Nativa, Sinop, v. 9, n. 5, p. 588-593, 2021.
Pesquisas Agrárias e Ambientais
DOI: https://doi.org/10.31413/nativa.v9i5.13152 ISSN: 2318-7670
Efeito das atividades antrópicas na cobertura vegetal na
Reserva Florestal de Mecubúri, Moçambique
Aguinaldo Joaquim MÁRIO1, Sailon Augusto Roia MESA2-IM,
Caetano Miguel Lemos SERROTE3*
1AJ Consultoria Florestal, Mocuba, Moçambique.
2Instituto de Investigação Agrária de Moçambique, Nampula, Moçambique. (In Memorian)
3Universidade Lúrio, Faculdade de Ciências Agrárias, Unango, Moçambique
*E-mail: serrotec@yahoo.com.br
(ORCID: 0000-0001-6613-4050; (In Memorian); 0000-0002-0275-2201)
Recebido em 14/11/2021; Aceito em 17/12/2021; Publicado em 28/12/2021.
RESUMO: O estudo foi realizado na Reserva Florestal de Mecubúri, em Moçambiquee, visando avaliar os
efeitos das atividades antrópicas sobre a cobertura florestal. Áreas de queimada, agrícola e de exploração
florestal foram comparadas com uma área controle em termos de composição e fitossociologia. Em cada área,
foram estabelecidas, de maneira sistemática, parcelas quadrangulares de 20 x 20 m, distantes 20 m uma da outra,
sendo realizado o levantamento da vegetação adulta e da regeneração. Foram determinados índices de
similaridade, diversidade e riqueza. Os resultados indicaram existir dissimilaridade entre as áreas, sendo que as
espécies Julbernardia globiflora, Diplorhynchus condylocarpon, Brachystegia utilis, Millettia stuhlmannii, Afzelia quanzensis,
Burkea africana e Cussonia arborea destacaram-se em termos de abundância, frequência, dominância, Índice de
Valor de Importância (IVI) e regeneração. O maior número de árvores por hectare foi encontrado na área de
controle e o menor número foi encontrado na área agrícola. Com base no índice de dispersão de Morisita, a
maior parte das espécies distribui-se de forma aleatória e agrupada. A distribuição diamétrica das árvores seguiu
o padrão de J-invertido, característico de florestas naturais. As práticas de queimadas, agricultura e exploração
florestal contribuem na redução da cobertura florestal na Reserva Florestal de Mecubúri.
Palavras-chave: fitossociologia; conservação; desmatamento.
The effect of anthropic activities on forest coverage
in the Mecubúri Forest Reserve, Mozambique
ABSTRACT: The study was carried out in the Mecubúri Forest Reserve, Mozambique, with the purpose of
evaluating the effects of human activities on the forest cover. Burning, agricultural and logging areas were
compared with a control area in terms of composition and phytosociology. In each area were systematically
established 20 x 20 m quadrangular plots, 20 m apart from each other, in which were carried out the survey of
adult vegetation and regeneration. The similarity, diversity and richness indices were determined. The results
showed that there is dissimilarity between the areas and the species Julbernardia globiflora, Diplorhynchus
condylocarpon, Brachystegia utilis, Millettia stuhlmannii, Afzelia quanzensis, Burkea africana e Cussonia arborea stood out
in terms of abundance, frequency, dominance, Importance Value Index (IVI) and regeneration. The largest
number of trees per hectare was found in the control area, and the smallest number was found in the agricultural
area. Based on the Morisita dispersion index, most species have random and clustered distribution. The
diametric structure of the trees followed the inverted-j, typical of natural forests. Burning, agriculture and
logging contribute to the reduction of forest cover in the Mecubúri Forest Reserve.
Keywords: phytosociology; conservation; deforestation.
