v. 5, n. 1, Janeiro-Abril/2021

Determinantes internos e externos da estrutura de capital das empresas brasileiras

Georgia Saiani Mendes

0000-0001-6790-4352

Universidade de São Paulo

Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil

 

 David Ferreira Lopes Santos           

david.lopes@unesp.br

0000-0003-3890-6417

Universidade Estadual Paulista

Jaboticabal, São Paulo, Brasil

 

Elton Eustáquio Casagrande

0000-0003-4523-6802

Universidade Estadual Paulista

Araraquara, São Paulo, Brasil

 

 

RESUMO

Este artigo teve por objetivo analisar os determinantes do endividamento das empresas no Brasil. Propõem-se um tratamento diferenciado nessa pesquisa ao avaliar variáveis internas e externas às firmas. As variáveis endógenas refletem os fundamentos financeiros da empresa e as variáveis exógenas expressam a dinâmica setorial competitiva em que a empresa está inserida. A hipótese do artigo é que ambas as dimensões exercem influência no  endividamento. A base de dados foi construída combinando dados financeiros anuais de empresas de capital aberto e fechado entre os anos de 1998 a 2014. A média de empresas em cada ano foi de 1.211 firmas. A partir destas empresas criou-se um painel balanceado com 89 empresas ativas ao longo dos 16 anos estudados e com informações para todas as variáveis.  Os resultados demonstram que todas as variáveis relacionadas aos fundamentos das empresas são significativas para explicar o endividamento das empresas. No entanto, somente uma variável relativa à dinâmica setorial foi significativa para explicar a estrutura de capital. Os resultados evidenciam que não há um único padrão teórico (Pecking Order ou Trade-off) para direcionar a estratégia de endividamento.

 

Palavras-chave: Desempenho Financeiro; Dinâmica Setorial; Endividamento; Gestão Financeira; Regressão com Dados em Painel.

 

Internal and external determinants of the capital structure of Brazilian companies

 

ABSTRACT

This paper aimed at analyzing the determinants factors of corporate indebtedness in Brazil. We propose a differential treatment in this research when evaluating internal and external variables to firms. The endogenous variables reflect the company financial fundamentals and the exogenous variables express the competitive sector dynamics in which the company is inserted in. The hypothesis is that both dimensions exert  influence on indebtedness. The database was constructed combining annual financial data of public and private companies between 1998 and 2014. The average number of companies in each year was of 1,211 companies. From that number, a balanced panel with 89 active companies throughout the 16 years of study and information for all the variables was created. The results show that all variables related to the companies foundations are significant to explain the indebtedness of them.  However, only one variable related to the sectoral dynamics  was significant to explain the capital structure. The results show that there is no single theoretical pattern (Pecking Order or Trade-off) to direct to the debt strategy.

 

Keywords: Financial Performance; Sector Dynamics; Indebtedness; Financial Management; Panel Data Regression

                                                   

Submetido: 19/12/2020

Solicitação de Correções: 24/02/2021

Aceito: 25/02/2021

Publicado: 30/04/2021

 

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

 

O debate sobre estrutura de capital repousa sobre contribuições seminais que continuam a influenciar as investigacões recentes e acentuar as discordâncias. A estrutura de capital tem relação com as decisões de endividamento e valor das empresas e procura explicar como as empresas combinam capital próprio e de terceiro para financiar investimento em ativos reais. A teoria tradicional desenvolvida por Durand (1952) afirma que é possível alcançar um nível ótimo de endividamento a fim de maximizar o valor do investimento e não da renda empresarial. O autor, contudo, coloca que sua teoria não era integralmente convecional, pois defendia que os empresários deviam maximizar a riqueza e não a renda. Mesmo intuítivo, Durand (1952) trabalha com a relação entre risco e retorno, em particular, ao acrescentar ao modelo o financiamento através de capital próprio acrescido de capital de terceiros.

A predominância da teoria que veio a seguir, de proposição Modigliani e Miller (1958), explorou a arbitragem para demonstrar que o fato de existerem empresa alavancadas, não causaria diferenças de valor com relação as empresas não alavancadas. Logo, a forma de financiamento era irrelevante e desconsiderava a estrutura de financiamento para a decisão de investimento em ativos reais. Mais tarde, ou autores acima incluíram o efeito do benefício fiscal da dívida para incrementar o trabalho anterior e, neste caso, ficou demonstrado que a diferença de valor entre empresas alavancadas e não alavancadas existe em função exclusivamente do benefício fiscal (MODIGLIANI; MILLER, 1963).

Pesquisar impactos antes desconsiderados da pesquisa de Modigliani e Miller foram feitos por outras abordagens, e entre elas, as teorias decorrentes do infortúnio financeiro (ALTMAN, 1984), custo de agência (JENSEN; MECKLING, 1976) e assimetria de informação (MYERS, 1984) que decorreu da crítica deste último ao estudo de Donaldson (1962), em particular com relação às expectativas homogêneas assumidas pelo último.

 A contribuição da Pecking Order Theory se origina com o conceito de assimetria de informações, que significa, por sua vez, um conhecimento mais completo por parte das Diretorias sobre a condição da empresa que administram do que os investidores. O efeito dessa hipótese se dá sobre a escolha entre financiamento interno ou externo e também entre emissão de dívida ou venda de novas ações. Logo, firmas irão preferir empregar recursos acumulados internamente, adaptarão os pagamentos de dividendos para manter a liquidez, e quando recursos externos são necessários, a preferência é pela emissão de dívidas.

