreneurship, along
with the researched sample, is manifested fundamentally in young men who have
already had some experience with the financial market, through financial
products. In addition, it was verified the importance of the formation and
schooling of the father figure in the propensity to undertake of the young
person.
KEYWORDS: Risk Aversion, Creation of New Business, University Entrepreneur,
University education, Profile Entrepreneur.
Submetido:
21/09/2022
Revisões
Requeridas: 24/02/2023
Aceito: 24/03/2023
Publicado:
30/04/2023
A
“Hipótese de Mercados Eficientes” (HME) assegura que o valor de um ativo é
resultado do entendimento consensual dos participantes com informações
simétricas com relação ao desempenho esperado do ativo em questão (VAN HORNE,
1998). A HME foi elaborada por Fama (1963 e 1965) e Samuelson (1965) que
compartilhavam a premissa da racionalidade ilimitada dos agentes financeiros
(AMINIMEHR et al., 2022).
O
entendimento dos principais pressupostos da teoria de finanças sustentou as
análises fundamentalistas realizadas no mercado financeiro ao longo do século
XX (ANACHE; LAURENCEL, 2013).
Ao
assumir a HME, os fundamentos da hipótese se baseiam na noção de que o
processamento ótimo dos dados disponíveis no mercado e as informações a serem
consideradas permitem ao indivíduo maximizar o alcance os resultados esperados
(HUBÁČEK; ŠÍR, 2022). Portanto, os tomadores de decisões atuam de acordo com a
teoria da utilidade esperada, gerando expectativas não enviesadas sobre eventos
futuros (HIRSHLEIFER, 2015).
Em termos
teóricos, a HME tem três versões de Fama (1970), forte, semi-forte e fraca para
a hipótese. Em paralelo ao desenvolvimento teórico em torno da HME, é fato que
as evidências sobre crises financeiras internacionais também levaram a novos
desenvolvimentos e mecanismos prudenciais, amplamente conhecidos na literatura
científica e publicações de mercado e institucionais .
Pereira e
Urpia (2011) e Dima, Dima e Ioan (2021) consideram que os eventos mais recentes
como a crise do mercado imobiliário em 2008 e as condições impostas pela
pandemia de Covid-19 fomentaram questionamentos na comunidade científica a
respeito de princípios teóricos da HME. Inclusive, autores como Adams e Finn
(2006), defendem que a HME se altera após o ocorrido em 2000, e aproveita para
elaborar uma crítica às premissas de racionalidade ilimitada na tomada de
decisão.
Nesse
contexto, a teoria das Finanças Comportamentais surge como uma alternativa à
busca de respostas a situações práticas que ocorrem no mercado financeiro e que
permeiam o contexto de decisão de agentes econômicos.
Enquanto
alternativa, a abordagem das finanças comportamentais não consiste em
substituir os pressupostos da teoria tradicional, como discutido no trabalho de
Ferreira (2008), mas incluir aspectos da psicologia para explicar situações
práticas que não são contempladas na teoria econômica tradicional.
No
contexto das finanças comportamentais, portanto, agentes econômicos com
pré-disposição a manifestar uma intenção empreendedora, como definida por
exemplo em Mcmullen e Shepherd (2006), se comportam de uma forma que viola as
condições de otimização baseadas na alocação de recursos segundo o risco e o
retorno.
Quando se
elege o indivíduo enquanto unidade de análise e quer-se entender o que o
influencia em termos de constituição de um empreendimento, as abordagens das
finanças comportamentais buscam isolar públicos com potencial econômico como os
universitários .
De acordo com Ferreira (2008), os estudos do
comportamento econômico dos indivíduos não só passaram a integrar a grade
curricular de universidades norte-americanas e europeias, com pesquisas,
congressos anuais, workshops, sendo criado, inclusive, o periódico Journal of
Economic Psychology, como também foram premiados pesquisadores nessa área com
dois prêmios Nobel, sendo o mais recente outorgado em 2002 à Amos Tversky,
juntamente com Daniel Kahneman, responsáveis por desenvolver a teoria do
prospecto, linha de pesquisa que analisa o processo decisório.
No Brasil,
ainda de acordo com Ferreira (2008) e Bogoni, Guarise, Almeida e Hein (2021) as
Finanças Comportamentais são a parte da Psicologia-Econômica que apresenta um
campo de expressivo crescimento já no fim do século XX. Observa-se, dentro da
pesquisa em finanças comportamentais, que o comportamento das pessoas não é
totalmente racional, durante todo o tempo. Por essa razão, os preços se desviam
dos valores razoáveis ou as escolhas em termos da psicologia da poupança, do
investimento, da dívida e da tomada de decisão seguem uma atitude diante do
risco, que é diferente da estabelecida pela HME .
Com
relação a aplicação ou teste das hipóteses de comportamento segundo as finanças
comportamentais, boa parte das pesquisas realizadas no Brasil e no exterior
utilizam o público universitário como base para coleta de informações e
estudos.
Castro
Júnior e Famá (2002) utilizaram estudantes de graduação em Administração com o
objetivo de verificar se as decisões de investimento são influenciadas pelas
percepções pessoais a respeito do risco. Os autores não só concluíram que as
percepções pessoais influenciavam as decisões, mas também perceberam que eram
percepções diferenciadas entre si e que as decisões tomadas em relação ao risco
diferiram da forma racional.
Silveira-Martins,
Daneluz, Müller e Leite (2018) apresenta o empreendedor como o indivíduo que
opera e/ou inicia um negócio para realizar um projeto pessoal ou uma ideia,
assumindo riscos e responsabilidades. Morgan et al. (2016) avaliam o Risco
estratégico e natural no empreendedorismo, buscando examinar indivíduo em um
ambiente que lhe permitam serem empreendedores, os achados da pesquisa
demonstram que os resultados alcançados pelos empreendedores são provenientes
de suas opções e decisões. Gu (2023) avaliou o impacto do excesso de confiança
dos gerentes de empresas em um mercado emergente, avaliando o impacto nas
possibilidades de promover chances de explorar novas oportunidades. Os
resultados demonstram que o do excesso de confiança tem um impacto negativos no
empreendedorismo e na lucratividade das empresas estudadas.
Ahmed,
Khattak e Anwar (2022) investigam a influência de cinco grandes traços de
personalidade nas intenções empreendedoras em estudantes universitários
paquistaneses. Os resultados encontrados evidenciam a existência de uma
associação significativa entre a aversão ao risco e a intenção empreendedora.