1. INTRODUÇÃO
Moçambique localiza-se na Costa Oriental da África
Austral e possui uma área de aproximadamente 78.475.500
ha. É um dos poucos países que ainda mantem uma área
considerável de florestas nativas e com grande diversidade de
espécies, distribuídas em cerca de 40,6 milhões de hectares,
que perfazem cerca de 51% do território nacional
(MARZOLI, 2007). As florestas produtivas cobrem cerca de
26,7 milhões de hectares, sendo que treze milhões de hectares
não são favoráveis para a produção madeireira e a maior parte
localiza-se dentro de áreas de conservação (Parques
Nacionais, Reservas Florestais e outras). As áreas de
conservação albergam uma diversidade de recursos que
fornecem bens e serviços, dos quais as populações
dependem, como recursos alimentares, medicinais,
econômicos e ambientais. Apesar disso, nessas áreas têm-se
praticado diversas atividades como a agricultura itinerante e
caça, caracterizadas pelo uso do fogo, na maioria das vezes
não controlado e que resulta na degradação ambiental
(NUBE et al., 2016).
Souza et al. (2001) sustentam que as atividades antrópicas
têm comprometido a sustentabilidade dos ecossistemas
florestais, por causar impactos negativos que contribuem de
forma significativa para a perda de espécies florestais e
faunísticas, destruição de habitats, fragmentos de paisagem,
Mário et al.
Nativa, Sinop, v. 9, n. 5, p. 588-593, 2021.
589
exposições do solo a intempéries, poluição da água, dentre
outros.
Mecubúri é um dos poucos distritos da Província de
Nampula, no norte de Moçambique, que possui uma das
maiores Reservas Florestais do país, que abriga considerável
número de espécies florestais e faunísticas, e no seu interior
encontram-se assentamentos humanos.
O presente trabalho teve como propósito avaliar os
efeitos das atividades antrópicas sobre a cobertura florestal
da Reserva de Mecubúri, com base na análise da composição
e distribuição espacial de espécies florestais.
2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. Área de estudo
A Reserva Florestal de Mecubúri (RFM) é considerada a
maior Reserva Florestal do país, cobrindo uma área total de
230.000ha correspondente a um triângulo entre as localidades
de Mecubúri – sede, Muite e Imala (MANANZE et al., 2016).
Foi criada pela Portaria número 8459 - Boletim Oficial nº 29,
I Série, de 22 de julho de 1950, com o principal objetivo de
impedir o avanço da agricultura e conservar o ecossistema,
garantindo assim a protecção da bacia hidrográfica do Rio
Mecubúri (SITOE; MAÚSSE-SITOE, 2009).
Figura 1. Localização da área de estudo.
Figure 1. Location of the study area.
Nas encostas superiores existem solos vermelhos e ou
alaranjados. O clima é predominantemente quente, oceânico,
seco (na zona norte da região) a chuvoso (no restante). A
precipitação média anual varia entre 500 a 1200mm podendo
exceder por vezes para 1500mm tornando-se um clima
subúmido chuvoso. A temperatura média anual é de 25º C,
sendo janeiro e fevereiro os meses mais quentes (com 26,6
ºC e 25,8ºC, respectivamente) e julho o mês mais frio e seco
(com 21,2ºC). A reserva é atravessada por vários rios,
permanentes e sazonais, sendo o rio Mecubúri o mais
importante (MANANZE et al., 2016).
A RFM apresenta grande diversidade de espécies
faunísticas, destacando-se Elefante-africano (Loxodonta
africana), Kudu (Tragelaphus strepsiceros), Imbabala (Tragelaphus
scriptus), Piva (Kobusellipsi prymus), Chango (Redunca arundinum),
Cabrito - cinzento (Sylvicar pagrimmia), Leopardo (Panthera
pardus), Facochero (Phacochoerus aethipicus) e o Leão (Panthera
leo), para além de inúmeras espécies de insetos, répteis,
pássaros e pequenos roedores (MANANZE et al., 2016).
O Miombo é o principal tipo de vegetação da Reserva
Florestal de Mecubúri, sendo caracterizado pela dominância
de uma ou mais espécies do género Brachystegia e
Julbernardia, e da espécie Isoberlina angolensis (Fabaceae,
Subfamília Caesalpinioideae) na região. Ao longo do rio
Mecubúri encontram-se florestas de galeria, com dominância
de espécies como Spirostachys africana, Schinziophyton rautaneniie,
Milletia stuhlmanni e ainda pequenas árvores como Friesodielsia
obovatae e várias espécies do género Strychnus.
