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A EDUCAÇÃO INFANTIL NA EDUCACAO DO CAMPO: UM OLHAR A PARTIR DAS PUBLICAÇÕES DA ANPED DOS ANOS DE 2012 A 2016

EARLY CHILDHOOD EDUCATION IN RURAL LOCATIONS: A LOOK AT THE PUBLICATIONS OF ANPED FROM 2012 UNTIL 2016

Agda Monteiro de Souza
Universidade do Estado do Amazonas, Brasil
Lucinete Gadelha da Costa
Universidade do Estado do Amazonas, Brasil

REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

ISSN-e: 2318-6674

Periodicidade: Frecuencia continua

vol. 5, núm. 2, 2017

revistareamec@gmail.com

Recepção: 31 Julho 2017

Aprovação: 14 Novembro 2017



DOI: https://doi.org/10.26571/2318-6674.a2017.v5.n2.p201-214.i5419

Os direitos autorais são mantidos pelos autores, os quais concedem à Revista REAMEC –Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática -os direitos exclusivos de primeira publicação. Os autores não serão remunerados pela publicação de trabalhos neste periódico. Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada neste periódico (ex.: publicar em repositório institucional, em site pessoal, publicar uma tradução, ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial neste periódico. Os editores da Revista têm o direito de proceder a ajustes textuais e de adequação às normas da publicação.

Resumo: Este artigo tem como objetivo refletir sobre o desenvolvimento curricular da educação infantil no contexto rural. Para atingir tal propósito, no procedimento da construção do texto, buscou-se realizar um levantamento de pesquisas sobre esta temática nos trabalhos apresentados e publicados em anais da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), entre os anos de 2012 a 2016. Nestes, foram encontrados quatro estudos voltados à educação infantil na perspectiva da educação do campo, cujo teor apresenta o referencial da educação do campo, o paradigma educacional originado dos movimentos sociais populares do campo na luta por direitos e, em especial, ao interesse deste presente estudo: o direito à educação contextualizada. Com os resultados deste levantamento, foi possível conhecer as experiências de aprendizagens voltadas à prática pedagógica envolvendo crianças, bem como a utilização do ato de brincar, com ênfase à valorização dos elementos locais contextualizados neste processo educacional, empregando como referência o que está disposto no campo: água, árvores, gravetos, folhas, frutos, sementes e outros elementos, sem no entanto reduzir o enfoque somente à natureza, mas refletir acerca da relação do homem do campo no contexto social em que é inserido como sujeito, construindo e reconstruindo suas relações.

Palavras-chave: Educação Infantil, Educação do Campo, Pesquisa.

Abstract: This article aims to reflect on the curricular development of early childhood education in the rural context. In order to achieve this objective, in the text construction procedure, we sought to carry out a survey of research on this theme of the papers presented and published in the annals of the National Association of Pos-graduate Studies and Research in Education (ANPEd) between the years of 2012 to 2016, In this study, we found four studies focused on early childhood education in the perspective of rural education. Such studies bring the reference of education in rural locations, educational paradigm originated from rural social movements that claims for rights and, in this case, the right to a contextualized education. The results of this survey brings the learning experiences focused on pedagogical practices with children in which play is emphasized, highlighting the value of the local elements of each context and, here we point out, the contextualization in this educational process having as references water, trees, sticks , leaves, fruits, seeds and other elements, without focusing only in the nature, but in the search for the understanding of the relationship of the rural man in the social context in which “he” as a subject builds and rebuilds relationships.

Keywords: Childhood Education, Field Education, Research.

1. INTRODUÇÃO

Este artigo é parte integrante de uma pesquisa de dissertação de mestrado, em andamento, cujo teor reflete sobre o desenvolvimento curricular da educação infantil no contexto rural. Para tanto, foi realizado um levantamento das pesquisas sobre esta temática nos trabalhos apresentados e publicados nos anais da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – ANPEd, entre os anos de 2012 a 2016, assim, foram encontrados quatro trabalhos voltados à educação infantil na perspectiva da educação do campo.