Gimenez-Jimenez et al. (2022) avaliaram o impacto da aversão ao risco e da
cultura em nível pais no processo dos estudantes empreendedores iniciantes no processo
de empreender. Com os resultados destacam-se que para o gênero feminino as
percepções de comportamentos de risco estão associadas a menos progresso no
processo de empreender. Considerando o vínculo entre as Finanças
Comportamentais e as decisões a respeito dos riscos (AHMED et al., 2022),
tem-se o risco como um fator comum entre as teorias das Finanças
Comportamentais e o Empreendedorismo.
No
Brasil, é crescente o número de empreendedores jovens, que criam seus negócios
por necessidade ou oportunidade e é destacável o impacto que a ação
empreendedora tem causado no plano de carreira desses jovens (SILVA; SILVA,
2019; SOUZA-E-SILVA; STELLA, 2015; GOMES; SILVA; ANJOUR; AÑES, 2014.). De
acordo com a pesquisa do Global Entrepreneurship Monitor (GEM), sobre o
empreendedorismo no Brasil, publicada em 2013, o sonho de abrirem suas próprias
empresas já superou a pretensão dos jovens brasileiros de terem uma carreira em
empresas tradicionais (43,5% contra 24,7%) (SOUZA-E-SILVA; STELLA, 2015). Ainda
de acordo com os autores, mesmo que a atividade empreendedora é vista com
potencial de carreira para todos os indivíduos, sem mensuração de idades, ela
tem chamado atenção pela participação dos jovens.
Dolabela
(2000) considera que atividades como a capacidade de inovar, perseverar, assim
como o convívio com a incerteza e com o risco são elementos indispensáveis ao
empreendedor nas formas de percepção do mundo e de si mesmo. Portanto, é
possível relacionar os pressupostos das Finanças Comportamentais ao ato de
empreender.
Destaca-se
que que há poucos estudos direcionados aos temas de empreendedorismo e finanças
comportamentais no país, e não há estudo que tem por objetivo analisar a
correlação entre a propensão de universitários em empreender a partir das
finanças comportamentais em uma universidade que esteja situada em um
conceituado polo industrial, cenário propício ao desenvolvimento da atividade
empreendedora.
Dessa
maneira, com o objetivo de avaliar por meio das finanças comportamentais a propensão de empreender do público
universitário, que representa boa parte das pesquisas relacionadas ao tema,
toma-se por base alunos de graduação da Faculdade de Ciências Agrárias e
Veterinárias da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
(Câmpus de Jaboticabal-SP).
O alcance
deste objetivo geral está sustentado por três objetivos específicos: i)
demarcar as teorias do empreendedorismo e finanças comportamentais; ii)
identificar características do perfil do empreendedor; iii) construir um
questionário para levantamento das informações.
O
presente trabalho está organizado em mais quatro seções além da Introdução. A
segunda seção é uma revisão de literatura, fundamental para compreensão dos
temas abordados e entender como ambos se relacionam. A terceira seção apresenta
os procedimentos metodológicos que delimitaram a pesquisa e os resultados. Na
quarta seção são apresentados os resultados e discussões da pesquisa. As considerações
finais são apresentadas na quinta seção.
2 Revisão
bibliográfica
Esta seção, inicialmente, elucida as principais
definições de empreendedorismo, apresenta o empreendedorismo no âmbito
universitário, traz uma abordagem do tema finanças comportamentais e, por
conseguinte, uma associação entre finanças comportamentais e empreendedorismo,
analisando a interação entre os dois temas.
2.1 Empreendedorismo e a universidade
Montanye (2006) apresenta uma revisão crítica da literatura para
definir o empreendedorismo como a process
by which individuals acquire ownership (property rights) in economics rents of
their creation. (p. 549). Na tradição Schumpeteriana, Kirzner (1973) fez um
importante avanço teórico sobre as características e comportamento do
empreendedor, ressaltando a capacidade de reação e o estado de alerta. Klein
(2008) expõe conceituações para o termo de acordo com três propósitos: i.
ocupacional que é liderado pelas políticas públicas ativas para promover a
empregabilidade; ii. estrutural que é fomentado nos estudos da firma e das
cadeias produtivas para criação de unidades de negócio ou novas firmas; iii. a
terceira acepção do termo é uma função com base em atributos e qualidades dos
indivíduos de acordo com as análises elaboradas por diversos autores, em
particular, austríacos que se dedicaram ao estudo do tema. Os atributos incluem
capacidade refinada de julgamento sobre possibilidades frente a incerteza. Para
Earl (2007) empreendedor é quem estabelece conexões entre as várias formas de
riqueza para gerar oportunidades lucrativas frente à incerteza, criadas pela
inovação, oriunda da mentalidade empreendedora (CANIN; EDRALIN, 2016, p.115).
O tipo de empreendedor é definido por Brãndle, Berger, Gola e Kuckretz
(2018) de acordo com sua eficácia na exploração de oportunidades, que ele mesmo
venha a criar ou aproveitar. A eficácia depende da identidade social que define
as crenças e a capacidade de monetizar suas ações ou atividades. Os indivíduos
são divididos em três grupos no estudo acima: i. darwinistas que empreendem com muita eficácia com foco exclusivo na
acumulação de capital; ii. comunitários que se organizam a partir dos valores
de cooperação em função da fragilidade de seus grupos sociais; iii.
missionários que se identificam e agem espontaneamente por causas humanitárias.
Os dois primeiros grupos conseguem gerar maior eficácia e êxito em suas ações
empreendedoras, enquanto para o terceiro grupo, os resultados alcançados não
sustentam a criação de negócios, mas esse grupo se perpetua em sua busca
humanitária.
Universidades acrescentam ao empreendedorismo seus papéis de centro de
educação, de ambiente de pesquisa e de agências universitárias de inovação[1].
Além de amparar os processos de patentes e transferência de tecnologias, novos
modelos acolheram ações organizadas para: i. criação de Spin-offs; ii.
desenvolvimento de pesquisadores – empreendedores que se profissionalizam
através da transferência de tecnologia; iii. elaboração de conteúdos de ensino
integrados ao setor privado (SIEGEL; WRIGHT; LOCKETT, 2007; IGLESIAS-SÁNCHEZ;
JAMBRINO-MALDONADO; VELASCO; KOKASH, 2016).