O distrito de Mecubúri apresenta uma população
estimada em 142.687 habitantes, com uma densidade
populacional de 19,7 hab/km2. Estima-se que vivam na área
da Reserva Florestal de Mecubúri cerca de 40 mil pessoas
integradas em 12 mil agregados familiares e distribuídos por
15 regulados. A maior parte dessa população (81%) é
Efeito das atividades antrópicas na cobertura vegetal na Reserva Florestal de Mecubúri, Moçambique
Nativa, Sinop, v. 9, n. 5, p. 588-593, 2021.
590
analfabeta, sobretudo as mulheres, sendo a agricultura
familiar a base de subsistência das famílias (MAE, 2005).
2.2. Coleta e processamento de dados
Para a identificação das atividades desenvolvidas na RFM
recorreu-se à entrevistas semiestruturadas e a observação
direta. A seleção dos indivíduos para a entrevista foi feita
mediante a amostragem não probabilística (amostragem bola
de neve).
Para comparar a composição florística e fitossociologia
foram selecionadas três áreas em função da atividade
praticada, nomeadamente, áreas de queimadas, de prática
agrícola ou de exploração florestal e uma área de controle
(sem intervenção humana). Foram estabelecidas parcelas
amostrais sistemáticas de 20 x 20 m, distantes 20m uma da
outra, totalizando 13 parcelas/ha. Nessas parcelas foram
realizados o levantamento das espécies, análise da
composição e determinados os parâmetros fitossociológicos
(abundância, frequência, dominância e índice de valor de
importância) de todos os indivíduos com DAP superior a
0,10 m. No interior de cada parcela foram estabelecidas
quatro subparcelas de 5,0 x 5,0 m para levantamento dos
dados da regeneração (indivíduos com DAP inferior a 0,10
m), divididos de acordo com as categorias de tamanho
propostas por Hosokawa et al. (2008): categoria de tamanho
1 (CT1), composta por indivíduos com altura inferior a 1 m;
categoria de tamanho 2 (CT2), composta por indivíduos de
1,1 3,0 m de altura; e categoria de tamanho 3 (CT3),
composta por indivíduos com altura superior a 3,0 m.
Também foi calculado o índice de Morisita para identificar o
padrão de distribuição das espécies florestais e o índice de
similaridade de Jaccard. Os dados foram processados no
programa R versão 3.2.1.
3. RESULTADOS
3.1. Atividades realizadas na Reserva Florestal de
Mecubúri
Dos 67 entrevistados, 34% apontaram a agricultura como
sendo a principal atividade desenvolvida na RFM, seguida da
exploração ilegal de madeira (28%), queimadas
descontroladas (19%), construção de habitações (14%) e
produção de carvão (5%) (Figura 2).
Figura 2. Principais atividades desenvolvidas na RFM.
Figure 2. Main activities developed at RFM.
3.2. Composição específica
O levantamento realizado resultou num total de 973
indivíduos e uma riqueza de 43 espécies distribuídas em 23
famílias botânicas. Com 33 espécies, a área agrícola teve a
maior riqueza, seguida da área de queimada (27 espécies). As
áreas de exploração florestal e de controle tiveram apenas 22
e 21 espécies respectivamente (Tabela 1).
A família Fabaceae foi destaque nas quatro áreas, com
41% na área de queimada, 60% na área agrícola, 72,52% na
área de exploração florestal e 77,5% na área de controle.
As espécies Afzelia quanzensis, Brachystegia utilis, Burkea
africana, Cussonia arborea, Julbernardia globiflora, Pericopsis
angolenses, Sterculia quinquiloba e Strychnos spinosa foram as
únicas observadas em todas as áreas de estudo, fato que pode
ser justificado pelo fato de não sofrerem grande pressão por
parte das comunidades locais.
3.3. Distribuição diamétrica da vegetação florestal
A distribuição diamétrica nas quatro áreas avaliadas
seguiu o padrão J-invertido, característico de florestas
naturais, em que a maior quantidade de indivíduos está nas
classes diamétricas menores, diminuindo com o aumento das
classes (Figura 3).
Tabela 1. Composição específica das áreas estudadas da RFM.
Table 1. Specific composition of the studied areas at RFM.
Espécies
Área
1
Área
2
Área
3
Área
4
Acacia nilotica
X
X
Acacia sp.
X
X
X
X
Afzelia quanzensis
X
X
X
X
Albizia adianthifolia
X
Albizia versicolor
X
Annona senegalensis
X
X
X
Bauhinia petersiana
X
X
X
Brackernridgere zamguebarica
X
Brachystegia allonii
X
X
X
Brachystegia
sp.