No Brasil, estudos apontam que as organizações apresentam resultados na direção da Pecking Order (CORREA; BASSO; NAKAMURA, 2013; ZEIDAN; GALIL; SHAPIR, 2018; CORDEIRO FILHO et al., 2018) e uma preferência por abordarem da estrutura de capital e sua relação com variáveis internas às firmas (KUMAR; COLOMBAGE; RAO, 2017; LI; ISLAM, 2015). Por outro lado, encontram-se uma variedade de estudos que buscam entender o comportamento de métricas internas às organizações de um único setor associadas a estrutura de capital (KAVESKI et al., 2015; HOYOS; GARZÓN, 2015; BRUNOZI et al., 2016, SANTOS  et al., 2014), o que sugere que as características específicas de cada  setor podem afetar seu endividamento (ZHONG; CHEN, 2014).

Por isso, esse estudo se posiciona na discussão teórica que envolve a tríade endividamento, desempenho e dinâmica setorial ainda em conformação e sem estudos empíricos de larga amplitude para a realidade brasileira. Devido a polarização que os estudos sobre endividamento possuem, o objetivo dessa pesquisa é analisar  os fatores os determinantes do endividamento das empresas no Brasil, a partir de um modelo que agregue variáveis internas e externas à firma.

Para tanto, o artigo foi organizado em mais 3 seções posteriores a essa introdução para melhor apresentar a pesquisa realizada. A próxima seção apresenta os fundamentos teóricos sobre o tema e que permitiram construir as hipóteses. A terceria seção apresenta os materiais e métodos que possibilitaram a construção da base de dados e os resultados que são apresentados e discutidos na quarta seção. Por fim, as considerações finais relatam as implicações e limitações desse estudo, bem como novas proposições para estudos empíricos.  A listagem das referências utilizadas encerram o artigo.

 

FUNDAMENTOS TEÓRICOS

 

Esta seção aborda os fundamentos teóricos que permitiram construir as hipóteses e as variáveis para testá-las. Desta forma, priorizou-se o uso de artigos clássicos nesse tema, bem como estudos empíricos nacionais e internacionais, com vistas a avaliar a utilização das variáveis explicativas ao endividamento e definir as relações esperadas.

 

Estrutura de Capital

A combinação das fontes de capitais, próprias e de terceiros, e seus respectivos custos geram o custo médio ponderado de capital. A maximização do lucro esperado por ação, depende de um custo médio ponderado mínimo, que por sua vez, é afetado pela relação dívida/ativos totais. Na abordagem tradicional existiria um nível de endividamento ótimo que poderia ser alcançado através da combinação de capital de terceiros e próprio que maximizariam o valor da empresa (DURAND, 1952).

O grau de alavancagem se relaciona com o risco enfrentado pelos acionistas e, portanto, com o custo do patrimônio dos acionistas ordinários. Esse risco, também conhecido pelo termo “beta” de uma empresa alavancada” pode ser resultado de uma estrutura ótima de capital, com metas calculadas para obter tal maximização.

Há, contudo, limitações empíricas para essa abordagem em mercados com fraca eficiência, em que o coeficiente beta é estimado com restrições em função da carteira de mercado não expressar de forma robusta o risco sistemático do país, como ocorre para a realidade brasileira (ASSAF NETO; LIMA; ARAÚJO, 2008; RODRIGUES et al., 2017).

A teoria da irrelevância financeira de Modigliani e Miller (1963) que corrigida para os  efeitos dos impostos em relação ao artigo de 1958, demonstra que o efeito fiscal da alavancagem afeta o valor de mercado e o WACC da empresa. (RODRIGUES, 2013; JAROS; BARTOSOVA, 2015; VIEIRA, 2013).

A teoria do Trade Off pressupõe que as empresas buscam definir seu endividamento considerando o balanceamento entre os benefícios fiscais da dívida e os custos de dificuldades financeiras com uma meta para endividamento (MYERS, 2001). Contudo, para a Pecking Order Theory, essa meta não é realizável pela existência da hipótese da assimetria de informações, que por sua vez, só pode ser observada indiretamente: a existência de restrição financeira externa eleva os custos de captação das empresas, o que torna a hierarquia de financiamento uma condição necessária para que a empresa realize seus investimentos. Em suma, há divergência entre os custos de financiamentos internos e externos o que leva as empresas acumularem de liquidez. Greenwald  (1984) e Myers and Majluf (1984).

A Pecking Order define que há preferências entre as fontes de financiamento. Uma empresa deve utilizar primeiramente seus recursos próprios (lucros somados a depreciação – cash-flow), para em seguida optar por capital de terceiros, e caso necessário utilizaria a emissão de ações (MYERS; MAJLUF, 1984). Essa vertente se sustenta com o fato de que empresas que possuem maior lucratividade podem reter seus lucros, e, portanto, tendem a utilizar capital próprio em detrimento do capital de terceiros, ou seja, são menos propensas ao endividamento (MYERS, 2001).

Moshirian, Nanda, Valdilyev, Zhang e Zhang (2017) estudaram a sensibilidade das variáveis financeiras internas da firma ao investimento em ativos fixos para 42 países, de 1993 a 2013, como forma de se observar os efeitos da assimetria de informações. Segundo os autores, na medida que os investimentos em intangíveis tornam-se relevantes relativamente ao investimento em ativos haverá redução da sensibilidade do cash-flow empregada como proxy para restrição financeira, em particular, para os países desenvolvidos. Quando se analisa a liquidez e investimento em tangíveis a produtividade marginal do capital fixo é mais previsível do que a dos ativos intangíveis. A previsão de produtividade a relação com a estrutura de capital permite testes mais robustos para os determinantes do investimento.

Logo, os estudos para os países em desenvolvimento tendem a apresentar uma maior sensibilidade do investimento às variáveis financeiras internas do que as empresas dos países desenvolvidos.

Liu (2017) discute, com base em revisitação de estudos publicados a partir dos anos 2000, os conceitos de flexibilidade financeira e política financeira. O autor parte do pressuposto de que os mercados financeiros não são perfeitos e a prudência precaucional deve ser testada. Com base nas investigações o autor defende que a flexibilidade define a estratégia da política financeira. A política financeira segundo o autor compreende as decisões de estrutura de capital.