A metodologia empregada na construção do texto foi embasada no estado da arte. Segundo Ferreira (2002), trata-se de um inventário descritivo, com propósito de criar um quadro panorâmico das pesquisas realizadas em torno de temas específicos. Assim, ao se realizar o levantamento nos anais da ANPEd, buscou-se pelas contribuições dessas pesquisas para servir de fundamento à investigação ora em andamento. Com a ajuda deste referencial, foi possível mapear os trabalhos científicos da educação infantil nos contextos campesinos, lançando mão das seguintes questões norteadoras: Quais os referenciais teóricos que fundamentam as pesquisas? Quais as metodologias utilizadas? Quais os resultados?

2. REFERENCIAIS TEÓRICOS

A educação infantil no contexto do campo teve seu início a partir da concepção urbana, assim como os demais níveis da educação básica, não havia diferenciação entre urbano e rural. No entanto, estes dois contextos são entendidos como contínuos e interdependentes (ARROYO, CALDART e MOLINA, 2011).

O reconhecimento plural das crianças brasileiras, no que se refere à identidade cultural, regional, socioeconômica, étnico-racial, linguística e religiosa, é garantida como direitos das crianças. (BRASIL, 2009). Quando se desenvolve trabalho com crianças dos contextos campesinos, precisa-se ter clareza quanto às questões educativas de cunho geral, comuns a todas as crianças do país e, as de cunhos específicos, voltadas aos contextos locais (SILVA, PASUCH e SILVA, 2012).

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil - DCNEI explicitam que, nas proposta pedagógicas em contextos do campo, é necessário: reconhecer os modos próprios de vida no campo como fundamentais para a constituição da identidade das crianças moradoras em territórios rurais; ter vinculação inerente à realidade dessas populações, suas culturas, tradições e identidades, assim como práticas ambientalmente sustentáveis; flexibilizar, se necessário, calendário, rotinas e atividades, respeitando as diferenças quanto à atividade econômica dessas populações; valorizar e evidenciar os saberes e o papel dessas populações na produção de conhecimentos sobre o mundo e sobre o ambiente natural (BRASIL, 2009, p. 21).

Na educação infantil das crianças campesinas, é necessário, portanto, aproveitar a riqueza do ambiente natural, o qual, por sua vez, quando incorporado às práticas educativas, proporcionam aprendizagens significativas, por ser um ambiente que faz parte da identidade e da realidade daquelas crianças (SILVAM PASUCH e SILVA, 2012).

Importante destacar que a Resolução no 2/2008, do Conselho Nacional de Educação, que estabelece diretrizes, normas e princípios para a educação básica do campo, em seu artigo I, define as populações do campo como sendo os agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados e acampados da reforma agrária, quilombolas, indígenas e outros. A referida Resolução dispõe que as populações campesinas têm características econômicas, sociais e culturais que lhes são próprias, e assim entende-se que não cabe um currículo idêntico ou adaptado das áreas urbanas às rurais.

Assinalam Silva, Pasuch e Silva (2012) que para ampliar as potencialidades das crianças e de seu desenvolvimento, é necessária a apropriação da sua cultura e de práticas educativas que valorizem a comunidade, citam projetos educativos voltados à comunidade, à culinária, às festas, aos artesanatos, às atividades plásticas da cultura, literaturas, incluindo os voltados às brincadeiras que fazem parte do cotidiano das crianças.

Segundo as autoras, há muitas possibilidades para desenvolver as atividades pedagógicas e que, a partir das interações e brincadeiras, os pequenos vão se desenvolvendo em seus aspectos, sociais, afetivos, cognitivos, psicomotores e físicos, afirmam ainda que:

[...]. O modo como organizamos os cantos, as salas, os banhos de sol, [...], o olhar para o ciclo das plantas e para a afloração, [...] a escuta dos bebês e das crianças pequenas para a escolha dos projetos de aprendizagens, [...] são exemplos de situações e práticas que possibilitam vivências que se somam às diferentes formas com as quais as crianças sentem, conhecem e narram o mundo e a si mesmas [...]

Neste entendimento, a educação infantil, seja no campo ou na cidade, precisa ultrapassar o modelo tradicional de ensino pautado apenas nos cuidados às crianças enquanto os pais labutam. Faz-se necessário construir um processo de formação integral da criança na relação do cuidar e educar dentro de uma cultura que lhe é peculiar.