X
X
Brachystegia utilis
X
X
X
X
Burkea africana
X
X
X
X
Cleistanthus holtzii
X
Combretum elaegnoides
X
X
Combretum imberbe
X
X
X
Combretum psidiodes
X
Cordyla africana
X
X
Cussonia arborea
X
X
X
X
Dalbergia boehmii,
X
X
Dalbergia melanoxylon
X
X
X
Dambollia xanthocarpa
X
Diplorhynchus condylocarpon
X
X
X
Flacourtia indica
X
Ficus natalensis
X
X
X
Julbernardia globiflora
X
X
X
X
Lannea schimperi
X
X
Millettia stuhlmannii
X
X
X
Pericorpsis angolenses
X
X
X
X
Piliostigma thonningii
X
X
Pseudolachnostylis maprouneifolia
X
X
Pterocarpus angolensis
X
X
X
Sclerocarya birrea
X
X
Steculia quinquiloba
X
X
X
X
Strychnos madagascariensis
X
X
Strychnos spinosa
X
X
X
Swartzia madagascariensis
X
X
X
Syzygium cordatum
X
Syzygium guinensis
X
X
Tamarindus indica
X
X
X
Trichilia emética
X
Vitex doniana
X
X
Vitex
sp.
X
X
Total
27
33
22
21
Área 1: área de queimada; Área 2: área agrícola; Área 3: área de exploração
florestal; Área 4: área de controle.
Agricultura
34%
Queimada
19%
Exploração
florestal
28%
Construção de
habitação
14%
Produção de carvão
5%
Mário et al.
Nativa, Sinop, v. 9, n. 5, p. 588-593, 2021.
591
3.4. Estrutura Horizontal
Na área de queimada, a espécie Julbernardia globiflora
obteve o maior peso ecológico, com o maior índice de valor
de importância (IVI = 45,77), resultado de uma abundância
(Abrel) de 11,9%, frequência (Frel) de 9,8% e dominância
(Dorel) de 24,07%. Seguem a Brachystegia utilis (Abrel =
13,99%; Frel = 9,02%; Dorel = 11,02%; IVI= 36,03), a
Diplorhynchus condylocarpon (Abrel = 14,8%; Frel = 9,02%;
Dorel = 10,51%; IVI = 34,33) e a Burkea africana (Abrel =
9,88%; Frel = 5,94%; Dorel = 11,48%; IVI = 27,3).
Na área agrícola, Brachystegia utilis obteve o maior peso
ecológico (Abrel = 18,02%; Frel = 7,38%; Dorel = 13,75%;
IVI = 39,15) seguida de Piliostigma thonningii (Abrel = 8,15%;
Frel = 8,05%; Dorel = 6,70%; IVI = 22,9), Trichilia emetica
(Abrel = 7,72%; Frel = 6,71%; Dorel = 6,94%; IVI = 21,37)
e Scleoracarya birrea (Abrel = 2,14%; Frel = 2,68%; Dorel =
12,12%; IVI = 16,94). Os valores obtidos indicam que a
espécie é importante em termos de área basal. O número de
árvores por hectare nessa área foi de 233.
Por seu turno, Millettia stuhlmannii obteve o maior peso
ecológico na área de exploração florestal, com Abrel =
21,31%, Frel = 12,24%, Dorel = 24,06%, IVI = 57,61),
seguida de Cussonia arborea (Abrel = 11,48%; Frel = 11,22%;
Dorel = 17,68%; IVI = 40,38), Brachystegia utilis (Abrel =
16,39%; Frel = 11,22%; Dorel = 8,25%; 35; IVI = 35,86),
Afzelia quanzensis (Abrel = 11,07%; Frel = 12,24%; Dorel =
10,03%; IVI = 33,34).
na área de controle, a espécie Brachystegia utilis teve o
maior peso ecológico (Abrel = 21,34%; Frel = 11,50%; Dorel
= 9,51%; IVI = 42,35), seguida de Afzelia quanzensis (Abrel =
11,85%; Frel = 8,85%; Dorel = 11,37%; IVI = 32,07),
Pericopsis angolenses (Abrel = 12,25%; Frel = 11,5%; Dorel =
7,23%; IVI = 30,98), Cussonia arborea (Abrel = 7,11%; Frel =
7,96%; Dorel = 8,16%); IVI = 23,23).