Walter e Block (2016) conectam o processo de decisão para explorar uma
oportunidade a partir das crenças dos indivíduos com a educação para ampliar o
conhecimento tácito. A educação para o empreendedorismo envolve a preparação de
estudantes criar mentalidades afinadas com o modus operandi da liderança e desenvolver habilidades necessárias
ao criar laboratórios sociais para simular a experiências da “vida em negócios”
(HASAN; KHAN; NABI, 2017).
A interação entre ensino e empreendedorismo levou a expressões como
Educação Empreendedora (EE). Sob esse ideário constatou-se que o
empreendedorismo é afetado pelas habilidades, competências e disposições
individuais que podem ser moldadas pela educação (ANATB; RECTOR; LEITE, 2018;
MARESCH; HARMS; KAILER; WIMMER-WURM, 2016). A educação empreendedora inclui
cursos sobre a criação e desenvolvimento de empresas e programas complementares
destinados a promover o espírito empreendedor (IGLESIAS-SÁNCHEZ et al., 2016).
O modelo acadêmico empreendedor nas universidades brasileiras é uma
síntese das variantes europeias e americanas, pois alguns pesquisadores
importaram mecanismos de transferência de tecnologia e adaptaram às
circunstâncias brasileiras (ETZKOWITZ; MELLO, 2004). De início, esses projetos
eram de pequena escala, não oficiais e isolados, mas logo alcançaram apoio em
empresas e governos. Apesar das resistências os iniciadores desses projetos
ganharam força por meio da formação de redes que atravessaram as instituições
(BERLIK; MURALIDHAR, 2017).
Finanças comportamentais e o empreendedorismo
Uma questão-chave ao ambiente econômico decorre dos mercados
financeiros, eficientes ou não, no sentido de se verificar se as decisões
econômicas levam em conta todas as informações disponíveis e se as decisões são
ajustadas instantaneamente, à medida que novas informações são descobertas
(BIRD; DU; WILLETT, 2017).
A Hipótese do Mercado Eficiente baseia-se na ideia de que a maioria os
agentes financeiros, ou pelo menos a maior parte do mercado, são racionais no
processamento de informações (BANERJI; KUNDU; ALAM, 2022). As finanças comportamentais, porém,
estudam como as pessoas agem aquém do ideal proposto pela hipótese eficiente e
como os mercados são, até certo ponto, ineficientes (HIRSHLEIFER, 2015).
Kahneman e Tversky (1979) deram início a uma versão oposta às finanças
tradicionais: a Teoria do Prospecto (BERLIK; MURALIDHAR, 2017). Posteriormente,
em 2002, esses autores foram laureados com o Prêmio Nobel de Economia (BERLIK;
MURALIDHAR, 2017; BOGONI; GUARISE; ALMEIDA; HEIN, 2021).
Na nova versão, os autores consideraram as anomalias do mercado
advindas da diferença entre o comportamento das pessoas e o comportamento
idealístico proposto pela HME. Com base nos fundamentos da psicologia
comportamental os autores elaboraram um modelo capaz de explicar as anomalias
(Teoria do Prospecto) que ganhou notoriedade ao criticar a teoria neoclássica
e, ao mesmo tempo, ser uma alternativa para a tomada de decisão sob risco
(BERLIK; MURALIDHAR, 2017).
A teoria das finanças comportamentais foi desenvolvida a partir da
acumulação de evidências empíricas contraditórias à HME, sendo assim, uma
vertente do pensamento cético, passando a estudar a influência da psicologia
sobre o comportamento dos profissionais financeiros e o subsequente efeito
sobre os mercados (BIANCHI; PANTANELLA; PIANESE, 2015). Ou seja, procura
descrever como as decisões são efetivamente tomadas a partir de uma visão
integrada, em vez de se guiar pelo ponto de vista estritamente racional (LEAL, 2015).
No quadro 1 apresentam-se as heurísticas da teoria comportamental em
finanças, que são comportamentos reproduzidos nas tomadas de decisões (BERLIK;
MURALIDHAR, 2017; BANERJI; KUNDU; ALAM, 2022).
Quadro
1: Dimensões das Finanças Comportamentais
Heurística |
Definição |
Representatividade |
São decisões baseadas em dados ou
informações pessoais pré-concebidas (TVERSKY; KAHNEMAN, 1974). |
Disponibilidade |
É a tomada de decisões influenciadas apenas
pelo conhecimento disponível imediato na memória do agente tomador, sem
examinar outras possibilidades ou alternativas (TVERSKY; KAHNEMAN, 1974). |
Excesso de Confiança |
Representa o otimismo exagerado nas decisões
financeiras, ou seja, quando a habilidade de prever eventos de mercado é
superestimada, ou ainda, quando os julgamentos são autoconfiantes,
subestimando riscos (ANACHE; LAURENCEL, 2013; BANERJI; KUNDU; ALAM, 2022;
NOBRE; MACHADO; NOBRE, 2022). |
Ancoragem |
É quando decisões são tomadas a partir de
associações com estereótipos formados e da desconsideração de informações
relevantes (TVERSKY; KAHNEMAN, 1974). |
Efeito Manada |
Agentes
com as mesmas percepções escolhem a mesma direção, ou seja, são influenciados
por seus vieses psicológicos a ponto de executarem a mesma decisão, gerando
uma mania. Essa mania está representada pelo efeito manada (ANACHE;
LAURENCEL, 2013; BANERJI; KUNDU; ALAM, 2022). |
Certeza |
Indivíduos tendem a supervalorizar eventos
considerados certos e subvalorizar um evento considerado apenas provável
(ANACHE; LAURENCEL, 2013). |
Reflexão |
Agentes apresentam um comportamento de
aversão ao risco no domínio dos ganhos e de propensão ao risco no domínio das
perdas (ANACHE; LAURENCEL, 2013). |
Isolamento |
Agentes
tendem a não escolherem opções em comum entre alternativas, concentrando-se
apenas no que as diferenciam, ou seja, descartam componentes compartilhados
por todas as probabilidades em consideração (ANACHE; LAURENCEL, 2013). |
Fonte: Elaborado
pelos autores
Quando os comportamentos que se enquadram nas heurísticas são
percebidos, pode-se partir do pressuposto que as escolhas observadas contêm a
presença de vieses comportamentais (BERLIK; MURALIDHAR, 2017).