Sendo assim, para o alcance do que fora proposto neste estudo, tornou-se imprescindível conhecer o conteúdo de pesquisas já realizadas, cujas referências tratem da realidade do contexto educacional do campo, com o objetivo também de contribuir na construção de currículos, os quais valorizem a história cultural e educativa das crianças que vivem nos diversos contextos rurais brasileiros.

3. MATERIAIS E MÉTODOS

Esta pesquisa de abordagem qualitativa e natureza bibliográfica tem como objetivo mapear os conhecimentos acumulados sobre o desenvolvimento curricular na educação infantil do campo, disponibilizados na plataforma eletrônica da ANPEd entre os anos de 2012 a 2016, identificando trabalhos realizados, visto que a construção do conhecimento não se dá de maneira isolada, ou seja, faz parte de um trabalho coletivo da comunidade científica, uma vez que todo conhecimento científico ancora-se nas pesquisas anteriormente realizadas, quer para reafirmar ou aprofundar abordagens, quer para lançar novos questionamentos sobre uma realidade parcialmente conhecida (FERREIRA, 2002).

Destaca a autora, ainda, que os inventários construídos pelos trabalhos do estado da arte, também, podem servir para destacar as lacunas ainda existentes, tanto em relação aos temas, que não foram suficientemente abordados, como também acerca das metodologias e novas tendências epistemológicas, por isso essas pesquisas não podem ser compreendidas apenas como uma catalogação de trabalhos em curso ou finalizados.

Assim, visando à reflexão de como o tema educação infantil do campo vem sendo abordado nas pesquisas, fora realizado um inventário dos trabalhos apresentados nos encontros de pesquisas educacionais nacionais e regionais da ANPEd, localizando-os nos seguintes grupos de trabalho - GT: GT - Movimentos Sociais, GT – Educação Popular, GT - Educação do Campo, GT – Currículo e GT - Educação de Crianças de 0 a 6 anos, disponibilizados nos anais da plataforma eletrônica da ANPEd, abrangendo os períodos de 2012 a 2016, cuja escolha se deu por ser esta instituição referência nacional de divulgação de produção do conhecimento na área da educação.

Para fins de entendimento, necessário se faz esclarecer que a partir do ano de 2014 os encontros científicos passaram a ser regionais nos anos pares e nacional nos anos ímpares. Assim, nos anos de 2012 e 2013, anos que ainda não contemplavam a mudança do estatuto da ANPEd, os encontros ocorreram em nível nacional. Em 2014, os encontros se deram em quatro regiões brasileiras, visto que as regiões Norte e Nordeste realizaram seu evento em parceria. No ano de 2015, o evento se deu em nível nacional e, em 2016, os encontros científicos foram realizados nas cinco regiões brasileiras.

Durante o processo de levantamento, foram identificados quatro trabalhos, todos apresentados em forma de comunicações orais e, por meio da leitura dos títulos, resumos e de palavras-chave possibilitou selecionar os que tratavam especificamente da educação infantil do campo, com as seguintes categorias: Educação Infantil do Campo, Desenvolvimento Curricular da Educação Infantil do Campo, Currículo da Educação Infantil do Campo, Práticas Pedagógicas na Educação Infantil do Campo, Proposta Pedagógica e/ou Proposta Curricular da Educação Infantil do Campo. Portanto, este vasto material contribuiu significativamente para o atendimento de várias categorias inerentes à temática ora em estudo.

Os trabalhos selecionados foram analisados e lidos na íntegra, sob o parâmetro das seguintes questões norteadoras: Quais os referenciais teóricos que fundamentam as pesquisas? Quais as metodologias utilizadas? Quais os resultados? Partindo dessas questões norteadoras, dos grupos de trabalhos e das categorias de busca, apresentou-se os trabalhos localizados na plataforma eletrônica da ANPEd, conforme apontado na sequência.

Nos anos de 2012 a 2015, não houve identificação de quaisquer trabalhos inerentes à temática. Quanto ao ano de 2016, foram encontrados trabalhos apresentados em encontros realizados separadamente nas cinco regiões brasileiras, todos oriundos de trabalhos completos, apresentados sob a forma de comunicações orais.