O número de árvores por hectare variou de 233 (área
agrícola) a 253 (área de controle).
3.5. Regeneração natural
Foram observados 294 indivíduos, sendo 74 pertencentes
à categoria de tamanho 2, que inclui indivíduos com altura
entre 1,1 e 3 m, e 220 da categoria de tamanho 3, que inclui
indivíduos com altura superior a 3 m (Tabela 2). Não houve
de indivíduos pertencentes à categoria de tamanho 1 (altura
inferior a 1 m).
Tabela 2. Regeneração natural da Reserva Florestal de Mecubúri,
Moçambique.
Table 2. Natural regeneration of the Mecubúri Forest Reserve,
Mozambique.
Categoria de tamanho
CT2
CT3
Total
Área agrícola
39
80
119
Área de queimada
29
66
95
Área de exploração florestal
2
23
25
Área de controle
4
51
55
Total
74
220
294
3.6. Padrão de distribuição das espécies vegetais
Os valores do Índice de Morisita indicam que as espécies
estão distribuídas de forma aleatória e em agrupamento. As
espécies com baixa abundância (menos de 2 indivíduo por
hectare) apresentaram índice de Morisita próximo a 1, o que
indica uma distribuição espacial aleatória. Para as espécies
vegetais de grande porte esse padrão aleatório, com baixa
densidade de indivíduos, pode aproximar-se da sua
distribuição natural na floresta, por serem espécies de maior
longevidade.
Figura 2. Distribuição dos indivíduos em classes diamétricas na
RFM.
Figure 2. Distribution of individuals in diametric classes at RFM.
3.7. Similaridade entre as áreas
Com base no índice de Jaccard, a similaridade entre as
áreas estudadas foi baixa, pois, os valores foram inferiores a
0,5 (JÚNIOR et al., 2008) (Tabela 3).
193
43 322
Classe 10-
20
Classe 20-
30
Classe 30-
40
Classe 40-
50
classe > 50
Área de queimada
Classes diamétricas (cm)
Nùmero de Individuos
215
13 221
Classe
10-20
Classe
20-30
Classe
30-40
Classe
40-50
classe >
50
Área agrícola
Classes diamétricas (cm)
Nùmero de Individuos
160
56
23 41
Classe 10-
20
Classe 20-
30
Classe 30-
40
Classe 40-
50
classe > 50
Área de exploração florestal
Nùmero de Individuos
Classes diamétricas (cm)
182
60
821
Classe 10-
20
Classe 20-
30
Classe 30-
40
Classe 40-
50
classe > 50
Área de controle
Classes diamétricas (cm)
Nùmero de Individuos
Efeito das atividades antrópicas na cobertura vegetal na Reserva Florestal de Mecubúri, Moçambique
Nativa, Sinop, v. 9, n. 5, p. 588-593, 2021.
592
Tabela 3. Valores do índice de similaridade de Jaccard entre as áreas
estudadas da Reserva Florestal de Mecubúri, Moçambique.
Table 3. Pairwise Jaccard similarity indices between the studied areas
from the Mecubúri Forest Reserve, Mozambique.
Área
1
2
3
4
1
-
0,37
0,23
0,13
2
-
0,11
0,15
3 - 0,21
4 -
4. DISCUSSÃO
As atividades identificadas nesse trabalho como sendo as
mais praticadas pela população residente da RFM são, em
adição à mineração, as que contribuem para a redução da
cobertura florestal e degradação dos ecossistemas em
Moçambique (SITOE; MAÚSSE-SITOE, 2009). De acordo
com o MICOA (2007), quando estas atividades o realizadas
em regiões com enormes aglomerados populacionais
resultam na destruição e/ou redução da biodiversidade e dos
habitats e na perda de fertilidade dos solos.