A flexibilidade financeira se resume na manutenção de elevados níveis de liquidez (disponibilidades) e nos baixos níveis de alavancagem. A combinação dessas duas decisões produzem efeitos no mercado ao favorecer o aumento do endividamento quando a corporação encontra oportunidades de investimento lucrativas.

Neste contexto, de oportunidade de crescimento, uma empresa ou grupo empresarial tem recursos imediatos para estabelecer suas ações, ao mesmo tempo que, pode recorrer aos credores dada sua capacidade de pagamento. Além das duas estratégias para manter a flexibilidade financeira, o autor recolhe também evidências de que a política de distribuição de dividendos se torna passiva e submissa a política de flexibilidade financeira (LIU, 2017).

A capacidade financeira citada como relevante nos parágrafos anteriores é medida por noções de liquidez, seja o índice de liquidez ou na forma do capital circulante líquido. O fato é que a decisão empresarial de utilizar variáveis que compõem a liquidez corrente pode se revelar de duas maneiras: i) redução dos ativos circulantes; ii) aumento dos passivos circulantes. Os efeitos combinados de i) e ii) serão empregados no financiamento de ativos imobilizados.

Ronneberg e Aarnes (2015) analisam a disposição de manter excesso de disponibilidades acima das necessidades operacionais em empresas públicas e privadas devido aos motivos de precaução, custos transacionais para tranformar ativos em disponibilidades, custo de agência, tributação – quando empresas tem bases multinacionais e procurarm postergar repatriações de lucros e estrutura competitiva de mercado. O período do estudo é de 2002 a 2012 com empresas norueguesas. As informações das demonstrações contábeis após o tratamento dos dados levou a formação de uma amostra com 779.113 observações do setor privado e 1.458 observações de mepresas públicas. Os autores também avaliam o desempenho dos dois grupos ao observarem o retorno sobre os ativos e a política de dividendos. Os autores demonstram a relevância das variáveis internas para explicar os investimentos e que as empresas públicas sofrem os efeitos dos custos de agência.

No artigo de Al–Amri, Al-Busaidi e Akguc (2015) as disponibilidade de recursos de curto prazo ou liquidez são meios para enfrentar situações críticas e recessivas. O estudo foi feito para a Europa e países do Oriente Médio no período entre 2003 e 2012 para os setores de bens duráveis, não duráveis, energia, química, serviços, saúde e indústria de transformação.

Ainda para Al–Amri, Al-Busaidi e Akguc (2015), o excesso de liquidez é definido como o volume acima do que seria necessário para financiar o investimento operacional corrente. A gestão contábil conservadora é definida como um instrumento de governança através da antecipação das perdas futuras e ganhos não auferidos. A contabilidade conservadora combinada com a decisão de manter elevado níveis de liquidez reduzem os efeitos das assimetrias de informação, de acordo com a revisão da literatura feita por estes autores. Para completar o quadro de investigação os autores também consideram a importância da liquidez como comportamento precaucional. O argumento é baseado nas expectativas das Diretorias ao prever restrições creditícias futuras em seus mercados, tanto em função do funcionamento dos mercados de crédito quanto da avaliação da atividade econômica. Os resultados demonstraram que a prática de governança – contabilidade conservadora e elevada liquidez influenciou as decisões de investimento das corporações, em particular as públicas.

O estudo de Zeidan, Galil e Shapir (2018) comprova a hipótese de que as empresas brasileiras estão mais inclinadas a utilizar seus lucros retidos como fonte de recursos. Correa, Basso e Nakamura (2013) também identificaram que as maiores empresas brasileiras aproximam-se mais da Pecking order do que da Trade off Theory.  Uma justificativa para esse comportamento é que a o capital próprio é de facil e rápido acesso pelas empresas em comparação com outras possibilidades de fonte de financiamento (XU; LI, 2015).

 

Dinâmica Setorial e Desempenho  

A estrutura de concorrência setorial afeta a estrutura de capital e as decisões relacionadas ao endividamento das empresas (ISLAM; KHANDAKER; 2015; MANGAFIC; MARTINOVIC; 2015). Os gestores devem se preocupar com o risco que a estrutura concorrencial do setor causa sobre a alavancagem operacional ou risco do negócio (ZHONG; CHEN; 2014; DE-CARVALHO; DIAS; ROSSI, 2018).

Li e Stathis (2017) testaram a estrutura de capital relacionando-a com a média de endividamento e o crescimento do setor econômico em cada empresa estava inserida na Austrália. Ambas as variáveis apresentaram relação com a contração de dívidas, de forma que empresas que estão em indústrias em crescimento tendem a utilizar recursos próprios. Aquelas que estão em setores com endividamento médio-alto são propensas a contrair mais dívidas. Os autores observaram também que as dívidas do setor vem se tornando mais importante, e por sustentar o sinal significantemente positivo em relação ao endividamento reforça a ideia da Trade-off Theory.

Pinková e Riederová (2013) analisaram variáveis internas às firmas considerando os diferentes setores da indústria de transformação do Cazaquistão. Há mudanças de decisão de estrutura de capital quando as empresas se encontram em setores distintos e algumas variáveis podem indicar propensão à constituição de dívidas em um setor, enquanto em outro pode significar aversão ao financiamento.

Martins e Terra (2014) e Kayo e Kimura (2011) utilizaram variáveis setoriais para mensurar os determinantes da estrutura de capital na América Latina. Para sua pesquisa, selecionaram as variáveis: dinamismo do setor, munificiência setorial e concentração do setor. Kayo e Kimura (2011) verificaram que 11,6% da estrutura de capital pode ser explicada com variáveis setoriais, demonstrando que em empresas localizadas em países emergentes o dinamismo e a concentração de mercado demonstram relação negativa com o endividamento. Já Martins e Terra (2014) concluíram que, em empresas brasileiras, variações setoriais corresponderam a 4,79% de variações em alavancagem e encontraram significância somente na variável de munificiência.