Deste total, três trabalhos são do GT- Educação de Crianças de 0 a 6 anos. Um foi apresentado na região Centro Oeste com o título: “O trabalho docente na educação infantil no contexto da escola rural”, outro na região Norte abordando: “O currículo da educação infantil do campo: a experiência da EMEI Cantinho do Saber na Vila de Aturiaí no município de Augusto Corrêa – PA” e, o terceiro, no Nordeste, cujo tema foi “O brincar das crianças do campo: uma proposta de análise”. O quarto trabalho, localizado no GT Educação do Campo foi apresentado na região Nordeste com a temática: “A infância para o movimento dos trabalhadores rurais sem-terra - MST: lugar de criança é no movimento”.

Tomando como base o estudo realizado, foram destacadas as seguintes questões: Quais os referenciais teóricos que fundamentam as pesquisas? Que metodologias foram utilizadas e quais foram os resultados? E posterior delineamentos.

No primeiro trabalho, intitulado "O trabalho docente na educação infantil no contexto da escola rural", que se encontrava em andamento, tem por objetivo compreender a concepção de trabalho do professor da educação infantil.

Vânia Ramos Rodrigues e Laís Leni Oliveira Lima, (2016), autoras da pesquisa, fundamentam o trabalho nos seguintes aportes teóricos: Arce (2004), Arce e Silva (2009), Arroyo (2007), Arroyo, Caldart e Molina (2004), Caldart, Arroyo e Molina (2011), Barbosa (2013), Coco (2011), Coelho (2011), Dandolini (2009), Gonçalves (2012), LDB Lei 9394/1996 (1996), Leontiev (2014), Marx (1978), Meszáros (2008), Oliveira e Vieira (2010), Ribeiro (2010), Saviani (2009), Silva (2013), Silva (2015) e outros.

A metodologia empregada é a abordagem qualitativa com evidências quantitativas, lançando mão das técnicas exploratórias, questionários e entrevistas semiestruturadas individuais com os sujeitos da pesquisa. A análise dos dados foi embasada na dialética, considerando as circunstâncias temporais e o contexto histórico em que os sujeitos estão inseridos.

Convém explicar que, em razão de a pesquisa encontrar-se naquele momento em andamento, os resultados obtidos mostraram que tanto a formação do professor, quanto suas concepções de mundo, trabalho e educação, revelam e definem o modo de agir em sala de aula, implicando assim, na educação das crianças.

Quanto ao segundo trabalho cuja temática é "O currículo da educação infantil do campo: a experiência da EMEI ‘Cantinho do Saber’ na Vila de Aturiaí no município de Augusto Corrêa – PA", tem por objetivo analisar o currículo vivenciado pelas crianças da referida instituição.

As pesquisadoras Sileide de Nazaré Brito Gonçalves e Fernanda Regina Silva de Aviz (2016) fundamentam o estudo nas seguintes referências: Campos (2008), DCNEI (2009), ECA (1990), LDB Lei 9394/1996 (1996), Diretrizes Complementares, Normas e Princípios para o Desenvolvimento de Políticas Públicas de Atendimento da Educação Básica do Campo (2008), Oliveira (2010), Silva e Pasuch (2010) e outros.

Quanto à metodologia, lançaram mão da abordagem qualitativa. As técnicas para coletar os dados foram a entrevista semiestruturada e a observação in locus. A análise dos dados se deu a partir da visão sócio-histórica da realidade, com análise baseada na interpretação e compreensão da fala e do discurso dos entrevistados.

No que tange aos resultados, percebeu-se que muitos professores concebem a educação infantil como preparação da criança para ingressar no ensino fundamental, com atividades mecânicas voltadas à alfabetização destas. Aliado a isso, verifica-se a carência de recursos didático-pedagógicos, visto que a instituição escolar se mantém exclusivamente com recursos vindos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e, ainda, notou-se que há dificuldades em articular um currículo adequado à realidade sócio-cultural das crianças, visto que a maioria dos docentes não reside na comunidade. Sendo assim, os professores não conhecem a realidade vivenciada pelas crianças para executar um currículo voltado àquele contexto rural.

No trabalho seguinte, analisou-se "O brincar das crianças do campo: uma proposta de análise", cujo objetivo foi o de significados e alguns sentidos do brincar das crianças em uma instituição de educação infantil, em um município baiano.