A pesquisa em finanças comportamentais abrange uma variedade de
tópicos, como o excesso de confiança, o otimismo, o pânico, a ilusão de
controle, o status quo, a ilusão do
dinheiro, o apego, a aversão à perda, a recuperação, o conservadorismo e até
mesmo o narcisismo (RAMIAH; XU; MOOSA, 2015; BANERJI; KUNDU; ALAM, 2022). Entre
os beneficiados dessa abordagem está o estudo do comportamento relacionado a
finanças, particularmente útil para fornecer informações sobre o
empreendedorismo (NEAȚU; IMBRIŞCĂ,
2015; NOBRE; MACHADO; NOBRE, 2022).
Considerando, como exemplos, o excesso de confiança e o otimismo, os
indivíduos empreendedores que são excessivamente confiantes em suas habilidades
também tendem a ser otimistas sobre o desempenho de suas empresas (HIRSHLEIFER,
2015; NOBRE; MACHADO; NOBRE, 2022). Além disso, o excesso de confiança e o
excesso de otimismo podem servir de encorajamento aos indivíduos avessos a
riscos a realizarem projetos mais arriscados ou inovadores, ou seja, o lado
positivo do otimismo e da confiança para o âmbito do empreendedorismo é
encorajar os empreendedores a se empenharem na realização dos seus projetos
(HIRSHLEIFER, 2015).
O comportamento do indivíduo e a tomada de decisões muitas vezes são
distorcidos por tipos diferentes de heurísticas e tendências, onde certos tipos
parecem ser bastante emblemáticos para o comportamento empreendedor, fazendo
com que o entendimento dessas tendências e heurísticas seja útil na tomada de
decisões pelos empreendedores (NEAȚU; IMBRIŞCĂ, 2015). Ainda segundo os
autores, isso é, em parte, devido ao fato de que a exploração de oportunidades
de negócios normalmente exige que os empreendedores tomem decisões em situações
complexas sem conhecer inteiramente todas as probabilidades ou todos os fatos relevantes de um evento
futuro que possa vir a ocorrer.
Estudos significativos como o conceito de racionalidade limitada,
tendências de julgamento, seguimento de regras, normas sociais e evolução foram
aproveitados com evidências crescentes nas pesquisas sobre o comportamento
empreendedor e em finanças, com muitas aplicações empresariais. Consegue-se
assim explicar situações aparentemente irracionais e imprevisíveis realizadas
por indivíduos, em geral empresários, especialmente quando se encontram em
situações de incerteza, risco, ou de informações incompletas (NEAȚU; IMBRIŞCĂ,
2015).
O modelo de finanças comportamentais aceita a possibilidade de que os
participantes do mercado, incluindo os empreendedores, cometem erros nas suas
ações, erros cognitivos (RAMIAH; XU; MOOSA, 2015), e desafia a visão
tradicional das finanças, procurando explicar não apenas a forma como as
pessoas de fato tomam decisões financeiras, mas também como essas decisões
podem ser melhoradas (LEAL, 2015).
3 metodologia
O
presente trabalho avaliou variáveis das finanças comportamentais que expressam
a propensão de empreender nos alunos de graduação. Utiliza-se uma pesquisa de
natureza aplicada que tem o objetivo de adquirir conhecimentos para usos
específicos Gil (2008). Os dados provêm dos graduandos dos cursos de
Administração, Ciências Biológicas, Engenharia Agronômica, Medicina Veterinária
e Zootecnia, da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) da
Universidade Estadual Paulista, de Jaboticabal.
O
objetivo metodológico adotado é descritivo e a forma da abordagem do problema é
quantitativa. Isso porque a obtenção de respostas é dada de forma estruturada
(através de questionário, presente na documentação suplementar); as técnicas de
análise serão dedutivas e orientadas pelos resultados generalizáveis (em que
uma amostra representa a população total) (GIL, 2008).
Para
realizar a consulta da revisão bibliográfica foram utilizadas a plataforma
Scopus, do portal de periódicos CAPES e do Google Acadêmico, sendo para esse
último as referências foram filtradas na medida em que constavam na base
Webqualis, com preferência aos artigos publicados em revistas de categorias A1,
A2, B1, B2 das áreas de Administração e Psicologia, no período de 2015 a 2018.
O
universo amostral são os estudantes de graduação da FCAV. Criada em 1966 e
localizada na cidade de Jaboticabal, no interior do Estado de São Paulo, a
Faculdade conta com treze departamentos responsáveis pelas atividades
acadêmicas de cinco cursos de Graduação, de onze Programas de Pós-Graduação e
cursos técnicos no Colégio Técnico Agrícola (FCAV, 2018).
A
população contém 1.554 alunos matriculados em 2018 nos cinco cursos de
graduação da FCAV. O instrumento da pesquisa, questionário, foi elaborado a
partir da literatura revisada. Com base na população estabeleceu-se um nível de
confiança de 90% e erro amostral de 5%. Com isso alcançou-se a amostra
necessária com 230 graduandos. A pesquisa é feita com amostragem aleatória
simples (onde não existem restrições que impedem a participação de nenhum
indivíduo) e variáveis categóricas.
Segundo
Gil (2008), o questionário pode ser definido como a técnica de investigação
composta por questões que são submetidas a pessoas para obtenção de informações
sobre conhecimentos, comportamento presente ou passado, expectativas,
interesses, valores e crenças. Ainda de acordo com o autor, as respostas a
essas questões submetidas “irão proporcionar os dados requeridos para descrever
as características da população pesquisada”.
O
questionário foi composto por questões fechadas. Os respondentes escolhem uma
dentre as alternativas disponíveis.
Esse instrumento de colega foi disponibilizado como documento suplementar ao
artigo.
O período
de aplicação das questões aos alunos foi entre os meses de Agosto e Outubro de
2018. Todo o processo de coleta das respostas foi obtido pelo envio de e-mails
aos estudantes, com o auxílio da Seção Técnica de Graduação da universidade
para o alcance da amostra esperada.
Quando
elaborado, para melhor análise das informações coletadas, o questionário foi
organizado em três categorias. A primeira, a Avaliação socioeconômica e Perfil
foi composta por questões a respeito de gênero e curso, bem como questões
acerca de renda e escolaridade, permitindo traçar um panorama sobre as
condições socioeconômicas dos estudantes, assim como os conhecer o suficiente
para identificar características em seus perfis que contribuem ao ato de
empreender.
O
histórico familiar pode influenciar a reflexão do indivíduo entre procurar
emprego ou empreender. A origem dos influenciadores (família) também é
relevante em função do aprendizado tácito que possibilita aos sucessores. Além
disso, o suporte familiar pode ser encorajador nessa faze inicial de avaliação
quanto a uma possível decisão. Essas influências favorecem o desenvolvimento de
atributos individuais (KLEIN, 2008; WALTER; BLOCK, 2016).