Venanzi, Nacarato e Abate (2014) encontraram associação negativa do índice de Herfindahl-Hirschman (IHH) com o endividamento, demonstrando que empresas que estão em mercados mais competitivos tendem a obter maior financiamento do que empresas em indústrias concentradas. Mitani (2014) estudou a relação da concentração de mercado feita através do market share com a estrutura de capital e identificou que empresas com grande market share tendem a contrair menos dívidas e organizações com baixa concentração de mercado estão sucetíveis a obter maior quantidade de capital de terceiros.

Macedo et al. (2015) apontam que as organizações brasileiras que não são cotadas na bolsa de valores se preocupam com a volatilidade dos seus lucros e Zhong e Chen (2014) demonstram que as organizações devem observar o endividamento do setor em que estão inseridas para definirem sua estrutura de capital. O risco da indústria foi estudado por Li e Islam (2015) e os autores observaram que organizações que se encontram em setores que possuem altos riscos tendem a contrair mair dívidas.

Apesar das evidências apresentadas considerando o efeito da dinâmica setorial na estrutura de capital, os autores Nejad e Wasiuzzaman (2015) alegam a pouca influência da indústria no endividamento, representando somente 3,62% de mudanças na estrutura de capital. Existe uma preponderância dos estudos utilizarem as variáves de retorno para estudar a relação do desempenho financeiro com a estrutura de capital. O retorno sobre ativos é o mais comentado, sendo apresentado majoritariamente sua associação negativa com o endividamento, sustentando o pressuposto que empresas tendem a reter seus lucros para suprir sua demanda de capital (VĂTAVU, 2015; SALIM; YADAV, 2012; KAVESKI et al., 2015).

Sumedrea (2015) estudou o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE – Return on Equity) e reafirma a tendência a Pecking Order Theory, pois quanto maior o ROE, menor as dívidas das organizações, ou seja, as empresas preferem utilizar recursos internos em detrimento dos externos para seu financiamento. Vătavu (2015), porém, encontrou relação negativa entre a dívida total e de curto prazo considerando o ROE como variável dependente, e defendeu que quanto mais dívidas a empresa possui, menos eficientemente ela utiliza o recurso de seus acionistas.

Thippayana (2014), Seghiescu e Văidean (2014) e Serrano e Franco (2018) constatam que o tamanho das empresas afeta positivamente o seu endividamento, ou seja, empresas maiores possuem mais ativos e têm menores dificuldades financeiras menores custos de falência e são sucetíveis a contrair maiores dívidas, apoiando a Trade-off Theory.

O giro do ativo e a estrutura de capital são métricas dispostas no estudo de Seghiescu e Văidean (2014) que identificaram que quanto mais eficiente a organização é em gerar receita sobre seus ativos, mais capital de terceiros ela possui. Santos et al. (2014) investigaram a estrutura de capital das empresas e notaram que o giro do ativo tem efeito significativo e positivo somente em referência ao endividamento a curto prazo. Brunozi et al. (2016) também encontrou resultados semelhantes sobre a variável, mostrando que quanto maior o giro do ativo, maior sua dependência em relação a recusos para sustentar suas atividades, e consequentemente maior seu endividamento.

Segundo Rodrigues et al. (2017), há relação negativa entre a estrutura de capital de empresas brasileiras e a margem operacional, Arowshegbe e Idialu (2013) também demonstraram essa associação ao testar o efeito da estrutura de capital na margem operacional observando que organizações com mais lucro tendem a contrair menos dívidas, sustentando a Pecking Order Theory (MYERS, 1984).

 

A concepção e a elaboração do modelo

A fim de estudar os efeitos de fatores internos e externos às empresas foram contruídas hipóteses com base no referencial teórico estudado. Assim, o Quadro 1 relaciona as variáveis internas e externas com as hipóteses e as referências teóricas que as sustetam.

O modelo proposto para esse estudo agrega variáveis internas e externas às firmas relacionadas, destaca-se, sobretudo, as variáveis com maior influência externa relativa à dinâmica setorial competitiva em que as empresas estão inseridas. A expectativa é aumentar a compreensão sobre os fatores que contribuem para a formação do endivamento empresarial, tendo em vista, os resultados inconclusos na literatura.

 

Quadro 1. Modelo de estudo

Variável

Hipótese

Referências

 

Alavancagem

(Interna)

H1: Há relação positiva entre a Alavancagem e o Endividamento.

Assaf Neto et al. (2008); Salim e Yadav (2012).

 

Capacidade de Pagamento

(Interna)

H2: Há relação negativa entre a Capacidade de Pagamento e o Endividamento.

Öztekin (2015); Myers (1984); Xu e Li (2015).

 

Giro do Ativo

(Interna)

H3: Há relação positiva entre o Giro do Ativo e o Endividamento.

Serghiescu e Vaidean (2014); Santos et al. (2014); Brunozi et al. (2016).

 

Margem Operacional

(Interna)

H4: Há relação negativa entre a Margem Operacional e o Endividamento.

Arowshegbe e Idialu (2013); Rodrigues et al. (2017).

 

Retorno sobre ativo

(Interna)

H5: Há relação negativa entre o ROA e o Endividamento.

Vătavu (2015); Salim e Yadav (2012); Kaveski et al. (2015).

 

Retorno sobre o patrimônio líquido

(Interna)

H6: Há relação negativa entre o ROE e o Endividamento.

Kaveski et al. (2015); Salim e Yadav (2012); Sumedrea (2015).