Carmem Virgínia Moraes da Silva e Liana Gonçalves Pontes Sodré (2016), autoras da pesquisa, fundamentam o trabalho nos seguintes teóricos: Aguiar, Bock e Furtado (2007), Aguiar e Ozella (2015), Bardin (2011), Barros, (2015), Bichara e Carvalho (2003), Bichara, Cotrim e Brandão (2012), Felipe, Silva e Silva (2013), Silva, Felipe, Ramos e Caldart (2015), Silva e Silva (2013), Teixeira (2009), Vygotsky (1966 e 1984) dentre outros.

Os procedimentos metodológicos foram baseados na abordagem qualitativa e os dados foram coletados por meio das técnicas de observação e entrevista com as crianças cujos questionamentos se davam por meio de roda de conversas com os pequenos, e ainda, atividades fotografadas e gravadas com auxílio de gravador de vídeos. A análise dos dados foi baseada, com predominância, na análise de conteúdo.

Como resultados, em síntese, chamou a atenção a ausência de elementos da natureza na referida instituição escolar e, consequentemente, no brincar das crianças participantes do estudo. Não havia água, árvores, gravetos, folhas, sombras, frutos, sementes ou qualquer elemento da flora local que fizesse parte das brincadeiras, dificultando a relação do brincar e os elementos da natureza apresentados nos estudos sobre o brincar das crianças campesinas, tão discutidas em Morais e Otta (2003), Teixeira (2009), Teixeira e Alves (2008), Santos (2010), Bichara (2003), Barros (2012), Felipe (2013) e Silva e Silva (2013)

Assim, as análises demonstraram que no diálogo entre o conhecimento global e os regionais locais, no que se refere à vivência do brincar das crianças, estas brincam com objetos industrializados, iguais aos que se fazem presentes na área urbana, tais como: os jogos, a massa de modelar, a bicicleta, os carros, os bonecos e outros. Como a criança é influenciada e influencia pelo meio social em que vive, [...]e sabendo que é nos primeiros anos de vida que se constrói as bases dos valores e princípios da vida em sociedade, brincar com objetos industrializados podem ser prejudiciais para sua formação identitária, enquanto cidadã de espaços onde os elementos naturais fazem parte de sua natureza, podendo até descaracterizar a reprodução do movimento sem-terra.

Por fim, no trabalho intitulado "A infância para o movimento dos trabalhadores rurais sem-terra - MST: lugar de criança é no movimento", esta pesquisa fora realizada em duas instituições escolares em distintos assentamentos liderados pelo MST.

Neste estudo, a autora Maria do Socorro Xavier Batista (2016) teve como objetivo conhecer e analisar diferentes olhares sobre as dimensões sociais e os diferentes aspectos da vida das crianças do campo, a partir das crianças, dos pais e educadores, com vista a melhor compreender e orientar as ações pedagógicas nas escolas do campo.

Sua fundamentação teórica teve como referência as ideias de Cruz (1995), Luz (2008), MST Boletim de Educação no 7 (1997), MST Caderno de Educação no 7 (1996), MST, Caderno de Educação no 12 (2004), MST Fazendo Escola no 2 (1999), MST Fazendo Escola no 4 (2008), MST Caderno da Infância no 1 (2011), Silva, Pasuch e Silva (2012) e outros.

Os procedimentos metodológicos empregam a pesquisa qualitativa e sua coleta de dados realizou-se por meio da observação participante, entrevistas com os professores e entrevistas com as crianças por meio de oficinas pedagógicas, utilizando como instrumentos de registros o gravador de voz, blocos de anotações, fotos e filmagens.

Os resultados apontam que a presença marcante das crianças nas mobilizações e ações coletivas do MST levou este movimento social de caráter popular a refletir sobre a infância e definir um projeto emancipador de educação, desde a infância, com vistas a garantir a educação e a reprodução do movimento dos trabalhadores sem-terra.

Cita-se, ainda, que a luta do MST por educação tem sido prioridade que o levou a desenvolver experiências educativas, produção de materiais sobre educação do campo e, a contabilizar as conquistas na educação nos acampamentos e assentamentos sob sua direção.