Na RFM, a família Fabaceae constitui a principal família,
em acordo com Gomes et al. (2021), que afirma que se trata
da família dominante nas florestas de Miombo, que é a
vegetação característica da área de estudo. As diferenças na
composição de espécies entre as áreas podem ser atribuídas à
diferenças nas atividades antrópicas (queimada
descontroladas, abertura de campos agrícolas e exploração
florestal). As variações climáticas, edáficas, nutrientes do
solo, fauna, uso passado e presente do solo, estágio
sucessional da floresta, diferenças no tipo perturbação, o
regime de uso florestal (concessão florestal, Reserva
Florestal, zona de uso múltiplo, floresta comunitária) e outros
distúrbios de origem antrópica afetam a composição de
espécies de uma determinada área. A predominância de
Julbernardia globiflora e as espécies do gênero Brachystegia é
explicada pelo fato de serem as principais componentes da
florestal de Miombo. Por seu turno, a ocorrência de espécies
em uma única área, pode dever-se a sua adaptação às
condições ambientais locais como saturação hídrica, teor de
nutrientes e pH do solo (SILVA et al., 2009).
As principais espécies de miombo se destacaram em
termos de importância ecológica nas quatro áreas da RFM.
No levantamento fitossociológico realizado numa floresta de
Miombo no norte de Moçambique, a Julbernardia paniculata foi
a espécie ecologicamente mais importante com IVI igual a
13,3%, seguido de Combretum adenogonium (IVI = 6,1%),
Pteleopsis myrtifolia (IVI = 5,4%), Burkea africana (IVI = 5,4%)
e Brachystegia spiciformis (IVI = 5,4%)
(NANVONAMUQUITXO et al., 2019).
Os valores do número de árvores por hectare obtidos
neste trabalho foram baixos quando comparado com a média
obtida por Uetela (2014), que foi de 452 árvores/ha. A
variação no número de árvores/ha entre as áreas pode ser
justificada pelo histórico de perturbação por atividade
humana, estágio sucessional, diferenças nas unidades
amostrais, tipo de amostragem empregues nos estudos, e
condições ambientais locais. O menor número de árvores na
área agrícola revela que as atividades agrícolas são as que mais
contribuem na desflorestação da RNM. Em Moçambique,
todos os anos, durante a estação seca, novas áreas de floresta
são cortadas para a abertura de novas áreas para a agricultura,
sendo essa atividade uma das maiores ameaças à
biodiversidade (MANANZE et al., 2016).
A distribuição diamétrica em j-invertido sugere que os
indivíduos maiores se encontram em menor número porque
são explorados. De acordo com Westphal et al. (2006), este
padrão sugere a existência de um balanço entre o
recrutamento e a mortalidade de indivíduos, garantindo o
processo dinâmico da floresta.
A regeneração é indicativa de uma floresta em equilíbrio
e em bom estado de conservação. Espécies que não
apresentam regeneração correm o risco de extinção e
demandam maior atenção (JUNIOR et al., 2013). No
presente estudo, a quantidade reduzida de árvores nas
categorias de tamanho mais baixas indica desequilíbrio na
estrutura vertical da floresta, provavelmente, ocasionado por
perturbações antrópicas (BRAGA et al., 2015). As espécies
com menor abundância e frequência apresentaram menor
regeneração nas duas categorias de tamanho por
apresentarem baixa produção e dispersão de sementes
(JUNIOR et al., 2013). As áreas de queimada e agrícola
apresentaram maior regeneração em relação às áreas de
exploração florestal e de controlo. De acordo com
Chidumayo (1988), o fogo é parte integral do ecossistema de
Miombo, sendo um fator chave na dinâmica da regeneração,
desenvolvimento e distribuição espacial de várias espécies de
fauna e flora. Porém, o impacto do fogo sobre o Miombo
varia em função da época, da frequência de ocorrência e da
quantidade de material combustível na floresta. No estudo de
Zolho (2005) destaca-se que o efeito do fogo sobre a
regeneração natural tem maior incidência sobre os principais
géneros que compõem o Miombo.
Em relação ao padrão de distribuição dos indivíduos,
índice de Morisita, as espécies pioneiras que crescem em
florestas perturbadas ou fragmentadas geralmente
encontram-se distribuídas em aglomerados, ao contrário das
plantações onde as espécies distribuem-se uniformemente
devido ao espaçamento definido no ato do plantio
(NASCIMENTO et al., 2001). Portanto, as atividades
antrópicas desenvolvidas na RFM resultaram na
fragmentação da vegetação, criando conglomerados das
espécies vegetais com consequência na redução da
abundância. Em outro estudo em que foi analisada a
diversidade florística, estrutura e distribuição espacial de
espécies que ocorrem num remanescente de Floresta
Ombrófila Mista, o índice de Morisita indicou que cerca de
75% das espécies apresentavam padrão de distribuição
agregado (SILVESTRE, 2012).