Tamanho

(Interna)

H7: Há relação positiva entre o Tamanho e o Endividamento.

Thippayana (2014), Seghiescu e Văidean (2014) e Serrano e Franco (2018)

Concentração

(Externa)

H8: Há relação negativa entre a concentração e o Endividamento.

Martins e Terra (2014); Kayo e Kimura (2011).

Variação da Receita

(Externa)

H9: Há relação negativa entre a Δ Receita e o Endividamento.

Hoyos e Garzón, (2015); Li e Islam (2015)

Variação do Lucro Operacional

(Externa)

H10: Há relação negativa entre a Δ Lucro Operacional e o Endividamento.

Santos e Rodriges (2014); Adi, Suhadak, Handayani e  Rahayu (2013)

Fonte. Elaboração própria.

 

MATERIAL E MÉTODOS

 

A abordagem neste artigo é descritiva e analisa relação de fatores internos e externos às empresas e seus efeitos sobre o endividamento, O método é quantitativo, baseado na aplicação de modelo empírico calculado por meio de regressão com dados em painel.

 

Material

As fontes de informação são: 1. Sistema Economática®; 2. “Balanços Patrimoniais”. A base de dados tem 1.211 empresas, das quais 89 apresentaram informações de 1998 a 2014, resultando em 1.424 observações (16 anos x 89 empresas). Pontua-se que o ano de 1998 serviu como ano base, por isso, são 16 e não 17 anos. Trata-se, portanto, de um dos estudos longitudinais com amostra não exclusiva de empresas de capital aberto para o Brasil. As empresas se distribuem por 17 setores: agricultura, alimentos, bebidas e fumo, sucroalcoleiro, comércio atacadista , comércio varejista, couro e calçados, equipamentos elétricos, farmacêutica , logística, madeira e móveis, material eletrônico, metalurgia, mineração , papel e celulose, plástico e borracha.

As identidade das variáveis utilizadas para o modelo empírico são apresentadas no Quadro 2 e decorrem de forma direta do modelo proposto no Quadro 1.

 

Quadro 2. Dados e variáveis necessárias para o desenvolvimento do modelo

Variáveis

Fórmulas

Construtos

Nomenclaturas

Endividamento Total

Estrutura de Capital

P – Passivo Total

AT – Ativo Total

Variação da receita

Dinâmica Setorial

R – Receita

Variação do lucro operacional

LO – Lucro Operacional

Razão de Concentração

Ri – Receita da empresa i

Rt – Receita total do mercado

Índice de Herfindahl-Hirschman

Giro do Ativo

 

 

 

 

 

 

 

 

Desempenho

Financeiro

GA – Giro do ativo

Margem Operacional

EBIT – Earn Before Interest and Taxes

Primeira diferença do ROE

LL – Lucro Líquido

PL – Patrimônio Líquido

Primeira diferença do ROA

AT – Ativo Total

LL – Lucro Líquido

Alavancagem

 

ALAV – Alavancagem

Tamanho

TAM – Tamanho

Primeira diferença do Endividamento

End – Endividamento

Capacidade de Pagamento

LO - Lucro Operacional

Fonte. Elaboração própria.

 

A variação da receita e a variação do lucro operacional (VREC e VLO) são usadas como proxy para medir o risco que cada empresa está exposta nos setores econômicos que estão inseridas. Como as receitas decorrem da quantidade de produtos vendidos e os preços praticados e essas premissas estão associadas múltiplos fatores externos às empresas (renda, crédito, concorrência, produtos substituos, entre outros), entende-se que a volatilidade da receita pode representar o risco do mercado que a empresa atua. Nessa direção, a variação da Margem Operacional também pode capturar o risco associado aos custos e despesas da empresa. Empresas com maior volatilidade nas suas margens pode sinalizar um ambiente de negociação com fornecedores mais dinâmico.

Em tempo, a utilização das variáveis Razão de Concentração (RC) e do Índice de Herfindahl-Hirschman (HHI) deve-se a capacidade das mesmas de identificar o tamanho da empresa diante do mercado que atua. Assim, quanto menor for o resultado mais exposta ao ambiente competitivo está a empresa. Ressalta-se que o painel balanceado construído para o modelo empírico contemplou 88 empresas que apresentaram informações em todos os anos, no entanto, os cálculos para RC e HHI foram feitos anualmente considerando todas as empresas alcançadas pelas bases nos seus respectivos setores (amostra  anual média de 1.211 empresas), o que permitiu calcular a participação da empresa no seu setor em cada ano.

Por oportuno, as variáveis relativas à rentabilidade (ROE e ROA) são usadas nesse estudo a partir das diferenças entre o resultado do período analisado e o imediatamente anterior. Esse fato deve-se ao julgamento que a formação do endividamento pode estar associada com a evolução dos níveis de rentabilidade no período analisado e, não simplesmente, por uma posição estática.

 

Métodos

Os testes realizados Jarque-Bera e Kwiatkowski-Phillips-Schmidt-Shin, mais conhecido como KPSS, verificam a característica de normalidade das empresas e a estacionariedade da amostra (MARQUES, 2000). A matriz de correlação foi utilizada para observar a correlação entre as variáveis e estatística descritiva apresentar as características amostrais.

A análise de regressão com dados em painel foi utilizada por combinar informações transversais de cada empresa (i) no recorte temporal (t) de 16 anos. Uma das principais vantagens que a estimação de dados em painel proporciona é a consideração da heterogeneidade particular, assumindo a existência de fatores diferenciadores dentro da amostra (MARQUES, 2000).