A segunda
parte, a Avaliação comportamental, possibilitou utilizar as respostas das
questões para discernir as tomadas de decisões dos estudantes, bem como
separá-los em dois grupos, um que demonstram comportamentos que propiciam ao
empreendedorismo e outro com menor possibilidade de empreender (BERLIK; MURALIDHAR, 2017). O conjunto de questões
dessa parte avalia a forma de pensamento sobre um investimento e o risco
associado (KIRZNER, 1973). Leva em conta tanto valores objetivos de
possibilidades para apreciação do entrevistado, quanto uma valoração subjetiva
do risco frente a possibilidade de perda dada a condição econômica que o
sustenta (NEAȚU; IMBRIŞCĂ, 2015).
Por fim,
a terceira parte, Intenção Empreendedora, objetivou reconhecer os alunos de
graduação que transitam do comportamento para uma intenção de empreender. A
intenção foi construída a partir de componentes que o indivíduo valoriza para tomar suas próprias
decisões e conexões (EARL, 2007), como: as expectativas dos seus entes sobre
sua carreira; sua autoavaliação da competência e do grau de confiança que
deposita em suas habilidades (BRÃNDLE; BERGER; GOLA; KUCKRETZ 2018; NOBRE;
MACHADO; NOBRE, 2022); a influência da relação de ensino – carreira promovida
pela Universidade, grau de escolaridade na família e experiência com aplicações
financeiras, esta última que revela o papel do plano de poupança em função de
uma possível estratégia (HIRSHLEIFER, 2015). Thomas e Subhashree (2020) ainda
destacam que alfabetização financeira e empreendedorismo estão positivamente
correlacionados, sendo ela uma das competências gerenciais mais cruciais na
criação e desenvolvimento de empreendimentos empresariais.
As respostas das três partes do questionário
foram analisadas e transformadas em fatores para serem correlacionadas através
do programa estatístico SPSS (Statistical
Package for the Social Sciences). Com o SPSS foi feita também a análise
discriminante para
avaliar a existência de fatores, ou respostas, que tornam os estudantes de
graduação mais propensos a empreender.
4 resultados
e discussão
Neste Esta seção do trabalho foi dividida em duas etapas. Na primeira foi
feita a demonstração e análise das informações levantadas pelas três partes do
questionário. Já na segunda, foram feitas considerações sobre a propensão ao
empreendedorismo da amostra de alunos selecionada para o estudo.
4.1
Avaliação
socioeconômica e perfil
A maior contribuição com o trabalho foi dos
alunos pertencentes ao sexo feminino, representando 54,8% do total (126
alunos). Como o público-alvo eram os alunos dos cinco cursos de graduação,
estes alunos foram questionados a respeito dos cursos que faziam parte. Assim,
a Administração e Engenharia Agronômica foram os cursos que mais compuseram a
amostra, representando, juntos, mais de 50%, seguidos pelos cursos de Ciências
Biológicas (16,1%), Zootecnia (15,2) e Medicina Veterinária (9,6%).
As idades dos alunos variaram entre 18 e 29 anos, sendo a grande
maioria entre as idades de 18 e 25 anos, representando mais de 90% do total.
Além disso, apenas 6,5%, responderam já possuírem diploma universitário, visto
que a maior parte desses jovens estão cursando o primeiro curso superior.
A maior parte da amostra é composta por estudantes que tiveram o
ensino fundamental e o ensino médio cursado completamente em escolas
particulares. O número de estudantes que cursaram o ensino fundamental em escolas
públicas é equivalente a 34,3% do total, e os que estudaram o ensino médio
completo em escolas de ensino público somam 81 de 230, 35,2% do total. Números
inferiores aos 46,1% e 60%, que representam, respectivamente, a parcela de
estudantes de ensino fundamental e médio particular.
Para análise do perfil dos alunos e da situação socioeconômica, também
foram feitas questões sobre a escolaridade dos seus pais, demonstrando que
28,7% e 33%, respectivamente, dos pais e das mães concluíram o ensino médio. É
importante destacar o número de pais (35,22%) e mães (40,00%) que concluíram o
ensino superior.
De acordo com o IBGE (2017) sobre a escolaridade no Brasil, menos de
5% dos jovens brasileiros possuem pais e mães com ensino superior. 26,9% dos
Pais dos alunos e 30% das Mães, ambos os valores em comparação ao total,
possuem ensino superior. Portanto, a amostra de alunos representa uma distinta
parcela da população brasileira em relação à escolaridade formal dos pais.
Ainda de acordo com o IBGE (2017) a maioria dos jovens com a mesma
idade dos alunos respondentes das questões conciliam trabalho e estudo. Neste
estudo, 64,5% estudantes responderam que não trabalham.
Quando questionados se alguém da família possui algum negócio, 95
estudantes, ou seja, 41,3% responderam que não. O restante, 58,7% alegaram que
algum representante da família possui negócio
próprio.
Dentro do conjunto de perguntas da primeira parte do questionário,
foram dadas alternativas de escolha sobre as pretensões após os alunos se
formarem. Mais de uma alternativa poderiam ser escolhidas e a opção de “Começar
meu próprio negócio” não foi a preferida, conforme apresentado na Tabela 1.
Tabela
1: Planejamento após se formar.
Alternativa |
Participação da Amostra |
% |
Continuar estudando |
123 |
53,5% |
Começar meu próprio
negócio |
44 |
19,1% |
Trabalhar em empresa da família |
16 |
7,0% |
Ser funcionário no setor privado |
150 |
65,2% |
Ser funcionário no setor público |
85 |
37,0% |
Eu não sei |
15 |
6,5% |
Fonte: Elaborado pelos
autores
Todavia, quando interrogados sobre a vontade própria de se tornarem um
empreendedor, 77% responderam positivamente, isto é, tem vontade ou já
consideraram essa alternativa para sua vida profissional.
4.1.1 Avaliação comportamental
A maior parcela das respostas foi negativa quanto à realização de
investimentos em algum ativo financeiro da economia, pois 63,5% disseram nunca
terem investido em ações, debêntures, quotas de fundos de investimento ou
caderneta de poupança. Do total, 7% dos alunos compõem
o percentual dos que disseram nunca terem investido, mas que possuem interesse
em fazê-lo, o que demonstra uma baixa alfabetização financeira, competência
crucial ao empreendedor, segundo Thomas e Subhashree (2020).