Assim, a discussão deste estudo prossegue, apresentando no próximo tópico os resultados alcançados.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Considerando que o objeto de investigação deste trabalho constitui-se em mapear as pesquisas no viés da educação infantil do campo, dos trabalhos localizados no banco de dados eletrônico da ANPEd, tomando como base as seguintes questões: Quais os referenciais teóricos que fundamentam as pesquisas? Quais as metodologias utilizadas? Quais os resultados? Chegou-se às seguintes reflexões:

No âmbito dos referenciais teóricos que fundamentam as pesquisas, os resultados revelaram que os trabalhos, em sua maioria, baseiam-se nos seguintes aportes teóricos que se repetem nos trabalhos individuais ou no coletivo: Alessandra Arce – Pedagogia da infância ou fetichismo da infância? (2004); Miguel Arroyo – Políticas de formação de educadores (as) do campo (2007); Miguel Arroyo, Roseli Caldart e Mônica Molina – Por uma educação do campo (2004); Roseli Caldart – Por uma educação do campo: traços de uma identidade em construção (2011); Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- Lei 9394/1996 (1996); Zilma de Moraes Ramos de Oliveira – O currículo da educação infantil: o que propõe as novas diretrizes (2010); Ana Paula Soares da Silva e Jaqueline e Pasuch – Orientações curriculares para a educação infantil do campo (2010); Isabel de Oliveira e Silva, Ana Paula Soares da Silva e Aracy Alves Martins – Infâncias do campo (2013); Roseli Salete Caldart – Dicionário da Educação do Campo (2012); Juliana Bezzon da Silva e Ana Paula Soares da Silva – A criança e o ambiente natural: experiências da educação infantil em assentamento rural (2013).

Ressalta-se que o Boletim de Educação no 7 (1997), o Caderno de Educação no 7 (1996), o Caderno de Educação no 12 (2004), o Caderno Fazendo Escola no 2 (1999), o Fazendo Escola no 4 (2008) e, o Caderno da Infância no 1 (2011), não foram repetidos nos quatro trabalhos identificados na plataforma eletrônica da ANPEd, porém eles são bases teóricas fundamentais na maioria dos textos dos autores citados. Então, os elegemos, também, como partes integrantes de nossa pesquisa.

No que diz respeito aos processos metodológicos, a abordagem adotada, na totalidade dos trabalhos mapeados, foi a qualitativa. As técnicas utilizadas foram a revisão bibliográfica, observação participante, pesquisa exploratória, pesquisa documental, questionário e entrevistas semiestruturadas. Quanto aos instrumentos para coletar os dados, lançou-se mão do gravador de voz, gravador de vídeo, máquina fotográfica e diário de campo.

Quanto aos resultados, destaca-se o das pesquisadoras Rodrigues e Lima (2016) que apresentaram que, tanto a formação acadêmica dos docentes quanto suas concepções de mundo, trabalho e educação, expressam o modo de agir em sala de aula, implicando, assim, na educação das crianças.

Gonçalves e Aviz (2016) defendem, a partir de sua pesquisa, que na prática docente os professores concebem a educação infantil como preparação da criança para ingressar no ensino fundamental, com atividades mecânicas voltadas à alfabetização destas e, ainda, que há dificuldades em articular um currículo adequado à realidade sócio-cultural das crianças, em razão de a maioria dos docentes não residirem na área rural onde a escola está inserida, desconhecendo, então, a realidade vivenciada pelos pequenos.

Para Silva e Sodré (2016), nos resultados dos seus estudos, foi possível identificar a ausência de elementos da natureza na instituição escolar, especificamente, no brincar das crianças.

Citam as pesquisadoras que não havia água, árvores, gravetos, folhas, sombras, frutos, sementes ou quaisquer elementos da flora local que fizessem parte das brincadeiras dos pequenos, descaracterizando a relação do brincar e os elementos da natureza tão discutida nos estudos sobre o brincar das crianças do campo nas pesquisas recentes e, citam, dentre vários autores que abordam a temática, os de Felipe (2013), Silva e Silva (2013) e Silva, Pasuch e Silva (2012). Ressaltam Silva e Sodré que os brinquedos industrializados, tais como os jogos pedagógicos, a massa de modelar, a bicicleta, os carros, os bonecos dentre outros, permeiam o brincar das crianças campesinas da instituição pesquisada.

Batista (2016), cujos estudos foram realizados em escolas que são acompanhadas pelo MST, desenvolvem práticas de caráter emancipador. Na proposta curricular e em seu desenvolvimento no trabalho com as crianças, realiza-se uma educação que, desde a infância, contribui com a construção de sua identidade individual e coletiva e, também, de militância, para garantir a reprodução e a manutenção dos movimentos sociais do campo.