Os dados em painel são determinados com base na seguinte equação genérica:

                                    (3)

 

, onde:

“βit corresponde ao vetor (k×1) de parâmetros desconhecidos relativos ao indivíduo i no momento t e xit a matriz (k×1) de variáveis explicativas; cuja primeira coluna, no caso do modelo ter termo independente, será integralmente constituída por 1’s” (MARQUES, 2000, p.4). A técnica dos dados em painel proporciona maior suporte econométrico e estatístico, mais informações inclusive de grande variabilidade dos dados, credibilidade, baixa colinearidade das métricas e maior número de graus de liberdade (DUARTE; LAMOUNIER; TAKAMASTU, 2007; MARQUES, 2000). Contudo, a análise também pode apresentar problemas, como: maior risco de amostras incompletas, enviesamento de heterogeneidade e de seleção (MARQUES, 2000).

 

 

 

 

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

 

As variáveis do modelo não têm distribuição normal, uma vez que não apresentam p-valor acima de 5% para o teste Jarque-Bera, mas as variáveis são estacionárias. A matriz de correlação aponta que 32,05% das variáveis apresentaram correlação nula, 6% fraca, e 2,5% apontaram correlação moderada. Esses resultados afastam a possibilidade de multicolineariedade. Devido a alta correlação entre HHI e RC (p-valor > 0,9) optou-se por utilizar a última de acordo com os resultados do intervalo de confiança do coeficiente registrado pela regressão de dados em painel. A correlação moderada entre o endividamento e a diferença do endividamento existe e representa uma limitação do estudo. Contudo, o objetivo ao emprega-las é observar o comportamento histórico entre ambas.

Na Tabela 1 as estatísticas esclarecem que:

1. O log do ativo possui correlação de 0,5 com a razão de concentração, o que identifica que empresas com maior concentração de ativo podem ter porcentagem de vendas acima da média da amostra;

2. O endividamento médio da amostra é de 46%, com desvio padrão é 27%. Seria esperado que setores produtivamente similares apresentassem endividamentos semelhantes. Porém, há uma divergência entre o esperado e o observado para as empresas, discutido inclusive na literatura (ZHONG; CHEN, 2014);

3. A dispersão mais contundente é a de Capacidade de Pagamento (PGTO), excetuando as variáveis de primeira diferença. O resultado significa que há empresas que utilizam a retenção de lucros para pagar suas dívidas (MYERS, 1984; XU e LI; 2015) e outras que se financiam com fontes externas.

Os resultados do modelo de regressão com dados em painel estão na Tabela 1

 

Tabela 1. Estatísticas descritivas e matriz de correlação das variáveis do modelo

Variável

Média

DP

Alav

Dend

DROA

DROE

END

GA

TAM

MO

PGTO

RC

VLO

VREC

ALAV

2,56

3,689

1

0,07

0,01

-0,30

0,33

0,01

0,07

-0,06

-0,02

0,01

-0,01

-0,01

DEND

0,002

0,381

 

1

-0,25

-0,10

0,25

0,04

0,00

-0,02

-0,06

-0,01

0,01

0,01

DROA

-0,001

0,174

 

 

1

0,17

-0,04

0,04

-0,04

0,14

0,08

0,00

-0,01

0,03

DROE

-0,004

0,456

 

 

 

1

0,01

0,01

0,02

0,02

0,01

0,01

-0,00

0,00

END

0,464

0,273

 

 

 

 

1

0,09

0,08

-0,18

-0,10

0,04

-0,00

-0,05

GA

1,094

0,947

 

 

 

 

 

1

-0,18

-0,04

-0,06

0,02

0,03

0,08

TAM

12,74

2,946

 

 

 

 

 

 

1

0,01

0,04

0,51

-0,02

-0,00

MO

0,0859

0,384

 

 

 

 

 

 

 

1

0,14

0,01

-0,01

0,00

PGTO

0,000

0,000

 

 

 

 

 

 

 

 

1

-0,01

-0,00

0,01

RC

0,001

0,003

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1

-0,01

-0,01

VLO

0,100

2,870

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1

-0,01

VREC

0,238

1,368

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1

Fonte. Elaboração própria.

 

O Método de Mínimos Quadrados Ponderados[1] foi empregado devido a presença de heteroscedasticidade no Modelo com Efeitos Fixos dada as diferenças entre as empresas e a variação no tempo das variáveis (GUJARATI, 2006).

 

Tabela 2. Resultados do modelo de regressão com dados em painel balanceado

Variáveis

Coeficiente

Erro Padrão

Razão-t

p-valor

Intervalo de Confiança

Constante

0,298

0,020

14,69

<0,0001

(0,258; 0,338)

ALAV

0,042

0,002

23,32

<0,0001

(0,038; 0,046)

DEND

0,397

0,037

10,61

<0,0001

(0,323; 0,470)

DROA

-0,086

0,043

-2,02

0,0441

(-0,170; -0,002)

DROE

0,122

0,013

9,29

<0,0001

(0,096; 0,147)

GA

0,020

0,004

5,03

<0,0001

(0,012; 0,028)

TAM

0,003

0,001

1,96

0,0496

(0,000; 0,005)

MO

-0,105

0,013

−7,93

<0,0001

(-0,131; -0,079)

PGTO

-0,002

0,001

-3,90

0,0001

(-0,003; -0,001)

RC

0,386

0,343

1,12

0,2614

(-0,287; 1,059)

VLO

-1,49e-09

1,10e-08

-0,13

0,8932

(-2,3e-008; 2,09e-008)

VREC

-4,63e-01

1,37e-01

-3,367

0,0008

(-7,3e-012; -1,93e-012)

Fonte. Elaboração própria

 

Na Tabela 2, o R² alcançou 41,87% e o R² ajustado 41,38%. A Estatística F (11,1323) do modelo reportou valor de 86,63, com p-valor menor que 0,000 rejeitando a hipótese nula de má especificação do modelo.