A maioria dos que investem assumiram não possuir
planejamento, mas 8,7% disseram investir em determinada estratégia. Caderneta
de Poupança e Câmbio são as duas exceções, pois se apresentam como os ativos mais conhecidos entre as opções estabelecidas.
Tendo em vista os aspectos comportamentais e sua importância no
processo de tomada de decisão sob incerteza, foram oferecidas aos respondentes
algumas alternativas hipotéticas de investimentos, a fim de identificar a
presença de vieses comportamentais em suas escolhas.
O Quadro 2 representa uma das quatro questões, com uma opção a ser
escolhida.
Quadro
2-Questão de viés comportamental
Primeira opção 80% de chances de ganhar R$ 4.000,00 e 20%
de chances de ganhar R$0,00 |
Segunda opção 100% de chances de ganhar R$ 3.000,00 |
Fonte:
Elaborado pelos autores
O estudo constatou que 81,7% optaram pela segunda opção, sinalizando a
presença de um viés comportamental e não uma decisão com base na racionalidade.
Os respondentes optaram por um comportamento de aversão ao risco, visto que a
opção de maior escolha apresenta 100% de certeza quanto ao ganho. Esse
resultado comprova a heurística do efeito certeza, visto que os indivíduos
tendem a subvalorizar um evento considerado apenas provável (Primeira opção) e
supervalorizar eventos vistos como certos (Segunda opção) (ANACHE; LAURENCEL, 2013).
Mais três questões com alternativas hipotéticas foram analisadas e as
opções escolhidas pelos estudantes foram de acordo com o Quadro 3.
Quadro
3: Heurísticas no viés comportamental
Questão |
Alternativa |
% de respondentes |
Questão 2 |
20% de chances de ganhar R$4.000,00 e 80% de
chances de ganhar R$0,00 |
49,6% |
25% de chances de ganhar R$3.000,00 e 75% de
chances de ganhar R$0,00 |
50,4% |
|
Questão 3 |
80% de chances de perder R$4.000,00 e 20% de
chances de perder R$0,00 |
84,8% |
100% de chances de perder R$3.000,00 |
15,2% |
|
Questão 4 |
20% de chances de perder R$4.000,00 e 80% de
chances de perder R$0,00 |
58,7% |
25% de chances de perder R$3.000,00 e 75% de
chances de perder R$0,00 |
41,3% |
Fonte: Elaborado pelos autores
Percebe-se que a maioria dos respondentes
ainda preferem a opção de maior certeza quanto ao ganho na questão 2, mesmo que
o percentual da alternativa de menor certeza de ganho também seja alto.
Conclui-se, portanto a presença do Efeito certeza, conforme definido por Anache
e Laurencel (2013), também nessa pergunta, assim como na primeira.
Na terceira questão, que prevê, em vez de ganhos, perdas
para os respondentes, observa-se uma alteração nos resultados em comparação as
duas perguntas anteriores. 84,8% dos respondentes optam pelo risco no campo das
perdas, o qual não admitiam no campo dos ganhos. Este resultado também
demonstra viés comportamental dentro dos estudos de Kahneman e Tversky (1979),
pois agora, diferentemente das escolhas anteriores, os agentes estão
apresentando um comportamento propenso ao risco
no campo das perdas, sendo essa mudança de comportamento conhecida como Efeito
reflexão (ANACHE; LAURENCEL, 2013).
As questões 2 e 4 podem ser consideradas questões antagônicas, pois as
probabilidades são idênticas, mas a questão 2 se refere a ganho e a questão 4
refere-se a perdas. Assim, as respostas dos entrevistados em uma questão
deveriam representar o oposto da outra, mas vemos que isso não ocorre, o que,
por si só, é um grande exemplo de viés na tomada de decisão por estes respondentes.
4.1.2 Intenção empreendedora
A Tabela 2 apresenta os resultados inerentes a intenção empreendedora
dos jovens em que se verificou em uma escala Likert de 5 pontos a sua
concordância quanto a capacidade e o interesse em empreender.
Tabela
2: Nível de Concordância sobre a capacidade
e viabilidade de empreender.
Questão |
Nível 1 |
Nível 2 |
Nível 3 |
Nível 4 |
Nível 5 |
Acredito na minha capacidade de começar um
novo negócio |
97 |
21 |
63 |
11 |
38 |
Para mim seria fácil começar um novo negócio |
123 |
11 |
57 |
37 |
2 |
Posso identificar facilmente novas
oportunidades de negócio |
55 |
57 |
73 |
34 |
11 |
Empreender é a melhor maneira de aproveitar
minha educação |
64 |
66 |
54 |
31 |
15 |
Não vejo nenhum problema em iniciar um novo
negócio |
85 |
69 |
43 |
22 |
11 |
Fonte: Elaborado pelos autores
A amostra considerada para o estudo se mostrou negativa com as
questões sobre a capacidade pessoal de se tornarem empreendedores e sobre a
percepção de cada um da viabilidade de iniciar um novo negócio. Uma parcela dos
alunos se mostrou pouco confiantes com a possibilidade e suas capacidades de
empreenderem, mas vale ressaltar que esses a maioria dos alunos se sentem
motivados por parentes e amigos a iniciar um novo negócio. Destaca-se também
que mesmo que pouco confiantes com suas capacidades e com possibilidades de
empreender, existe uma parcela que demonstra confiança em relação a suas
capacidades e enxergam possibilidades de empreender, mesmo que sejam poucos
estudantes.
Os resultados mostram que o número de estudantes que não possuem o
real desejo de iniciar um negócio é maior do que os que possuem, mesmo que a
parcela destes últimos seja grande.
Tanto as perguntas sobre a capacidade real de se tornarem
empreendedores e a percepção dos alunos da viabilidade de iniciar um negócio
novo, quanto às perguntas sobre o real desejo de iniciarem um negócio novo,
colocam o comportamento dos graduandos contrários ao comportamento dos
indivíduos empreendedores descrito por Hirshleifer (2015) e Nobre, Machado e
Nobre (2022), pois a confiança e o otimismo não encontrados nas respostas
indicam, para o autor, que também faltará otimismo desses alunos na abertura de
seus negócios, caso optem por empreender.
Além das questões na Tabela 2 na intenção empreendedora, verificou-se
adicionalmente no mesmo questionário que nem todos os estudantes enxergam o
empreendedorismo com mais vantagens do que desvantagens. É grande, porém, a
parcela de alunos que iniciariam um negócio caso tivessem recursos, compondo
70% da amostra total.