A baixa similaridade verificada entre as áreas de estudo
pode dever-se às diferenças dos componentes físicos e
químicos do solo, topografia e da reduzida quantidade de
espécies comuns entre as áreas. No nosso trabalho, as
atividades praticadas nas diferentes áreas da RFM causam um
nível de perturbação diferente. Em um estudo realizado
numa área de Miombo no centro do país, foram obtidos
índices de similaridade de Jaccard entre 0,15 e 0,31 para
espécies pertencentes a áreas florestadas e campos agrícolas
abandonados (WILLIAMS et al., 2008).
5. CONCLUSÕES
Na Reserva Florestal de Mecubúri são praticadas as
seguintes atividades antrópicas que afetam a cobertura
florestal: exploração florestal, queimadas descontroladas,
agricultura, produção de carvão e construção de habitações.
Essas atividades têm contribuído na redução da cobertura
florestal e na degradação do ecossistema. Como resultado, a
Mário et al.
Nativa, Sinop, v. 9, n. 5, p. 588-593, 2021.
593
maior parte das espécies vegetais encontra-se distribuída de
forma aleatória. A distribuição das árvores por classes
diamétricas seguiu o padrão J-invertido, característico de
florestas naturais, com o maior número de árvores na menor
classe de diâmetro, reduzindo com o aumento das classes
diamétricas.
As espécies Julbernardia globiflora, Diplorhynchus
condylocarpon, Brachystegia utilis, Millettia stuhlmannii, Afzelia
quanzensis, Burkea africana e Cussonia arborea, são as de maior
valor ecológico na área. A similaridade entre as áreas foi baixa
e o maior número de árvores por hectare foi encontrado na
área de controlo, sendo o menor número encontrado na área
agrícola.
6. REFERÊNCIAS
BRAGA, E. O; SILVA, J. A. F; PANTOJA, M. V.; JARDIM,
M. A. G. Florística, estrutura fitossociológica e formas de
vida do estrato inferior em uma floresta de várzea
Amazônica. Biota Amazónica, v. 5, n. 3, p. 59-65, 2015.
DOI: http://dx.doi.org/10.18561/2179-
5746/biotaamazonia.v5n3p59-65
GOMES, A. L.; REVERMANN, R.; MELLER, P.;
GONÇALVES, F. M. P.; AIDAR, M. P. M.; LAGES, F.;
FINCKH, M. Functional traits and symbiotic
associations of geoxyles and trees explain the dominance
of detarioid legumes in miombo ecosystems. New
Phytologist, v. 230, n. 2, p. 510-520. DOI:
https://doi.org/10.1111/nph.17168
HOSOKAWA, R. T.; MOURA, J. B.; CUNHA, U. S.
Introdução ao manejo e economia de florestas.
Curitiba: Editora UFPR, 2008. 164 p.
JÚNIOR, E. V. F.; SOARES, T. S.; COSTA, M. F. F.;
SILVA, V. S. M. Composição, diversidade e similaridade
florística de uma floresta tropical semi-decídua sub-
montana em Marcelândia - MT. Acta Amazonica, v. 38,
n. 4, p. 673-680, 2008. DOI:
https://doi.org/10.1590/S0044-59672008000400010
JUNIOR, F. T. A.; FERREIRA, R. L. C.; SILVA, J. A. A.;
MARANGON, L. C.; CESPEDES, G. H. G.
Regeneração Natural de uma Área de Caatinga, no Sertão
Pernambucano, nordeste do Brasil. Cerne, v. 19, n. 2, p.
229-235, 2013. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-
77602013000200006
MAE-MOÇAMBIQUE_Ministério da Administração
Estatal. Perfil de Desenvolvimento do Distrito de
Mecuburi – Nampula. Maputo, 2005. 51p.
MANANZE, S. E.; SILVA, J. N.; VASCONCELOS, M. J.
P. Quantificação do Desmatamento na Reserva Florestal
de Mecubúri – Moçambique. Sociedade e Território, v.
28, n. 1, p. 27-47, 2016.