Os intervalos de confiança das variáveis com coeficientes significativos (p-valor < 0,10) asseguram maior confiabilidade na análise dos resultados dos coeficientes, pois os limites inferiores e superiores das variáveis apresentam o mesmo sinal que o coeficente. O intervalo foi definido para 95% de confiança.

A constante do modelo apresentou significância e associação positiva com o endividamento, ou seja, há outros fatores que não estão no estudo explicam o financiamento. Esses fatores podem ser aspectos comportamentais dos executivos das organizações.

As variáveis relacionadas ao Desempenho Financeiro foram todas significativas em relação ao endividamento. A variável mais importante, segundo o coeficiente, foi a diferença do endividamento (DEND), o que sugere que as decisões de financiar dependem do endividamento do ano anterior.

Não obstante, como as mudanças na estrutura de capital são uma decisão interna às empresas, o comportamento da variação do endividamento indica a preferência pela adoção de fatores endógenos para determinação do mesmo (KAYO; KIMURA, 2011; NEJAD; WASIUZZAMAN, 2015).

A diferença do retorno sobre o ativo (DROA) apresentou associação expressiva e negativa com o endividamento, apoiando o estudo feito por Vătavu (2015) sobre o uso da primeira diferença. Quanto mais às empresas apresentam variação positiva na rentabilidade dos seus ativos no ano x para x+1, menor será o seu endividamento, em função de recursos retidos (SERGHIESCU; VĂIDEAN, 2014; KAVESKI et al., 2015). Esse fato pode estar associado a estabilidade, pois uma vez que não há constância na rentabilidade obtida, a opção mais segura seria se utilizar de recursos próprios, o que indica uma associação com a pecking order (MYERS, 1984; CORDEIRO FILHO et al., 2018).

Os resultados também mostram que as empresas que possuem capacidade de geração de lucros para os acionistas (DROE) associada à alavancagem (ALAV) são propensas a ter maior endividamento, pois utilizam suas dívidas a investimentos que proporcionam melhores níveis de rentabilidade. Evidências como essa contrariam resultados obtidos por Kaveski et al. (2015) e Salim e Yadav (2012) que previram a inexistência de associação e relação negativa da estrutura de capital com o ROE. O comportamento da alavancagem (ALAV) acompanhado da primeira diferença do patrimônio líquido (DROE) favorece a Trade-Off Theory.

O tamanho dos ativos (TAM) afeta positivamente a estrutura de capital das organizações, em virtude da manutenção e desenvolvimento de seu crescimento, devido a menor dificuldade financeira e/ou custo de agência da dívida  das mesmas (THIPPAYANA, 2014;  SERRANO; FRANCO, 2018).

A maior eficiência no uso dos ativos (GA) reflete a tendência a aumentar o endividamento e a dependência deste. Portanto, o resultado aponta para a existência de Trade-off Theory, na qual as empresas preferem fontes de financiamentos externas à internas visto que podem ser favorecidas fiscalmente com as dívidas, ignorando a facilidade de obtenção proporcionada por recursos internos (BRUNOZI et al, 2016; SERGHIESCU; VĂIDEAN, 2014; XU; LI, 2015).

O resultado do coeficiente negativo da Margem Operacional (MO) e da Capacidade de Pagamento (PGTO) com o endividamento significa que as empresas com poucos recursos em caixa tendem a endividar-se mais, da mesma maneira que, firmas com maior margem têm propensão a endividar-se menos, pois as últimas priorizam a utilização de recursos internos de acordo com a Pecking Order (RODRIGUES et al., 2017;  AROWSHEGBE; IDIALU, 2013).

As variáveis de Dinâmica Setorial definidas razão de concentração (RC), variação o lucro operacional (VLO) não apresentaram significância no modelo (p-valor > 0,10). Por outro lado, variação da receita (VREC) apresentou coeficiente negativo e significativo, o que sinaliza que as empresas cujas receitas são mais voláteis apresentam menores níveis de endividamento, cumpre ressaltar, entretanto, que o coeficiente é praticamente nulo resultado similar ao alcançado por Nejad e Wasiuzzaman (2015). Esses últimos explicaram que as condições exógenas às empresas explicam 3,62% das variações da estrutura de capital.

Kayo e Kimura (2011), por sua vez, observaram que a dinâmica setorial pode representar uma variação de 11,6% do endividamento, mesmo que preponderem os fatores endógenos para determinação da estrutura de capital.

O Quadro 3 recupera os principais resultados alcançados. Destaca-se assim uma relação entre resultados –  relação com a Estrutura de capital – Teorias. A sigla TOT se refere a Trade-off Theory, PO a Pecking Order e AI a Asssimetria de Informações.

 

Quadro 3. Variáveis e sua relação com a Estrutura de Capital

Variável

Hipótese

Resultado

Teoria

Endividamento

Há relação entre o Endividamento e as demais variáveis.

Aceita parcialmente

TOT, PO e AI

Alavancagem

Há relação positiva entre a Alavancagem e o Endividamento.

Aceita

TOT

DROA

Há relação negativa entre o ROA e o Endividamento.

Aceita

PO

DROE

Há relação negativa entre o ROE e o Endividamento.

Aceita

TOT

GA

Há relação positiva entre o GA e o Endividamento.

Aceita

TOT

TAM

Há relação positiva entre o Tamanho e o Endividamento.

Aceita

TOT

MO

Há relação negativa entre a Margem Operacional e Endividamento.

Aceita

PO e AI

PGTO

Há relação negativa entre a Capacidade de Pagamento e o Endividamento.

Aceita

PO e AI

RC

Há relação negativa entre a concentração e o Endividamento.

Rejeitada

 

VLO

Há relação negativa entre a ΔLucro Operacional e o Endividamento.

Rejeitada

 

VREC

Há relação negativa entre a ΔReceita e o Endividamento.