4.2 Propensão
ao Empreendedorismo
Questões foram construídas a fim de coletar informações que possam
indicar a propensão ao empreendedorismo pelos alunos. Essas informações,
provindas das respostas ao questionário, foram analisadas acima, sempre
observadas se são favoráveis ou não ao ato empreendedor.
A partir de uma Análise fatorial exploratória, é possível identificar
se as variáveis observáveis possuem ligação, ou seja, quais dessas informações
adquiridas através do questionário possuem relação entre si. Na análise, os
testes de Kaiser Meyer-Olkin (KMO) e de Esfericidade de Bartlett têm como
objetivo verificar se a aplicação da análise fatorial tem validade para as
variáveis escolhidas. Para Hair, Black, Babin, & Anderson (2010) os valores
aceitáveis para o teste KMO são entre 0,5 e 1,0, abaixo dessa média o teste é
inaceitável. Ainda de acordo com os autores, a aprovação pelo teste de Bartlett
se dá quando a significância é zero.
Foi realizado um teste de Análise fatorial exploratória com as
respostas dadas as 10 questões da segunda parte do questionário, as questões da
Avaliação Comportamental e a análise foi aprovada pelo KMO e pelo teste de
Bartlett, tendo 0,783 para o primeiro e 0 de significância no segundo.
Conforme a Tabela 3 abaixo, as 10 respostas das questões foram
reduzidas para 3 componentes. Portanto, todas as respostas são aproximadas dos
componentes que possuem maior ligação.
Tabela
3: Matriz de componente rotativa da
Avaliação comportamental.
|
Componente |
||
Variáveis |
1 |
2 |
3 |
FC2-Nível de conhecimento sobre Quotas de
fundos de investimentos |
,810 |
|
|
FC1-Nível de conhecimento sobre Ações e
Debêntures |
,797 |
|
|
FC6-Nível de conhecimento sobre Caderneta de
poupança |
,763 |
|
|
FC4-Nível de conhecimento sobre Contratos de
opções financeiras |
,727 |
|
|
FC5-Nível de conhecimento sobre Certificados
de recebíveis e Letras de crédito |
,725 |
|
|
FC3-Nível de conhecimento sobre Câmbio
(Moeda estrangeira) |
,647 |
|
|
Questão_3-Alternativa hipotética de
investimento |
|
,780 |
|
Questão_4-Alternativa hipotética de investimento |
|
,742 |
|
Questão_1-Alternativa hipotética de
investimento |
|
|
,779 |
Questão_2-Alternativa hipotética de
investimento |
|
|
,543 |
Fonte: Elaborado pelos autores
“FC” representam as respostas às questões de conhecimento sobre os
ativos financeiros e “Questão_1” até “Questão_4” são as informações sobre as
hipóteses de investimentos oferecidas aos alunos de graduação.
Conforme observa-se, todas as “FC”s estão organizadas em um mesmo
componente e as outras 4 informações também estão bem divididas. Isso demonstra
que a parte do questionário que buscava saber sobre os vieses comportamentais
dos alunos foi elaborada com eficácia, pois a solução ótima de organização
apresentada pela matriz de componente rotativa está de acordo com a forma com que
as questões foram apresentadas no questionário.
A mesma análise acima foi realizada para as questões sobre Intenção
empreendedora, a terceira parte do questionário, e os resultados também foram
aprovados pelos testes de KMO e de Bartlett. Além disso, houve a redução das 52
respostas para 11, sendo elas, divididas em uma sequência ótima feita pela
matriz de componente rotativa.
Na sequência, a primeira análise discriminante foi feita com as
informações obtidas pelo questionário através das perguntas sobre a Avaliação
comportamental. A análise discriminante
é uma técnica analítica que testa a hipótese de que a média de um grupo de
variáveis independentes para mais grupos são iguais (HAIR; BLACK; BABIN;
ANDERSON, 2010). Ainda segundo os autores, há um escore Z, encontrado
automaticamente pelo software utilizado, que deve ser sempre positivo para que
os fatores possam representar os grupos, pois se o Z é positivo isto indica que
o fator está acima da média. Também deve-se levar em consideração a
significância encontrada, visto que ela representa a discrepância daquele fator
em relação aos outros e que quanto menor, mais representativo é este fator
(HAIR et al., 2010).
A Tabela 4 apresenta os testes de igualdades de médias de grupo da
Avaliação comportamental.
Tabela
4: Testes de igualdades de médias de
grupo da Avaliação comportamental.
Variáveis |
Lambda de Wilks |
Z |
df1 |
df2 |
Sig. |
FC1 |
1,000 |
,010 |
1 |
228 |
,919 |
FC2 |
,995 |
1,078 |
1 |
228 |
,300 |
FC3 |
,979 |
4,809 |
1 |
228 |
,029 |
FC4 |
,999 |
,263 |
1 |
228 |
,609 |
FC5 |
,995 |
1,158 |
1 |
228 |
,283 |
FC6 |
,981 |
4,331 |
1 |
228 |
,039 |
Questão_1 |
,999 |
,272 |
1 |
228 |
,602 |
Questão_2 |
1,000 |
,027 |
1 |
228 |
,869 |
Questão_3 |
,997 |
,727 |
1 |
228 |
,395 |
Questão_4 |
,979 |
5,009 |
1 |
228 |
,026 |
Fonte: Elaborado pelos autores
Pode-se perceber por meio da tabela que as variáveis FC3, FC6 e
Questão_4 são as que mais discriminam os grupos, ou seja, o poder de
diferenciação delas em relação ao grupo é superior, se comparado
com as variáveis restantes, devido aos valores do score Z e das baixas significâncias, evidenciando os achados
de Thomas e Subhashree (2020) destacando a relação positiva existente entre a
alfabetização financeira e empreendedorismo.
No fim da análise discriminante da Avaliação
comportamental tem-se que a FC6 e a Questão_4 representam todo o grupo de
questões da segunda parte do questionário. Portanto, a questão FC6, que
pergunta o nível de conhecimento e ou informações que os alunos têm sobre a
caderneta de poupança, e a questão que oferece duas as alternativas hipotéticas
de 80% de chances de perder R$ 4.000,00 e 20% de chances de perder R$ 0,00 ou
100% de chances de perder R$ 3.000,00, são as duas perguntas que indicam a
propensão ao empreendedorismo dos estudantes dentro da Avaliação
comportamental, conforme apresentado por Thomas e Subhashree (2020) e
Hirshleifer (2015).