MARZOLI, A. Inventário Florestal Nacional. Avaliação
Integrada das Florestas de Moçambique - AIFM. Maputo:
Direcção Nacional de Terras e Florestas, 2007. 109p.
MICOA-MOÇAMBIQUE_Ministério para a Coordenação
da Ação Ambiental. Plano de Ação para a Prevenção e
Controlo às Queimadas Descontroladas 2008-2018.
Maputo. 2007. 53p.
NASCIMENTO, A. R. T.; LONGHI, S. J.; BRENA, D. A.
Estrutura e padrões de distribuição espacial de espécies
arbóreas em uma amostra de floresta ombrófila mista em
nova prata. Ciência Florestal, v. 11, n. 1, p. 109-115,
2001.
NUBE, T. G.; DOS SANTOS, A. S. J.; JUNIOR, R. T.;
SILVA, I. C. Impactos socioeconômicos das plantações
florestais no Niassa, Moçambique. Floresta e Ambiente,
v. 23, n. 1, p .52-60, 2016. DOI:
https://doi.org/10.1590/2179-8087.038813
SILVA, A. C.; HIGUCHI, P.; FILHO, A. T. O.;
GRANATE, J. J.; MARQUES, M. Florística e estrutura
da comunidade arbórea em fragmentos de floresta aluvial
em São Sebastião da Bela Vista, Minas Gerais, Brasil.
Revista Brasileira de Botânica, v. 32, n. 2, p. 283-297,
2009. DOI: https://doi.org/10.1590/S0100-
84042009000200008
SITOE, A.; MAÚSSE-SITOE, S. Construindo parcerias
florestais: Potencial das reservas florestais na
redução do desmatamento com participação das
comunidades locais. Maputo: ICPF, 2009. 22p.
SOUZA, P. A. de; VENTURIN, N.; MACEDO, R. L. G.;
ALVARENGA, M. I. N.; SILVA V. F. da.
Estabelecimento de espécies arbóreas em recuperação de
área degradada pela extração de areia. Cerne, v. 7, n. 2, p.
43-52, 2001.
UETELA, A. E. Dinâmica e prognose de produção de
uma floresta de Miombo utilizando matriz de
transição. 2014. Dissertação (Mestrado em Ciências
Florestais). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
2014. 90p. Disponível em
<http://www.floresta.ufpr.br/pos-
graduacao/defesas/pdf_ms/2014/d687_0180-M.pdf>.
Acesso em: 23 set 2020.
ZOLHO, R. Effect of fire frequency on the regeneration
of Miombo woodland in Nhambita, Mozambique.
Tese de mestrado. University of Edinburgh. 2005. 71p.
Dissertação (Mestrado em Ciências). Universidade de
Edinburgh. Disponível em <
https://www.biofund.org.mz/biblioteca_virtual/effect-
of-fire-frequency-on-the-regeneration-of-miombo-
woodland-in-nhambita-mozambique/>. Acesso em: 26
jun 2020.
NANVONAMUQUITXO, S. J. A.; MACUEIA, F. B. E. D.;
CARAVELA, M. I. Estrutura e diversidade de uma
floresta de Miombo em Taratibu, Norte de Moçambique.
Nativa, v. 7, n. 6, p. 778-783. 2019. DOI:
http://dx.doi.org/10.31413/nativa.v7i6.7198
CHIDUMAYO, E. N. A re-assessment of effects of fire on
miombo regeneration in the Zambian Copperbelt.
Journal of Tropical Ecology, v. 4, n. 4, p. 361-372,
1988.
WILLIAMS, M.; RYAN, C. M.; REES, R. M.; SAMBANE,
E.; FERNANDO, J.; GRACE, J. Carbon sequestration
and biodiversity of re-growing miombo woodlands in
Mozambique. Forest Ecology and Management, v.
254, n. 2, p. 145-155, 2008. DOI:
https://doi.org/10.1016/j.foreco.2007.07.033.
SILVESTRE, R.; KOEHLER, H. S.; MACHADO, S. A.;
BALBINOT, R.; WATZLAWICK, L. F. Florística,
estrutura e distribuição espacial de espécies ocorrentes
em um remanescente de floresta ombrófila mista.
Ambiência, v. 8, n .2, p. 259-274, 2012.