Aceita

PO e AI

Fonte. Elaboração própria

 

Todas as variáves relativas ao desempenho financeiro das empresas e, portanto variáveis endógenas, foram significativas o que não ocorreu com as variáveis externas relativas à dinâmica setorial, pois somente a variação da receita foi significativa e, ainda assim, com o menor coeficiente entre as variáveis analisadas.

A preponderância dos fatores internos frente os externos para essa amostra, em que o endividamento das empresas foi estudado por 16 anos, revela que a longevidade das empresas pode estar mais associada a estratégias de orçamento de capital baseadas nos fundamentos financeiros das empresas do que na dinâmica setorial que envolve o mercado.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo identificou os fatores internos e externos às empresas que são importantes na determinação da estrutura de capital, com base em uma amostra composta de 89 firmas distribuídas em 17 setores entre 1999 a 2014.

Os fatores internos às empresas foram os que mais explicaram a estrutura de capital. A dinâmica da indústria, apesar de sua base teórica (PINKOVÁ;  RIEDEROVÁ, 2013; MITANI, 2014; KAYO; KIMURA, 2011) não apresentou significância e confiabilidade de seus coeficientes. A razão de concentração não apresentou associação com as dívidas das empresas, como apontado pelos autores Nejad e Wasiuzzaman (2015), que já haviam identificado a baixa preponderância das condições exógenas às firmas em relação ao endividamento. O risco de mercado, representado por variação do lucro operacional (VLO) e da receita (VREC), também não indicou relacionamento com a estrutura de capital e demonstrou incerteza do posicionamento de seu coeficiente através do intervalo de confiança.

O desempenho financeiro especificado pela reunião das variáveis:1. Alavancagem; 2. Diferença de endividamento; 3. Diferença do retorno sobre ativo; 4. Diferença do retorno para o acionista; 5. Giro e tamanho do ativo apresentaram alta significância com a estrutura de capital das firmas, confirmando a importância dos fatores internos às organizações na escolha do endividamento (KAYO; KIMURA, 2011; MARTINS; TERRA, 2014). No entanto, a capacidade de pagamento obteve pouca significância e sua influência no endividamento tendeu a zero. 

A alta associação da primeira diferença do endividamento (DEND) com a estrutura de capital indica que as organizações estão analisando majoritariamente a sua composição do ano anterior para tomar decisões futuras, o que revela uma posição conservadora de seus executivos, como também foi destacado por Al–Amri, Al-Busaidi, e Akguc (2015).

Apesar da majoritaria influência da diferença do endividamento, há evidências que os gestores também tomam decisões relacionadas à estrutura de capital dependendo da situação que a empresa se encontra.

De maneira geral, as evidências do presente estudo sugerem que não há uma única orientação teórica capaz de explicar plenamente os resultados. É admissível que firmas em crescimento (DROE) e com expansão da receita (GA) busquem uma maior contração de dívidas para viabilizar seu desenvolvimento, da mesma forma que organizações que possuem modelos de negócios que viabilizam o uso da alavancagem (ALAV) busquem o nível ótimo de endividamento fundamentando-se na Trade-Off Theory.

Sob outra perspectiva, empresas com maior geração de caixa (MO) são capazes de usar esse recurso para financiar suas atividades e ampliar sua independência em relação às dívidas (RODRIGUES et al., 2017). Organizações maduras em seus setores que não buscam necessariamente crescimento acelerado (DROA) e firmas que possuem rentabilidade abaixo dos juros ofertados pelo mercado (DROA) também são direcionadas para fontes internas de financiamento, sustentando a Pecking Order (MYERS, 1984).

A assimetria de informações também foi identificada, pois organizações com alta geração de caixa (MO) podem encaminhar esses recursos para o autofinanciamento e não para distribuição de dividendos, a fim de demonstrar confiança nos investimentos que foram realizados pela empresa (MYERS, 1984).

A contribuição desta pesquisa está relacionada a definição das variáveis que explicam a estrutura de capital, e, consequentemente, refletem nas decisões dos gestores quanto ao endividamento. Para os gestores, é importante observar endividamento de anos anteriores, o crescimento da empresa, crescimento da receita, a situação do negócio perante a alavancagem, geração de caixa, maturidade da organização e a rentabilidade em relação ao juros do mercado. 

As limitações do estudo se baseiam na falta de normalidade dos resíduos e das variáveis individuais, fato que pode ser compreendido frente a heterogeneidade da amostra, em função das diferentes características e tamanhos das empresas estudadas. Também houve a significância da constante do modelo de regressão com dados em painel, o que sugere que outras variáveis, que não foram abordadas neste estudo, explicam a variável dependente endividamento. Além disso, existe a limitação temporal que o estudo possui e a correlação moderada da variável diferença do endividamento com o endividamento.

Recomenda-se que estudos futuros verifiquem se aspectos comportamentais dos executivos das empresas influenciam a tomada de decisão perante o finaciamento, verificando se o perfil, idade, gênero, nacionalidade, formação, experiência, tamanho do conselho e remuneração dos gestores afetam as decisões de estrutura de capital. Outra possibilidade seria pesquisar sobre outros fatores externos às empresas, identificando novas variáveis indicativas do setor, da economia e do país que possam sinalizar mudanças na estrutura de capital das empresas. Por fim, discutir os resultados desse estudo moderando empresas de capital aberto e capital fechado, bem como, empresas de pequeno e grande porte poderá trazer contribuições distintas ao tema.

 

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[1] A premissa central do Método Mínimos Quadrados Ponderados reside em proporcionar estimadores (coeficientes) que minimizam a soma ponderado dos quadrados dos resíduos, tornando-os mais consistentes. Isso ocorre ao ponderar em menor grau as variáveis com maior variância, o que não ocorre no Método de Mínimos Quadrados Ordinários em que os pesos são idênticos para todas as variáveis em todo o tempo (GUJARATI, 2006).