5. CONSIDERAÇÕES

A educação infantil do campo vem ganhando visibilidade nos estudos sociais e educacionais brasileiro, apesar de sua inclusão ter ocorrido nas DCNEI somente a partir do ano de 2009, têm despertado o olhar de pesquisadores para este nível de educação.

Os problemas oriundos da falta de formação de professores para atuar no contexto do campo, de propostas pedagógico-curriculares específicas para esses povos e, das questões envolvendo os movimentos sociais do campo, faz-nos refletir sobre os avanços e retrocessos educacionais destinados aos povos que habitam e trabalham nos diversos campos brasileiros.

Nas reflexões sobre os aportes teóricos desta pesquisa, identificou-se pesquisadores engajados na causa da educação do campo, os quais citamos Ana Paula Soares da Silva, Jaqueline Pasuch, Juliana Bezzon da Silva, Miguel Gonzalez Arroyo, Mônica Castagna Molina, Edgar Jorge Kolling, Roseli Salete Caldart, dentre muitos, cujas obras clarificam os conhecimentos epistemológicos sobre a educação campesina, trazendo as diversas vozes das áreas rurais às discussões sociais.

Quanto ao caminho metodológico dos trabalhosescolhidos para análise, verifica-se que todos explicitam, claramente, os procedimentos investigativos da pesquisa, os quais, em nosso entendimento, validam cientificamente os trabalhos realizados.

No que diz respeito aos resultados, os estudos apontam para a necessidade de mudanças nas propostas pedagógico-curriculares para as escolas dos povos dos contextos campesinos, para atender a suas reais necessidades e anseios, conforme previsto, inclusive, nas DCNEI, as quais orientam que nas propostas pedagógicas se deve reconhecer os modos próprios de vida como fundamentais para a constituição da identidade das crianças, estar vinculada à realidade desses povos no que diz respeito às suas culturas, tradições e identidades, inclusive valorizar os saberes dessas populações.

As experiências de aprendizagens propostas nos trabalhos mapeados ratificam o que já vem sendo investigado no estudo em andamento que inclui a formação específica de professores para atuar nestas áreas, bem como a necessidade de que os docentes residam na comunidade onde a instituição escolar está localizada para que estes reconheçam os modos de vida do campesinato e possam trabalhar contextualizando e valorizando seus saberes e, ainda, que na prática pedagógica e no brincar das crianças sejam inseridos os elementos da natureza, tais como: água, árvores, gravetos, folhas, frutos, sementes ou quaisquer elementos, sem no entanto reduzir somente ao enfoque a natureza, mas sim buscar-se entender a relação do homem do campo no contexto social em que é inserido como sujeito, construindo e reconstruindo suas relações.

Do estudo ora apresentado, depreende que a análise e reflexão dos trabalhos inventariados contribuiu, significativamente, para o conhecimento dos aportes teóricos, metodológicos e na observação dos resultados, os quais servirão como fundamento para dar-se continuidade à dissertação do mestrado em andamento, dentre estes destacam-se os Cadernos de Educação, os Cadernos Fazendo Escola e o Caderno da Infância no 1, cujo conteúdo também somará significativamente para a consecução e finalização da pesquisa.

REFERÊNCIAS

ARROYO, Miguel G.; CALDART, Roseli Salete; MOLINA, Mônica Castagna. (Orgs). Por uma educação do campo. 5. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

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FERREIRA, Norma Sandra de Almeida. As pesquisas denominadas estado da arte. Educação & Sociedade, ano XXIII, no 79, p. 257-272, Ago, 2002.

GONÇALVES, S. de N. B.; AVIZ, F. R. S. O currículo da educação infantil do campo: a experiência da EMEI Cantinho do Saber na Vila de Aturiaí no município de Augusto Corrêa-PA. In: Anais da 1ª reunião científica ANPED norte: políticas públicas e formação humana: desafios para a educação Panamazônica. Belém, PA. 2016, pg. 1358-1373.

RODRIGUES, V. R.; LIMA, L. L. O. O trabalho docente na educação infantil no contexto da escola rural. In: Anais do XIII encontro de pesquisa em educação da região centro-oeste: projeto nacional de educação: desafios éticos, políticos e culturais. Brasília: Universidade de Brasília, 2016.

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