Uso de produtos florestais não madeireiros em comunidades da Flona Tapajós
Nativa, Sinop, v. 9, n. 3, p. 302-309, mai./jun. 2021.
que obstruam a trilha, matar animais peçonhentos, entre
outros (SILVA et al., 2014).
Na comunidade de Jamaraquá, os produtos gerados pelas
sementes são confeccionados por um grupo de mulheres que
produzem as biojoias e os artesanatos. A confecção ocorre
na casa das artesãs, que posteriormente são levados para um
local comunitário para serem expostos aos visitantes
As mulheres artesãs de Jamaraquá, destacaram a
habilidade de coleta de sementes, para a confecção de
biojoias, utilizando seus conhecimentos empírico sobre o uso
do ecossistema florestal, para identificar as sementes mais
resistentes, onde encontrar, em qual período do ano, período
de perecibilidade, dentre outras atribuições (SILVA et al.,
2014). No presente estudo, as mulheres são a maioria nas
atividades envolvendo PFNMs, principalmente no
artesanato. Porém, foi evidenciada a participação dos homens
como o descobridor de novos pontos de coleta de sementes.
A relação das mulheres e os PFNMs é baseado
historicamente na cultura de alguns povos em coletar
alimentos, combustíveis e matéria-prima para artesanatos
como uma atividade atribuída ao gênero feminino. Em
contrapartida, o homem tem a função de coletar produtos
utilizados com menos frequência, como a madeira para
construção de casas, postes e cercas, além de outros serviços
considerados pesados como a caça (Shackleton et al., 2011).
As mulheres em Jamaraquá não coletam as sementes na
floresta, é um trabalho dos homens (esposos e filhos) que vão
à floresta, no ecossistema de terra firme, em busca de
morototó, tento vermelho, paxiúba (Socratea exorrhiza (Mart.)
H.Wendl.) e, no ecossistema de igapó, colhem o tento
amarelo.
Assim também acontece em Maguari, as famílias
envolvidas nessa atividade têm suas tarefas bem divididas. Os
homens coletam as sementes, e as mulheres fazem o
beneficiamento e a montagem das biojoias, assim como em
São Domingos. As espécies coletadas são: jutaí, saboneteira,
morototó, tento vermelho, seringa, caracaxá ou jupati,
cérebro de macaco e o flamboyant são coletados na floresta,
enquanto o tento amarelo é coletado na praia, além da
extração do látex para fazer as mantas de FSA.
Em Maguari, a coleta de semente é destinada à montagem
de biojoias, e a madeira, para fabricação de animais
entalhados usados em decoração. Na produção das biojoias
cada artesão vende sua produção na sua residência, mas a
confecção é feita em pequenos grupos de mulheres, que se
reúnem na casa de uma artesã, normalmente com a matriarca
da família, para a montagem.
A produção das biojoias em Maguari foi impulsionada
pelo crescente turismo na comunidade em que os turistas
ficam hospedados nas casas dos comunitários. Além da
hospedagem, a venda de artesanato e biojoias foram
incrementadas para que os visitantes pudessem levar uma
lembrança do local. A produção de biojoias na comunidade
visa a comercialização em escala local para os visitantes da
comunidade (SILVA et al., 2014; SILVA et al., 2016).
Quanto a comunidade de São Domingos a produção
familiar gira em torno de cestas, biojoias e artesanato em
madeira, mas sua principal renda advém do ecoturismo. A
produção do artesanato e da biojoias já eram praticados pelo
núcleo familiar, no entanto, para uso pessoal. Com o
vislumbre de agregar valor cultural para que os turistas
pudessem associar algo da comunidade a cultura local, além
da possibilidade de renda extra para a subsistência familiar,
começaram a produzir artesanatos e biojoias para exposição
e venda aos turistas.
O turismo alicerçado nas comunidades vem beneficiando
as populações tradicionais nas três comunidades do presente
estudo. O Plano de Manejo da Unidade prevê e incentiva esse
tipo de atividade, tanto que já foram oferecidos cursos de
capacitação aos comunitários, incluindo cursos destinados
para a melhoria das técnicas de produção de biojoias,
investimentos na infraestrutura e implantação de trilhas. No
entanto, vínculos precisam ser restabelecidos
e novas parcerias feitas para que esse alvo seja alcançado
(MOREIRA; BURNS, 2015).
A produção de biojoias, utilizando os recursos da
natureza, ao mesmo tempo promovem a valorização da
cultura e mão de obra local, contribui significativamente para
o desenvolvimento sustentável como um todo (GONDIM,
2015). A produção e a coleta de sementes da floresta nas
Comunidades de São Domingos, Maguari e Jamaraquá é uma
atividade social direcionada à conservação da floresta, por
não retirar recursos além de suas necessidades e, dessa forma,
colaborar com o manejo tradicional e usufruto dos recursos
disponíveis no entorno das comunidades (SILVA et al.,
2016).
Muitos povos indígenas já utilizavam sementes na
confecção de suas indumentárias de rituais, atualmente esses
artefatos são vendidos nas cidades por várias etnias indígenas
(ZEA, 2006; CARVALHO, 2015). A etnias Wai-Wai, do
território indígena (T.I), Nhamundá-Mapuerá, em
Oriximiná-PA, confeccionam biojoias principalmente das
sementes de morototó que são coletadas no entorno de suas
habitações. Essas sementes são beneficiadas e tingidas para a
elaboração de diversas peças (ZEA, 2006).
A etnia Saterê-Mawé, localizada no médio Rio Amazonas,
denominada T.I. Andirá-Marau, na fronteira dos Estados do
Amazonas e do Pará, também utilizam as sementes de
diversas espécies, a saber: jarina (Phytelephas macrocarpa Ruiz &
Pav.), murumuru (Astrocaryum murumuru Mart.), ingarana
(Abarema jupunba Barneby & Grimes), morototó, puçá
(Mouriri apiranga Spruce ex Triana) e o tucumã
(CARVALHO, 2015).
A produção das biojoias nas comunidades da Flona
Tapajós tornou-se um complemento de renda para muitas
famílias. Porém, deve ser realizada de maneira sustentável,
sem agressão ao meio ambiente e sem a geração de muitos
resíduos durante as etapas de produção. Esses processos
fortalecem as culturas regionais, pois os materiais para
confecção das biojoias são encontrados nas florestas,
refletindo os valores sociais, culturais e econômicos de cada
parte do país (GONDIM, 2015).
A atribuição de valor aos produtos mostra que os artesãos
se preocupam com a qualidade das peças produzidas e, dessa
forma, eles compreendem que o consumidor vai ter uma
melhor aceitação do produto (SEBRAE, 2014; SILVA et al.,
2014; SILVA et al., 2016). Entretanto, alguns aspectos
relacionados ao controle do que é vendido, ou qual peça tem
maior aceitação, ainda não é percebida como importante,
assim, não se tem uma ideia de qual item tem maior
aprovação por parte dos compradores que visitam as
comunidades. Em Jamaraquá e Maguari a maioria dos
artesãos possui controle do que é vendido, mostrando uma
maior organização, em relação aos de São Domingos, que
não possuem controle na produção e venda de suas peças.
Os critérios para atribuir valor monetário às sementes são
a dureza, dificuldade para encontrá-las na floresta e valor
estético. Quanto mais duras, as sementes oferecem mais