Os alunos dos cinco cursos de graduação que responderam
terem conhecimento sobre a caderneta de poupança e escolheram a opção de 100% de chances de perder (tabela 3) R$3.000,00 são mais
propensos a serem empreendedores,
pois são alunos que possuem um conhecimento prévio do mercado e que definiram
sua escolha na hipótese de investimento através da análise das oportunidades,
escolhendo a oportunidade vinculada à um risco percebido, porém, que é mais
lucrativo do que a outra opção, valendo a pena segui-la (MOCELIN; AZAMBUJA, 2017).
O resultado pode ser explicado pela capacidade de julgamento e
discernimento econômico desse público em formar expectativas em termos de
valores esperados, como analisado por Kirzner (1973).
Tabela
5: Coeficientes de função de
classificação da Avaliação comportamental.
|
Expectativa 0 |
Expectativa 1 |
FC6-Nível de conhecimento sobre caderneta de
poupança |
1,395 |
1,684 |
Questão_4-Alternativa hipotética de investimento |
1,380 |
,517 |
(Constante) |
-2,457 |
-4,432 |
Fonte:
Elaborado pelos autores
Quando realizada a análise discriminante das questões
sobre intenção empreendedora também é possível verificar que os alunos que
disseram que tornar-se empreendedor implica mais vantagens do que desvantagens.
Se tivessem a oportunidade e recursos, gostariam de iniciar um negócio.
Observa-se, então, a presença de alunos com potencial empreendedor
dentro da amostra de alunos escolhidos nos cursos de graduação, que procuram
explorar uma atividade a partir de uma noção de eficácia como analisado por
Brãndle, Berger, Gola e Kuckretz (2018).
Por fim, foi realizado testes de igualdades de médias de grupo do
perfil, apresentando as características de perfil e as condições
socioeconômicas presentes nos estudantes que tem o interesse em empreender.
O gênero, a escolaridade do pai e a realização de investimentos em
algum ativo financeiro da economia são questões fundamentais dentro do grupo
das perguntas de Avaliação socioeconômica e
Perfil. De acordo com a divisão entre as expectativas 0 e 1, realizadas anteriormente
para o uso das respostas das questões pelo software, alunos do sexo masculino,
que os pais possuem Pós-graduação e/ou mestrado e/ou doutorado e que já
investiram seu dinheiro em algum ativo financeiro da economia são indivíduos
mais propensos a empreender.
Uma pesquisa do GEM-Global
Entrepreneurship Monitor de 2016, aponta que a alta renda familiar aliada à
experiência da família com negócios, cria um cenário favorável ao
empreendedorismo, a renda familiar pode ser relacionada com o grau de escolaridade
do pai, influenciador nos resultados do trabalho, visto que o nível superior e
especializações elevam o salário do trabalhador brasileiro (GEM, 2016).
O fato de que estudantes que já tiveram contato com algum ativo da
economia serem mais propensos a empreenderem pode ser explicado através de
estudos baseados na teoria da aprendizagem social (SLT ou Social Learning Theory), que detectaram a diferença de performance
entre indivíduos que possuem e os que não possuem conhecimentos de mercado quando se trata de criar e gerir
empresas, revelando que os conhecimentos já adquiridos são aplicados nos
negócios novos e uteis para bons desempenhos (SCHERER; ADAMS; WIEBE, 1989).
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho abrangeu um estudo realizado com
estudantes de graduação, a partir de uma pesquisa, a
fim de verificar a propensão desses alunos a empreender, tendo como base os
pressupostos das finanças comportamentais.
Verifica-se a presença de vieses das finanças comportamentais no interesse em empreender dos
alunos dos cincos cursos de graduação considerados, isto é, suas decisões
sinalizam a presença de um viés comportamental e não de uma decisão com base na
racionalidade. Desta forma, os alunos que possuem um perfil relacionado a esses
vieses comportamentais, em especifico
os que dispõem de maior alfabetização financeira, são a parcela da amostra mais
propensa a empreender.
Em relação ao comportamento desses estudantes, por
exemplo, os alunos que aceitam assumir risco em hipóteses de investimentos são
aqueles com maior propensão a começarem novos negócios. O mesmo acontece quando
é considerada a intenção dos alunos em empreender, quando os estudantes que
veem o empreendedorismo com mais otimismo e com mais vantagens são os mais
propensos a iniciarem uma nova empresa.
O trabalho também pôde identificar, no tocante ao perfil
dos alunos, que existem algumas características que os tornam mais inclinados a
ação empreendedora. Conseguiu-se definir que o gênero, a escolaridade do pai e
a realização de investimentos em algum ativo financeiro são fatores
determinantes nas decisões da amostra considerada. Esses resultados devem ser
levados para futuras investigações inclusive por coordenadores de escolas do
ensino médio.
Através das respostas dos questionários foi possível
entender que alguns aspectos presentes no comportamento dos alunos são
preponderantes nas suas tomadas de decisões. E estes aspectos, que fazem parte
da individualidade de cada graduando, mas que estão presentes em determinada
parcela do grupo, também interferem nas suas ações empreendedoras.
O presente trabalho considerou uma amostra dentro de uma
única universidade brasileira, portanto, o trabalho encontra uma limitação
quanto a extrapolação desses resultados para outros contextos. Mas, está em
simetria com aplicações internacionais o que permite a compreensão de
comportamentos na realidade brasileira. Quase que finalmente, o presente
trabalho aliou às contribuições das finanças comportamentais com aplicação
metodológica para compreender o comportamento de jovens, possíveis
empreendedores da FCAV, que ao criarem empresas poderão imprimir uma condução
que pode ser antecipada pela identificação de um padrão de comportamento. Nessa
linha, o acompanhamento pela instituição dos egressos fortalecerá as relações
de ensino, pesquisa e empreendedorismo.
Sugere-se, finalmente, que novos estudos sejam realizados
em outras instituições universitárias para que os resultados possam ser
comparados, a partir da relação empreendedorismo e finanças comportamentais,
entre estudantes universitários. Com isso, eleva-se a frequência de evidências
e a quantidade de informações para que a relação complexa entre comportamento,
empreendedorismo e finanças comportamentais possa ser melhor compreendida no
Brasil.
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[1] Agências de Inovação são uma característica das três universidades estaduais, UNESP, USP e UNICAMP do Estado de São Paulo.